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Responsabilidade civil do Estado pelas suas omissões, Teses (TCC) de Direito Administrativo

Esta pesquisa teve o intuito de trazer um estudo sobre a responsabilidade civil extracontratual do Estado pelas suas omissões, fazendo uma abordagem pela história da responsabilidade civil do Estado, os seus elementos de configuração e quais as teses adotadas pela doutrina e jurisprudência pátrias acerca da responsabilidade civil do Estado pela sua omissão, se subjetiva ou objetiva.

Tipologia: Teses (TCC)

2021

À venda por 14/01/2022

wellington-kague
wellington-kague 🇧🇷

4.3

(4)

5 documentos

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FACULDADE EDUCAMAIS
PÓS GRADUAÇÃO LATO SENSU EM ADVOCACIA PÚBLICA
RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO: A
RESPONSABILIDADE POR OMISSÃO SOB O VIÉS DA DOUTRINA
NACIONAL E DA JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS SUPERIORES
WELLINGTON MORIYUKI KAGUE
DRACENA SP
2021
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Baixe Responsabilidade civil do Estado pelas suas omissões e outras Teses (TCC) em PDF para Direito Administrativo, somente na Docsity!

FACULDADE EDUCAMAIS

PÓS GRADUAÇÃO LATO SENSU EM ADVOCACIA PÚBLICA

RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO: A

RESPONSABILIDADE POR OMISSÃO SOB O VIÉS DA DOUTRINA

NACIONAL E DA JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS SUPERIORES

WELLINGTON MORIYUKI KAGUE

DRACENA – SP

WELLINGTON MORIYUKI KAGUE

RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO: A

RESPONSABILIDADE POR OMISSÃO SOB O VIÉS DA DOUTRINA

NACIONAL E DA JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS SUPERIORES

Trabalho de Conclusão da Pós-Graduação lato sensu apresentado para aprovação no Curso de Pós- Graduação em Advocacia Pública realizado pela Faculdade EducaMais como pré-requisito para a obtenção do Título de Especialista em Advocacia Pública. Orientador:

DRACENA – SP

RESUMO

O presente trabalho tem como finalidade o estudo da responsabilidade civil do Estado pelos atos omissivos e dos entendimentos jurisprudenciais e doutrinários a ela referentes. Para a compreensão do tema de maneira completa abordou-se as noções gerais da responsabilidade civil privatista e a responsabilidade civil do Estado. Dentro das noções gerais, a responsabilidade civil se divide em negocial e extranegocial, a depender da origem do dano, se oriunda de um negócio jurídico ou não. Ademais, os elementos gerais da responsabilidade civil, de acordo com a doutrina majoritária, consistem em conduta, dano, nexo causal e culpa ou dolo. A responsabilidade civil possui três funções principais, quais sejam, a reparatória, a punitiva e a precaucional, sendo que todas elas estão presentes e dialogam entre si. Evoluindo o tema, passou-se a tratar da responsabilidade extracontratual do Estado. Foram desenvolvidas as fases da responsabilidade civil Estatal, falando- se em três fases principais: a fase da irresponsabilidade, a fase civilista ou subjetiva e a fase publicista. No Brasil nunca houve a fase da irresponsabilidade Estatal, vigorando a responsabilidade subjetiva até o advento da Constituição de 1946, quando então passou-se a adotar a de caráter objetivo pelo risco administrativo. Com a promulgação da atual Constituição de 1988, inovou-se ao ampliar o alcance da responsabilidade civil do Estado, eis que passou a se empregar o termo agentes públicos, expressão mais ampla que funcionários públicos. Por fim, foi abordado o tema da responsabilidade civil Estatal pelas suas omissões sob o aspecto doutrinário e jurisprudencial. Na doutrina, há aqueles que apoiam a responsabilidade subjetiva (fundada na culpa do serviço) e, por outro lado, aqueles que defendem a responsabilidade objetiva. O STJ tem jurisprudência firme no sentido da responsabilidade subjetiva do Estado por suas omissões. Já o STF tem precedentes mais antigos adotando a responsabilidade subjetiva, contudo, os julgados mais recentes adotam a responsabilidade objetiva do Estado pela omissão específica. No mais, foi abordada a possibilidade de o Estado ser responsabilizado pelas suas omissões legislativas, sendo também um tema com posições divergentes, ora pela irresponsabilidade, ora pela responsabilidade. O trabalho foi escrito com supedâneo em pesquisas doutrinarias e jurisprudenciais atualizadas, em especial livros e artigos, através do método dedutivo. Palavras-chave: Responsabilidade civil. Extranegocial. Dano. Nexo de causalidade. Omissão. Risco. Teoria Objetiva.

ABSTRACT

The present work is relevant to the study of the civil responsibility of the State for the omissive acts and of the jurisprudential and doctrinal understandings related to it. To fully understand the topic, we approached the general notions of privatist civil liability and the civil liability of the State. Within general notions, civil liability is divided into business and extra-business, depending on the source of the damage, whether it comes from a legal business or not. In addition, the general elements of civil liability, according to the majority doctrine, consist of conduct, damage, causal link and fault or deceit. Civil liability has three main functions, namely, reparatory, punitive and precautionary, all of which are present and dialogue with each other. As the theme evolved, the State's non-contractual responsibility started to be dealt with. They were developed as phases of State civil liability, speaking of three main phases: a phase of irresponsibility, a civilist phase and a publicist phase. In Brazil, there was never a phase of State irresponsibility, with subjective responsibility prevailing until the advent of the 1946 Constitution, when then the objective one started to be adopted due to administrative risk. With the promulgation of the current 1988 Constitution, it was innovated by expanding the scope of the State's civil liability, since the term public agents began to be used, a broader expression than public officials. Finally, the issue of State civil liability for its omissions under the doctrinal and jurisprudential aspect was addressed. In the doctrine, there are those who support subjective responsibility (founded on the guilt of the service) and, on the other hand, those who defend strict responsibility. The STJ has strong jurisprudence in the sense of the State's subjective responsibility for its omissions. The STF, on the other hand, has older precedents adopting subjective responsibility, however, the most recent judgments adopt the State's strict responsibility for the specific omission. In addition, the possibility of the State being held responsible for its legislative omissions was addressed, and it was also a topic with divergent positions, sometimes due to irresponsibility, sometimes due to responsibility. The work was written based on updated doctrinal and jurisprudential research, especially books and articles, through the deductive method. Keywords: Civil responsibility. Extra-Business. Damage. Causal link. Omission. Risk. Objective Theory.

INTRODUÇÃO

A princípio, é importante esclarecer que a pesquisa se utilizou da metodologia bibliográfica, haja vista terem sido consultadas obras, artigos científicos e pesquisas de jurisprudência, bem como o método de abordagem foi o dedutivo, buscando-se analisar o tema a partir de noções gerais da responsabilidade civil, para só então abordar a responsabilidade civil do Estado pelas suas omissões e suas particularidades. No início desta pesquisa, explicou-se as noções gerais acerca da responsabilidade civil, tendo-se abordado as espécies de responsabilidades de acordo com a origem do dano, se negocial ou extranegocial, eis que elas são regidas por um regime jurídico diverso. Foi também explanado os entendimentos doutrinários acerca dos elementos da responsabilidade civil, buscando-se trazer as suas divergências, alguns optando por incluir a culpa dentre eles, outros a retirando do rol de elementos. Ao final dessa primeira parte do trabalho, foram abordadas as funções da responsabilidade civil, tema relevante, mas que não é tão abordado nos livros jurídicos. Consoante abaixo mencionado, a doutrina reconhece as funções reparatória, punitiva e precaucional, que dialogam entre si e se conjugam funcionalmente. No segundo capítulo, explicou-se a responsabilidade civil extranegocial do Estado, em linhas gerais, começando-se pelas suas fases, que são classificadas pela doutrina através das fases da irresponsabilidade, a fase privatista ou civilista e a fase publicista, sendo esta última fase a que é reconhecida atualmente como vigente no Brasil. Posteriormente, foi demonstrado o desenvolvimento da responsabilidade civil Estatal no Brasil, sendo que desde 1946 é reconhecida a responsabilidade objetiva pelo risco administrativo, tendo a Constituição de 1988 trazido algumas inovações. Dentre essas inovações foi a ampliação do alcance da responsabilidade civil do Estado, eis que foi trocada a expressão funcionários públicos por agentes públicos, termo esse de maior abrangência.

Por derradeiro, chegou-se ao objeto desta pesquisa, explicando-se a responsabilidade civil do Estado pelas suas omissões, abordando o tema através da doutrina e da jurisprudência dos tribunais superiores. Restou ressaltado que a divergência é grande, tanto na doutrina, quanto na jurisprudência, eis que alguns entendem pela teoria subjetiva fundada na culpa anônima, enquanto outros adotam a teoria objetiva, ora fundada na tese da omissão específica, ora no próprio risco administrativo. No último tópico do capítulo final foi exposta a omissão legislativa e a sua possibilidade de acarretar a responsabilização civil Estatal, havendo uma tendência de se admiti-la, sem prejuízo de haver julgados a inadmitindo.

inadimplemento/descumprimento contratual/negocial) e extracontratual ou extranegocial (em regra, fundada na prática de atos ilícitos). Nesse sentido, elucidantes são as palavras de Tartuce (2017, p. 499 ): A responsabilidade civil surge em face do descumprimento obrigacional, pela desobediência de uma regra estabelecida em um contrato, ou por deixar determinada pessoa de observar um preceito normativo que regula a vida. Neste sentido, fala-se respectivamente, em responsabilidade civil contratual ou negocial e em responsabilidade civil extracontratual (...) Insta observar que a responsabilidade civil extracontratual também é amplamente conhecida na doutrina e jurisprudência nacionais como responsabilidade aquiliana. Conforme Chaves, Rosenvald e Braga Netto (2017, p. 85), tal nome deriva da chamada lex aquilia de damno , conjunto de regras de origem romana que vinculavam a responsabilidade civil à noção de ato ilícito e acarretavam a responsabilização apenas daquele sujeito que causasse danos pela prática de ilícitos culposos (culpa compreendida em seu sentido amplo, abarcando a culpa em sentido estrito e o dolo), de modo que a reponsabilidade aquiliana não se compatibiliza com a responsabilidade objetiva (configurada independentemente de culpa). Em razão dessa incompatibilidade da responsabilidade extracontratual aquiliana com a objetiva, referidos autores sustentam não mais ser a expressão responsabilidade aquiliana adequada aos dias atuais. Ademais, de acordo com a espécie de responsabilidade civil a se tratar, se extracontratual ou contratual, será determinado o regime jurídico de normas a serem aplicadas no direito interno, de modo que se houver o descumprimento de um contrato, a parte que o descumpriu será responsável pelos danos que daí advierem, em regra, aplicando-se as regras constantes dos artigos 389 a 420 do Código Civil de 2002 (CC/02); enquanto que, no caso da prática de atos ilícitos ou de abusos de direitos dos quais resultaram danos, aquele que os causou responderá por tais com base, em regra, nos preceitos constantes dos artigos 927 e seguintes do CC/02. Portanto, a responsabilidade civil geral é dual ou binária, a variar de acordo com a sua origem, de modo que, se oriunda do descumprimento negocial ela será contratual, enquanto que se derivar da prática de atos ilícitos ou de abuso de direito ela será extracontratual. Adiante, passa-se à análise dos elementos que integram, como regra, a responsabilidade civil.

1.2 ELEMENTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL

A responsabilidade civil, conforme já dito acima, acarreta a assunção da obrigação de reparar os danos causados a outrem, seja ela contratual ou extranegocial. Para a configuração da responsabilidade contratual basta o inadimplemento do contrato por uma das partes da relação jurídica obrigacional, desde que presentes os requisitos constantes do artigo 104 do CC/02 e, por não ser esse o objeto da presente pesquisa, não se aprofundará no seu estudo. Já no que tange à responsabilidade civil extracontratual, a doutrina civilista diverge quanto aos seus pressupostos de existência, havendo diversidade de requisitos. Nesse passo, há doutrina que sustente a necessidade de estarem presentes os elementos ação ou omissão, culpa ou dolo do agente, relação de causalidade e o dano para a configuração da responsabilidade extracontratual, tal como leciona Gonçalves (2016, p. 512- 513 , v.1). Já Pamplona Filho e Gagliano (2016, p. 522, v. 1) afirmam a imprescindibilidade da presença dos pressupostos ação humana (positiva ou negativa), dano (material ou moral), nexo de causalidade (entre o agente e o prejuízo) e a imputabilidade (requisito apenas da obrigação de indenizar), para a configuração da responsabilidade civil, não mais figurando como elemento indispensável a culpa em sentido amplo. Apesar da mencionada divergência doutrinária, conforme ensina Tartuce (2017, p. 519), prevalece na doutrina que os elementos da responsabilidade civil são quatro, quais sejam: conduta humana, culpa genérica ou lato sensu , nexo de causalidade e dano ou prejuízo. A conduta representa, nas palavras de Cavalieri Filho (2012, p. 25), o comportamento humano voluntário que se caracteriza por uma ação ou uma omissão que acarreta a produção de consequências relevantes para o direito. Veja-se que a regra é a ocorrência de condutas positivas, comissivas, ou seja, por meio de ações dos indivíduos humanos. Contudo, também podem ocorrer as condutas negativas ou omissivas, sendo que estas apenas geram o dever de indenizar se o sujeito omisso possuía o dever legal de agir e não o faz, ocasionando, assim,

responsabilidade civil, ou seja, todos os fatos relativos ao evento danoso implicam em responsabilidade. Essa teoria não é a adotada no ordenamento jurídico brasileiro e é criticada em razão do regresso infinito do nexo causal. No que tange à causalidade adequada, segundo esta teoria só é considerado como causa o fato antecedente e relevante, analisado em abstrato, para a causação do dano, fixando-se a indenização de acordo com os fatos que integram o contexto danoso. Consoante o escólio de Borges e Sá (2018, p. 692), essa tese é criticada pela doutrina em razão da elevada discricionariedade conferida ao órgão julgador que irá efetuar a análise em abstrato do nexo causal. Relativamente à última teoria, qual seja, a do dano direto e imediato ou da interrupção do nexo causal, ela se assemelha com a causalidade adequada em razão dos fatos antecedentes não se equivalerem, contudo, só é causa do evento danoso aquela que se vincular direta e imediatamente ao dano, de modo que, se ocorrer alguma das excludentes de ilicitude (caso fortuito, força maior, culpa exclusiva da vítima) o nexo de causalidade é interrompido e, por falta do elemento nexo, deixa de haver a responsabilidade. Essa é a teoria adotada pelo Código Civil de 2002 e a apontada pela doutrina predominante como a aceita no âmbito da responsabilidade civil extracontratual do Estado (Borges e Sá, 2018, p. 692). Portanto, a despeito da divergência doutrinária, conforme explicado, prevalece na doutrina que os elementos gerais da responsabilidade civil são a conduta humana, a culpa genérica ou lato sensu , o dano ou prejuízo e o nexo de causalidade, sendo que a teoria prevalecente tanto no âmbito privatista, quanto na seara pública acerca do nexo é a da causalidade direta e imediata, considerando-se como causas apenas as que se relacionam direta e imediatamente com o evento danoso. Passa-se agora ao estudo das funções da responsabilidade civil. 1.3 FUNÇÕES DA RESPONSABILIDADE CIVIL Um tema não muito abordado na doutrina nacional, apesar da sua relevância, é o das funções da responsabilidade civil, sendo, todavia, comumente explorada tão somente uma das suas funções, qual seja, a reparatória. Ocorre que essa é apenas uma das suas funções, havendo doutrina que sustente a existência das funções punitivas e precaucional também, além de outras ainda não mencionadas, em um rol aberto de funções, sendo que todas elas convivem

de forma conjugada e não isolada entre si (Chaves, Rosenvald e Braga Netto, 2017 , p. 62 ). A função mais conhecida e difundida, a reparatória, consiste na necessidade de se restabelecer o equilíbrio jurídico-econômico, entre a vítima e o agente, rompido pelo dano causado por este. Há então a responsabilização do agente de modo que este repare as lesões causadas, restabelecendo a relação jurídica ao status quo ante ¸ não havendo que se limitar o dever de indenizar, eis que isso imporia à vítima o dever de suportar o restante dos danos não reparados (Cavalieri Filho, 2012, p. 14-15). Todavia, apesar da relevância da função reparatória em restabelecer o equilíbrio anteriormente existente, a doutrina aponta críticas quanto à sua incapacidade de efetivamente restaurar as partes ao estado em que se encontravam anteriormente. Consoante lecionam Chaves, Rosenvald e Braga Netto (2017, p. 70), a mera indenização em pecúnia não elimina a perda produzida pela conduta ilícita, eis que os fatos danosos geram, em certos casos, situações de irreversibilidade, sendo que o ressarcimento apenas acarreta a transferência de riqueza monetária do ofensor ao ofendido. Os autores também apontam que esse ressarcimento compensa os prejuízos apenas no aspecto individual do lesado, não satisfazendo a reparação relativa à sociedade que, mesmo após o agente efetuar o ressarcimento ao ofendido, continua no prejuízo. Já a função punitiva consiste no desestímulo aos agentes, no sentido de que não pratiquem atos causadores de danos a terceiros. Tal se dá através da aplicação do dever de indenizar àquele que efetivamente causou o dano, o induzindo a tomar todas as devidas cautelas a fim de evitar novas condutas ensejadoras de prejuízos, servindo também de exemplo à coletividade em geral para que evite a prática de condutas danosas. Conforme sustentam Chaves, Rosenvald e Braga Netto (op. cit., p. 70-71), a decisão que condena o agente a ressarcir os danos ao ofendido inclui as funções dissuasiva e punitiva, eis que funciona como uma regra de prevenção geral de acidentes, servindo como um “ressarcimento exemplar” a incutir na coletividade a ideia de evitar a prática de condutas danosas. No que tange à função precaucional, esta foi inserida inicialmente no ordenamento pátrio através do direito ambiental por meio da sua previsão no artigo 15 da Declaração da ECO-92, simbolizando tal função a necessidade de se adotar medidas de cautela adequadas a fim de evitar prováveis danos graves e irreversíveis

2 RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO

ESTADO

Ultrapassado o estudo geral do tema em relevo, consignadas as diferenças entre a responsabilidade contratual e a extracontratual, bem como estudados os elementos gerais da responsabilidade civil geral, é relevante abordar o tema da responsabilidade civil extracontratual do Estado para se chegar, após, à responsabilidade pelas suas omissões, tema central desta pesquisa. Conforme se verá abaixo, o Estado inicialmente não respondia pelos seus atos que porventura causassem danos aos particulares, aplicando-se a fase da irresponsabilidade do Estado, passando, posteriormente, para a fase da responsabilidade subjetiva civilista e, por fim, pela fase publicista ou da responsabilidade objetiva. A responsabilidade civil extracontratual do Estado pode ser definida, segundo Bandeira de Mello (2015, p. 1021), como a: obrigação que lhe incumbe de reparar economicamente os danos lesivos à esfera juridicamente garantida de outrem e que lhe sejam imputáveis em decorrência de comportamentos unilaterais, lícitos ou ilícitos, comissivos ou omissivos, materiais ou jurídicos. Ademais, a responsabilidade do Estado na Constituição de 1988 está prevista, de um modo geral, no seu artigo 37, §6º, que estabelece a regra da responsabilidade civil objetiva do Estado, havendo algumas particularidades a serem esmiuçadas abaixo. 2.1 FASES DA RESPONSABILIDADE CIVIL ESTATAL A responsabilidade civil do Estado foi sendo desenvolvida ao longo do tempo, tendo seguido uma ordem de fases distintas, cada qual com suas características próprias. Conforme aponta a doutrina (Cunha Júnior, 2015, p. 355-357), há três fases da responsabilidade estatal, sendo elas a fase da irresponsabilidade, a civilista e a publicista. A primeira fase, ou seja, a da irresponsabilidade do Estado, vigorou principalmente durante a idade moderna em que vigorava o Estado absolutista, em que apenas os súditos respondiam pelos danos que causassem a terceiros, não

havendo qualquer possibilidade de impor alguma responsabilização ao Estado, ou seja, o rei nunca errava (“ the king can do no wrong ”). Tal fase era amparada pela teoria regaliana, que pregava justamente a irresponsabilidade do Estado pelos seus atos, eis que o rei e o imperador eram tidos como Deuses na terra ou como o próprio Estado personificado. Nas palavras do rei Luiz XIV da França (1638-1715), conhecido como Rei-Sol, “o Estado sou eu”. Essa tese da irresponsabilidade logo foi superada, passando-se para a fase da responsabilidade civilista do Estado. Em seu começo, o Estado respondia somente nos casos previstos em lei, tendo como primeiro caso de reponsabilidade civil do Estado o caso “Blanco” na França, segundo o qual um vagão de ferroviária havia atropelado uma garota. Posteriormente, ainda nessa fase, o Estado seria responsabilizado se estivessem presentes os elementos conduta Estatal, dano, nexo causal e culpa em sentido amplo (dolo ou culpa), ainda que não houvesse previsão legal dos casos de sua incidência. Portanto, exigia-se o dolo ou a culpa para configurar a responsabilidade do Estado, de modo semelhante à responsabilidade civil dos particulares em geral que era subjetiva. No Brasil, essa tese possuiu guarida no antigo Código Civil de 1916. Avançando, a terceira fase, também conhecida como publicista, era assim chamada em razão do regime de direito público aplicável. Percebeu-se que o ônus das vítimas de provar a culpa ou o dolo do agente e identificá-lo era excessivamente difícil e desproporcional, motivo pelo qual essa fase foi iniciada adotando-se a teoria da culpa anônima ou faute du service para embasá-la. Nos termos dessa teoria da culpa do serviço, era prescindível identificar o agente público causador do dano e provar a sua culpa ou dolo, bastando para tanto comprovar a falha ou culpa do serviço, ou seja, que ele foi prestado com atraso, que foi prestado de modo ineficiente ou que não foi prestado, quando deveria. Destarte, por ser necessária a prova da culpa anônima ou do serviço, essa responsabilidade é subjetiva. Ademais, ainda na fase publicista, da teoria da culpa anônima evoluiu-se para a teoria do risco, a fim de fundamentar a possibilidade de aplicação da responsabilidade objetiva do Estado, ou seja, independente da culpa ou do dolo, dispensando-se o elemento subjetivo, bastando a comprovação do nexo de causalidade entre a conduta comissiva (e omissiva para parte da doutrina) do Estado

reconhecem a sua diferença, mas afirmam inexistir aplicação prática do risco integral pela sua falta de razoabilidade e extremismo (Meirelles, 2015, p. 782); e, por fim, há também aqueles que afirmam ser o risco integral aplicado em algumas hipóteses específicas e excepcionais, segundo a doutrina majoritária, consoante ensina Matheus Carvalho (2019, p. 352), tais como no caso de dano nuclear, danos ambientais, seguro obrigatório DPVAT e os crimes ocorridos a bordo de aeronaves brasileiras decorrentes de ataques terroristas. Além desses riscos, parte da doutrina alega o desenvolvimento da teoria do risco social na atualidade. Por meio dessa tese, consoante ensina José dos Santos Carvalho Filho (2015, p. 575), a vítima se torna o centro da responsabilidade civil e não mais o causador do dano, socializando-se os riscos, de modo que toda a coletividade (representada pelo Estado) por eles responda. Contudo, o autor explica que tal teoria consiste em um mero aspecto mais específico da teoria do risco integral, de modo que o Estado seria responsável mesmo se os danos não decorrerem direta e imediatamente da conduta estatal. Verifica-se, portanto, que a responsabilidade estatal foi se moldando e evoluindo ao longo da história, passando-se pelas fases da irresponsabilidade, da responsabilidade civilista com culpa e pela responsabilidade publicista, esta fundamentada inicialmente na teoria da culpa do serviço, avançando, posteriormente, para as teorias do risco integral e administrativo. 2.2 DESENVOLVIMENTO DA RESPONSABILIDADE ESTATAL NO BRASIL A responsabilidade do Estado no Brasil passou por algumas fases, mas nunca se chegou a ter plenamente a fase da irresponsabilidade do Estado, conforme se demonstrará a seguir, com supedâneo nas lições de Borges e Sá (2018, p. 703- 706 ). Com efeito, a Constituição do Império de 1824 trouxe a irresponsabilidade do Imperador (atos de império) em seu artigo 99, mas o Estado era responsável pelos atos de gestão dos seus agentes públicos, nos termos do artigo 179, inciso XXIX e da sua regulamentação infraconstitucional, de modo que desde o nascimento do Estado Brasileiro nunca se adotou a tese da irresponsabilidade do Estado. Já na Constituição Republicana de 1891, não houve muitas alterações na matéria, apenas se mantendo a previsão infraconstitucional de responsabilidade solidária entre os funcionários públicos e o Estado, tendo sido previsto a possibilidade

de ação regressiva por parte do Estado contra o funcionário público que houvesse atuado com culpa em sentido amplo. Com o advento do Código Civil de 1916, passou a ser prevista a responsabilidade subjetiva do Estado Brasileiro, conforme o artigo 15 do Códex , de modo que, conforme já acima explanado, o Estado responderia pelos atos de seus agentes se demonstrada a culpa ou o dolo, nos mesmos moldes da responsabilidade civil extranegocial dos particulares. Adiante, as Constituições de 1934 e 1937 previram a responsabilidade subjetiva solidária entre o Estado e os seus funcionários públicos, também dependendo da comprovação do dolo ou da culpa dos funcionários. A Constituição de 1946, pós Estado Novo, em seu artigo 194, finalmente inaugurou a responsabilidade objetiva do Estado, superando-se a fase civilista, dispensando-se o dolo ou a culpa do funcionário público, inaugurando a fase publicista. Já na Constituição de 1967, não houve qualquer inovação, mantendo-se a responsabilidade civil objetiva pelo risco administrativo. Com o advento da Constituição Republicana de 1988, manteve-se a previsão da responsabilidade civil objetiva do Estado pelo risco administrativo, mas se inovou ao ampliar o alcance da regra, trocando o termo “funcionário público” por “agente público”, expressão muito mais ampla, a abarcar também os agentes colaboradores do Poder Púbico. Ademais, conforme o artigo 37, §6º da CR/88, respondem objetivamente não só as pessoas jurídicas de direito público, mas também as pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público, mantendo-se a previsão de ação regressiva contra o agente público causador do dano que tenha atuado com dolo ou culpa. Na seara infraconstitucional, previu o Código Civil de 2002, em seu artigo 43, que as pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis pelos danos causados pelos seus agentes, quando tenham agido nessa qualidade. Nada obstante, o Código Civilista deixou de mencionar as pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos, em aparente conflito de normas. Ora, se a própria Constituição previu a responsabilidade objetiva dos particulares prestadores de serviços públicos, aplica-se a norma superior ao caso (a Constituição), excluindo-se a possível interpretação da Lei Civil de que somente as pessoas jurídicas