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Guias e Dicas
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Análise do Filme 2001: A Space Odyssey: A Inteligência Artificial e as Emoções de HAL, Manuais, Projetos, Pesquisas de Música

Neste documento, é apresentada uma análise detalhada do filme 2001: a space odyssey, com ênfase na inteligência artificial representada por hal e nas emoções que ele parece sentir. O texto aborda as interações entre hal e a tripulação, as mentiras e a crise de comunicação entre os humanos, além da relação entre a máquina e o homem. O documento também menciona outras obras relacionadas a ia, como ia (ai) e her.

Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Pernambuco
Pernambuco 🇧🇷

4.2

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Universidade Federal de São Carlos
Centro de Educação e Ciências Humanas
Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade
TECNOLOGIA, PODER E VIOLÊNCIA EM 2001:
Uma Odisseia no Espaço.
Mauricio José Vera Failache
São Carlos SP
2015
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Universidade Federal de São Carlos

Centro de Educação e Ciências Humanas

Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade

TECNOLOGIA, PODER E VIOLÊNCIA EM 2001:

Uma Odisseia no Espaço.

Mauricio José Vera Failache

São Carlos – SP

MAURICIO JOSÉ VERA FAILACHE

TECNOLOGIA, PODER E VIOLÊNCIA EM

2001: Uma Odisseia no Espaço.

Dissertação apresentada ao Programa de

Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e

Sociedade, do Centro de Educação e Ciências

Humanas, da Universidade Federal de São Carlos,

como parte dos requisitos para a obtenção do

título de Mestre em Ciência, Tecnologia e

Sociedade.

Orientador: Prof. Dr. Arthur Autran

Franco de Sá Neto

São Carlos – SP

MAURICIO JOSÉ VERA FAILACHE

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS Centro de Educação e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade

Folha de Aprovação Assinaturas dos membros da comissão examinadora que avaliou e aprovou a Defesa de Dissertação de Mestrado do candidato Mauricio José Vera Failache, realizada em 24/02/2015:.

Prof. Dr. Arthur Autran Franco de Sá Neto UFSCar

Prof. Dr. Valdemir Miotello UFSCar

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À Iara Maria, filha que nasceu durante este trecho do caminho e que me ensina todos os dias que há um universo inteiro a ser descoberto e redescoberto.

Título: TECNOLOGIA, PODER E VIOLÊNCIA EM 2001: Uma Odisseia no Espaço.

Resumo: No presente trabalho, empreende-se a análise fílmica de 2001: uma odisseia no espaço,( 2001: a space oddissey, 1968) de Stanley Kubrick, na qual se representa a origem do homem associada à descoberta da tecnologia e à transformação de ambos ao longo da história. A descoberta e uso da técnica relacionam-se com um novo conhecimento (um saber) e, junto com ele, uma série de efeitos permeados por relações de poder, observadas com base no olhar de teóricos de diversas áreas, dentre eles Michel Foucault. O gênero literário-cinematográfico a que pertence 2001: Uma Odisseia no Espaço é o da ficção científica, campo das críticas sociais, políticas, econômicas e até religiosas. Kubrick, com este filme, no contexto dos anos sessenta, abre um novo tempo nas grandes produções do gênero pela sua alta qualidade estética. O estilo narrativo não é menos inovador, já que em um gênero onde tudo era explicado em detalhe, Kubrick apresenta uma história visual, a ser dita através de diversas músicas e imagens, e não somente por meio de diálogos. Este trabalho também observa a relação entre o homem e suas tecnologias representada no longa-metragem a partir da questão da alteridade tal como pensada por Bakhtin.

Palavras-chave: análise fílmica, Stanley Kubrick, poder, saber, tecnologia, sociedade

Abstract: The present work undertakes the film analysis of the feature film 2001: A Space Odissey (1968) of Stanley Kubrick, in wich the origin of the tool is associated with the origin and transformation of man throughout history. The Discovery and use of the tool provided a new knowledge and, along with it, a number of effects permeated by Power relations – analyzed based on diverse authors point of view, between them Michel Foucault. The literary-cinematographic genre to wich 2001: A Space Odissey belongs to, is science fiction, wich is the natural medium to social, political, economic and even religious criticism. Kubrick with this film within the sixties context, opens a new era in major productions of the genre, wich had been relied on a few technological and economic resources, and also for its high aesthetic quality both at photographic level and special effects. The narrative style is no less innovative because in a genre where everything was explained in detail, Kubrick shows a visual story, to be told through different musics and images, and not just relied on dialogs and callouts. This paper also notes the relationship between humans and their Technologies represented in the film, from the issue of the otherness as conceived by Bakhtin.

Keywords: film analysis, Stanley Kubrick, power, knowledge, technology, society.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 10

CAPÍTULO 1

1 - O NASCIMENTO DO HOMEM E SUA FERRAMENTA Primeira Sequência (5 cenas)............................................................................................ 22

1.1 - O alvorecer do homem (The Dawn of Man) – “vislumbres” de alteridade bakhtiniana ........................................................................... 23

1.2 - O poço – Ou o primeiro conflito de interesses ...................................... 27

1.3 - A noite, o medo – Representação das emoções através de imagens ..... 28

1.4 - A descoberta do monolito e a ferramenta – O monolito como provocador da inteligência primitiva ..................................................... 30

1.5 - A disputa e conquista do poço – O uso da ferramenta como arma para dominar um recurso vital através do uso da força ................................. 38

CAPÍTULO 2 2 – VIOLÊNCIA, PODER E CIÊNCIA EM 2001 UMA ODISSEIA NO ESPAÇO Segunda sequência (5 cenas)............................................................ 42

2.1 - Dança nuclear no Danúbio azul – A ameaça atômica na era espacial e o cotidiano das viagens entre a Terra e a lua .......................................... 42

2.2 - O Hilton estação espacial – As relações de poder presentes entre cientistas soviéticos e norte-americanos e a solidão do homem da era espacial .................................................................................................. 50

4 - Quarta Sequência - Intermission (2 cenas) ................................................ 84 4.1 - Intermission (tela preta) – Momento de transcendência evolutiva da máquina? ................................................................................................ 84

4.2 - Troca da antena e morte de Poole – HAL decide tomar controle da Missão. ................................................................................................... 87

5 - Quinta Sequência - Júpiter e além do infinito (5 cenas) ............................ 98 5.1 - Conjunção de planetas – Alusão sobrenatural no gênero de FC? ....... 98

5.2 - Viagem dentro do monolito The Star Gate – Aventura psicodélica e transformadora da visão de Bowman. .................................................. 101

5.3 - Quarto de hotel Luis XVI – Ou a quarta dimensão onde Bowman se transforma - .......................................................................................... 103

5.4 - Volta à Terra como Star Child – O retorno do Herói ....................... 105

5.5 - Créditos (tela preta e Johan Strauss) – Convite para transformar nosso cotidiano? ............................................................................................. 108

CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 110 REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFÍCAS .................................................................... 117 ANEXOS ..................................................................................................................... 121 FICHA TÉCNICA DO FILME ................................................................................ 121 FILMOGRAFIA ........................................................................................................ 123 DECUPAGEM ........................................................................................................... 124

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INTRODUÇÃO

A obra de Stanley Kubrick é marcada pela discussão dos grandes problemas com os quais o ser humano se defronta. Abrams considera a obra desse diretor comparável à “arquitetônica de um grande sistema filosófico que diz algo sobre tudo. Todas as facetas da natureza humana são reveladas em suas amplas diversidades de variantes como alta e baixa cultura, amor e sexo, história, guerra, crime, loucura, viagens espaciais, condicionamento social, e tecnologia” (ABRAMS, 2007, p.1). Já Duncan observa que seus personagens refletem as dualidades humanas, o bem e o mal, amor e ódio, desejo e medo, fidelidade e traição, de maneiras diversas ao longo da sua filmografia (DUNCAN, 2011, p.9-10). Finalmente, Ciment complementa dizendo que “uma das principais obsessões presentes em seus filmes: o desejo de um poder absoluto sobre os seres e as coisas e seu inevitável correlato, o terror de perder o controle deles” (CIMENT, 2013, p.83). São diversos os assuntos de interesse social que permeiam a filmografia de Stanley Kubrick, e dentre eles, ao longo de sua produção cinematográfica se destaca um interesse constante pela violência presente nas relações humanas. Pode-se citar como exemplos Laranja Mecânica, ( Clockwork Orange, 1971), Dr Fantástico, ( Dr. Strangelove: or how I start loving the bomb, 1964), Nascido Para Matar ( Born to kill, 1987), Glória feita de sangue ( Paths of glory, 1957) e até Barry Lyndon (1975) (CIMENT, 2013, p.21). Além da violência, são também temas motrizes presentes ao longo da sua filmografia a angústia e a agressividade, como em Lolita (1962) e O Iluminado ( The Shining , 1980). No caso de 2001: Uma Odisseia no Espaço não foi diferente e anos depois da sua primeira exibição em 1968, esta obra de Kubrick continua despertando o interesse dentro e fora do âmbito cinematográfico. Sua mensagem, deliberadamente aberta, aumenta o fascínio sobre tal feito no que diz respeito à arte e à linguagem cinematográfica. Sobre essa maneira singular em que o diretor se expressa, especificamente em 2001: Uma Odisseia no Espaço , em que os diálogos são reduzidos ao mínimo, Walker (1973, p.267) afirma que: Suprimindo a objetividade da palavra escrita, rompendo com a lógica narrativa, Kubrick assegurou que para assistir aos seus filmes requer um ato de contínua inferência por parte dos espectadores para preencher o campo de atenção fazendo suas próprias conexões imaginativas. Pensado e rigorosamente concebido como qualquer filme de Kubrick, o trabalho inteiro deixa uma densa impressão de imagens que são livres de implicar

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uma suposta epidemia. O monolito que fora enterrado há quatro milhões de anos na lua, emitira um sinal de rádio em direção a júpiter ao ser alcançado pela luz solar. A terceira parte do filme “ Júpiter Mission , 18 months later ” ( Missão a Júpiter 18 meses depois ), a bordo da nave Discovery One , os astronautas David Bowman (Keir Dullea), Frank Poole (Gary Lockwood), acompanhados do supercomputador HAL 9000, ou simplesmente HAL (voz de Douglas Rain) e mais três astronautas em hibernação criogênica viajam em direção a Júpiter, mas sem saber da existência do monolito e o sinal que este emitira, exceto HAL. O computador prevê uma falha em uma antena de comunicação e recomenda trocá-la antes de falhar, mas os astronautas descobrem que não há nada de errado com a antena e percebem que HAL provavelmente cometeu um erro e consideram o seu desligamento. O supercomputador de bordo da Discovery One descobre o plano para desligá-lo na quarta parte do filme, intitulada por Intermission , questiona os motivos da missão e decide tomar o comando da mão dos astronautas, eliminando-os. Bowman sobrevive ao ataque de HAL e retoma o controle da nave e da missão e desconecta HAL, que em seus momentos finais roga por sua própria existência. Ao se desconectar o “cérebro da Discovery”, inicia-se a exibição de um vídeo pré-gravado no qual se revela a verdadeira intenção e motivo da missão a Júpiter. Na quinta e última parte do filme, Júpiter e além do infinito , Bowman após desconectar HAL, aventura-se dentro de um monolito que se encontra flutuando perto da nave, e neste momento começa sua transformação (Bowman/Homem) evolutiva na criança estelar, dentro de uma dimensão imaginada como um quarto de hotel decorado ao estilo Luis XVI. Após sua transformação, Bowman, agora criança estelar, retorna à Terra transformado, evoluído e contemplativo. O filme é dividido em cinco partes (ou sequências), marcadas por títulos que surgem ao longo do filme, como: “ The Dawn Of Men ”, “ TMA-1 ” (marcado pela aparição da primeira nave espacial após o lançamento do osso até o contato de Floyd com o monolito na lua), Júpiter Mission 18 months later e Intermission , e a última sequência, Júpiter e além do infinito marcada por um fade out ou (tela preta), no qual se inicia a viagem cósmica de Bowman através de um dos monolitos que funciona como um portal para outra dimensão. Porém, o presente trabalho, encontra-se dividido em três partes, nas quais serão abordadas as questões indicadas a seguir. O capítulo um, “ O nascimento do homem e sua ferramenta” , corresponde à primeira sequência do filme, “ The Dawn of Men”, em que se aborda a transformação do

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homem-macaco por meio da descoberta da ferramenta, após seu contato com um estranho monolito e a conquista de território utilizando a mesma ferramenta em forma de arma. O segundo capítulo, “ Violência, poder e ciência em 2001: uma odisseia no espaço” , corresponde à segunda sequência do longa, “ TMA-1 ”, e no qual são observadas as rotinas no espaço e a vida dentro das naves e estações espaciais que orbitam entre a Terra e a lua. Menciona-se também a questão da descoberta de um segundo monolito na lua, que emitirá um sinal com direção a Júpiter e cuja descoberta não é revelada por autoridades norte-americanas. Observar-se-ão algumas questões inerentes ao poder e à alteridade presente nas relações mostradas entre cientistas soviéticos e norte-americanos com base em algumas teorias de Michel Foucault e de Mikhail Bakhtin. No terceiro capítulo, são incluídas as três últimas sequências do filme, “ Júpiter Mission”, “Intermission” , e “ Júpiter e além do infinito ”, e abordados assuntos como a relação do homem com a tecnologia representada pelo supercomputador HAL9000, assim como a evolução do homem e sua transformação em criança estelar , que após sua travessia galáctica, retorna à Terra, culminando na odisseia espacial. Dessa forma, cumpre informar que o objetivo deste trabalho consiste em realizar uma análise cinematográfica e observar a representação do homem e suas tecnologias presente no longa-metragem, e como tais relações podem se encontrar permeadas de relações de poder. A transformação do homem-macaco em homem moderno, manipulador de ferramentas, trouxe consigo mudanças não só na sua dieta ou postura, mas também no seu lugar ocupado no espaço e na cadeia alimentar. No que tange aos aspectos da concepção do filme, este começa a ser pensado, em inícios de 1964. Kubrick acabara de lançar Dr. Fantástico (1963), filme que expunha de forma explícita sua preocupação com o contexto histórico em que vivia, o da Guerra Fria, conflito encabeçado pelas duas grandes superpotências mundiais, Estados Unidos e a União Soviética. A principal preocupação, sobretudo nos anos sessenta, era o de uma aniquilação em massa pelo uso de armas atômicas. Hobsbawm (2013, p. 224) observa que o confronto direto das duas superpotências parecia ser impedido apenas pelo receio de uma “destruição mútua inevitável” (MAD – Mutually Assured Destruction ), temor que aumentava à medida que se passava o tempo, e mais coisas podiam dar errado, política e tecnologicamente. Tal aniquilação não aconteceu, mas parecia ser uma possibilidade iminente por cerca de

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Vale ressaltar que o referido autor, nos estudos sobre gêneros, entende-os como primários ou secundários. O gênero primário (ou simples) é aquele produzido dentro de um contexto cultural pouco organizado (ou sujeito a algum tipo de controle) como no caso do diálogo cotidiano, por exemplo. Os gêneros secundários (ou complexos) surgem em um contexto cultural mais complexo e organizado, e relativamente mais desenvolvido. Exemplos deste gênero são os romances, dramas, pesquisas científicas, todo tipo de gêneros publicísticos, dentre outros. Os gêneros primários constituem os secundários que ali se transformam e adquirem um caráter especial, perdendo seu vínculo com a realidade concreta e os enunciados reais alheios, como por exemplo, no caso da incorporação de diálogos cotidianos em um romance ou em uma pesquisa científica por exemplo. Desta forma, tais diálogos passam a ser um acontecimento no contexto artístico-literário (ou acadêmico, no caso do trabalho científico), e não mais como acontecimento da vida cotidiana (onde teve origem o diálogo) (BAKHTIN, 2006, p. 261-268). A questão do estilo é relevante, pois se encontra indissoluvelmente ligada ao enunciado e às formas típicas de enunciados, isto é, aos gêneros do discurso. Todo enunciado, seja primário ou secundário, oral ou escrito, e de qualquer campo da comunicação discursiva, é individual, podendo assim mostrar a individualidade de quem se comunica. Tal individualidade conforma o chamado “estilo individual”. Bakhtin adverte sobre a liberdade do uso do estilo individual em determinados gêneros, como no caso de documentos oficiais e de ordens militares, por exemplo, em que tal estilo não seria adequado, pois é necessário o máximo de uniformidade na produção dos enunciados. No outro extremo, pode-se encontrar gêneros como o da literatura de ficção, que segundo o autor, é um dos mais favoráveis para a expressão desse estilo pessoal (BAKHTIN, 2006, p. 265). O gênero literário da FC, assim como diversos outros (romance, poesia), são expressões artísticas que muitas vezes expressam o caráter social do contexto em que a obra foi produzida. Nesse sentido, Volochínov observou que através da arte (que é eminentemente social), poderiam ser exprimidas respostas ao meio social extra-artístico que influencia a própria arte desde o exterior. Na arte o que não é alheio atua sobre o alheio, e uma forma social influencia sobre outra. O estético , ou mesmo o jurídico, ou o cognitivo, são tão somente uma variedade do social; por tanto, a teoria da arte não pode ser senão uma sociologia da arte (VOLOCHÍNOV,2013, p.73).

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No que tange ao gênero da FC cinematográfica, gênero a que pertence 2001:Uma Odisseia no Espaço, Dufour observa a íntima ligação que existe entre o cinema de FC e a ficção científica literária, situando suas origens em Frankenstein de Mary Shelley (1818), às obras de Jules Verne e H.G. Wells especificamente. Esta aproximação encontra respaldo uma vez que as obras destes autores não se baseiam no efeito de forças mágicas, e sim pelos efeitos e potencialidades das descobertas científicas do e sobre o homem. Esta é uma diferença entre o que se conhece como FC e a fantasy (que não conforma uma variante do gênero de FC). A fantasy fala de magia onde na FC se fala de progresso, ciência e racionalidade; onde a FC fala sobre o homem e sua capacidade para enfrentar a natureza, a fantasy ressalta a naturalidade do homem e as “forças inefáveis e indizíveis da natureza- e, por conseguinte, de uma natureza entendida, não como facto mas como valor” (DUFOUR, 2012, p.11-12). Manlove (1975, p.1), aproxima-se de uma definição do gênero de fantasia ( fantasy ) como “uma ficção que evoca um sentimento de prodígio e contém um elemento substancial e irredutível de supernatural ou mundos, seres ou objetos impossíveis, com os quais o leitor ou as personagens na história se tornam pelo menos parcialmente familiares.” Manlove complementa que, quando a explicação do sobrenatural é possível, adentra-se consequentemente, no gênero da FC (MANLOVE, 1975, p.1). Podem citar-se como exemplos de filmes do gênero de fantasia, O Senhor dos Anéis: A Sociedade do Anel ( Lord of the Rings: The Fellowship of the Ring , Peter Jackson, 2001), e Thor: O Mundo Sombrio ( Thor: The Dark World , Alan Taylor, 2013). De acordo com Suppia (2007, p.4), há algumas dificuldades na hora de estabelecer um lugar exato para marcar a origem do gênero de FC e em estabelecer suas fronteiras. Por um lado, se a FC parte de um fenômeno literário, esta pode então ser considerada um gênero global, pois deveriam ser incluídas obras geradas no mesmo período em diversas partes do mundo, consequentemente possibilitando a existência (e gênese particular) do gênero em cada país. Escapa ao objeto deste trabalho aprofundar nestas questões, porém é relevante expor brevemente as dificuldades para definir ou conceituar de forma categórica o gênero da FC tanto na área literária como na cinematográfica. Em sentido amplo, segundo Suppia (2007, p.9), o cinema de FC pode compreender “todo filme que encerre um discurso científico e/ou a descrição de um artefato e/ou processo tecnológico relevante para a narrativa”, pelo que, sempre que tal

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origens na Europa no século XIX), e o lugar onde 2001: Uma Odisseia no Espaço se situa em relação a elas. Do ponto de vista histórico, autores como Dufour (2012, p.32-33), situam a origem do cinema de FC “de pleno direito” na década de cinquenta. Previamente a este período, os filmes eram em sua maioria aventuras serials ao estilo Flash Gordon (em que cada episódio abria com um resumo da história), e de terror como a adaptação de Frankenstein (J. Whale, 1931). A razão disto seria a inexistência de um gênero cinematográfico que pudesse ser reivindicado como próprio no caso dos serials , limitando sua ligação à FC por sua origem nos pulps. No caso de filmes como Frankenstein , o sistema de estúdios que favorece filmes do gênero de terror nos anos trinta, obrigavam a inscrever filmes neste tipo de categoria, ainda que tivessem características do gênero de FC. Apontam-se como razões para isto, poucos filmes que abordam o tema da FC, e quando o faziam, o tema ficava em segundo plano. Logo, nos anos cinquenta, os grandes estúdios perdem seu poder devido a diversos acontecimentos sociais, políticos e econômicos que permearam os Estados Unidos. Dufour (2012. p.39) aponta principalmente como causas do surgimento do gênero, à perda de poder dos grandes estúdios e ao surgimento de um novo tipo de público, o adolescente, que passa a assistir os filmes em drive-ins , o que provocara o fechamento de numerosas salas de cinema (muitas das grandes empresas eram responsáveis pela produção, distribuição e até da exibição); as leis anti trust aprovadas nos Estados Unidos obrigaram a separar as atividades de produção-distribuição e de exploração; por último, o aquecimento do mercado de aparelhos de televisão no pós- guerra. A grande maioria dos filmes de FC até então eram produzidos por “pequenas companhias”, como a Universal e RKO (DUFOUR, 2012, p.32). O momento de crise dos grandes estúdios, é também o tempo em que a tecnociência abriu todo um espectro de possibilidades no imaginário da sociedade como, por exemplo, guerras atômicas e as consequentes mutações que transformariam animais em monstros, entre outros. A Guerra Fria e a corrida espacial faziam com que o novo gênero provocasse interesse no público. A ciência, por sua parte, era percebida pela sociedade como objetiva, e a base na qual se apoia a tecnologia, fazendo desta última, uma forma de conhecimento subordinada e dependente da primeira. O processo por meio do qual se transforma o conhecimento científico em bem-estar social é percebido como um processo linear, tomando como ponto de partida a ciência básica, seguido da ciência aplicada, o desenvolvimento tecnológico, a inovação e sua difusão, o

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crescimento econômico e um consequente benefício social. Em razão deste paradigma, o período do pós-guerra até o início dos anos sessenta foi denominado de “ciência como motor do progresso” (VELHO, 2011, p.135-136), algo que provavelmente aumentou em certa medida o interesse no gênero FC. Considerada como um dos grandes estúdios, a MGM ( Metro Goldwyn Mayer ) só em 1956 produziu um filme de FC, O Planeta Proibido ( Forbidden Planet, Fred M. Wilcox, 1956), seguido de A Máquina do Tempo ( The Time Machine , George Pal, 1960) e A Aldeia de Malditos ( Village of the Damned , Wolf Rilla, 1960) quatros anos depois, e novamente em 1968, com 2001: Uma Odisseia no Espaço. A disponibilidade de recursos faz com que neste período surja um gênero com uma preocupação maior comrespeito a detalhes que aportem realismo, autenticidade, que tornem a história que se conta verossímil, o que para Dufour (2012, p. 43) constitui uma “FC correta”. O primeiro filme dentre os que se preocupam com certa autenticidade, e que para Suppia conforma o cinema de FC “moderno”, seria A Conquista da Lua realizada por Irving Pichel ( Destination Moon, 1950), que por sua vez foi o primeiro a cores, e Da Terra à Lua ( Rocketship X-M, Kurt Neumann, 1950), sendo a característica deste tipo de filme a busca de uma assessoria que delimite os delírios de uma narrativa aos confins do que seria cientificamente possível, tornando a história crível por espectadores cada vez mais fascinados com os avanços científicos (ou suas potencialidades) (SUPPIA, 2007, p.34- 35). Isto podia ocorrer tanto com o auxílio de escritores renomados de FC, como com a ajuda de empresas especializadas, como no caso de 2001: Uma odisseia no Espaço , em que Kubrick contou com a colaboração de ambos, tanto de Arthur C. Clarke, como da NASA, a Bell Co., Boeing, IBM, dentre outras, para produzir um filme “correto” no tocante à realidade que pretendia representar. Existem diversos subgêneros de FC como os de FC de Guerra, de Monstros, a já mencionada de Terror e serial , o Noir (uma espécie de filme “policial” de FC), de Propaganda (política principalmente), a Space Opera de FC (uma derivação dos pulps dos anos 40, onde questões como a falta de oxigênio em novos planetas é ignorado, a verossimilhança é intencionalmente colocada de lado), o filme Apocalíptico de FC, o Cômico, e finalmente o Metafísico, que será mencionado no trabalho por constituir um subgênero a que também pertence 2001: Uma Odisseia no Espaço. A captação do cotidiano é outro aspecto em que 2001: Uma Odisseia no Espaço é pioneiro. Até então os filmes do gênero de FC não mostravam em detalhe os pormenores de se encontrar em um ambiente estranho ao terrestre, como o ambiente