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entregando 'pratos feitos' de boa linguagem, vêm saciar a fome do povo, ... acordo com a gramática de valências, o verbo é o centro de onde provêm os ...
Tipologia: Esquemas
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Dissertação apresentada à Faculdade de Ciências e Letras da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de Araraquara, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Letras (Área de Concentração: Lingüística e Língua Portuguesa).
Orientadora: Profª Drª Maria Helena de Moura Neves
Araraquara 2006
A Deus, por me dar a sabedoria necessária para saber onde procurar, e o que fazer nos momentos de desespero.
Aos meus pais, Luiz Marques e Terezinha Ferreira Carlos, à minha irmã, Virgínia Ap. C. Marques, e ao meu noivo, Ruan Casale dos Santos, pela compreensão e incentivo nos momentos difíceis.
Aos meus diretores e demais colegas e amigos, pelo total apoio dispensado para a realização desta dissertação.
À minha querida orientadora, professora Drª Maria Helena de Moura Neves, pelo tempo dispensado e a sempre pronta disposição para me orientar.
À CAPES e ao Governo do Estado de São Paulo, pelas bolsas concedidas para a realização deste trabalho.
Resumo
O objetivo geral do estudo é a observação, no uso efetivo da língua, de construções vigentes examinando-as em confronto com cânones prescritos em obras normativas da atualidade. O objetivo específico é o exame da tensão entre o que propõem essas obras e o que ocorre na língua escrita de 1900 a 1950 quanto à regência de alguns dos verbos mais tratados pelos manuais normativos: esquecer(-se) , lembrar(-se) , pagar , perdoar , assistir , obedecer , ir e chegar. Paralelamente se buscará um confronto com os resultados obtidos em pesquisa anterior, na qual se estudou a regência verbal na segunda metade do século passado. A análise se serviu de uma amostra do corpus do Laboratório de Lexicografia da Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara (UNESP), que contém cerca de duzentos milhões de ocorrências. A investigação, de base funcionalista, concentra-se nos processos ligados à manifestação da transitividade verbal.
Palavras-chave: regência verbal, transitividade, uso, norma, prescrição.
Abstract
The general goal of this research is the observation of real constructions in the effective use of the language, examining them in confrontation with prescribed models in normative manuals. The specific goal of the research is the examination of the tension between what these manuals propose and what occurs in the written language, in the period between 1900 and 1950, according to the regency of some of the most treated verbs in the normative Portuguese manuals: esquecer(-se) ( to forget ), lembrar(-se) ( to remember ), pagar ( to pay ), perdoar ( to forgive ), assistir ( to watch ), obedecer ( to obey ), ir ( to go ) and chegar ( to arrive ). Besides, it will be made a confrontation with the results of a previous research, in which it was studied the verbal regency in the second half of the last century. The analysis has a sample of the corpus of the Laboratory of Lexicographical Studies of the College of Sciences and Letters of Araraquara (UNESP), which has almost two hundred million occurrences. The investigation, that has a functionalist basis, is concentrated in the processes linked to the manifestation of the verbal transitivity.
Keywords: verbal regency, transitivity, use, rules, prescription.
A preocupação com o “uso correto” da linguagem existe desde a Antigüidade, e sempre teve lugar importante nos estudos de gramáticos, retóricos, lógicos e pedagogos, sendo, ainda hoje, tema para inúmeras pesquisas. Há muito tempo faz-se distinção entre o que é utilizado pelos usuários e o que é regulado pela norma e considerado “melhor vernáculo” (Góis, 1938). A base para comparação eram, especialmente, os antigos escritores, como Padre Antônio Vieira, Camilo Castelo Branco e Garrett, entre outros. Durante muito tempo, valorizou-se a linguagem dos autores literários de épocas clássicas (especialmente dos séculos XVI e XVII) como a única “correta” – valorização que, algumas vezes, ainda acontece –, mas, como bem lembra Bechara (2001), “nem tudo o que os clássicos dessa época usaram tem ou pode ter vigência hoje” (p. 5). Neves (1994a) também argumenta nesse sentido: “não existe mais uma determinada literatura, de um determinado período, que constitua modelo a ser perseguido (…)”(p. 15). Apesar disso, há, ainda hoje, uma grande valorização da modalidade de língua considerada padrão (algumas vezes, inclusive, associada ao conceito de língua “culta”^1 ). Muitas pessoas (especialmente os professores de português) acreditam que o estudo dos manuais de gramática tradicional é a chave para um bom desempenho lingüístico, devendo ser a escola a responsável por prover esse bom desempenho, mas algumas pesquisas (como Neves, 2001) mostram que, em diversos casos, é o usuário comum da língua que “se fascina” com o mundo da “boa linguagem” e a ele quer ter acesso, especialmente por uma questão de prestígio social. Assim, propagam-se amplamente os manuais tradicionais e
(^1) Neste trabalho, utilizou-se, quando em referência ao que recomenda a tradição normativa, o termo “norma- padrão”, já que este não carrega um juízo de valor. Considera-se, usualmente, como “norma culta”, aquelausada pelo segmento social de maior prestígio e, portanto, este termo está intrinsecamente relacionado a uma questão de valor e prestígio social, e não propriamente lingüístico, não sendo pertinente a sua utilização emum estudo que busque focalizar a língua em uso.
ser vista não como possível deficiência, mas como “garantia de eficiência da comunicação” (Neves, 2001a, p. 34), enquanto os estudos sobre oralidade permitiram relativizar o padrão e vincular escolha de padrão a modalidade de língua, com o intuito de obter adequação a cada situação particular de comunicação. Partindo-se, portanto, do princípio de que a língua é, indubitavelmente, heterogênea e variável, torna-se necessário ser extremamente cauteloso ao, simplistamente, classificar uma forma como “certa” ou “errada”, e condenar, autoritariamente, determinadas construções; afinal, como afirmou Câmara Jr. (1980, p. 5), “a norma não pode ser uniforme e rígida. Ela é elástica e contingente, de acordo com cada situação social específica”. Em outras palavras: são raras as pessoas que empregam os mesmos enunciados em uma situação formal e em uma situação não-formal (um exemplo é a maioria dos professores em uma conferência e em casa). Desse modo, confirma-se a hipótese de que, em alguns casos, o usuário pode (e muitas vezes o fará) abandonar construções contempladas nas obras normativas para adotar construções estigmatizadas por elas, desde que estas representem melhor o que quer expressar. É essa tensão sociocultural – a dificuldade na escolha entre aquilo que o usuário da língua considera expressivo e feliz (mas que ouviu dizer que não é correto) e o que não diz bem o que queria dizer (mas que não corre o risco de ser socialmente criticado) – que gera o interesse do estudo, já que perturba o desempenho dos usuários que têm acesso às prescrições normativas (hoje muito difundidas, inclusive pela mídia). Fica claro, portanto, que as prescrições normativas não são de base propriamente lingüística, mas primordialmente de base sociocultural. Logo, surgem alguns questionamentos, bastante pertinentes: se a língua é, sem discussão, variável e heterogênea, por que se continua a valorizar tão fortemente as lições normativas? Por que, cada vez mais, os filólogos, lingüistas e gramáticos que se preocupam com o estudo da língua
realmente (e não apenas com a divulgação de regras tradicionalistas), verdadeiros especialistas, vão cedendo lugar aos “repetidores e empacotadores de lições que (…), entregando ‘pratos feitos’ de boa linguagem, vêm saciar a fome do povo, que acredita que com esses pacotes vai conseguir falar ‘sem ninguém botar defeito’” (Neves, 2001a, p. 44)? Por outro lado, até que ponto o lingüista, que também é usuário da língua, pode descartar as prescrições, considerando-as não-genuínas e não levando em conta a sua variedade e natureza (Neves, 1997)? Como propor uma restrição de uso, ao se considerar legítima determinada prescrição? E qual o real alcance de uma prescrição assim legitimada, se não é da própria língua que provêm as restrições? Refletindo sobre essas questões, chega-se à conclusão de que o lingüista deve, sim, inserir-se na discussão a respeito das prescrições normativas, mas não simplesmente para confirmar o que se prega tradicionalmente. O importante é que ele examine a língua em uso e avalie os casos em que há distanciamento da norma, sempre tendo em mente seu conhecimento do funcionamento lingüístico. Isso possibilitará a elaboração de projetos que explicitem uma gramática do português observada diretamente nos usos reais da língua, e que verifiquem como os enunciados produzidos em determinadas situações esbarram em pressões (geralmente de natureza não-lingüística), o que gera uma certa tensão entre o “adequado” e “prestigiado pela sociedade” (Neves, 2001a). Algumas correntes lingüísticas e gramaticais auxiliam nessa área de estudo e, mais particularmente, permitem uma visão amplificada da questão na regência verbal (foco de análise deste trabalho) analisada sob a tensão entre norma e uso. Uma delas (inserida na área que interessa particularmente a este trabalho), desenvolvida a partir dos anos 50, é a teoria das valências, que coloca o verbo como categoria central na análise das frases. De acordo com a gramática de valências, o verbo é o centro de onde provêm os controles a
O presente estudo parte de um outro projeto, realizado anteriormente em nível de Iniciação Científica, no qual se procurou fazer a comparação entre a prescrição normativa e os usos reais na língua escrita contemporânea no campo de regência verbal, e que utilizou, para tal, textos recentes (dos últimos 50 anos) provenientes da imprensa, textos técnicos, oratórios, etc., constantes de um corpus de aproximadamente 200 milhões de ocorrências disponíveis no Laboratório de Lexicografia da Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara – UNESP. Essa pesquisa esteve ligada à investigação mais ampla que está consolidada, principalmente, na obra Guia de uso do português (Neves, 2003a). Durante o desenvolvimento desse projeto estudou-se, dentre outras coisas, a regência de alguns dos verbos mais tratados pelos manuais tradicionais, e verificou-se que, quanto à língua escrita moderna, a obediência às prescrições da norma foi, no geral, muito elevada. Além disso, os resultados permitiram relacionar o uso da norma-padrão mais diretamente com as formas de linguagem mais tensa, o que confirmou a hipótese de que “essa obediência constitui um ajustamento a exigências sociais, e não uma parametrização de base propriamente lingüística” (Neves, 2004, p. 75). Após tal constatação, surgiu o interesse pela comparação entre uso e norma também na língua escrita mais antiga, especificamente a da primeira metade do século XX, com o intuito de, examinando-se a tensão entre prescrição normativa e uso real também nessa época, proceder a uma comparação entre os períodos e confirmar (ou não) as hipóteses e os resultados obtidos no estudo anterior. Registrando não apenas os usos, mas também as prescrições e tensões resultantes, o que se procura preparar com esta dissertação é um material de referência para todas as pessoas, falantes ou estudiosos da língua, que estejam interessadas em uma
organização da gramática que reúna, sempre que possível, os componentes envolvidos na produção dos enunciados reais da língua, inclusive as pressões socioculturais que acabam interferindo nas escolhas. A base teórica do projeto é funcionalista, nos moldes de Halliday (1985), Dik (1989; 1997), Givón (1984; 1993; 1995) e Neves (1997), tendo-se em vista, basicamente, a teoria da competência comunicativa exposta nesta última. De acordo com a autora (Neves, 1997), os componentes funcionais são os componentes fundamentais do significado na língua, sendo cada elemento da língua explicado por referência à sua função na comunicação lingüística. Assim, a forma dos enunciados não é independente da sua função, e uma descrição completa considera todo o complexo interacional, ou seja, o que importa não é o que cada elemento significa isoladamente, mas como se codificam no texto a escolha do item, a ordem em que ele se coloca, a sua combinação com outros elementos, etc. A variação lingüística – pressuposto básico na análise que aqui se propõe –, como aponta Neves (2001), encontra aparato propício para avaliação na teoria funcionalista da linguagem, que é dirigida especialmente para a competência comunicativa dos falantes, leva consideração a “intenção” do falante e a “interpretação” do ouvinte, e assenta-se no ponto de vista de que o usuário da língua sabe não apenas o que dizer em determinada situação, mas também como fazê-lo. Conclui-se, portanto, que não é na submissão a regras rígidas estabelecidas em empregos registrados de épocas antigas, próprios de outros gêneros de discurso e pertencentes a outros registros lingüísticos que um falante, numa situação única e individual de comunicação adquire condições de exercer plenamente suas “capacidades” de usuário da língua, e chegar a uma comunicação eficiente, fechando com sucesso circuito tão complexo como o da interação verbal (Neves, 1997).
O objetivo geral do trabalho se insere na proposta de um projeto maior que busca observar, no uso da língua, as construções vigentes que se contrapõem aos cânones prescritos em obras normativas. O objetivo específico é examinar a tensão entre o que propõem os manuais normativos e o que realmente ocorre na língua escrita do português do Brasil, na primeira metade do século XX, quanto à regência de alguns dos verbos mais tratados por esses manuais, a saber: pagar , perdoar , assistir , obedecer , chegar , ir , esquecer(-se) e lembrar(- se). Objetivo paralelo é buscar um confronto com os resultados obtidos em pesquisa anterior, na qual se estudou a regência verbal na segunda metade do século passado, verificando-se as possíveis discrepâncias com relação à obediência à prescrição normativa entre as duas épocas e procurando explicá-las, quando possível.
A pesquisa aqui realizada coloca sob análise a tensão que se estabelece entre as motivações de uso, nascidas das necessidades de eficiência na atuação lingüística, e as prescrições, oriundas da tendência conservadorista da disciplina gramatical, tal como constituída no Ocidente (Neves, 2002). Concentra-se a investigação nos processos ligados à predicação (e, conseqüentemente, à complementação), que é o processo básico de constituição dos enunciados, buscando-se avaliar, especialmente, a aparente tensão entre o uso e a norma nos casos que a tradição chama de regência verbal. A diretriz que governa a investigação − e que diz respeito à ligação entre variabilidade lingüística e eficiência
comunicativa − leva a que se coloquem no centro da investigação as questões cujo equacionamento implica conjunção dos aspectos sintático, semântico e pragmático, ou seja, aqueles “desvios” que ensejam a avaliação das razões e motivações que levaram os falantes, a serviço da acomodação gramatical da língua (Hopper, 1987), a abandonar construções erigidas em cânones para adotar − e persistir em − construções estigmatizadas pelas obras normativas. O corpus utilizado para a realização deste trabalho foi elaborado a partir da modalidade de língua escrita do Brasil do início do século XX, estando disponíveis para exame cerca de 200 milhões de ocorrências^3 , armazenadas em disco rígido de computador, no programa de busca Folio Views , na Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara (UNESP), em textos de todos os tipos em prosa (textos romanescos, jornalísticos, dramáticos, oratórios, técnicos) e poesia. Desses dados constam: a) o corpus principal, constituído por mais de 100 milhões de ocorrências, obtido por digitação e por leitura ótica; b) um segundo corpus de controle, constituído pelo material da revista Veja, de cinco anos;
(^3) Ao corpus inicial, contendo textos dos últimos 50 anos (cerca de 100 milhões de ocorrências), incorporaram-se textos da primeira metade do século XX, e também do século XIX.