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Resenha do livro:, Notas de aula de Teatro

6 João Roberto Faria. ... entre 1863 e 1865 em dois atos com seis personagens. ... nossas mãos agitando-se no ar, quando éramos habitantes da terra, ...

Tipologia: Notas de aula

2022

Compartilhado em 07/11/2022

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Universidade Federal Fluminense
Centro de Estudos Gerais
Instituto de Letras
Coordenação de Pós-Graduação
ADRIANE CAMARA DE OLIVEIRA
O teatro machadiano:
Dom Casmurro e o texto teatral
Orientador: Professor Doutor JOSÉ LUÍS JOBIM
Niterói
2012
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Universidade Federal Fluminense

Centro de Estudos Gerais

Instituto de Letras

Coordenação de Pós-Graduação

ADRIANE CAMARA DE OLIVEIRA

O teatro machadiano:

Dom Casmurro e o texto teatral

Orientador: Professor Doutor JOSÉ LUÍS JOBIM

Niterói

ADRIANE CAMARA DE OLIVEIRA

O teatro machadiano:

Dom Casmurro e o texto teatral

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________________________________

Professor Doutor José Luís Jobim – Orientador UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

______________________________________________________________________

Professora Doutora Maria Elizabeth Chaves de Mello UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

______________________________________________________________________

Professor Doutor Roberto Acízelo Quelha de Souza UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

______________________________________________________________________

Professor Doutor Marcus Vinicius Nogueira Soares UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

______________________________________________________________________

Professor Doutor Flávio Carneiro UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Niterói 2012

RESUMO

Nesta Tese de Doutorado pretendemos desenvolver uma leitura do teatro machadiano que estimulará a interpretação de Dom Casmurro em dois níveis, a fim de responder à pergunta que estimula nossa pesquisa: em que medida a estrutura do texto de Dom Casmurro se aproveita de elementos propriamente teatrais , isto é, dramáticos? Esclareceremos que essa pergunta somente pode ser enunciada a partir de uma hipótese anterior: a presença, na composição de Dom Casmurro , da centralidade no emprego de recursos propriamente teatrais. Não apenas o narrador frequenta o teatro com assiduidade, e nele vive experiências marcantes, como também é possível identificar um vocabulário propriamente teatral ao longo do texto. Ou seja, o teatro é tanto ambiente da ação romanesca, quanto metáfora definidora dos relacionamentos entre os personagens, além de definir sua compreensão da vida. A identificação do elemento teatral como estruturador do texto de Dom Casmurro representa a contribuição que pretendemos oferecer aos estudos machadianos.

Palavras-chave: Teatro – Recepção de Dom Casmurro – Estudos machadianos.

ABSTRACT

In this PhD Thesis we aim at developing a reading of Machado de Assis’s theater in order to propose an interpretation of Dom Casmurro in two levels, in order to answer the question, which has prompted our research: to what extent the structure of the Dom Casmurro takes advantage of elements properly theatrical, that is, dramatic? We clarify that this question can only be formulated on the basis of a previous hypothesis: the central presence, in the composition of Dom Casmurro , often resorts to theatrical devices. Not only the narrator goes quite often to the theatre, and lives there relevant experiences, but also it is possible to identify a vocabulary properly theatrical throughout the text. That is, the theatre is both ambiance of the narrative and metaphor, which defines the relationship between characters, and theatre also determine Bento Santiago’s worldview. The identification of the theatrical element as structure of the text of Dom Casmurro represents the contribution we aim at offering to the Machadian studies.

Key Words: Theatre – Reception of Dom Casmurro

  • Machadian Studies.

Introdução

A cena da prosa

Roteiro de leitura

Nesta Tese de Doutorado pretendemos desenvolver uma leitura do teatro de Machado de Assis, a fim de identificar os temas centrais de sua obra dramática, assim como de seus procedimentos recorrentes. Para tanto, analisaremos o conjunto de suas peças, estudando todos os seus textos dramáticos, além de avaliar sua recepção. Com base nessa leitura completa do teatro de Machado de Assis, proporemos uma leitura de Dom Casmurro em dois níveis, a fim de responder à pergunta que também estimula nossa pesquisa: em que medida a estrutura do texto de Dom Casmurro se aproveita de elementos propriamente teatrais , isto é, dramáticos?^1 Esclarecemos que essa pergunta somente pode ser enunciada a partir de uma dupla hipótese anterior: de um lado, a relevância do teatro machadiano, compreendido como laboratório de formas e temas, e, de outro lado, a presença, na composição de Dom Casmurro , da centralidade no emprego de recursos propriamente teatrais. Nesse sentido, destacamos desde já a pesquisa que apresentaremos no último capítulo desta Tese, com base no levantamento do campo semântico associado ao universo teatral no romance Dom Casmurro. Não apenas o narrador frequenta o teatro com assiduidade, e nele vive experiências marcantes, como também é possível identificar um vocabulário propriamente teatral ao longo do texto. Ou seja, o teatro é tanto ambiente da ação romanesca, quanto metáfora definidora dos relacionamentos entre os personagens, além de definir sua compreensão da vida. E ainda mais: a estrutura do texto dramático também se revela importante na escrita das memórias do narrador casmurro. Por isso, tanto a análise do conjunto do teatro machadiano, quanto a identificação do elemento teatral como estruturador do texto de Dom Casmurro representam as duas contribuições que pretendemos oferecer aos estudos machadianos. De fato, a identificação desses dos elementos representam o eixo deste trabalho. Trataremos desse aspecto com vagar no último capítulo, mas podemos, à guisa de ilustração, destacar de imediato alguns elementos, com o objetivo de sustentar nosso projeto, além de fornecer uma orientação imediata para o avaliador do nosso trabalho. Com base nesse trabalho de levantamento de campo semântico, pretendemos reler capítulos-chave de Dom Casmurro , e mesmo passagens específicas, à luz dessa

(^1) No capítulo I, explicitaremos o conceito de dramático empregado nesta Tese.

encenação de um conjunto de peças shakespearianas, realizada pela companhia do célebre ator italiano Ernesto Rossi, na década de 1870, mais precisamente em setembro e outubro de 1871, teria sido fundamental para a concepção da literatura de Machado de Assis: “O que parece importante assinalar é que Shakespeare no palco foi uma revelação para Machado”.^6 Em relação ao tema específico desta Tese – a importância do teatro na obra machadiana, assim como a presença de elementos propriamente teatrais na elaboração de Dom Casmurro – o pesquisador propõe uma possibilidade de grande interesse para nosso raciocínio:

Por fim, não custa arriscar uma hipótese: o Otelo que Bentinho vê no teatro, pelos olhos de Machado, é o de Ernesto Rossi. O personagem de Dom Casmurro não menciona o nome do ator. Mas a informação, no capítulo CXXXI, de que ‘começava o ano de 1872’, nos dá uma pista extraordinária.^7

Ainda em relação à importância do teatro na vida e na obra do autor de A mão e a luva , José Luís Jobim estudou outra faceta. Em ensaio relevante para o tema desta Tese, o autor analisou os pareceres feitos por Machado para o Conservatório Dramático Teatral. Aliás, a opinião de Machado é bem conhecida e, nesse contexto, não há como não recordá-la:

A literatura dramática tem, como todo o povo constituído, um corpo policial, que lhe serve de censura e pena: é o conservatório. Dois são, ou devem ser, os fins desta instituição: o moral e o intelectual. Preenche o primeiro na correção das feições menos decentes das concepções dramáticas; atinge ao segundo analisando e decidindo sobre o mérito literário – dessas mesmas concepções.^8

A conclusão de José Luís Jobim alimenta nosso estudo, pois acreditamos que, em relação à forma teatral, é possível dizer o mesmo no tocante aos pareceres escritos pelo autor de Lição de Botânica :

(...) embora seja um aspecto muito pouco estudado da carreira de Machado de Assis, sua atuação no Conservatório Dramático Brasileiro

(^6) João Roberto Faria. “Machado de Assis e o Teatro de seu Tempo”. Joaquim Maria Machado de Assis. Do Teatro. Textos críticos e escritos diversos. João Roberto Faria (org.). São Paulo: Editora Perspectiva, 2008, p. 86. 7 8 Idem , p. 89. Machado de Assis. “O Conservatório Dramático”. Machado de Assis. Obra Completa. III. Afrânio Coutinho (org.). Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1986, p. 794. Texto originalmente publicado em O Espelho , em 25 de dezembro de 1859.

certamente merece maior atenção por parte dos pesquisadores de nossa literatura.^9

Por fim, e voltamos a insistir que essa não é uma relação completa de textos críticos dedicados ao teatro machadiano ou à possível identificação de elementos teatrais em sua obra, devemos mencionar o estudo de Cecília Loyola. A pesquisadora buscou tanto compreender o teatro machadiano sob uma luz renovada, quanto assinalar o caráter experimental de suas experiências dramáticas. Algumas dessas experiências teriam repercutido na prosa de ficção de Machado – retornaremos no segundo capítulo ao estudo de Loyola Brandão no estudo da recepção de seu teatro.^10 Por exemplo, Barreto Filho, em sua biografia de Machado de Assis, descortinou um horizonte que desejamos ampliar. Em suas palavras:

O fracasso de Machado como escritor teatral é importante porque determinou a forma de suas produções da maturidade. (...) Do teatro também adveio a sua simplificação do cenário e a concentração do interesse no jogo dos caracteres e na análise das paixões, bem como um certo modo de contar a vida em cenas sucessivas, bastando-se a si mesmas.^11

Podemos, então, ver o teatro como sempre se compreenderam os contos,^12 vale dizer, como um laboratório de formas e temas, cuja concentração de recursos e procedimentos propicia a escrita das obras-primas da maturidade. De nossa parte, por isso mesmo, pretendemos compreender a centralidade do recurso ao teatro não apenas na estrutura do enredo de Dom Casmurro , mas também na forma de criar o relacionamento especial com o leitor, uma das marcas mais salientes da literatura machadiana. Repare-se que, nessa breve apresentação de nossa hipótese, nem sequer mencionamos o impressionante capítulo IX, “A ópera”, e a filosofia de vida daí derivada, que discutiremos no último capítulo.

(^9) José Luís Jobim. “Machado de Assis, membro do Conservatório Dramático”. José Luís Jobim (org.). A Biblioteca de Machado de Assis. Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Letras / Topbooks, 2001, p. 393. 10 11 Cecília Loyola.^ Machado de Assis e o teatro das convenções. Rio de Janeiro: UAPÊ, 1997. Barreto Filho. Introdução a Machado de Assis. Rio de Janeiro: Livraria Agir, 1947, p. 55 &

  1. 12 João Cezar de Castro Rocha. “Rosebud e o Santo Graal: uma hipótese para a leitura dos contos de Machado de Assis.” Teresa , São Paulo, v. 6/7, 2006, p. 164-184.

Dom Casmurro , relido sob este novo ângulo, é uma nova obra que desvela em suas páginas não só o romancista como também o dramaturgo , não só o épico, como também o dramático.^13

Revelação dupla: do destaque do teatro em Dom Casmurro , por certo, mas também, e esse é o ponto que defendemos, da importância do texto teatral na elaboração da literatura de Machado de Assis.

(^13) Maria Augusta H. W Ribeiro & Jacó Guinsburg. Jacó Guinsburg. “A consciência do espetáculo no espetáculo da consciência”. Diálogos sobre o teatro. Armando Sérgio da Silva (org.). São Paulo: EDUSP, 1992, p. 214, grifos nossos.

Capítulo I

O teatro de Machado de Assis:

formas e temas

A palavra drama se emprega: 1º) para designar o gênero dramático em geral; 2º) como sinônimo de peça teatral; 3º) como uma forma dramática específica, que resulta do hibridismo da tragédia com a comédia. Com essa terceira acepção, surge o drama, na primeira metade do século XVIII, como criação do dramaturgo francês Nivelle de La Chaussée (...).^15

Portanto, a nossa hipótese se baseia no estudo das peças machadianas sob um novo olhar, valorizando a recorrência de um mesmo tema ( embate entre razão e emoção ) e a estrutura dramática que o redimensiona. Algumas questões serão colocadas, por exemplo, de que forma e qual foi a motivação dos desfechos serem apresentados de modos tão diversos? Em virtude dessa característica, faz-se necessária uma breve pesquisa sobre a recorrência de palavras, citações e referências que fornecerão o material do terceiro capítulo desta tese, a fim de complementar um dos itens da primeira parte do trabalho, dedicada tanto à estrutura desses textos, quanto ao levantamento do campo semântico associado ao teatro. Ressaltamos que, do ponto de vista da obra machadiana como um todo, cabe sim uma unidade, que neste capítulo será discutida, sobretudo, a partir do teatro, pois o aprofundamento completo dessa questão exigiria o concurso sistemático a outros gêneros literários, que consagraram o autor de Dom Casmurro. A profundidade com que se pode trabalhar esse mesmo tema em outros gêneros talvez explique melhor o sucesso no romance e nas “memórias”.^16 A obstinação com a qual Machado trabalhou vários temas, incluindo o embate entre razão e emoção, fez com que ele encontrasse uma complexidade maior, que talvez só pudesse ser mais bem explorada num amplo horizonte de outros gêneros literários. Nas palavras sempre citadas de Silviano Santiago:

Já é tempo de se começar a compreender a obra de Machado como um todo coerentemente organizado, percebendo que certas estruturas primárias e primeiras se desarticulam e rearticulam sob formas de estruturas diferentes, mais complexas e mais sofisticadas, à medida que seus textos se sucedem cronologicamente.^17

(^15) Angélica Soares. Gêneros literários. São Paulo: Ática, 2002, p.63. (^16) Ver José Luís Jobim. “Foco narrativo y memorias en la novela machadiana de la madurez”. Revolución y Cultura 17 , v. 6, 2008, p. 12-19. Silviano Santiago. “Retórica da verossimilhança”. Uma literatura nos trópicos : ensaios sobre dependência cultural. Rio de Janeiro: Rocco, 2000, p. 27.

Contudo, para efeito deste capítulo, limitaremos nossa perspectiva especialmente ao teatro de Machado de Assis.

Esquema do teatro machadiano

A fim de organizar o material relativo ao teatro machadiano, decidimos preparar as planilhas com as quais concluímos este capítulo. Desse modo, poderemos controlar com maior segurança os diversos caminhos trilhados por Machado no universo teatral. Identificaremos, então: 1) as peças escritas por Machado; 2) as peças por ele traduzidas;

  1. algumas das peças por ele criticadas. E, sempre que possível, indicaremos o ano da escrita, tradução ou crítica. Em alguns casos, indicaremos o ano da encenação. Porém, desde já ressalvamos que nem todas as peças machadianas foram encenadas. Antes da apresentação das planilhas, é importante destacar a presença do teatro e, sobretudo, do texto teatral , atravessando toda a produção machadiana. Empregamos o conceito de teatral na acepção consagrada pelos pesquisadores Carlinda Nunez e Victor Hugo Pereira: “ Teatral remete à apreciação mais geral, abrangendo todo tipo de criação textual para teatro (...)”.^18 Em outras palavras, muito mais do que um mero “acidente”, pretendemos pensar a ligação de Machado com o teatro de uma forma mais sistemática:

O teatro de Machado de Assis foi escrito e publicado ao longo de toda a carreira do escritor. Algumas de suas primeiras páginas aconteceram de fato dedicadas ao palco, como é o caso de Hoje avental, amanhã luva , de 1860. Ao final, deixou, como testemunha de uma obra, a peça Lição de Botânica , de 1906. (...) Não deveríamos nos surpreender, se acaso encontrássemos ali, naquelas páginas de teatro quase esquecidas, certas esferas fundamentais vinculadas ao Romance e ao Conto.^19

Dois anos, portanto, antes do falecimento do escritor e da publicação de seu último romance, Memorial de Aires , Machado continuava escrevendo para o teatro. E, nas palavras de Cecília Loyola, descobre-se uma dimensão nova no teatro machadiano: assim como os contos, quem sabe a escrita teatral também não tenha sido um

(^18) Carlinda Fariale Pate Nuñez & Victor Hugo Adler Pereira. “O teatro e o gênero dramático”. José Luís Jobim (org.). 19 Introdução aos termos literários. Rio de Janeiro: EdUERJ, 1999, p. 72. Cecília Loyola. Machado de Assis e o teatro das convenções. Rio de Janeiro: UAPÊ, 1997, p.16. No segundo capítulo, voltaremos a discutir o trabalho de Cecília Loyola.

No tocante ao período imediatamente anterior, “tudo indica que Machado acompanhou de perto a vida teatral no Rio de Janeiro, a partir do segundo semestre de 1856, e que isso foi decisivo em sua formação”.^23 Portanto, as planilhas que apresentamos no final deste capítulo explicitam e, por assim dizer, “quantificam” o interesse machadiano pelo teatro; interesse que justifica o propósito desta tese, na busca de elementos propriamente teatrais na composição de Dom Casmurro.

Conflito de caracteres

Entre a primeira peça machadiana, Hoje avental, amanhã luva , e a última, Lição de Botânica , se passaram 45 anos, num período compreendido de 1860 a 1905. O autor mostra-se preocupado com a sociedade e reflete sobre ela através do teatro; seguindo o caminho de Joaquim Manuel de Macedo e de José de Alencar, entre outros. Trata-se, em alguma medida, de opção empregada por diversos autores no século XIX. Aliás, em 1872, em seu primeiro romance, Ressurreição , Machado reconheceu a importância do teatro em sua formação. Escutemos suas palavras:

Não sei o que deva pensar deste livro; ignoro sobretudo o que pensará dele o leitor. A benevolência com que foi recebido um volume de contos e novelas, que há dous anos publiquei, me animou a escrevê-lo. É um ensaio. Vai despretensiosamente às mãos da crítica e do público, que o tratarão com a justiça que merecer. (...) Minha ideia ao escrever este livro foi pôr em ação aquele pensamento de Shakespeare: Our doubts are traitors, And make us lose the good we oft might win, By fearing to attempt.

(^23) João Roberto Faria (org.). “Machado de Assis e o teatro de seu tempo”. Machado de Assis. Do teatro. Textos críticos e escritos diversos. São Paulo: Perspectiva, 2008, p. 30.

Não quis fazer romance de costumes; tentei o esboço de uma situação e o contraste de dous caracteres; com esses simples elementos busquei o interesse do livro.^24

O modelo inicial do romance machadiano, portanto, elabora o conflito dramático, assimilando, pelo menos em alguma medida, a ideia dos personagens como caracteres em contraste, em conflito. É como se Machado pensasse nos indivíduos como seres cuja característica básica seria a predominância dos conflitos de toda ordem: religiosos, filosóficos, existenciais, humanos, políticos. Assim, Machado, de maneira perspicaz, trabalha esses temas entrincheirados em pequenos quadros compostos por suas peças. Tais conflitos são vividos internamente seja pela própria natureza, pessoal e intransferível; e dificilmente extravasados em pequenos círculos sociais. João Roberto Faria também destacou o paralelo que nos interessa: “(...) podemos lembrar que já em 1872 ele publica seu primeiro romance, Ressurreição , para ‘pôr em ação’ o pensamento de Shakespeare em Medida por Medida ”.^25 Em outras palavras, parece possível, e esperamos fecundo, associar o teatro e o romance machadianos. Vem daí, talvez, a opção inicial do autor pela escola teatral realista, contrapondo-se à romântica, afinal a última com seus excessos não conseguiria passar para o público a tensão intrínseca do indivíduo que vive tais conflitos. Como veremos, esse é um ponto destacado pelo mais importante pesquisador do teatro brasileiro oitocentista, João Roberto Faria e que voltaremos a discutir no próximo capítulo. Então, vejamos os temas ou conflitos humanos trabalhados pelo autor na quase totalidade de suas peças através de breves resumos e estudos de todo seu corpus dramático.

Hoje avental, amanhã luva

A peça Hoje avental, amanhã luva foi publicada no jornal A Marmota em 20, 23 e 27 de março de 1860. Machado contava apenas 20 anos e nesse período demonstrava um grande interesse pelo teatro, talvez impressionado pela popularidade que o gênero assegurava a seus praticantes.

(^24) Machado de Assis. Ressurreição. Afrânio Coutinho (org.). Obras completas. I. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1978, p. 116. 25 João Roberto Faria. Op. cit ., p. 86.