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Raciocinio Clínico e Prática Centrada na Pessoa no Contexto da Fisioterapia, Notas de estudo de Fisioterapia

Os processos de raciocínio utilizados na prática clínica de fisioterapia, particularmente o raciocínio clínico dedutivo e indutivo. Além disso, discute o conceito de prática centrada na pessoa (pcp) e sua importância na área da fisioterapia músculo-esquelética. O texto também aborda a importância de respeitar a autonomia do utente e a tomada de decisão colaborativa na pcp.

O que você vai aprender

  • O que é a Prática Centrada na Pessoa (PCP) e por que é importante na fisioterapia?
  • Qual é a importância da autonomia do utente na Prática Centrada na Pessoa?
  • Que conceitos de raciocínio são utilizados na prática clínica de fisioterapia?
  • Como os processos de raciocínio clínico afetam a tomada de decisão em fisioterapia?
  • Como os modelos de raciocínio clínico se diferenciam entre si?

Tipologia: Notas de estudo

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Wanderlei
Wanderlei 🇧🇷

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RACIOCÍNIO CLÍNICO E PRÁTICA CENTRADA NA
PESSOA EM FISIOTERAPIA MÚSCULO-ESQUELÉTICA
Lara Campos
Abril 2021
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RACIOCÍNIO CLÍNICO E PRÁTICA CENTRADA NA

PESSOA EM FISIOTERAPIA MÚSCULO-ESQUELÉTICA

Lara Campos

Abril 2021

O presente trabalho faz parte do processo de candidatura para atribuição do Título de Especialista, de acordo com o Decreto-Lei nº 206/2009 de 31 de agosto publicado em Diário da República, 1ª Série – N.º

1. RACIOCÍNIO CLÍNICO

O conceito de raciocínio clínico refere-se ao processo de pensamento e tomada de decisão que é utilizado na prática clínica 3 Pode ser definido como o processo pelo qual o fisioterapeuta, interagindo com o utente e/ou outros significativos (familiares, cuidadores, outros profissionais de saúde da equipa) estrutura o significado, objetivos e estratégias de gestão da saúde, baseando- se nos dados clínicos recolhidos, escolhas do utente e julgamento e conhecimento do profissional^4. Existem diferentes tipos de raciocínio clínico. Nas áreas médicas, é habitual assumir um raciocínio clínico direcionado para o diagnóstico. Neste tipo de processo mental, os profissionais procuram informação inicial acerca do problema do utente e estabelecem, a partir dessa informação, hipóteses diagnósticas. Este tipo de raciocínio clínico é designado como raciocínio hipotético-dedutivo. O processo de avaliação é assim orientado para a testagem de hipóteses, ou seja, desencadeia-se consoante a informação que vai sendo prestada pelo utente, criando novas e concorrentes hipóteses, que vão sendo testadas e clarificadas através da recolha de dados e reavaliadas ao longo da gestão do tratamento3, Este tipo de processo designa-se Backward Reasoning. Neste modelo, a verdade ou realidade (conhecimento) são conceitos objetivos e mensuráveis, e é utilizada a observação e experimentação para produzir um resultado que pode, a partir daí, ser generalizado. Na prática clínica em fisioterapia, o raciocínio hipotético-dedutivo visa, dentro das limitações dos padrões disponíveis, validar informações ou dados adquiridos através do utente por meio de procedimentos fiáveis de mensuração^3.

Outros modelos de raciocínio clínico focam-se menos nos processos e mais na organização e acessibilidade ao conhecimento pré-adquirido pelo profissional. Um exemplo deste tipo de modelos de raciocínio é aquele que se baseia em “padrões de reconhecimento” - os profissionais reconhecem características comuns de um determinado problema quase instantaneamente, movendo-se de um conjunto de observações específicas para um diagnóstico de generalização, num processo designado por Forward Reasoning.

Estes dois tipos de raciocínio diagnóstico são utilizados na prática clínica, sendo que os padrões de reconhecimento são mais rápidos e eficientes e são habitualmente usados por profissionais mais experientes; e o raciocínio hipotético-dedutivo é mais utilizado por profissionais menos experientes ou por aqueles que, apesar de experientes, se veem confrontados com um problema de apresentação mais complexa^3.

Apesar do reconhecimento da importância do raciocínio diagnóstico nas áreas da saúde, nas últimas duas décadas a investigação começou a derivar do raciocínio clínico de base médica para abordagens mais cognitivas, que refletissem a noção de que os profissionais de saúde devem considerar a compreensão da pessoa para além do seu problema de saúde^5. Em contraste com a perspetiva biomédica, que habitualmente estava relacionada com paradigmas científicos ou experimentais, começou a entender-se que uma noção de causa-efeito nem sempre é verdadeira, reconhecendo-se que uma “causa” aparentemente semelhante pode ter “efeitos” diferentes em pessoas diferentes, ou seja, é dependente do contexto em que é produzida, ou socialmente construída, levando à possibilidade de existirem múltiplas realidades ou perspetivas^5. Este tipo de raciocínio tem por base uma perspetiva biopsicossocial, em que o processo de compreensão da incapacidade e seus efeitos na qualidade de vida de uma pessoa, gera (em vez de testa) hipóteses a respeito de constructos como motivações, crenças e atitudes, para chegar a uma validação consensual dessas hipóteses com a pessoa^5. O tipo de raciocínio inerente a esta abordagem - designado por raciocínio narrativo (ou indutivo) - é fundamentado no reconhecimento da aprendizagem que advém da experiência e contexto do utente. O raciocínio narrativo reconhece que o significado que a pessoa atribui às situações que a envolvem pode ser constitutivo das suas ações e tomadas de decisão^4.

compreender e interagir com a pessoa e o seu contexto para efetivar a mudança (requere uma abordagem biopsicossocial - raciocínio narrativo e gestão comunicativa). A análise do contexto implica reconhecer o utente como pessoa, a sua perspetiva do problema, as suas experiências (desejos, crenças, motivações, emoções,…), a base das suas perspetivas e de que forma o problema está a afetar a sua vida^4. Para compreender e gerir o utente e os seus problemas com sucesso, o fisioterapeuta deve considerar não apenas as possibilidades físicas de diagnóstico (estruturas envolvidas e fisiopatologia associada), mas também todos os outros fatores que podem estar a contribuir para a saúde da pessoa^9 Na realidade, um diagnóstico compreensivo deve englobar o que é apreendido a partir de diferentes formas de raciocínio - colaborativo, ético, procedimental, interactivo, preditivo e educacional - reconhecendo o problema físico resultante do raciocínio diagnóstico e a pessoa, em todo o seu contexto, resultante da perspetiva obtida através do raciocínio narrativo4,10. Para os profissionais de saúde, é, portanto, aparente que os processos de raciocínio clínico dedutivo e indutivo são necessários para a compreensão da relação não linear entre a incapacidade física e a experiência pessoal da incapacidade. O modelo biopsicossocial não pretende ignorar os fatores biológicos, mas antes ampliar a compreensão acerca do problema do utente^11.

Gifford^10 propôs um modelo de saúde e incapacidade que pretende retratar as interações entre as vias aferentes e eferentes do sistema nervoso central, que contribuem para a manutenção da saúde ou para a manutenção/desenvolvimento de problemas de saúde, como dor e incapacidade. A integridade dos tecidos é “comunicada”, juntamente com a informação contextual acerca do ambiente, incluindo o ambiente imediato que inclui a experiência da lesão e o ambiente contínuo que constitui a experiência de dor da pessoa, através de mecanismos de input (vias sensoriais). A partir daí, o cérebro, tanto de forma consciente, como inconsciente, integra e analisa a informação recebida – se o input sensorial atingir um nível de consciência, vai ser analisado lado a lado com as experiências anteriores, e crenças do utente sendo, obviamente, por elas influenciado. Por fim, toda a informação será processada – processamento – de forma a criar uma resposta através dos mecanismos de output (somáticos motores, autonómicos, neuroendócrinos e sistemas descendentes de controlo/feedback).

A forma como um indivíduo pensa e sente a sua situação de saúde tem efeitos profundos no output fisiológico, psicológico e comportamental gerado, o que por sua vez afeta a manifestação da saúde ou incapacidade – a mesma extensão de lesão ou doença não terá a mesma apresentação em duas pessoas diferentes, já que a manifestação da mesma é moldada em parte por aquilo que a pessoa é e pela forma como o seu sistema

(único) responde.!!

3. PRÁTICA CENTRADA NA PESSOA

A capacidade de um profissional incorporar a experiência do utente no processo de raciocínio clínico está relacionada com aquilo que se designa por prática centrada na pessoa (PCP), um constructo que tem vindo a ganhar cada vez mais importância na área da fisioterapia músculo-esquelética^12. Num documento que pretende estabelecer os componentes para que se atinja a qualidade na saúde, o Instituto de Medicina definiu seis áreas fundamentais, que considera estarem em níveis aquém do desejável. Uma dessas áreas são os cuidados centrados na pessoa, ou seja, a prestação de cuidados que respeitem e respondam às preferências individuais do utente, assim como às suas necessidades e valores (IOM). A PCP pode ser definida como “a experiência (na medida em que o utente individual informado deseja) de transparência, individualização, reconhecimento, respeito, dignidade e escolha em todos os assuntos, sem exceção, relacionados à própria pessoa, circunstâncias e relacionamentos nos cuidados de saúde”^13. A PCP considera o utente como um ser individual, afastando-se da visão da pessoa como mero objeto portador de doença. Isto significa que o profissional deve entender o contexto da pessoa e estabelecer com ela uma aliança terapêutica ao longo do processo de cuidados^14 Esta aliança terapêutica pressupõe uma relação igualitária entre o utente e o profissional de saúde, permitindo a autonomia do utente e igualando o poder entre as duas partes, permitindo a tomada de decisão colaborativa. Como tal, a PCP contribui para a produção de planos ou resoluções de tratamento adequados, potencializados pelo que é significativo para o utente, em vez de o reduzir meramente ao seu diagnóstico^15. Diferentes autores têm tentado identificar as principais componentes da PCP, sendo que, com algumas variações, é unanimemente aceite que esta englobe dimensões como o respeito pelo utente e suas crenças, motivações e necessidades; companheirismo e tomada de decisão colaborativa; equidade e facilidade no acesso à

Outras barreiras identificadas relacionam-se com a estruturação física dos serviços - espaços demasiado amplos limitam a privacidade e afetam a comunicação entre utentes e profissionais - e com os constrangimentos temporais^20 No que se refere com as variáveis facilitadoras na implementação destas práticas, é unânime que a liderança representa um dos principais fatores para uma implementação efetiva19–22. O compromisso das lideranças com a aplicação destas práticas, determina até que ponto as organizações de saúde orquestram um ajuste entre a visão da PCP e o plano estratégico e prioridades. As chefias têm a responsabilidade não só de definir com clareza as bases deste modelo, mas também de as comunicar e disseminar pelos funcionários, em todos os departamentos^19. Ainda assim, é obviamente fundamental que os profissionais, a título individual, sejam capazes de auto-refletir sobre a sua prática, percebendo até que ponto estão a incluir o utente no processo terapêutico^11 Deste ponto de vista, a educação e formação, tanto de profissionais como de utentes, foi considerada por diferentes autores como uma estratégia fundamental na implementação da prática centrada na pessoa19,21,23.

CASO CLÍNICO

1. EXAME SUBJECTIVO

A D. Glória tem 69 anos. É viúva e vive sozinha, uma vez que ambos os filhos já saíram de casa há vários anos. Tem dois netos, que costumam passar alguns fins-de-semana com ela.

História Atual

Foi sugerido à D. Glória que nos falasse sobre si e a situação que a terá conduzido à fisioterapia.

A utente começa por referir que já teria feito fisioterapia no serviço, há cerca de três anos, na altura com queixas de dor ao nível do ombro direito, que lhe teriam dito estar associadas com tendinopatias recorrentes, relacionadas com as atividades profissionais que desenvolveu durante a vida – agricultora, costureira e carpinteira. Refere ter melhorado consideravelmente com os tratamentos. Algum tempo mais tarde, há cerca de um ano, conta ter sofrido uma queda durante uma das suas atividades agrícolas, da qual resultou uma forte dor no ombro, que a levou a dirigir-se ao Serviço de Urgência, onde lhe terá sido diagnosticada uma rotura muscular. A partir dessa data refere ter sentido melhoria progressiva das queixas álgicas, no entanto, imediatamente após a queda, passa a apresentar limitação funcional do membro superior direito, com incapacidade de o elevar acima dos 90º. Apesar disso, a utente diz ter “feito a sua própria Fisioterapia”, o que progressivamente a levou a recuperar a mobilidade do membro, que atualmente, na sua perspectiva, não é responsável pelas suas queixas.

Quando conversamos sobre o problema atual, a D. Glória refere que desde há muitos anos, após a menopausa e ainda antes das dores no ombro, que apresenta sintomas em ambas as mãos (mas predominantemente à direita), nomeadamente dor e parestesias noturnas. Mantém este problema até à atualidade, com períodos de melhoria e exacerbação intermitentes. Considera ser este o seu principal problema e o motivo pelo qual procura tratamentos de Fisioterapia.

Estas queixas não melhoram com a toma dos AINE.

A utente não estabelece uma relação entre D1 e D2, acreditando que o surgimento de uma não condiciona o aparecimento da outra

2. MECANISMOS

Mecanismos de Input – Tipo de Dor

A evidência apresentada no exame subjetivo sugere que:

D1 é uma Dor Nociceptiva Mecânica Surge ao final do dia, possivelmente por manutenção da carga ao nível da coluna cervical Melhora com o repouso Responde moderadamente à toma de AINE

D2 é uma Dor Neuropática Isquémica Dor tipo “queimadura”, associada a parestesias Distribuição por um dermatoma específico (C7) Não se altera perante a toma de AINE. Piora com a imobilidade (isquémia tecidular), nomeadamente durante o período noturno, e melhora com a atividade/mudança de posição

Mecanismos de Processamento (Centrais/Cognitivos) As queixas apresentadas têm uma evolução prolongada, tendo ultrapassado o tempo esperado de recuperação, e existem alguns fatores psicossociais (estado emocional, depressão…) valorizáveis, o que poderia constituir evidência positiva para a existência de problemas ao nível do processamento. No entanto, existem também alguns dados que contrariam esta hipótese, nomeadamente, o facto das queixas apresentadas serem localizadas (D2 não é localizada, mas segue uma distribuição especifica), responderem de forma esperada aos estímulos provocatórios e, no caso de D1, responderem positivamente à toma de medicação anti-inflamatória. Para além disso, foi possível perceber, através do exame subjetivo, que a D. Glória é uma pessoa ativa, não evidenciando sinais da presença de fatores como a medo do movimento ou catastrofização e demonstrando ainda alguma

capacidade de autogestão, quando refere que recuperou a mobilidade do ombro fazendo a sua própria fisioterapia. Considera-se que a evolução prolongada das queixas pode ser explicada pela manutenção de atividades potencialmente lesivas (profissionais e agrícolas), o que pode não só ter retardado o período de recuperação, como também ter sido responsável por lesões paralelas e mecanismos adaptativos. Quanto à presença de sinais que indicam alguma fragilidade emocional, a utente relaciona-os com os problemas profissionais existentes, não havendo qualquer evidência que associe a presença das queixas e as alterações emocionais - a D. Glória associa a sua depressão, emagrecimento e dificuldade em dormir, com os problemas profissionais e económicos dos últimos meses, e não parece valorizar particularmente o papel das queixas músculo-esqueléticas neste processo. Assim sendo, pensa-se ser possível afirmar que não existem fatores psicossociais que contribuam direta e negativamente na evolução do problema da utente. Não deverá, contudo, ser desvalorizada a informação de que a utente apresenta algumas alterações emocionais, e alteração do padrão de sono que, indiretamente, constituem fatores potencialmente importantes na progressão do seu problema e do tratamento do mesmo.

Mecanismos de Output Não existe evidência no exame subjetivo que permita identificar mecanismos motores, que influenciem o raciocínio clínico subjacente à condição da utente.

3. ORIGEM DOS SINTOMAS

Considera-se a possibilidade das seguintes estruturas serem responsáveis pelos sintomas apresentados:

D1: Articulações Interapofisárias Disco Intervertebral Facetas articulares

D2 : Raiz de C Nervo Mediano

5. FACTORES CONTRIBUINTES

Físicos Idade A utente tem 69 anos, o que pode indicar possibilidade de existência de alterações degenerativas articulares.

Rotura do Supra-Espinhoso A utente tem história de tendinopatias repetidas e existe registo ecográfico que confirma rotura total do tendão do supra-espinhoso. Esta situação pode estar associada a alterações biomecânicas do membro superior, que acarretem disfunções cervicais ou da mobilidade neural.

Ambientais Utente muito ativa, que realiza atividades agrícolas por vezes exigentes. A utente não impõe qualquer restrição às atividades agrícolas do quotidiano. Esta situação pode contribuir de forma dupla para a sua situação – por um lado pode ser um fator positivo, do ponto de vista em que indica que a utente se mantém ativa, não evidenciando medo do movimento; por outro pode representar um fator negativo, se os esforços realizados contribuírem para a continuidade e progressão dos sintomas.

Psicossociais (Orange, Yellow, Blue, Black Flags) Depressão e alteração do padrão de sono. Fatores que podem contribuir negativamente para o processo de recuperação.

6. MECANISMOS TECIDULARES

Como já referido, as queixas da utente apresentam uma evolução excessivamente prolongada. Desta forma, do ponto de vista do mecanismo tecidular, torna-se difícil determinar em que fase se encontra a lesão. É previsível que possa existir um ciclo que, por determinantes externos (esforço, trauma, sobrecarga,) possa, de forma intermitente, iniciar novas fases inflamatórias. Pela evidência subjetiva, esta não será uma dessas fases, nem existe indício de ter acontecido uma recorrência inflamatória nos últimos

tempos. Assim sendo, o mais provável, é que a lesão da utente se encontre numa fase de remodelação e maturação.

7. PRECAUÇÕES / CONTRA-INDICAÇÕES / RED - FLAGS

Na presença de dor cervical, é fundamental excluir a possibilidade de patologia vascular inerente, antes de iniciar manobras de avaliação ou tratamento. Ainda durante o exame subjetivo, o utente deverá ser questionado acerca da existência de hábitos tabágicos, assim como de trauma recente, antecedentes familiares de AVC ou hipercolesterolémia^2. Neste caso, a D. Glória negou qualquer um fatores. Registou- se o facto de a utente sofrer de hipertensão arterial que, no entanto, deverá estar controlada pela medicação anti-hipertensora. Ainda assim, deverá ser considerada no exame objectivo uma avaliação neurológica dos pares cranianos, marcha e coordenação, tensão arterial e auscultação^2 Para além disso, deverá ser verificada a possibilidade existência de outras red-flags. O emagrecimento referido pela utente poderia constituir um sinal de alerta para a possibilidade de existência de patologia grave, nomeadamente neoplásica, mas parece existir uma explicação para esse facto e não existem outros dados que, para já, remetam para essa possibilidade. Ainda assim, o exame objetivo deve ser conduzido e interpretado com esta informação em mente.

O facto de existir evidência acerca de uma rotura completa do supra-espinhoso, antevê a possibilidade de existirem alterações da biomecânica ou instabilidade ao nível do ombro. Esta informação pode constituir um fator de precaução na realização de alguns testes objetivos, nomeadamente aqueles que exigem maiores amplitudes de movimento nesta articulação. A existência de queixas de origem neuropática, leva a que seja considerada precaução ao nível dos testes realizados, devido à irritabilidade do sistema nervoso e aos sintomas latentes que podem surgir.

Por outro lado, o facto de a localização das queixas neuropáticas se limitar à mão, e de estas aliviarem com frio local, pode levar a crer que a origem seja mais distal, mais especificamente ao nível do túnel cárpico, local frequente de compressão do nervo mediano (Síndrome do Túnel Cárpico - STC). A existência de dor predominantemente noturna é também característica desta afecção 27.

Existem sintomas particulares e sinas objetivos que podem auxiliar no diagnóstico diferencial destas duas patologias. As medidas objetivas identificadas na literatura como adequadas à classificação da dor cervical são a mobilidade ativa cervical e torácica, a mobilidade acessória cervical e o Cranial Cervical Flexion Test^26. A avaliação da mobilidade cervical em sujeitos com radiculopatia, resulta normalmente num achado especifico, em que a extensão ou rotação cervical serão os movimentos mais dolorosos e, eventualmente, mais limitados, uma vez que provocam uma redução do espaço ao nível dos buracos de conjugação24,26, A avaliação dos reflexos osteotendinosos (ROT) resulta frequentemente numa hiporreflexia do membro superior, neste caso concreto, afetando o reflexo tricipital^24 Os testes especiais considerados úteis para o diagnóstico de radiculopatia são o Teste de Spurling, o Teste de Distração e os Testes de Tensão Neural do membro superior^26.

No que se refere com o STC, as parestesias apresentam comportamento predominantemente noturno, intermitente, e apenas aumentam de frequência ou surgem durante o dia em fases mais avançadas da doença28,29. A dor é sobretudo sentida na mão, sendo que raramente irradia para o antebraço^28. Os testes considerados úteis para o diagnóstico desta condição são o Teste de Phalen e o Teste de Tinel24,28. Será importante também verificar a integridade e força muscular – uma neuropatia do mediano poderá resultar em fraqueza do curto abdutor do polegar e, consequentemente, hipotrofia da região tenar da mão afectada24,28,29; uma radiculopatia de C7 poderá resultar em redução da força muscular do tricípite^24.

A informação existente, acerca de uma rotura ao nível da coifa dos rotadores, não influencia de forma significativa o raciocínio subjacente aos sintomas neuropáticos, uma vez que a utente refere que os sintomas no ombro tiveram início posterior às queixas na mão direita.

Por outro lado, a utente não apresenta atualmente queixas ao nível do ombro ou braço, e não parece provável que a rotura da coifa possa influenciar o quadro apresentado, uma vez que não existe qualquer evidência que estabeleça uma relação entre a presença desta patologia e a existência de comprometimento neural, pelo menos ao nível da raiz de C7 ou do nervo mediano. Quanto muito, poderia considerar-se uma lesão ao nível do nervo supraescapular 30 mas não existe no exame subjetivo qualquer informação compatível com esta hipótese. Assim sendo, considera-se que o exame objetivo não se deverá focar nesta articulação. Ainda assim, a existência desta lesão não deve ser desvalorizada, uma vez que pode ser responsável por alterações biomecânicas que potenciem o mecanismo lesivo responsável pelos sintomas neuropáticos, principalmente se considerarmos a possibilidade da sua origem cervical.

9. EXAME OBJECTIVO

AVALIAÇÃO POSTURAL Anteriorização dos ombros ( ++ à direita.) Depressão do ombro direito Acentuação das curvaturas vertebrais (hiperlordose cervical, hipercifose dorsal e hiperlordose lombar)

AVALIAÇÃO DA MOBILIDADE CERVICAL (ACTIVA/PASSIVA) Flexão completa, dor ligeira (na região cervical baixa, sem irradiação) Extensão ligeiramente limitada, dor moderada (na região cervical baixa, sem irradiação) Rotação Direita ligeiramente limitada, dor moderada (na região cervical baixa, sem irradiação) Rotação Esquerda completa, indolor Flexão Lateral Direita completa, indolor. Flexão Lateral Esquerda completa, com dor de estiramento na região do Trapézio Superior, contralateral.

Em todos os movimentos dolorosos, a utente refere exacerbação da dor com a aplicação de pressão adicional