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trata-se do voto do ministro barroso sobre o uso de drogas.
Tipologia: Trabalhos
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Não perca as partes importantes!
1. O consumo de drogas ilícitas, sobretudo daquelas consideradas pesadas, é uma coisa ruim. Por isso, o papel do Estado e da sociedade deve ser o de: a) desincentivar o consumo; b) tratar os dependentes; e c) combater o tráfico. Portanto, nada do que se dirá aqui – e creio que isso vale para todos os Ministros, independentemente de sua posição – deve ser interpretado como autorização ou incentivo ao consumo de drogas.
Esta a primeira prioridade: neutralizar, a médio prazo, o poder do tráfico. Para isso, só há uma solução: acabar com a ilegalidade das drogas e regular a produção e a distribuição. Esta ideia foi veiculada em um corajoso artigo de Helio Schwartsman, publicado na Folha de São Paulo de 19.08.2015. É importante o registro, mas não é isto o que está em discussão. O grande problema do direito é que não podemos fazer experimentação em laboratórios para saber se algo funciona ou não funciona. Por isso, temos que atuar aos poucos, passo a passo, testando soluções. A segunda prioridade entre nós deve ser impedir que as cadeias fiquem entupidas de jovens pobres e primários, pequenos traficantes, que entram com baixa periculosidade e na prisão começam a cursar a escola do crime, unindo-se a quadrilhas e facções. Há um genocídio brasileiro de jovens pobres e negros, imersos na violência desse sistema.
Por fim, como terceira prioridade, vem o consumidor. O consumidor não deve ser tratado como um criminoso, mas como alguém que se sujeita deliberadamente a um comportamento de risco. Risco da sua escolha e do qual se torna a principal vítima. Mas o risco por si só não é fundamento para a criminalização, ou teríamos que banir diversas atividades, do alpinismo ao mergulho submarino.
Estabelecidas estas premissas fáticas e filosóficas, passo a enunciar as razões pragmáticas que justificam a descriminalização.
1. Primeira razão: Fracasso da política atual Em lugar de reduzir a produção, o comércio e o consumo, a política mundial de criminalização e repressão produziu um poderoso mercado negro e permitiu o surgimento ou o fortalecimento do crime organizado. Paralelamente a isso, floresceu a criminalidade associada ao tráfico, que inclui, sobretudo, o tráfico de armas utilizadas nas disputas por territórios e nos confrontos com a polícia. Em contraste com o aumento do consumo de drogas, inclusive a maconha, o consumo de tabaco caiu drasticamente. Segundo dados trazidos pelo IBCCRIM, em
1984, 35% dos adultos consumiam cigarros. Em 2013, esse número caíra para 15%. Informação e advertência produzem, a médio prazo, resultados melhores do que a criminalização.
2. Segunda razão: Alto custo para a sociedade O modelo criminalizador e repressor produz um alto custo para a sociedade e para o Estado, resultando em aumento da população carcerária, da violência e da discriminação. Da promulgação da lei de drogas, em 2006, até hoje, houve um aumento do encarceramento por infrações relacionadas às drogas de 9% para 27%. Aproximadamente, 63% das mulheres que se encontram encarceradas o foram por delitos relacionados às drogas. Vale dizer: atualmente, 1 em cada 2 mulheres e 1 em cada 4 homens presos no país estão atrás das grades por tráfico de drogas. Cada vaga no sistema penitenciário custa, de acordo com o Depen, R$ 43.835,20. O custo mensal de cada detento é de cerca de R$ 2.000. Além do custo elevado, há outro fenômeno associado ao encarceramento: jovens primários são presos juntamente com bandidos ferozes e se tornam, em pouco tempo, em criminosos mais perigosos. Ao voltarem para a rua, são mais ameaçadores para a sociedade, sendo que o índice de reincidência é acima de 70%. Por fim, há um outro problema: como não há critério objetivo para distinguir consumo de tráfico, no mundo real, a consequência prática mais comum, como noticiam, dentre muitos, Pedro Abramovay e Ilona Szabó, é que “ricos com pequenas quantidades são usuários, pobres são traficantes”. Por essa razão, é imperativo que se estabeleçam critérios para distinguir consumo de tráfico. 3. Terceira razão: a criminalização afeta a proteção da saúde pública O sistema atual de Guerra às Drogas faz com que as preocupações com a saúde pública – que são o principal objetivo do controle de drogas – assuma uma posição secundária em relação às políticas de segurança pública e à aplicação da lei penal. A
Do ponto de vista jurídico, há pelo menos três fundamentos que justificam e legitimam a descriminalização à luz da Constituição:
1. Violação ao direito de privacidade A intimidade e a vida privada, que compõem o conteúdo do direito de privacidade, são direitos fundamentais protegidos pelo art. 5º, X da Constituição. O direito de privacidade identifica um espaço na vida das pessoas que deve ser imune a interferências externas, seja de outros indivíduos, seja do Estado. O que uma pessoa faz na sua intimidade, da sua religião aos seus hábitos pessoais, como regra devem ficar na sua esfera de decisão e discricionariedade. Sobretudo, quando não afetar a esfera jurídica de um terceiro. Ex. É preciso não confundir moral com direito. Há coisas que a sociedade pode achar ruins, mas que nem por isso são ilícitas. Se um indivíduo, na solidão das suas noites, bebe até cair desmaiado na cama, isso não parece bom, mas não é ilícito. Se ele
fumar meia carteira de cigarros entre o jantar e a hora de ir dormir, tampouco parece bom, mas não é ilícito. Pois digo eu: o mesmo vale se, em lugar de beber ou consumir cigarros, ele fumar um baseado. É ruim, mas não é papel do Estado se imiscuir nessa área.
2. Violação à autonomia individual A liberdade é um valor essencial nas sociedades democráticas. Não sendo, todavia, absoluta, ela pode ser restringida pela lei. Porém, a liberdade possui um núcleo essencial e intangível, que é a autonomia individual. Emanação da dignidade humana, a autonomia assegura ao indivíduo a sua autodeterminação, o direito de fazer as suas escolhas existenciais de acordo com as suas próprias concepções do bem e do bom. Cada um é feliz à sua maneira. A autonomia é a parte da liberdade que não pode ser suprimida pelo Estado ou pela sociedade. Exs mais óbvios: o Estado e a sociedade não podem decidir com quem você vai se casar, qual deve ser a sua religião ou que profissão você vai seguir.
As pessoas têm, igualmente, o direito de escolher os seus prazeres legítimos. Há quem faça alpinismo, voe de ultraleve, participe de corridas de automóvel, ande de motocicleta ou faça mergulho submarino. Todas essas são atividades que envolvem riscos. Nem por isso são proibidas. O Estado pode, porém, limitar a liberdade individual para proteger direitos de terceiros ou determinados valores sociais. Pois bem: o indivíduo que fuma um cigarro de maconha na sua casa ou em outro ambiente privado não viola direitos de terceiros. Tampouco fere qualquer valor social. Nem mesmo a saúde pública, salvo em um sentido muito vago e remoto. Se este fosse um fundamento para proibição, o consumo de álcool deveria ser banido. E, por boas razões, não se cogita disso. Note-se bem: o Estado tem todo o direito de combater o uso, fazer campanhas contra, educar e advertir a população. Mas punir com o direito penal é uma forma de autoritarismo e paternalismo que impede o indivíduo de fazer suas escolhas
acima: a saúde pública não só não é protegida como é de certa forma afetada pela criminalização.
A questão da necessidade poderia ser disputada. Há países que optam por criminalizar a maconha. Mas em número decrescente. Na América Latina, como visto, somente Brasil, Suriname e Guianas tratam o porte de drogas para uso pessoal como crime. Existem alternativas que vão desde a previsão de sanções administrativas até o combate via contrapropaganda e cláusulas de advertência.
Mas é sobretudo no terceiro subprincípio – o da proporcionalidade em sentido estrito – , quando se vai aferir o custo benefício da criminalização que a desproporcionalidade se evidencia de maneira mais contundente. O custo tem sido imenso
Em suma: por ausência de lesividade a bem jurídico alheio, por inadequação, discutível necessidade e, sobretudo, pelo custo imenso em troca de benefícios irrelevantes, a criminalização não é a forma mais razoável e proporcional de se lidar com o problema.
Pelos mesmos fundamentos, declaro a inconstitucionalidade, por arrastamento, do § 1o^ do artigo 28 da Lei no^ 11.343/2006, o qual prevê que se submete às mesmas penas do caput, “quem, para seu consumo pessoal, semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de substância ou produto capaz de causar dependência física ou psíquica”. Aqui, à falta de um critério específico para delimitar o que seja pequena quantidade para consumo pessoal, utilizo o parâmetro adotado no Uruguai, que é de 6 (seis) plantas fêmeas.
DISTINGUIR CONSUMO PESSOAL DE TRÁFICO
“Art. 28. § 2o^ Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente.”
O fato de que a Guerra às Drogas foi travada com as vicissitudes e deficiências do padrão Brasil não muda este quadro.
II. A descriminalização produziria aumento de consumo
III. A descriminalização aumentaria a criminalidade associada ao consumo de drogas
Naturalmente, ninguém cogita disso. Nos EUA a Emenda 18 produziu a lei seca, banindo a fabricação e distribuição de bebidas alcoólicas entre 1920 e 1933. As consequências foram tão nefastas quanto as que a criminalização das drogas nos traz hoje.
IV. A descriminalização trará impacto para a saúde pública
V. A descriminalização aumentaria os riscos do trânsito com pessoas dirigindo intoxicadas
VI. Há grande inconsistência em descriminalizar o consumo e manter a criminalização da produção e da distribuição
Uma última observação: pesquisa do psicólogo Giovani Caetano Jaskulski conclui que o álcool e o cigarro – não a maconha – funcionam como porta de entrada para drogas mais pesadas.
VII. Criação de um “exército de formiguinhas”
recomenda-se a adoção do critério seguido por Portugal, que, como regra geral, não considera tráfico a posse de até 25 gramas de Cannabis. No tocante ao cultivo de pequenas quantidades para consumo próprio, o limite proposto é de 6 plantas fêmeas.