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Evolução do Direito de Família no Brasil e sua interação com a Responsabilidade Civil, Notas de aula de Direito

Este documento aborda a evolução do direito de família no brasil, particularmente após a promulgação da constituição federal de 1988, e sua interação com a responsabilidade civil. Discutem-se temas como a igualdade de gênero, autonomia das relações familiares, proteção jurídica aos danos morais e afetivos, e a crescente relevância dos princípios constitucionais na regulação das relações familiares.

O que você vai aprender

  • Qual é a importância dos princípios constitucionais na regulação das relações familiares?
  • Quais são as consequências dos avanços jurídicos no conceito jurídico de família?
  • Como a Responsabilidade Civil interage com o Direito de Família no Brasil?
  • Como o Direito de Família evoluiu no Brasil após a Constituição Federal de 1988?
  • Como o abandono afetivo é tratado no Direito de Família brasileiro?

Tipologia: Notas de aula

2022

Compartilhado em 07/11/2022

VictorCosta
VictorCosta 🇧🇷

4.7

(47)

226 documentos

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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA
ISABELA SILVEIRA CORRÊA
RESPONSABILIDADE CIVIL POR ABANDONO AFETIVO PARENTAL:
ILICITUDE NO DEVER DE CONVIVÊNCIA
Florianópolis
2020
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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA

ISABELA SILVEIRA CORRÊA

RESPONSABILIDADE CIVIL POR ABANDONO AFETIVO PARENTAL:

ILICITUDE NO DEVER DE CONVIVÊNCIA

Florianópolis 2020

ISABELA SILVEIRA CORRÊA

RESPONSABILIDADE CIVIL POR “ABANDONO AFETIVO” PARENTAL:

ILICITUDE NO DEVER DE CONVIVÊNCIA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Direito, da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientadora: Profa. Patrícia Fontanella, Dra. Florianópolis 2020

TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

RESPONSABILIDADE CIVIL POR “ABANDONO AFETIVO” PARENTAL:

ILICITUDE NO DEVER DE CONVIVÊNCIA

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico e referencial conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Sul de Santa Catarina, a Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de todo e qualquer reflexo acerca deste Trabalho de Conclusão de Curso. Estou ciente de que poderei responder administrativa, civil e criminalmente em caso de plágio comprovado do trabalho monográfico. Florianópolis, 08 de julho de 2020.


ISABELA SILVEIRA CORRÊA

A minha família, com amor e gratidão.

RESUMO

O presente trabalho tem como escopo verificar a possibilidade de responsabilização civil pelo abandono afetivo do genitor, que viola o direito de convivência do filho com o pai/mãe. Dessa forma, a pesquisa foi elaborada por meio do método bibliográfico, sendo utilizada legislação, doutrina e jurisprudência. A princípio buscou-se analisar as transformações da família, diante dos avanços da legislação, com a Constituição Federal de 1988 e seus princípios, e a afetividade como elemento fundamental das relações. Esse novo cenário familiar elevou a proteção da criança e do adolescente, elencando uma série de deveres inerentes aos pais. Assim, faz-se uma breve consideração sobre a responsabilidade civil e sua aplicação no Direito de Família, a fim de demonstrar o dever indenizatório do genitor que viola um dever estabelecido pela legislação. O descumprimento de uma obrigação decorrente do dever de convivência caracteriza o chamado pela doutrina e jurisprudência de “abandono afetivo”, passível de reparação quando comprovado o dano psíquico. Palavras-chave: Poder Familiar. Abandono Afetivo. Responsabilidade Civil. Dever de Convivência.

SUMÁRIO

9 1 INTRODUÇÃO O instituto da família no Brasil passou por uma grande transformação com o advento da Constituição Federal de 1988 (CF/88). Analisa-se o poder familiar sob um novo aspecto, diante da transição entre o estado de dominação da figura masculina, perante a mulher e os filhos, para o de proteção. Essa transição gerou uma série de mudanças na formação desse núcleo social. Notável que o vínculo afetivo nessas relações se tornou figura essencial, especialmente no que tange ao interesse da criança e do adolescente. Com base nos princípios fundamentais garantidos pela CF/88, e posteriormente com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a criança passou a ser tratada como sujeito de direitos. A Carta Magna assegura plenamente a criança e ao adolescente o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de protegê-los de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Sob a égide do princípio basilar do ordenamento jurídico, a dignidade da pessoa humana, os princípios da proteção integral da criança e do adolescente, bem como da paternidade responsável e da convivência familiar, norteiam a conduta dos genitores, a fim de direcionar a educação e criação que as crianças devem receber. Nesse sentido, amparados pela CF/88, muitos filhos, diante da ausência de afeto e de convivência familiar, procuram o Poder Judiciário com o intuito de buscar uma reparação ao dano psíquico gerado pelo denominado “abandono afetivo”. Este trabalho objetiva verificar a possibilidade de responsabilidade civil por abandono afetivo parental. Questionam-se, portanto, quais são efetivamente os deveres dos pais perante seus filhos, e se essas obrigações são apenas referentes ao dever de sustento ou se englobam outros capazes de gerar a aplicação das regras gerais de responsabilidade civil. Inicialmente, analisa-se o instituto da família, resgatando uma visão histórica sob o aspecto do Código Civil de 1916 (CC/1916) e do Código Civil de 2002 (CC/2002), bem como da CF/88 e seus princípios que cercam o Direito de Família e norteiam o tema em estudo. Posteriormente, compreende-se a responsabilidade civil, brevemente seu histórico, seus elementos essenciais que caracterizam a configuração do dever de indenizar e sua relação com o Direito de Família.

10 Em seguida, conceitua-se o denominado “abandono afetivo” e o dever de convivência sob a perspectiva da possibilidade da responsabilização do genitor, tendo em vista o descumprimento dos deveres oriundos do poder familiar e a comprovação do dano. Por fim, apresentam-se as posições favoráveis e contrárias na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Tribunal de Justiça de Santa Catarina sobre a (im)possibilidade de responsabilização civil por “abandono afetivo” dos genitores. O método de abordagem utilizado no presente trabalho é o dedutivo, visto que se inicia com informações gerais, caminhando para uma análise específica do conteúdo limitado. Realiza-se perante três etapas: inicialmente através de uma verificação dos dados gerais, importante para a compreensão do assunto; em seguida correlacionar os danos assim analisado; e, por fim, de acordo com a particularidade do tema, analisar as possibilidades. A técnica utilizada para realizar a monografia é a bibliográfica, com base em material já elaborado, como leis, artigos jurídicos, revistas especializadas, livros e jurisprudência dos tribunais que envolvam o tema em estudo.

12 2.1 A FAMÍLIA BRASILEIRA Sem destoar da realidade em relação à definição de família, a evolução histórica segue a mesma complexibilidade.^8 Para Paulo Nader, durante o processo de evolução até o que se entende como a família de hoje, passou-se por mais três regimes: uma fase de promiscuidade social, o matriarcado como sistema social primitivo e o patriarcado.^9 Os primeiros agrupamentos sociais “[...] formavam-se com base no instinto sexual [...]”^10 , “[...] pregando, como realidade inicial, a promiscuidade entre seres humanos”.^11 Eis a lição de Álvaro Villaça Azevedo: A acatar-se a teoria segundo a qual os homens primitivos viveram, inicialmente, em hordas promíscuas, em mera união de sexos, sem quaisquer vínculos sociais ou civis, tem-se de entender que, depois dessa fase, a organização da sociedade familiar deu-se em torno da mulher, ou seja, em forma de poliandria, com a básica ideia de que o pai era desconhecido, segundo informam-nos aqueles que por essa teoria propugnam, que, assim, admitem o matriarcado antes do patriarcado poligâmico, depois monogâmico.^12 Essa estrutura social, inicialmente, era “[...] integrada por todos os parentes, formando unidade de produção, com amplo incentivo à procriação [...]”^13 , de modo que as relações sexuais não se limitavam à família, “[...] ocorriam entre todos os membros que integravam a tribo”.^14 Assim, apenas a mãe da criança era conhecida, “[...] o que permite afirmar que a família teve de início um caráter matriarcal, porque a criança ficava sempre junto à mãe, que a alimentava e a educava”.^15 Posteriormente, resultado do início de uma nova cultura enraizada no culto religioso, surge a necessidade de formar uma estrutura social mais conveniente, a fim de organizar a (^8) GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: direito de família. 9. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019a. v. 6. p. 55. (^9) NADER, Paulo. Curso de direito civil: direito de família. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019. v. 5. p. 7. E- book. Acesso Restrito via Minha Biblioteca. (^10) MALUF, Carlos Alberto Dabus; MALUF, Adriana Caldas do Rego Freitas Dabus. Curso de Direito de Família. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 31. E-book. Acesso Restrito via Minha Biblioteca. (^11) AZEVEDO, Álvaro Villaça. Curso de direito civil: direito de família. 2. ed. São Paulo: Saraiva Educação,

  1. v. 6. p. 22. E-book. Acesso Restrito via Minha Biblioteca. (^12) Ibid., p. 23. (^13) DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 13. ed., rev., ampl. e atual. Salvador: Editora JusPodivm, 2020. p. 43. (^14) VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: família e sucessões. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2020a. v. 5. p. 4. E- book. Acesso Restrito via Minha Biblioteca. (^15) Ibid., p. 4.

13 vida em sociedade.^16 Diante da tradição religiosa, esses agrupamentos, que passaram a ser entidades familiares, se estabeleciam, exclusivamente, por meio do casamento. O patriarcado, que passou a vigorar na época, caracterizou-se “[...] pela concentração exclusiva de poderes nas mãos do marido, tanto em relação à esposa quanto aos filhos [...]”^17 , “[...] pautava-se numa unidade econômica, política, militar e religiosa, que era comandada sempre por uma figura do sexo masculino, o pater famílias”.^18 O homem, amparado pelo princípio da autoridade, detinha o pater poder, resultado de uma relação, exclusivamente, autoritária sobre a mulher e os filhos, inclusive sendo capaz de “[...] vendê-los, impor-lhes castigos e penas corporais e até mesmo tirar-lhes a vida”.^19 Sobre o pater famílias, Maria Berenice Dias afirma: A expressão ‘poder familiar’ adotada pelo Código Civil corresponde ao antigo pátrio poder, termo que remonta ao direito romano: pater potestas – direito absoluto e ilimitado conferido ao chefe da organização familiar sobre a pessoa dos filhos. A conotação machista do vocábulo é flagrante, pois só se menciona o poder do pai com relação aos filhos.^20 (grifo da autora) O cenário patriarcalista e a ascensão do casamento conduziram a mulher a um papel de inferioridade na sociedade conjugal. O CC/1916^21 , que vigorava, estabelecia sua condição de relativamente incapaz após o casamento, sendo o marido responsável por assisti-la nos atos da vida civil.^22 Nessa perspectiva, os filhos não recebiam tratamento diferente: As relações sem casamento eram moral, social e civilmente reprovadas, atingindo diretamente os filhos que eram classificados e consequentemente discriminados em função da situação jurídica dos pais. Legítimos eram os filhos concebidos na constância do casamento. Ilegítimos, os que não procediam de justas núpcias. Distinguiam-se os filhos ilegítimos em naturais, assim considerados os que nasciam de homem e mulher entre os quais não havia impedimento matrimonial, e os espúrios, denominação que designava aqueles que descendiam de pessoas impedidas (^16) MALUF, Carlos Alberto Dabus; MALUF, Adriana Caldas do Rego Freitas Dabus. Curso de Direito de Família. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 31. E-book. Acesso Restrito via Minha Biblioteca. (^17) NADER, Paulo. Curso de direito civil: direito de família. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019. p. 9. E-book. Acesso Restrito via Minha Biblioteca. (^18) GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: direito de família. 9. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019a. v. 6. p. 58. (^19) GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. 15. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018. v. 6. p. 31. (^20) DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 13. ed. rev., ampl. e atual. Salvador: Editora JusPodivm, 2020. p. 301, apud RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito de Família. 28 ed. São Paulo: Saraiva, 2004. v. 6. p. 353. (^21) BRASIL. Lei nº 3.071, de 1º de janeiro de 1916. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil. Brasília, DF: Presidência da República, 1916. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L3071.htm. Acesso em: 23 abr. 2020. (^22) RAMOS, Patricia Pimental de Oliveira Chambers. Poder familiar e a guarda compartilhada: novos paradigmas do direito de família. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 33. E-book. Acesso Restrito via Minha Biblioteca.

15 Para Maria Berenice Dias, o contexto patriarcalista vivido: [...] não resistiu à revolução industrial, que fez aumentar a necessidade de mão de obra, principalmente para o desempenho de atividades terciárias. Foi assim que a mulher ingressou no mercado de trabalho, deixando o homem de ser a única fonte de subsistência da família. Com isso, sua estrutura mudou. Tornou-se nuclear, restrita ao casal e sua prole. Acabou a prevalência do seu caráter produtivo e reprodutivo. A família migrou do campo para as cidades e passou a conviver em espaços menores. Isso levou à aproximação dos seus membros, sendo mais prestigiado o vínculo afetivo que envolve seus integrantes. Surge a concepção da família formada por laços afetivos de carinho, de amor.^29 No decorrer dos séculos, os avanços tecnológicos e científicos contribuíram de forma predominante para a transformação de uma família de caráter exclusivamente hierarquizado, resultado de uma sociedade machista^30 , “[...] heteroparental, biológica, institucional vista como unidade de produção e de reprodução”^31 para “[...] uma família pluralizada, democrática, igualitária, hetero ou homoparental, biológica ou socioafetiva, construída com base na afetividade [...]” 32 sob um aspecto protetor.^33 Assim, a família se desprende do caráter econômico e reprodutivo, abre mão do casamento como instituto que define sua consolidação e torna-se uma unidade socioafetiva, revestida de afeto, em busca de proteção e do desenvolvimento de cada um. “É a busca da dignidade humana, sobrepujando valores meramente patrimoniais”.^34 “Substituiu-se, à organização autocrática uma orientação democrática-efetiva. O centro de sua constituição deslocou-se do princípios da autoridade para o da compreensão e do amor”.^35 Após um grande período de transformações, a entidade familiar assume novas formas. O que antes era inaceitável aos olhos das leis e costumes passa a ser a realidade. A diversidade nos modelos de família deu novo rumo à história desse instituto.^36 (^29) DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 13. ed. rev., ampl. e atual. Salvador: Editora JusPodivm, 2020. p. 43. (^30) GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. 15. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018. v. 6. p. 31. (^31) FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Direito das Famílias. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 12, apud MADALENO, Rolf. Manual de Direito de Família. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense,

  1. p. 19. (^32) MADALENO, Rolf. Manual de Direito de Família. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019. p. 19. (^33) GONÇALVES, op. cit., p. 31. (^34) FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: direitos reais. 15. ed. rev., ampl. e atual. Salvador: Ed. JusPodivm, 2018. p 37. (^35) PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: direito de família. 28. ed. rev. e atual. por Tânia da Silva Pereira. Rio de Janeiro: Forense, 2020. v. V. p. 30. E-book. Acesso via Minha Biblioteca. (^36) MALUF, Carlos Alberto Dabus; MALUF, Adriana Caldas do Rego Freitas Dabus. Curso de Direito de Família. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 38. E-book. Acesso Restrito via Minha Biblioteca.

16 2.2 EVOLUÇÃO LEGISLATIVA DA FAMÍLIA A primeira Constituição no Brasil, chamada de Constituição Monárquica de 1824, determinou a elaboração de um CC, que foi desenvolvido por Clóvis Beviláqua. Esse CC foi promulgado em janeiro de 1916, sendo um marco importante ao estabelecer um regramento próprio, considerando o período da República Velha que o Brasil vivia, marcado por uma sociedade “[...] que se preocupava muito mais com o ter do que com o ser”.^37 De acordo com Carlos Eduardo Pianovski Ruzyk: O Código Civil de 1916 regulava a família do início do século passado. Em sua versão original, trazia estreita e discriminatória visão da família, limitando-a ao casamento. Impedia sua dissolução, fazia distinções entre seus membros e trazia qualificações discriminatórias às pessoas unidas sem casamento e aos filhos havidos dessas relações. As referências feitas aos vínculos extramatrimoniais e aos filhos ilegítimos eram punitivas e serviam exclusivamente para excluir direitos, na vã tentativa da preservação da família matrimonializada.^38 (grifo do autor) A Lei nº 3.071, de 1º de janeiro de 1916^39 , foi criada diante de uma sociedade totalmente patriarcalista e rural, com aspectos predominantes da família da Antiguidade. A mulher representava a figura doméstica, recebendo tratamento legal inferior aos homens. O marido era a autoridade e o representante da entidade familiar, e os filhos, apenas os homens, os continuadores da família. Com forte influência da Igreja, o Estado seguia nos mesmos moldes, mantendo “[...] a indissolubilidade do vínculo do casamento e a capitis deminutio, incapacidade relativa da mulher, bem como a distinção legal de filiação legítima e ilegítima”.^40 Nesse sentido, Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho afirmam: Sob o manto (ou o jugo) conservador e hipócrita da ‘estabilidade do casamento’, a mulher era degradada, os filhos relegados a segundo plano, e se, porventura, houvesse a constituição de uma família a latere do paradigma legal, a normatização vigente simplesmente bania esses indivíduos (concubina, filho adulterino) para o limbo jurídico da discriminação e do desprezo.^41 (^37) GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: direito de família. 9. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019a. v. 6. p. 72. (^38) RUZYK, Carlos Eduardo Pianovski. Familias simultâneas: da unidade codificada à pluralidade constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 16, apud DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 13. ed. rev. ampl. e atual. Salvador: Editora JusPodivm, 2020. p. 46. (^39) BRASIL. Lei nº 3.071, 1º de janeiro de 1916. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil. Brasília, DF: Presidência da República, 1916. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L3071.htm. Acesso em: 23 abr. 2020. (^40) VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: família e sucessões. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2020a. v. 5. p. 17. E- book. Acesso Restrito via Minha Biblioteca. (^41) GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, op. cit., p. 71.

18 estabelecendo a família nos moldes da igualdade, solidariedade e respeitando seu princípio basilar: a dignidade da pessoa humana. Em poucas palavras, Maria Berenice Dias resume esse novo cenário: [...] a Constituição da República de 1988, num único dispositivo, espancou séculos de hipocrisia e preconceito. Instaurou a igualdade entre o homem e a mulher e esgarçou o conceito de família, passando a proteger de forma igualitária todos os seus membros. Estendeu proteção à família constituída pelo casamento, bem como à união estável entre o homem e a mulher e à comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, que recebeu o nome de família monoparental. Consagrou a igualdade dos filhos, havidos ou não do casamento, ou por adoção, garantindo- lhes os mesmos direitos e qualificações.^50 (grifos da autora) Nesse sentido, Zeno Veloso define: No direito brasileiro, a partir da metade do século XX, paulatinamente, o legislador foi vencendo barreiras e resistências, atribuindo direitos aos filhos ilegítimos e tornando a mulher plenamente capaz, até o ponto culminante que representou a Constituição de 1988, que não mais distingue a origem da filiação, equiparando os direitos dos filhos, nem mais considera a preponderância do varão na sociedade conjugal. A Lei no^ 4.121, de 27862, Estatuto da Mulher Casada, que eliminou a incapacidade relativa da mulher casada, inaugura entre nós a era da igualdade entre os cônjuges, sem que, naquele momento, a organização familiar deixasse de ser preponderantemente patriarcal, pois muitas prerrogativas ainda foram mantidas com o varão.^51 Com a Carta Constitucional de 1988^52 , nasce uma nova concepção de valores. Norteada pelo princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, o legislador buscou garantir que não houvesse “[...] superposição de qualquer estrutura institucional à tutela de seus integrantes”.^53 A entidade familiar passou a ser reconhecida independentemente de sua formalização. O art. 226 da CF/88 garantiu proteção a todos os “tipos” de família, com ou sem existência de vínculo matrimonial.^54 A família, que era considerada uma “[...] instituição capaz de merecer (^50) VELOSO, Zeno. Homossexualidade e Direito. Jornal O Liberal, de Belém do Pará, em 22.5.1999, p. 3, apud DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 13. ed. rev. ampl. e atual. Salvador: Editora JusPodivm, 2020. p. 46. (^51) VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: família e sucessões. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2020a. v. 5. p. 17. E- book. Acesso Restrito via Minha Biblioteca. (^52) BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Presidência da República, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Con stituicao.htm. Acesso em: 26 abr. 2020. (^53) RAMOS, Patricia Pimental de Oliveira Chambers. Poder familiar e a guarda compartilhada: novos paradigmas do direito de família. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 40. E-book. Acesso Restrito via Minha Biblioteca. (^54) VENOSA, op. cit., p. 18.

19 tutela jurídica pelo simples fato de existir [...]”^55 , passou a ser “[...] valorada de maneira instrumental, tutelada somente na exata medida em que se constitua em um núcleo intermediário de desenvolvimento da personalidade dos filhos e de promoção da dignidade dos seus integrantes”.^56 A igualdade entre homens e mulheres foi marco para a evolução do Direito de Família, nasce o poder familiar diante da igualdade de direitos e deveres entre os cônjuges, amparado pelo art. 226, § 5º da CF/88. Admite-se o divórcio (art. 226, § 6º, da CF/88, com a redação dada pela Emenda Constitucional 66/2010). Legitima-se, também, a igualdade dos filhos. Torna-se inválido qualquer comportamento discriminatório diante do princípio da dignidade da pessoa humana, garantindo-lhes direitos iguais independentemente de sua origem, segundo art. 227, § 6º da CF/88. O Estado assume importante papel e responsabilidade na vida das famílias brasileiras, conforme o art. 226, § 8º, ao “[...] assegurar assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”.^57 Segundo a autora Patrícia Pimental de Oliveira Chambers Ramos: Alterou-se o conceito de unidade familiar, antes considerado aglutinação formal de pais e filhos legítimos baseada no casamento, para um conceito flexível e instrumental, fulcrado no liame substancial de pelo menos um dos genitores com seus filhos, com origem não só no casamento, mas em outros tipos de entidades familiares, e voltado para a realização espiritual e o desenvolvimento da personalidade de seus membros, com a equiparação dos direitos e deveres do homem e da mulher. Coube à Constituição de 1988 promover a plena equiparação dos filhos, desvinculando-os da situação jurídica dos pais, que passaram a ter o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, independentemente de serem ou não casados.^58 Em relação à evolução legislativa do Direito de Família, Paulo Nader analisa: As mudanças que se operam no presente nascem, em parte, de uma ruptura com o passado, que fundava a sua filosofia no individualismo e não atentava plenamente para a dignidade inerente aos seres humanos, donde a discriminação às então chamadas família e filiação ilegítimas, que ficavam à míngua de qualquer amparo. Daí não se poder acatar, sem reparos, a afirmativa de Francesco Cosentini, segundo a qual a reforma jurídica traduz apenas um desdobramento harmônico das instituições pretéritas, como se infere de seu texto: ‘É na harmonia do antigo e do (^55) RAMOS, Patricia Pimental de Oliveira Chambers. Poder familiar e a guarda compartilhada: novos paradigmas do direito de família. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 40. E-book. Acesso Restrito via Minha Biblioteca. (^56) RAMOS, loc. cit. (^57) Ibid., p. 41. (^58) Ibid., p. 40.