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Este documento discute sobre a presença de simulação em avaliações neuropsicológicas e os fatores que podem influenciar este fenômeno, incluindo ganhos significativos externos, evidências de testes neuropsicológicos, auto-relatos e capacidades psiquiátricas, neurológicas ou de desenvolvimento. O texto também aborda a importância de adquirir informações sobre o indivíduo através de questões desenvolvimentais, culturais, históricas, ocupacionais, médicas e de abuso de substâncias, para informar a entrevista clínica e as provas psicométricas.
Tipologia: Notas de estudo
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Instituto Superior de Ciências da Saúde – Norte Departamento de Psicologia, UnIPSa
Hugo Sousa,
Simulação na Neuropsicologia Forense:
exploração de um método de detecção
Hugo Sousa,
III. Resumo: “Background” : No processo de avaliação neuropsicológica dos défices cognitivos, uma das dificuldades com que se depara o neuropsicólogo é a simulação. Uma das hipóteses de detecção de simulação, reside na avaliação dos padrões de resposta apresentados nas provas neuropsicológicas, tendo sido desenvolvidos estudos em provas como o Wisconsin Card Sorting Test (WCST), ou o Trail Making Test (TMT), com elevados níveis de sensibilidade. Método: Amostra constituída por 56 sujeitos, diagnosticados com traumatismo crânio- encefálico, que realizaram avaliação neuropsicológica forense, numa situação em que podem auferir recompensa monetária por incapacidade. Os instrumentos utilizados foram o WCST, TMT, o Brief Symptom Inventory (BSI), e a grelha de análise dos autos do processo. Tendo como base os valores de referência de detecção de indicadores de simulação de Suhr e Boyer (1999), para o WCST, e de Egeland e Langfjaeran (2007), para o TMT, e os critérios de Slick et. al (1999) para diagnóstico de simuladores, procedeu-se à combinação de indicadores derivados destes instrumentos de modo a criar dois grupos: um grupo de prováveis simuladores e um grupo de prováveis não simuladores. Foi de seguida realizada comparação entre os grupos ao nível da sintomatologia psicológica, dados de auto-relato, e dados sócio- demográficos. Resultados: Cerca de 30% da amostra enquadra-se no grupo de prováveis simuladores. Não foram encontradas diferenças significativas a nível sócio-demográfico, nem ao nível dos dados de auto-relato, entre os dois grupos. Não existem diferenças significativas ao nível da sintomatologia psicológica, para além da dimensão somatização, apresentando o grupo de prováveis simuladores menores índices. Estes valores de somatização, para este grupo, encontram-se inseridos nos esperados nos valores normativos, enquanto que no grupo de prováveis não simuladores, a somatização, encontra-se significativamente superior aos valores normativos. Com esta excepção, pelos resultados, verificamos uma grande homogeneidade entre os dois grupos. Conclusão: Destaca-se a significativa percentagem de prováveis simuladores na avaliação neuropsicológica forense, que revela a necessidade de aplicação, e desenvolvimento, de métodos eficazes da sua detecção. Este processo de detecção deve ser rigoroso, visto que, pelos resultados obtidos, os grupos apresentam grande homogeneidade, sendo a somatização a única dimensão que os distingue, sendo menor no grupo de prováveis simuladores. Mais estudos serão necessários na avaliação das contingências deste resultado. Estes estudos deverão focar-se na análise das discrepâncias entre dano real e o dano evidenciado, e sua relação com a sintomatologia psicológica.
IV. Introdução
1. A Psicologia e Neuropsicologia, Contexto Forense A Psicologia Forense pode ser definida como uma disciplina que pretende dar resposta às questões científicas e práticas que o sistema de justiça coloca aos psicólogos (Goldstein, 2003). Forense advém do latim forensis , que significa público, devendo este ramo da psicologia ser então entendido como um campo interdisciplinar, cuja especificidade é a interface entre a Psicologia e o Direito (Machado & Gonçalves, 2005). Negligenciada durante muito tempo, a psicologia forense tem vindo a conquistar uma visibilidade e uma expansão cada vez maior nos últimos 30 anos (Fonseca, 2006) e, hoje em dia, nos procedimentos civis e criminais, os psicólogos são frequentemente solicitados para avaliar uma grande diversidade de situações, tais como a competência para submeter a julgamento, questões relacionadas com a guarda de menores, responsabilidade criminal, regulação do poder paternal, assim como avaliação de danos psicológicos posteriores a lesões traumáticas cerebrais (Johnston, Schopp & Shigaki, 2000). Por sua vez, a neuropsicologia pode ser descrita como uma integração entre a psicologia e a neurologia. Definida em 1974 por Meier como “o estudo científico da relação entre o cérebro e o comportamento”(p.289), a performance neuropsicológica, pressupõe uma influência conjunta de factores orgânicos e comportamentais (Horton & Puente, 1990). A neuropsicologia forense, pode ser considerada como um híbrido, que combina a base científica e prática neuropsicológica com as dimensões científica e prática forense (e.g. Heilbronner, 2004; Gudjonsson, 1995; McKinlay, 1992; McMahon & Satz, 1981). O primeiro envolvimento da neuropsicologia na área da psicologia forense é remetido para 1954, tendo nas últimas décadas, e acompanhando o crescimento geral da Psicologia Forense, existido uma “explosão” da actividade neste campo (Taylor, 1999), tornando-se, a psicologia forense, talvez a área da prática da neuropsicologia que mais rapidamente se expandiu (Sweet, King, Malina, Bergman, & Simmons, 2002). O seu crescimento está em parte relacionado com a sua relevância. Isto é, apesar da sobreposição das áreas da psiquiatria, neurologia e neuropsicologia, o estudo detalhado e intensivo da cognição, comportamento e emoções através de um procedimento baseado em testes específicos, é preferencialmente a actividade do neuropsicólogo (Sweet, 2009). Os neuropsicólogos na prática da psicologia forense têm-se centrado, ao longo da história, nos casos de avaliação relacionados com trauma cerebral (Denney & Wynkoop, 2000), em que na sua forma mais utópica, a avaliação neuropsicológica forense deveria permitir a identificação do estado mental e o seu potencial diagnóstico antes do acontecimento, no momento do acontecimento, e no momento actual (Denney & Wynkoop, 2000).
A neuropsicologia passa então a ser vista como o meio para a avaliação neuropsicológica, como método de examinar as funções cerebrais, estudando o seu produto comportamental. Sendo o comportamento o seu objecto, a avaliação neuropsicológica baseia-se por isso nas mesmas técnicas e pressupostos da tradicional avaliação psicológica para propósitos diagnósticos e terapêuticos (Heilbrun, et al., 2003). Assim, de modo a se avaliar o estudo sistemático do comportamento, a neuropsicologia forense, faz uso de testes estandardizados que fornecem indices sensitivos da relação do comportamento cerebral. Neste sentido, e uma vez que as baterias de avaliação neuropsicológica geralmente avaliam um largo espectro de comportamentos, a aproximação multidimensional para medir funcionamentos corticais superiores demonstrou ser extremamente útil na quantificação das incapacidades resultadas do trauma cerebral ou noutras condições neuropatológicas, e com isto as avaliações neuropsicológicas tornaram-se importantes para a compreensão de sequelas cognitivas, comportamentais e emocionais, na variedade de problemas neurológicos inseridos nos propósitos legais (Heilbrun, et al., 2003). Assim, a neuropsicologia forense rapidamente emergiu como uma subespecialidade da neuropsicologia que directamente aplica os princípios da neuropsicologia nas questões de dano cerebral que são relevantes nos processos cíveis e criminais (Heilbrun, et al., 2003). Por exemplo, Rabin, Barr e Burton (2005), relataram que 68,3% dos neuropsicólogos responderam a questões solicitadas pelos órgãos de justiça. Por outro lado, o aumento da actividade da neuropsicologia no campo da justiça, rápida e consequentemente levou a que a sua validade fosse questionada (Matarazzo, 1987). Durante a década de 80 e no início de 90, uma quantidade considerável de investigadores debateram questões específicas da neuropsicologia relevantes para o trabalho forense (e.g. Hall e McNinch, 1988; Martell, 1992). Várias questões surgiram acerca do mérito (ou falta dele) da neuropsicologia, assim como a sua pertinência neste contexto. Hoje em dia parece no entanto consensual que os procedimentos de avaliação neuropsicológica atingiram um nível elevado de proeminência sob o ponto de vista legal (Taylor, 1999). Deste modo, a natureza quantitativa e objectiva da avaliação neuropsicológica tornou-se valorizada nos tribunais, no fornecimento de informação ao juíz quanto à determinação, efeitos e prognóstico da disfunção cerebral (Heilbrun, et al., 2003), e ao longo do tempo, a percentagem de indivíduos envolvidos nas avaliações neuropsicológicas aumentou significativamente, não só devido ao crescimento da neuropsicologia, como também pelo aumento da compreensão da lesão cerebral, por uma maior sobrevivência de indivíduos com este tipo de lesões e as suas consequentes incapacidades crónicas (Johnston, Schopp & Shigaki, 2000). No contexto da neuropsicologia forense, surge a necessidade de em primeiro lugar se realizarem determinadas tarefas, de modo a avaliar o tipo e grau das consequências cognitivas
A Simulação (enquanto diagnóstico) é referida como envolvendo simulação consciente para obter recompensas externas. Existe ainda um espaço “vazio” que envolve os casos de simulação inconsciente para objectivos externos. O DSM-IV-TR sugere que deve haver suspeita de Simulação sempre que haja uma combinação dos seguintes factores: (a) contexto medico-legal, (b) marcada discrepância entre as queixas e incapacidades da pessoa e os resultados objectivos, (c) falta de cooperação durante a avaliação diagnóstica e no cumprimento do tratamento prescrito, e (d) a presença de personalidade anti-social (Larrabee, 2005) Por outro lado, Larrabee (2005) e Iverson e Binder (2000) propuseram um modelo de três factores indicando que a Simulação pode ocorrer de três formas: (a) fraco desempenho intencional nos testes de capacidades, (b) exagero notório dos sintomas, ou (c) combinação dos primeiros dois factores. Rogers (1997) propôs uma definição de Simulação similar à do DSM-IV-TR, mas eliminou os factores associados à psicopatologia e à presença de personalidade anti-social. Este autor defende que deve haver um afastamento do “perturbado mentalmente” e da conceptualização de simulação como algo “mau”, defendendo que a simulação deve ser reconhecida como um comportamento adaptativo (Rogers, 1990a, 1990b, citado por Larrabee, 2005). Slick et al. (1999) desenvolveram um critério de diagnóstico de Simulação da Disfunção Neurocognitiva (SDN). Estes autores definiram o SDN como “o exagero volitivo ou fabrico de disfunção cognitiva com o objectivo de alcançar ganhos materiais substanciais, ou evitar ou escapar a deveres formais ou a responsabilidades. O material ganho inclui dinheiro, bens, ou serviços” (p.552). Este sistema de Slick foi formatado de forma paralela ao DSM-IV-TR (American Psychiatric Association, 1994), modelo de uma definição geral, seguida de vários, necessários e suficientes, critérios de suporte (ou rejeição) para uma conclusão sobre a Simulação. Na determinação da presença de SDN, o clínico deve avaliar o caso com base em quatro critérios: (A) presença de ganho significativo externo; (B) evidência de testes neuropsicológicos; (C) evidência do auto-relato; e (D) a capacidade de factores psiquiátricos, neurológicos, ou desenvolvimentais que percebam os comportamentos que encontrem os necessários pontos B e C (Larrabee, Greiffenstein, Greve & Bianchini, 2007). Se incentivos externos estão presentes, os comportamentos do Critério B podem ser suficientes para o diagnóstico de Simulação por si só; a descoberta de um viés de resposta isoladamente é suficiente para um diagnóstico de SDN. Um diagnóstico de provável SDN pode ser feito com dois tipos de critério B ou um tipo de critério B associado com um ou mais tipos inseridos no Critério C (Larrabee, Greiffenstein, Greve & Bianchini, 2007). Relativamente ao Critério B, baseia-se em desempenhos pobres em especializados e validados testes (caso do critério B1 e B2), ou em discrepâncias entre os
dados dos testes e os padrões de funcionamento cerebral conhecidos (B3); observações comportamentais (B4); informação colateral (B5); e a documentada história pós-acidente (B6) (Larrabee, Greiffenstein, Greve & Bianchini, 2007). Na tabela 1 podemos verificar, de forma sistematizada, os critérios de Simulação de Disfunção Cognitiva (SDN):
Tabela 1. Critérios de Simulação da Disfunção Cognitiva de Slick, Sherman, e Iverson (1999). A. Presença de incentivo externo substancial. Pelo menos um incentivo substancial para exagero ou fabrico de sintomas estão de forma claramente identificável presentes no momento da avaliação. B. Evidência de testagem neuropsicológica
2.2. Motivos e Prevalência da Simulação Aos indivíduos que é realizada uma avaliação neuropsicológica forense existem associados de forma frequente ganhos económicos significativos caso seja estabelecido um diagnóstico de défice cognitivo. Enquanto que certos incentivos externos podem motivar a simulação, o efeito de um incentivo financeiro (por exemplo, a indemnização a trabalhadores por lesões cerebrais) é o mais fácil de documentar e o mais e melhor estudado (Larrabee, Greiffenstein, Greve & Bianchini, 2007). Não existindo uma consensualidade entre os valores de simulação existentes na avaliação psicológica forense existindo recompensa económica, têm surgido alguns estudos focados na análise desta mesma dimensão. A influência específica da compensação financeira a partir da severidade dos sintomas foi analisada numa meta-análise conduzida por Binder e Rohling (1996), que descobriu que a força da associação entre medidas, incluindo os resultados de testes neuropsicológicos e o incentivo financeiro, foi de .47 no total, havendo no caso da trauma cerebral ligeiro, uma frequência mais elevada, que pode chegar a .88. Mittenberg, Patton, Canyock, e Condit (2002) realizaram uma pesquisa através da ABCN (American Board of Clinical Neuropsychology) a técnicos que realizaram
2.3. O Traumatismo Crânio-Encefálico (TCE) e sua Avaliação A área avaliativa de contexto forense, em que parece existir maior simulação encontra-se ao nível da avaliação dos défices cognitivos associados a traumatismos crânio-encefálicos (TCE), em que existe uma recompensa externa, económica, caso seja provado esse mesmo défice. Achamos por isso importante explorar as especificidades inerentes ao traumatismo crânio-encefálico, e à sua avaliação no contexto da psicologia forense. Assim, os sintomas cognitivos e neuro-comportamentais são frequentes após uma lesão traumática cerebral (Sbordone, Seyranian & Ruff, 2000), sendo a avaliação psicológica, inicialmente, realizada através da entrevista clínica, seguindo-se depois com uso de testes neuropsicológicos que permitem avaliar os possíveis danos cognitivos. Estes métodos são ainda complementados com a revisão dos registos médicos independentemente do mecanismo do trauma, severidade da lesão craniana, ou o tipo de litígio (Mittenberg & Morgan, 2009). Um dos importantes pontos do processo avaliativo é portanto a entrevista clínica. É importante adquirir informação sobre o indivíduo através da realização de questões de ordem desenvolvimental, cultural, referentes à história educacional, ocupacional, médica e de abuso de substâncias, assim como todo o estado actual destas dimensões (Delis & Jacobson, 2000), uma vez que, muitas delas são ulteriores à lesão cerebral por si só e podem afectar a performance na avaliação psicométrica de nível cognitivo, (Delis & Jacobson, 2000; Sbordone, Seyranian & Ruff, 2000), possibilitando assim, a entrevista clínica, desde logo informações sobre as dimensões cognitivas, e o que esperar das provas psicométricas (Delis & Jacobson, 2000). Os danos cerebrais causados por um traumatismo crânio-encefálico são variados, num largo espectro de dimensões. Assim, através dos estudos realizados chega-se à conclusão que ao nível das funções intelectuais, estas permanecem dentro do considerado normal (Hopkins, Tate & Bigler, 2005), sendo que, os maiores danos apresentam-se ao nível cognitivo, nomeadamente ao nível da memória, atenção e função executiva, assim como numa diminuição da velocidade de processamento (Draper & Ponsford, 2008; Hopkins, Tate & Bigler, 2005; Serino et al., 2006; Horton & Wedding, 2008). No que diz respeito à diminuição da velocidade e eficiência do processamento de informação, os indivíduos apresentam uma maior lentificação do pensamento, dificuldades em rapidamente focar a sua atenção à informação apresentada, maior lentificação na resolução de problemas, e uma percepção de que as “coisas” parecem estar a mover-se a uma velocidade superior ao normal. Para se avaliar esta dimensão é frequente a utilização de testes como o STROOP Color and Word Test (Horton e Wedding, 2008; Marques-Teixeira, 2005).
Associadas às dificuldades relativas ao processamento de informação, como já referido, são ainda de esperar dificuldades de atenção e concentração. Todos os indivíduos após trauma cerebral reportam maiores dificuldades em focar a sua atenção num estímulo, sendo o período de atenção mais curto, evidenciando-se maiores períodos de distractibilidade. A maioria dos pacientes queixa-se ainda de incapacidade de realizar mais que uma tarefa em simultâneo após a lesão, assim como uma incapacidade de processar mais que uma ideia ou tarefa em simultâneo. De modo a se avaliar estas dificuldades é frequente o uso de testes como o Trail Making Test (TMT), em que uma significativa dificuldade na Parte B, comparativamente à Parte A, é um indicativo de dificuldades ao nível da atenção selectiva (Horton & Wedding, 2008; Marques-Teixeira, 2005). As dificuldades ao nível da memória e aprendizagem, são esperadas numa variada amplitude entre as actividades de vida diária, assim como na dificuldade de recordação de material armazenado previamente ao acidente. No entanto, na maioria dos indivíduos com TCE, o material memorizado antes do acidente, encontra-se retido e é acessível, enquanto que as novas informações a reter são difíceis de ficarem estabelecidas, ficando pobremente consolidadas, e consequentemente difíceis de recordar (Horton & Wedding, 2008). A acrescentar que, como testes de avaliação desta dimensão cognitiva, são frequentemente utilizados, o Hopkins Verbal Learning Test – Revised (HVLT-R), o Califórnia Verbal Learning Test (CVLT) ou a Weschler Memory Scale (WMS). Após TCE, os indivíduos podem ainda apresentar dificuldades ao nível da função executiva. Relacionadas com a função executiva estão as funções de capacidade de planeamento, iniciação, e conclusão de tarefas, assim como para a auto-monitorização e auto-correcção. Estes domínios são controlados primordialmente pelo lobo frontal. A salientar que o lobo frontal apenas pode modelar toda a função executiva se a informação para si enviada de outras regiões do cérebro é precisa, uma vez que o cérebro actua como um todo na regulação de todas as suas funções. Por esta razão, os indivíduos com lesões difusas ou específicas em certas regiões cerebrais, apresentam dificuldades no desempenho nos testes relativos à avaliação da função executiva (Horton & Wedding, 2008), como por exemplo no Wisconsin Card Sorting Test (WCST) 1 (Marques-Teixeira, 2005). Para além dos danos a nível cognitivo, são ainda de esperar alterações ao nível de dimensões da personalidade. A depressão, culpa, ansiedade sobre o futuro, desamparo e desespero, são sintomas frequentemente encontrados em pessoas que sofreram trauma cerebral, em particular aqueles que apresentam traumas de ligeiros a médios. Isto acontece porque os indivíduos com danos mais severos, geralmente, não apresentam um nível de consciência que lhes permita ter
(^1) Este domínio vai ser mais profundamente explorado no ponto 3.
é necessário determinar se ocorreu um baixo esforço ou exagero dos sintomas, garantindo que os critérios de diagnóstico de Simulação foram assegurados. No entanto, a maioria dos testes de detecção de Simulação apenas nos dão uma probabilidade desse menor esforço ou exagero da sintomatologia ter ocorrido (Franzen & Iverson, 2006). Uma outra dimensão que dificulta a detecção da simulação neste contexto, é o facto de poderem existir sintomas psicogénicos que podem coexistir com autênticos défices neuropsicológicos em indivíduos em que efectivamente existe um inquestionável dano cerebral (Palmer, Brauer, Boone, Allman, & Castro, 1995, citado por Heubrock e Petermann, 1998). Assim, e uma vez que os simuladores tendem a descrever sintomas idênticos aos encontrados nas verdadeiras lesões cerebrais e a apresentarem pobres performances nos testes neuropsicológicos, os neuropsicólogos podem experienciar significativas dificuldades para distinguir as pessoas que estão a tentar manipular os resultados, das pessoas que verdadeiramente apresentam verdadeiros défices (Sbordone, Seyranian & Ruff, 2000), uma vez que, a questão da simulação não se foca apenas no facto de se a pessoa apresenta realmente danos ou apenas está a simular. As pessoas com verdadeiras lesões podem e fazem simulação (Bianchini, Greve, & Love, 2003; Bianchini, Etherton & Greve, 2004), sendo ainda importante referir que mesmo indivíduos de níveis sócio-culturais mais baixos conseguem retratar com êxito défices neuropsicológicos aquando da avaliação (Faust, Hart, & Guilmette, 1988). Outra das dificuldades referidas da avaliação neuropsicológica forense está relacionada com o facto de as pessoas que se encontram envolvidas em processos legais relacionados com lesões traumáticas cerebrais poderem ter um conhecimento considerável acerca dos sintomas provenientes de lesões cranianas, por experiência directa, por exposição a outros pacientes, ou por coaching deliberado ou inadvertido (Strauss et al., 2002). Na era da Internet, existe facilmente uma cópia da informação que pode ser utilizada por indivíduos que desejam imitar os tipos de danos neuro-comportamentais e neuro-cognitivos (incluindo défices nos testes neuro-cognitivos) verificados em pacientes. Posto isto, os simuladores não estão apenas a manipular ou a exagerar o grau de incapacidade funcional atribuído ao dano cerebral, como também os resultados reflectidos nos testes neuropsicológicos e noutras formas de avaliação (Bianchini, Greve, & Glinn, 2005). Por fim, outra dificuldade presente na avaliação neuropsicológica forense prende-se com o relato de sintomas simulados. Estes são uma preocupação importante na generalidade das avaliações psicológicas forenses, uma vez que o diagnóstico de perturbação psiquiátrica está altamente dependente do auto-relato dos sintomas (Berry & Schipper, 2007).
3. Métodos de detecção da Simulação É importante realçar que a exibição de um comportamento que eleve a nossa suspeição, não significa que a simulação esteja na verdade a ocorrer. Deste modo, o técnico precisa de outros dados que expliquem tal comportamento, como por exemplo se existem algumas explicações médicas que esclareçam tais discrepâncias, ou se existe uma determinada perturbação psiquiátrica ou existência de uma determinada variável de personalidade que possa interferir com o baixo esforço (Franzen & Iverson, 2006). Sendo a simulação um fenómeno presente na neuropsicologia forense, e sendo a resistência um obstáculo frequente com que o neuropsicólogo forense se depara, é assim necessário que o técnico desenvolva estratégias para ultrapassar estas dificuldades (Machado & Gonçalves, 2005). O uso consistente de medidas de simulação válidas e de confiança possibilitam uma classificação precisa na avaliação forense, e permitem aos peritos forenses afirmar com mais confiança os seus resultados clínicos (Vitacco et al., 2008). Rogers (1997, citado por Denney e Wynkoop, 2000) conclui que “a avaliação dos estilos de resposta continuam a ser componentes essenciais da avaliação clínica” e que “os psicólogos e outros técnicos da saúde mental devem empregar o mesmo grau de meticulosidade na avaliação da Simulação e defensividade, como o fazem no estabelecimento de qualquer diagnóstico ”(p. 396). Denney e Wynkoop (2000) afirmam ainda que, a falha na atribuição de Simulação na neuropsicologia forense pode reflectir uma inadequada e até incompetente avaliação. Neste sentido, desde há já muito tempo que os autores afirmam que a utilização de instrumentos de simulação são uma parte necessária da avaliação neuropsicológica, e que a validade dos testes neuropsicológicos usados reflectem a validade da avaliação em si (Meyers & Volbrecht, 2003). Para se detectar a simulação existem, no contexto neuropsicológico, duas amplas linhas de instrumentos (Spreen & Strauss, 1998):
instrumentos neuropsicológicos vastamente utilizados, pode tornar-se não só mais eficiente, como também um método mais válido na detecção da simulação. Assim, ao longo das últimas décadas, tem existido investigação, no sentido de extraír indicações de simulação através de diferentes instrumentos de avaliação neuropsicológica dirigidos para variadas funções cognitivas como a função executiva (e.g. Suhr & Boyer, 1999; Bernard, McGrath, & Houston, 1996; Greve, Bianchini, Mathias, Houston & Crouch, 2002) atenção selectiva e velocidade psicomotora (e.g. Egeland & Langfjaeran, 2007; O’Bryant, Hilsabeck, Fisher & McCaffrey, 2003; Ruffolo, Guilmette & Willis, 2000), memória (e.g. Slick, Iverson & Green, 2000; Martens & Donders, 2001;) e velocidade de processamento (e.g. Egeland & Langfjaeran, 2007; Osimani, Alon, Berger, & Abarbanel, 1997). Como já vimos, estes indicadores extraídos deste tipo de instrumentos são correspondentes a critérios do tipo B2 dos métodos de diagnóstico de Slick et al. (2005), possibilitando o diagnóstico de Prováveis Simuladores segundo os mesmos autores.
3.1. A avaliação das Funções Executivas e a detecção da sua simulação através do Wisconsin Card Sorting Test (WCST) O grande nível de capacidades cognitivas suportadas pelo lobo frontal e estruturas associadas (como por exemplo, o sistema límbico, e o lobo temporal anterior), podem ser consideradas como as Funções Executivas. Estas referem-se às capacidades que optimizam e integram a operação de um número de sistemas cognitivos (Baddeley, 1986), e envolvem a regulação da excitação e comportamento, capacidade de resposta às alterações das contingências, planeamento e sequenciação, aplicação de estratégias, e tomada de decisão (Damasio & Anderson, 2003). Para Lezak, Howieson & Loring (2004), o impacto funcional da incapacidade executiva é definida da seguinte forma: “Quando as funções executivas se encontram intactas, a pessoa pode sustentar consideráveis perdas cognitivas e continuar autónoma, independente. Quando as funções executivas estão afectadas, o indivíduo pode deixar de ter a capacidade de satisfazer os seus cuidados pessoais, ou realizar um trabalho útil ou remunerado de forma independente, assim como mostrar uma incapacidade de manter relações sociais normais, dependendo de quão preservadas estão as capacidades cognitivas” (p. 35). O conhecido caso de Phineas Gage, o supervisor de construção ferroviária, de 25 anos, que em 1848 sofreu um acidente quando uma explosão impeliu uma haste de aço que passou pela sua face esquerda até ao topo do crânio, é um exemplo usualmente referido quando nos focamos nas lesões do lobo frontal e dos défices ao nível da função executiva. Nesta altura, Harlow (1868, citado por Neylan, 1999,) experienciou o efeito comportamental dramático que se verificou : “os seus funcionários, que o consideravam o trabalhador mais eficiente e capaz
antes do acidente, referiram que existiram mudanças tão acentuadas que Gage não poderia mais ocupar o seu local de trabalho” (Harlow, 1868, citado por Neylan, 1999, p. 280). Damásio, Grabowski, Frank, Galaburda e Damásio (1994), usando o crânio de Gage e técnicas modernas de neuroimagem, reconstruíram as suas lesões, demonstrando nitidamente alterações do lobo frontal bilateralmente. As profundas incapacidades advindas de um lobo frontal afectado mostraram-se perfeitamente claras no relatório de Harlow, principalmente quando este referiu existirem alterações ao nível do julgamento, capacidade de planeamento, resolução de problemas, e outros aspectos relativos à tomada de decisão (Eslinger & Damasio, 1984). Portanto, um indivíduo que antes de um acidente estava apto a trabalhar numa profissão que requer um certo nível de capacidades cognitivas, mas que depois do acontecimento traumático, se encontra incapaz de voltar ao seu trabalho com o mesmo nível salarial, isto pode-lhe permitir recolher uma recompensa por essa incapacidade (Greve & Bianchini, 2007). Se o paciente ficar de todo incapacitado para realizar a sua actividade laboral, o ganho pode ainda ser maior. A mesma lógica aplica-se à questão dos cuidados pessoais, uma vez que os pacientes podem procurar recompensas como facto de terem perdido estas suas faculdades. Assim, a disfunção cerebral que produz défices ao nível executivo podem recompensar muito mais o indivíduo do que a patologia que afecta de forma discreta as funções cognitivas, uma vez que, os défices executivos têm um impacto funcional mais amplo e muito mais incapacitante (Greve & Bianchini, 2007). Uma vez que a disfunção executiva pode causar sérias incapacidades, a evidência neuropsicológica da disfunção executiva, pode ser consideravelmente valorizável no processo judicial uma vez que representa a incapacidade. Sendo assim, existe certamente uma substancial motivação a fabricar ou exagerar os défices nas medidas de função executiva (Greve & Bianchini, 2007). Como vimos, ao longo do tempo, têm existido vários estudos em que se tenta detectar a simulação através de provas psicométricas não especificamente destinadas para esse efeito. Entre os instrumentos frequentemente citados estão o Wisconsin Card Sorting Test (WCST) (Bernard, McGrath & Houston, 1996; Suhr & Boyer, 1999; Greve, Bianchini, Mathias, Houston & Crouch, 2002; Greve & Bianchini, 2002). As tarefas de card sorting têm sido usadas para estudar as funções cognitivas desde a década de 20 e 30, quando os investigadores usaram o chamado processo de abstracção. No caso do Wisconsin Card Sorting Test , entre os resultados normativos, estão as categorias completas, respostas perseverativas, erros perseverativos^2 , erros não-perseverativos, falhas
(^2) No contexto, perseveração refere-se a marcar continuamente a mesma dimensão mesmo que não esteja correcta.