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Política e Serviços de Saúde Mental: Reduzindo Barreiras e Promovendo Cuidados Mentais, Provas de Serviço Social

Uma resolução de problemas relacionados à saúde mental, incluindo a compreensão da relação entre saúde mental e física, a formação de profissionais de saúde mental, a inclusão de saúde mental em programas de formação, a prestação de serviços de saúde mental na comunidade e a importância de reduzir os obstáculos ao tratamento e aos cuidados. Além disso, discute a necessidade de aumentar as verbas para programas de saúde mental, a participação de outros setores além da saúde, a monitorização da saúde mental e a necessidade de mais pesquisas sobre os aspectos biológicos e psicossociais da saúde mental.

Tipologia: Provas

2010

Compartilhado em 05/08/2010

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vanessa-canato-11 🇧🇷

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RELATÓRIO
MUNDIAL
DA SAÚDE
Saúde mental: nova concepção, nova esperança
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RELATÓRIO

MUNDIAL

DA SAÚDE

Saúde mental: nova concepção, nova esperança

Ministério da Saúde Direcção-Geral da Saúde

RELATÓRIO

MUNDIAL

DA SAÚDE

Saúde mental: nova concepção, nova esperança

APRESENTAÇÃO DA EDIÇÃO PORTUGUESA

No âmbito das actividades desenvolvidas no transcurso do ano de 2001, que foi dedicado à discussão do tema Saúde Mental pela Organização Mundial da Saúde, temos a satisfação de apresentar esta edição em língua portuguesa do Relatório Mundial de Saúde 2001, que traz uma importante contribuição para o aprofundamento do nosso conhecimento neste campo relevante da Saúde Pública.

Nesta edição, optou-se por publicar apenas o conteúdo específico referente à Saúde Mental, podendo o anexo estatístico geral ser consultado na página WEB da OMS, em http://www.who.int/whr/.

Os redactores principais do presente relatório foram Rangaswamy Srinivasa Murthy (redac- tor-chefe), José Manoel Bertolote, JoAnne Epping-Jordan, Michelle Funk, Thomson Prentice, Benedetto Saraceno e Shekhar Saxena. O relatório foi preparado sob a direcção de uma comissão coordenadora formada por Susan Holck, Christopher Murray (Presidente), Rangaswamy Srinivasa Murthy, Thomson Prentice, Benedetto Saraceno e Derek Yach.

Toda a equipa do relatório tem a agradecer as contribuições recebidas de Gavin Andrews, Sarah Assamagan, Myron Belfer, Tom Bornemann, Meena Cabral de Mello, Somnath Chatterji, Daniel Chisholm, Alex Cohen, Leon Eisenberg, David Goldberg, Steve Hyman, Arthur Kleinmann, Alan

Lopez, Doris Ma Fat, Colin Mathers, Maristela Monteiro, Philip Musgrove, Norman Sartorius, Chitra Subramanian, Naren Wig e Derek Yach.

Foi recebida a valiosa contribuição de um grupo consultivo interno e de um grupo de referência regional cujos nomes estão listados no Apêndi- ce. A equipa do relatório expressa a sua gratidão aos Directores Regionais, aos Directores Execu- tivos da Sede da OMS e aos assessores especi- ais da Directora-Geral pela sua assistência e conselhos suplementares.

A organização editorial do relatório esteve a cargo de Angela Haden e Barbara Campanini. A preparação das tabelas e figuras foi coordenada por Michel Beusenberg.

Produzido por Climepsi Editores sob encomenda da Direcção-Geral da Saúde

Tradução Gabinete de Tradução Climepsi Editores Capa Paulo Novo Revisão Fernanda Fonseca Paginação Miguel Velez Impressão e acabamento Moinho Velho – Loja de Edição, Lda.

CLIMEPSI EDITORES CLIMEPSI – Sociedade Médico-Psicológica, Lda. Rua Pinheiro Chagas, 38, 1.º D.to 1050-179 LISBOA – PORTUGAL Telefone: +351 213174711 Fax: +351 213528574 E-mail: info@climepsi.pt www.climepsi.pt

    1. A saúde mental pelo prisma da saúde pública Três cenários para a acção XIX
    • Introdução
    • Para compreender a saúde mental
    • Compreensão das perturbações mentais e comportamentais
    • Uma abordagem integrada de saúde pública
    1. O peso das perturbações mentais e comportamentais
    • Identificação das perturbações
    • Diagnóstico das perturbações
    • Prevalência das perturbações
    • Impacte das perturbações
    • Algumas perturbações comuns
    • Co-morbilidade
    • Suicídio
    • Determinantes das perturbações mentais e comportamentais
    1. A resolução de problemas de saúde mental
    • Um paradigma em mudança
    • Princípios dos cuidados
    • Ingredientes dos cuidados ..................................................................
    • Exemplos de eficácia..........................................................................
    1. Política e prestação de serviços de saúde mental ................................
    • Formulação de políticas.....................................................................
    • Formulação da política de saúde mental ............................................
    • Promoção da saúde mental ................................................................
    • A participação de outros sectores.......................................................
    • Promoção da pesquisa .......................................................................
    1. O caminho a seguir............................................................................
    • Fornecer soluções eficazes..................................................................
    • Recomendações gerais .......................................................................
    • Medidas a tomar em função dos recursos disponíveis ........................
  • Referências .............................................................................................
  • Agradecimentos ......................................................................................

A doença mental não é sinal de malogro pes- soal. Não acontece só aos os outros. Todos nos lembramos de uma época, ainda não há muito tempo, em que não se podia falar abertamente sobre cancro. Era segredo de família. Ainda hoje muitos de nós preferiríamos não falar sobre SIDA. Estas barreiras estão a ser, pouco a pouco, derru- badas. O Dia Mundial da Saúde 2001 teve por lema «Cuidar, sim. Excluir, não». A sua mensagem era a de que não se justifica ex- cluir das nossas comunidades as pessoas que têm doenças mentais ou perturbações cere- brais – há lugar para todos. No entanto, muitos de nós ainda nos afastamos assusta- dos de tais pessoas ou fingimos ignorá-las – como se não nos atrevêssemos a compreender e a aceitar. O tema deste relató- rio é «Nova Concepção, Nova Esperança». Ele mostra como a ciência e a sensibilidade se combinam para derrubar as barreiras reais à prestação de cui- dados e à cura em saúde mental. Isso porque existe uma nova compreensão que oferece uma esperança real aos doentes mentais: a compreensão de como factores genéticos, biológicos, sociais e ambientais se juntam para causar doenças da mente e do cérebro; a compreensão de como são realmente inseparáveis a saúde mental e a física, e de como é complexa e profunda a influência de uma sobre a outra. E isso é apenas o começo. Para mim, falar sobre saúde sem falar em saúde mental é como afinar um instrumento e deixar algumas notas dissonantes. A OMS está a fazer uma declaração muito simples: a saúde mental – negli- genciada durante demasiado tempo – é essencial para o bem-estar geral das pessoas, das sociedades e dos países, e deve ser universalmente encarada sob uma nova luz.

MENSAGEM

DA DIRECTORA-GERAL

D.ra^ Gro Harlem Brundtland

MENSAGEM DA DIRECTORA-GERAL XIII

compreensão da relação entre saúde mental e física vem aumentando rapida- mente. Sabemos que as perturbações mentais resultam de muitos factores e que têm a sua base física no cérebro. Sabemos que elas podem afectar a todos, em toda a parte. E sabemos que, mais frequentemente do que se pensa, podem ser tratadas eficazmente. Este relatório aborda as perturbações depressivas, a esquizofrenia, o atraso mental, as perturbações da infância e da adolescência, a dependência das dro- gas e do álcool, a doença de Alzheimer e a epilepsia. Todas estas perturbações são comuns, e todas causam grave incapacidade. A epilepsia, embora não seja uma doença mental, foi incluída porque enfrenta muitas vezes os mesmos estig- mas, a mesma ignorância e o mesmo medo associado às doenças mentais. O nosso relatório é uma revisão geral daquilo que sabemos sobre o peso actual e futuro de todas essas perturbações e dos principais factores que para elas contribuem. Ele aborda a eficácia da prevenção e a disponibilidade, bem como os obstáculos, do tratamento. Examinamos detidamente a prestação e o planeamento de serviços. E o relatório termina enunciando resumidamente as políticas necessárias para assegurar o fim do estigma e da discriminação, bem como a implantação da prevenção e do tratamento eficaz, com financiamento adequado. Em diferentes contextos, fazemos esta simples afirmação: dispomos dos meios e do conhecimento científico para ajudar os portadores de perturbações mentais e cerebrais. Os Governos têm-se mostrado descuidados, tanto como a comunidade da saúde pública. Por acidente ou por desígnio, todos somos res- ponsáveis por esta situação. Como principal instituição mundial de saúde públi- ca, a OMS tem uma e apenas uma opção: assegurar que a nossa geração seja a última a permitir que a vergonha e o estigma tomem a dianteira sobre a ciência e a razão.

Gro Harlem Brundtland Genebra Outubro de 2001

XVI RELATÓRIO MUNDIAL DA SAÚDE

Para que isso aconteça, porém, é preciso que o pessoal de saúde em geral receba formação quanto às aptidões essenciais dos cuidados em saúde mental. Essa formação garante o melhor uso dos conhecimentos disponíveis para o maior número de pessoas e possibilita a imediata aplicação das intervenções. Assim, a saúde mental deve ser incluída nos programas de formação, com cursos de actualização destinados a melhorar a eficácia no tratamento de per- turbações mentais nos serviços gerais de saúde.

2. Disponibilizar medicamentos psicotrópicos

Devem ser fornecidos, e estar constantemente disponíveis, medicamentos psicotrópicos essenciais em todos os níveis de cuidados de saúde. Estes medi- camentos devem ser incluídos nas listas de medicamentos essenciais de todos os países, e os melhores, para tratamento das afecções, devem estar disponí- veis sempre que possível. Em alguns países, isso pode exigir modificações na legislação reguladora. Esses medicamentos podem atenuar os sintomas, redu- zir a incapacidade, abreviar o curso de muitas perturbações e prevenir as recorrências. Muitas vezes, eles proporcionam o tratamento de primeira linha, especialmente em situações em que não estão disponíveis intervenções psicos- sociais nem profissionais altamente qualificados.

3. Proporcionar cuidados na comunidade

A prestação de cuidados, com base na comunidade, tem melhor efeito so- bre o resultado e a qualidade de vida das pessoas com perturbações mentais crónicas do que o tratamento institucional. A transferência de doentes dos hospitais psiquiátricos para a comunidade é também eficaz em relação ao cus- to e respeita os direitos humanos. Assim, os serviços de saúde mental devem ser prestados na comunidade, fazendo uso de todos os recursos disponíveis. Os serviços de base comunitária podem levar a intervenções precoces e limitar o estigma associado com o tratamento. Os grandes hospitais psiquiátricos, de tipo carcerário, devem ser substituídos por serviços de cuidados na comunida- de, apoiados por camas psiquiátricas em hospitais gerais e cuidados domici- liários, que respondam a todas as necessidades dos doentes que eram da res- ponsabilidade daqueles hospitais. Essa mudança para os cuidados comunitários requer a disponibilidade de trabalhadores em saúde e serviços de reabilitação a nível da comunidade, juntamente com a prestação de apoio, em face de cri- ses, e protecção na habitação e no emprego.

PANORAMA GERAL XVII

4. Educar o público

Devem ser lançadas, em todos os países, campanhas de educação e sensibilização do público sobre a saúde mental. A meta principal é reduzir os obstáculos ao tratamento e aos cuidados, aumentando a consciência sobre a frequência das perturbações mentais, a sua susceptibilidade ao tratamento, o processo de recuperação e o respeito pelos direitos humanos das pessoas com tais perturbações. As opções de cuidados disponíveis e os seus benefícios de- vem ser amplamente divulgados, de tal forma que as respostas da população em geral, dos profissionais, dos media , dos formuladores de políticas e dos políticos reflictam os melhores conhecimentos disponíveis. Isso já é uma prio- ridade em diversos países e em várias organizações nacionais e internacionais. Uma campanha de sensibilização e educação do público bem planeada pode reduzir o estigma e a discriminação, fomentar a utilização dos serviços de saúde mental e conseguir uma aproximação maior entre a saúde mental e a saúde física.

5. Envolver as comunidades, as famílias e os utentes

As comunidades, as famílias e os utentes devem ser incluídos na formula- ção e na tomada de decisões sobre políticas, programas e serviços. Isso deve resultar num melhor dimensionamento dos serviços face às necessidades da população e na sua melhor utilização. Além disso, as intervenções devem levar em conta a idade, o sexo, a cultura e as condições sociais, a fim de atender às necessidades das pessoas com perturbações mentais e das suas famílias.

6. Estabelecer políticas, programas e legislação nacionais

A política, os programas e a legislação sobre saúde mental constituem fases necessárias de uma acção significativa e sustentada, devendo basear-se nos conhecimentos actuais e na consideração pelos direitos humanos. A maioria dos países terá de aumentar as suas verbas para programas de saúde mental. Alguns, que recentemente elaboraram ou reformularam as suas políticas e leis, registaram progressos na implementação dos seus programas de cuidados em saúde mental. As reformas da saúde mental devem fazer parte das reformas maiores do sistema de saúde. Os planos de seguros de saúde não devem discri- minar as pessoas com perturbações mentais, proporcionando um maior aces- so ao tratamento e reduzindo os encargos da prestação de cuidados.

PANORAMA GERAL XIX

10. Apoiar mais a pesquisa

Há necessidade de mais pesquisas sobre os aspectos biológicos e psicosso- ciais da saúde mental, a fim de melhorar a compreensão das perturbações mentais e de desenvolver intervenções mais eficazes. Tais pesquisas devem ser levadas a cabo numa ampla base internacional, visando a compreensão das variações de uma para outra comunidade e um maior conhecimento dos facto- res que influenciam a origem, evolução e resultado das perturbações mentais. É urgente o fortalecimento da capacidade de investigação nos países em desen- volvimento.

Três cenários para a acção

Para que estas recomendações sejam efectivamente postas em prática, é crítica a acção internacional, porque muitos países carecem dos recursos ne- cessários. Os organismos técnicos e de desenvolvimento das Nações Unidas, assim como outros, podem ajudar os países no incremento das infra-estrutu- ras de saúde mental, na formação de recursos humanos e no fortalecimento da capacidade de pesquisa. Para ajudar a orientar os países, o relatório sugere, na parte final, «três cenários para a acção», de acordo com os diferentes níveis de recursos nacio- nais para a saúde mental no mundo. O Cenário A, por exemplo, aplica-se aos países economicamente mais pobres, onde tais recursos estão completamente ausentes ou são muito limitados. Mesmo nesses casos, podem aplicar-se ac- ções específicas, tais como preparar todo o pessoal, disponibilizar medicamen- tos essenciais em todos os serviços de saúde e tirar da prisão os doentes men- tais. Para os países com níveis moderados de recursos, o Cenário B sugere, entre outras acções, o encerramento dos hospitais custodiais para doentes mentais e outras medidas, no sentido de integrar os cuidados de saúde mental nos cuidados de saúde geral. O Cenário C, para os países que têm mais recur- sos, propõe aperfeiçoamentos do tratamento em cuidados primários de saúde, acesso mais fácil a novos medicamentos e serviços de cuidados comunitários que proporcionem 100% de cobertura. Todas estas acções e recomendações são reflexo do próprio relatório.

Configuração do relatório

O Capítulo 1 apresenta ao leitor uma nova concepção de saúde mental e explica porque esta é tão importante a saúde física quanto para o bem-estar geral dos indivíduos, das famílias, das sociedades e das comunidades.

XX RELATÓRIO MUNDIAL DA SAÚDE

A saúde mental e a saúde física são dois elementos da vida estreitamente entrelaçados e profundamente interdependentes. Avanços na neurociência e na medicina do comportamento já mostraram que, como muitas doenças físi- cas, as perturbações mentais e comportamentais resultam de uma complexa interacção de factores biológicos, psicológicos e sociais. Com o avanço da revolução molecular, os investigadores estão a adquirir a capacidade de observar o trabalho do cérebro humano vivo e pensante e de ver e compreender porque, às vezes, funciona pior do que poderia funcionar. Avan- ços futuros trarão uma compreensão mais completa de como o cérebro está relacionado com formas complexas de funcionamento mental e comportamen- tal. Inovações no levantamento de imagens cerebrais e outras técnicas de investigação permitirão um «filme em tempo real» do sistema nervoso em acção. Entretanto, a evidência científica trazida do campo da medicina do com- portamento demonstrou a existência de uma relação fundamental entre saúde mental e física – por exemplo, que a depressão pressagia a ocorrência de per- turbação cardíaca. As pesquisas mostram que existem duas vias principais pelas quais a saúde física e a mental influenciam-se mutuamente. Uma dessas vias são os sistemas fisiológicos, como o funcionamento neu- roendócrino e imunitário. Os estados afectivos angustiados e deprimidos, por exemplo, desencadeiam uma cascata de mudanças adversas no funcionamento endócrino e imunitário e criam uma maior susceptibilidade a toda uma série de doenças físicas. Outra via é o comportamento saudável, que diz respeito a, por exemplo, regime alimentar, exercício, práticas sexuais, uso de tabaco e observância de tratamentos médicos. O comportamento de uma pessoa em matéria de saúde depende muito da sua saúde mental. Por exemplo, indícios recentes vieram mostrar que os jovens com problemas psiquiátricos, como a depressão e o abuso de substâncias, têm mais probabilidades de se tornarem fumadores e ter um comportamento sexual de alto risco. Os factores psicológicos do indivíduo estão também relacionados com o desenvolvimento de perturbações mentais. A relação da criança com os seus pais, ou outros prestadores de cuidados, durante a infância tem um carácter crítico. Seja qual for a causa específica, a criança privada de um envolvimento afectivo tem mais probabilidades de sofrer perturbações de comportamento, seja na infância seja mais tarde. Factores sociais, como a urbanização des- controlada, a pobreza e a rápida transformação tecnológica são também relevantes. É particularmente importante a relação entre saúde mental e pobreza: os pobres e os carentes apresentam uma maior prevalência de per- turbações, inclusive o abuso de substâncias. São grandes as lacunas no trata- mento da maioria destes problemas. Para os pobres, porém, essas lacunas são enormes.

XXII RELATÓRIO MUNDIAL DA SAÚDE

nas recomendações gerais. Trata-se da transferência positiva, recomendada para todos os países e já em curso em alguns, dos hospitais ou instituições de tipo clausura para a prestação de cuidados na comunidade, com apoio na disponibilidade de camas para casos agudos nos hospitais gerais. Na Europa, no século XIX, a doença mental era vista, por um lado, como assunto legítimo para a pesquisa científica: a psiquiatria germinou como disci- plina médica e os portadores de perturbação mental passaram a ser considera- dos pacientes da medicina. Por outro lado, os portadores dessas perturbações, tais como os que tinham muitas outras doenças e formas indesejáveis de com- portamento social, eram isolados da sociedade em grandes instituições carce- rárias, os manicómios públicos, que vieram depois a ser chamados hospitais psiquiátricos. Essas tendências foram depois exportadas para a África, as Américas e a Ásia. Durante a segunda metade do século XX, ocorreu uma mudança no para- digma dos cuidados de saúde mental, devida, em grande parte, a três factores independentes. Primeiro, registou-se um progresso significativo na psicofarma- cologia, com a descoberta de novas classes de medicamentos, especialmente agentes neurolépticos e antidepressivos, bem como o desenvolvimento de no- vas formas de intervenção psicossocial. Segundo, o movimento dos direitos humanos transformou-se num fenómeno verdadeiramente internacional, sob a égide da recém-criada Organização das Nações Unidas, e a democracia fez avanços em todo o mundo. Em terceiro lugar, foi firmemente incorporado um elemento mental no conceito de saúde definido pela recém-criada OMS. Jun- tas, essas ocorrências estimularam o abandono dos cuidados em grandes insti- tuições carcerárias a favor de um tratamento, mais aberto e flexível, na comu- nidade. O malogro dos manicómios é evidenciado por repetidos casos de maus- -tratos aos doentes, isolamento geográfico e profissional tanto das instituições quanto do seu pessoal, insuficiência dos procedimentos para notificação e pres- tação de contas, má administração e gestão ineficiente, má aplicação dos recur- sos financeiros, falta de formação do pessoal e procedimentos inadequados de inspecção e controlo da qualidade. Por outro lado, na perspectiva comunitária, o que se procura é proporcio- nar bons cuidados e a emancipação das pessoas com perturbação mental e de comportamento. Na prática, a perspectiva comunitária implica o desenvolvi- mento de uma ampla gama de serviços, em contextos locais. Esse processo, que ainda não começou em muitas regiões e países, tem em vista assegurar que sejam proporcionadas integralmente algumas das funções do asilo e que não sejam perpetuados os aspectos negativos das instituições. As características da prestação de cuidados, no âmbito comunitário, são as seguintes:

PANORAMA GERAL XXIII

  • serviços situados perto do domicílio, inclusive os cuidados proporcio- nados por hospitais gerais na admissão de casos agudos, e instalações residenciais de longo prazo na comunidade;
  • intervenções relacionadas tanto com as deficiências quanto com os sin- tomas;
  • tratamento e outros cuidados específicos para o diagnóstico e resposta às necessidades de cada indivíduo;
  • uma ampla gama de serviços que tem em conta as necessidades das pessoas com perturbações mentais e comportamentais;
  • serviços que são combinados e coordenados entre profissionais de saúde mental e organismos da comunidade;
  • serviços ambulatórios e não estáticos, inclusive aqueles que podem ofe- recer tratamento no domicílio;
  • parceria com os prestadores de cuidados e atendimento das suas neces- sidades;
  • legislação de suporte a todos estes aspectos.

Este capítulo, porém, não recomenda o encerramento de hospitais para doentes mentais sem que existam alternativas comunitárias, nem, por outro lado, a criação de alternativas comunitárias sem fechar os hospitais psiquiátri- cos. As duas coisas terão de ocorrer ao mesmo tempo, de forma paulatina e bem coordenada. Um processo de desinstitucionalização bem fundamentado tem três componentes essenciais:

  • prevenção das admissões impróprias em hospitais psiquiátricos, me- diante o fornecimento de serviços comunitários;
  • regresso à comunidade dos doentes institucionais de longo prazo, que tenham passado por uma preparação adequada;
  • estabelecimento e manutenção de sistemas de apoio comunitário para doentes não institucionalizados.

Em muitos países em desenvolvimento, os programas de cuidados em saúde mental têm baixa prioridade. A dotação de recursos é limitada a um pequeno número de instituições que geralmente estão com excesso de lotação e pessoal insuficiente e ineficiente. Os serviços denotam pouca compreensão das neces- sidades dos doentes ou da variedade de abordagens disponíveis para trata- mento. Não há cuidados psiquiátricos para a maioria da população. Os úni- cos serviços existentes estão situados em grandes hospitais psiquiátricos, que funcionam numa perspectiva mais penal do que terapêutica. Não são facil- mente acessíveis e convertem-se em comunidades fechadas, isoladas da socie- dade em geral. Não obstante as grandes diferenças nos cuidados de saúde mental, entre países em desenvolvimento e desenvolvidos, todos têm um problema comum: