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Neste texto, o autor aborda a relação entre psicologia e direitos humanos, discutindo a convergência e a sobreposição de áreas entre esses campos. Ele também explora a importância da psicologia na construção do campo dos direitos humanos e os objetivos e elementos atuais dessa área de estudo. A teoria dos direitos humanos é apresentada como uma invenção da modernidade ocidental.
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Tipologia: Resumos
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O presente artigo aborda o encontro entre a Psicologia e os Direitos Humanos no Brasil. Para tanto, é feito um preâmbulo sobre a criação do curso de Psicologia no país, seu respectivo contexto sócio-histórico e o lugar desse novo profissional. Alguns aspectos teóricos e relativos à prática psicológica são problematizados. Ao mesmo tempo, é abordado o momento de revisão e transformação pelo qual passou a Psicologia, assim como sua pluralidade epistemológica. Em seguida, é elaborado um panorama sobre Direitos Humanos, sua criação e seu surgimento no cenário mundial. Também são apresentados seus princípios fundamentais e a concepção contemporânea de Direitos Humanos. Questões relativas a como os Direitos Humanos surgiram na realidade brasileira são brevemente introduzidos. Posteriormente, são abordados os pontos de convergência entre esses dois campos, com o objetivo de demonstrar e ratificar a proximidade existente entre Psicologia e Direitos Humanos. Por fim, evidenciar a importância desse diálogo para qualificar ainda mais a Psicologia, como ciência e profissão. Palavras-chave : Psicologia, Direitos Humanos, Conhecimento Científico.
12 Cássia Maria Rosato
This article presents a crossroads between Psychology and Human Rights in Brazil. For this, a preamble is made about the creation of Psychology’s under- graduate degree as a science and a profession, the socio-historical context and the place of this new professional. Some practical and theoretical aspects are discussed. At the same time, the revision and the transformation moment that occurred with the Psychology is approached, as well as its epistemological plurality. Afterwards, an overview of Human Rights is made, its creation and appearance in the world scene. Also, their guiding principles are presented and the contemporary concept of Human Rights. Questions related to how Human Rights emerged in the Brazilian reality are briefly introduced. Points of convergence between these two areas are described to demonstrate and confirm the proximity between Psychology and Human Rights. Finally, the importance of this dialogue is made eveident to further qualify Psychology as science and as a profession. Keywords : Psychology, Human Rights, Scientific Knowledge. UMA PROPOSTA DE ANÁLISE Pensar e elaborar um artigo que trate do encontro entre a Psicologia e os Direitos Humanos no Brasil pode parecer algo dispensável, priorita- riamente por duas razões. A primeira delas é que, para alguns, propor a convergência entre a Psicologia e os Direitos Humanos pode soar como uma obviedade, tendo em vista os diversos campos de atuação da Psicologia que hoje incidem em questões relativas aos Direitos Humanos. Abordar essa temática seria uma questão já superada, já que esse diálogo se encontra em profícuo desenvolvimento. A segunda razão seria exatamente o contrário, ou seja, para outros, propor um diálogo entre Psicologia e Direitos Humanos pode significar uma sobreposição de áreas, já que o campo dos Direitos Humanos tradicionalmente sempre foi algo relacionado ao Direito. Entende-se que, cada vez mais, torna-se imprescindível explicitar o diálogo entre esses dois campos, não apenas para demonstrar os pontos que possuem em comum, mas principalmente para fundamentar teoricamente quais as conexões entre Psicologia e Direitos Humanos. Secundariamente, evidenciar aos que ainda não vislumbram esse diálogo a possibilidade de perceber a proximidade inerente que existe entre essas duas áreas.
14 Cássia Maria Rosato
Psicologia e Direitos Humanos: cursos e percursos comuns 15 Assim, pode-se inferir que, nessa lógica, o conhecimento em si não possui origem, mas sim, foi inventado. Em outras palavras, as verdades históricas que, em determinados períodos ganham validade, em detrimento de outras, não passam de invenções/criações que, por razões diversas, ganham o estatuto de legitimidade perante a sociedade. Nesse contexto de construção do conhecimento, a Psicologia surgiria no contexto brasileiro. Combinado com isso é preciso considerar também o lugar de poder/ saber trabalhado também por Foucault (1979) que se constitui enquanto elemento-chave para entender como determinados fenômenos adquirem força e passam a ser reconhecidos socialmente. De acordo com o referido autor: O importante, creio eu, é que a verdade não existe fora do poder ou sem poder (...). A verdade é deste mundo; ela é produzida nele graças a múltiplas coerções e nele produz efeitos regulamentados de poder. Cada sociedade tem seu regime de verdade, sua ‘política geral’ de verdade: isto é, os tipos de discurso que ela acolhe e faz funcionar como verdadeiros; os mecanismos e as instâncias que permitem distinguir os enunciados verdadeiros dos falsos, a maneira como se sanciona uns e outros, as técnicas e os procedimentos que são valorizados para a obtenção da verdade; o estatuto daqueles que têm o encargo de dizer o que funciona como verdadeiro (p. 12). Nesta linha, não há como se furtar de que a Psicologia veio como um lugar de saber/poder, muitas vezes, a serviço da repressão e da lógica normatizadora do sujeito. Nesse sentido, em relação ao saber psicológico produzido, eis uma caracterização que traduz a formação dessa categoria profissional que estava surgindo no país, como bem descreveu Coimbra (1995): (...) a formação “psi”, em geral, traz certas características modelares insti- tuídas e tão bem marcadas; como, em nossa formação, predomina o viés positivista, onde se tornam hegemônicos os conceitos de neutralidade, objetividade, cientificidade e tecnicismo; onde, nos diferentes discursos e práticas, o homem e a sociedade são apresentados como “coisas em si”, abstratos, naturais e não produzidos historicamente (p. ix). Ainda que a maior parte do texto legislativo que ensejou a criação da Psicologia já tenha sido reformulado e que essa formação “psi” já tenha
Psicologia e Direitos Humanos: cursos e percursos comuns 17 Dessa maneira, para conhecer e compreender o campo da Psicologia torna-se de fundamental relevância considerar as diversas correntes teóricas existentes, situando-as em seus respectivos contextos sócio-históricos. Essa realidade pode ser caracterizada por uma imensa pluralidade e heteroge- neidade de abordagens teóricas e diferentes perspectivas epistemológicas. Assim, a Psicologia é constituída por uma rede complexa de saberes que podem ser convergentes ou não. Nessa lógica, a mesma situação se aplica à Psicologia Social enquanto especialidade do campo da Psicologia e certa- mente a que mais se aproxima dos Direitos Humanos, do ponto de vista teórico-prático. Segundo Spink (2007), teríamos aproximadamente 04 (quatro) diferentes “histórias” da Psicologia Social que têm sido difundidas na atualidade. A primeira delas foca uma Psicologia Social experimental que permitiria a mensuração de comportamentos de modo objetivo e rigoroso, seguindo a lógica das ciências naturais. Uma segunda história, derivada da primeira, considera uma perspectiva mais flexível que a primeira, priori- zando aplicações práticas do que está colocado em teorias. Já a terceira história da Psicologia Social trabalharia com contextos sociais e históricos, entendendo a própria construção da disciplina como produto de sua época; nessa perspectiva, já estaria colocado um viés crítico, ultrapassando o enfoque descritivo das propostas anteriores. Por fim, a quarta história trabalharia com a compreensão da própria disciplina Psicologia Social funcionar como instrumento de dominação social, sendo imprescindível considerar as conseqüências de se trabalhar com conduta humana e subjetividade. Essas diferentes “histórias” da Psicologia Social não estão colocadas de modo linear e cronológico, como se estivessem sobrepostas ou ultra- passadas; pelo contrário, são perspectivas atuais e atuantes no campo da Psicologia, tendo diferentes representantes e grupos de pesquisa, espalhados pelas diversas universidades brasileiras. Nesse grande leque de possibilidades e compreensões, a autora faz um resumo do que seriam essas diferentes linhas de pesquisa em Psicologia Social e, ao final, introduz uma questão bastante significativa:
18 Cássia Maria Rosato De um lado, encontramos uma Psicologia Social do biológico, do intra- individual, do interindividual e do grupo; no meio, uma psicologia social da subjetividade, da linguagem, das representações sociais, dos grupos e dos processos políticos; e, de outro lado, uma Psicologia Social centrada na interação social, na reprodução, na mudança e nos movimentos coletivos. Se todos eles são textos recentes sobre Psicologia Social, por que são tão diferentes? (p. 569). Assim, é possível constatar que os estudos e pesquisas, no campo da Psicologia Social estão localizados nessa rede epistemológica que se caracte- riza, fundamentalmente, pela diversidade de compreensões e pressupostos. Dessa imensa rede de produções e possibilidades, fica a questão central acerca do conhecimento psicológico que é produzido nos dias de hoje, e, essencialmente, o que é feito com essas produções. Significa afirmar a necessidade de que esse saber não seja produzido para reforçar o para- digma determinista daquela Psicologia individualizante supostamente já superado e compreender a instrumentalização que muitas vezes é feita com as produções do conhecimento. Dentro dessa pluralidade que envolve teoria e prática em Psicologia, há outro aspecto que merece destaque não apenas pela sua importância, mas, principalmente, pela pouca discussão do assunto nos meios acadê- micos e no próprio exercício profissional. Trata-se dos usos e efeitos que os diversos saberes psicológicos produzem nos dias de hoje; ou seja, quais são os desdobramentos dessas intervenções, e em última análise, o que é feito com esse conhecimento psicológico, compreendendo-o enquanto instrumento de saber/poder. Significa afirmar a necessidade de entender a instrumentalização que pode ser feita com esses saberes/poderes, partindo do pressuposto de que a intervenção psicológica é uma ação política, portanto, que tem efeitos na sociedade como um todo. Para tanto, torna-se fundamental ter como princípio que todo e qualquer conhecimento deve sempre ser contextualizado de acordo com sua realidade social, já que inexiste indivíduo ou grupo apartado de uma sociedade. De acordo com Jacó-Vilela (1999), estas seriam questões de relevância:
20 Cássia Maria Rosato impôs às nações a necessidade de se pensar estratégias internacionais que inibissem novos genocídios dessa proporção. Esse foi o embrião, no Ocidente, do que se convencionou nomear de Direitos Humanos. Fica evidente que a idéia de Direitos Humanos é moderna na história da sociedade ocidental. É importante ressaltar que, nesse artigo, parte-se da concepção contemporânea de Direitos Humanos cuja perspectiva principal é a da universalidade, indivisibilidade e interdependência destes direitos. De acordo com Piovesan (2002), esta concepção deriva do pós Segunda Guerra Mundial, momento em que o mundo se confrontou com inúmeras atrocidades oriundas dos regimes totalitários. Este cenário aterrorizador mobilizou a comunidade internacional para a necessidade premente de criação de um dispositivo normativo que pudesse frear estas violações, a partir do questionamento da soberania estatal, tendo em vista que, na Segunda Guerra Mundial, o Estado foi o maior violador dos Direitos Humanos acobertado por esta soberania nacional. Neste sentido, houve um entendimento de que deveria existir um instrumento internacional que garantisse a proteção aos Direitos Humanos de qualquer pessoa, independentemente de seu país de origem. Portanto, em 1945, criou-se a mais importante organização internacional – Organi- zação das Nações Unidas (ONU) – com o objetivo de proteção aos Direitos Humanos, assim como manutenção da paz e da segurança em âmbito mundial. Nesta conjuntura de construção de dispositivos normativos para proteção internacional dos direitos, adota-se a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) em 1948. Se este triste episódio da história mundial significou o rompimento com todos os direitos até então conquis- tados, a Declaração surgia com o objetivo de reconstruir este esfacelamento, superando a soberania dos Estados. Nesta concepção contemporânea, a primeira característica diz respeito aos direitos dirigidos universalmente para todas as pessoas, bastando a condição de ser humano para ser titular destes direitos. No entanto, no contexto atual, há uma parcela significativa da população mundial que seus direitos respeitados. Dessa forma, é imperativo reforçar uma questão anterior, apresentada por Arendt (2000) que se refere
Psicologia e Direitos Humanos: cursos e percursos comuns 21 primeiramente ao “direito a ter direitos”, ou seja, a imensa maioria da população mundial desconhece o conteúdo dos Direitos Humanos como um conjunto de direitos conquistados historicamente que lhe assiste ou não possui mecanismos de acesso ou reivindicação destes direitos. Já a segunda característica sinaliza para a indivisibilidade dos Direitos Humanos, partindo do pressuposto de inter-relação e interdepen- dência destes direitos. Não basta que os direitos civis e políticos estejam garantidos, faz-se necessário observar também os direitos sociais, econô- micos e culturais (DHESCs); se um direito é violado, os demais também o são. É necessário superar antigas dicotomias que dedicavam lugares e prioridades distintas aos direitos civis e políticos e aos direitos econômicos, sociais e culturais. Significa reafirmar que um direito não existe isolado dos demais e no caso de violação de um direito, necessariamente, outros também estarão sendo violados. Nesta perspectiva normatizadora, pode-se afirmar que principal- mente a partir da Segunda Guerra Mundial houve inúmeros avanços em âmbito mundial no que tange a adoção de Declarações, Tratados e Pactos Internacionais de respeito e proteção aos Direitos Humanos, dos quais diversos países, inclusive o Brasil, são signatários. Após a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), seguiram-se diversos outros dispositivos normatizadores, valendo destacar os principais: Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos (1966), Pacto Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966), Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial (1968), Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (1979), Convenção sobre os Direitos da Criança (1989), dentre outros. É importante salientar que a suposta contradição entre a existência de Pactos Internacionais distintos para os Direitos Civis e Políticos e para os DHESCs, e a assertiva anterior a respeito da indivisibilidade destes direitos, deve-se à bipolaridade da política mundial naquele período. A impossibi- lidade de diálogo entre os blocos capitalista e socialista obrigou a ONU a viabilizar dois instrumentos diferentes, contrariando a proposta inicial que visava um único instrumento detalhando os direitos previstos na DUDH.
Psicologia e Direitos Humanos: cursos e percursos comuns 23 No entanto, frente a essa cultura de aceitação é bastante pertinente o questionamento de Bobbio (2004) em relação à suposta tolerância que se deve para a devida implementação dos direitos: Um direito cujo reconhecimento e cuja efetiva proteção são adiados sine die , além de confiados à vontade de sujeitos cuja obrigação de executar o “programa” é apenas uma obrigação moral ou, no máximo, política, pode ainda ser chamado corretamente de “direito”? (p. 92). De qualquer sorte, há que se resgatar a concepção contemporânea de universalidade e indivisibilidade de direitos, não existindo nenhum tipo de valoração ou sobreposição de direitos, tendo em vista que todos são igual- mente relevantes para a promoção da igualdade e da dignidade humana enquanto principais fundamentos dos Direitos Humanos. Para tanto, toma-se como referência uma reflexão de Mondaini (2006) como indicativo de qual o lugar dos Direitos Humanos na contemporaneidade: Na atualidade, não obstante as inúmeras conquistas obtidas em torno da afirmação dos direitos humanos, tanto no campo jurídico-legal como no plano cultural-ideal, continuam a se fazer presentes críticas que parecem ignorar o fato de que o único instrumento capaz de medir o nível de civili- dade alcançado por uma sociedade – e seu progressivo distanciamento da barbárie – localiza-se exatamente na capacidade que esta tem de fazer com que os seus concidadãos sejam protegidos pelo generoso guarda-chuva dos direitos humanos (p. 12). Ou seja, independente do país ou do contexto sócio-histórico vivido, podemos perceber hoje que os Direitos Humanos funcionam como termô- metro ou bússola norteadora que indica o grau de civilidade de uma socie- dade. Isso não se refere apenas ao respeito formal, pois importantes textos foram assinados pelo Brasil, conforme já colocado anteriormente, sendo referências no assunto. Trata-se aqui da construção de uma cultura que respeite os Direitos Humanos efetivamente para todas as pessoas. Assim, além dos Direitos Humanos serem uma referência em relação ao progresso histórico de determinada sociedade, é preciso compreender que o campo dos direitos é necessariamente uma arena política como bem
24 Cássia Maria Rosato sinaliza Bobbio (2004): “O problema fundamental em relação aos direitos dos homens, hoje, não é tanto o de justificá-los, mas o de protegê-los. Trata- se de um problema não filosófico, mas político” (p. 43). No cenário brasileiro, os primeiros sinais de movimentos sociais pelos Direitos Humanos datam da década de 60 e 70, período político mais conhecido como os anos de chumbo. De acordo com Sader (1988), frente a um Estado repressor e autoritário, novos atores sociais surgem enquanto estratégia de resistência, principalmente a partir de movimentos ligados à Igreja, à esquerda e ao sindicalismo: Com isso (os novos sujeitos políticos) acabaram alargando a própria noção de política, pois politizaram múltiplas esferas do seu cotidiano. Apoiando-se nos valores de justiça contra as desigualdades imperantes na sociedade; da solidariedade entre os dominados, os trabalhadores, os pobres; da dignidade constituída na própria luta em que fazem reconhecer seu valor; fizeram da afirmação da própria identidade um valor que antecede cálculos racionais para a obtenção de novos objetivos concretos (p. 312). Tal digressão histórica baseia-se na necessidade de trazer elementos que colaborem para essa proposta de investigação entre a Psicologia e os Direitos Humanos, a fim de identificar seus cursos, percursos e principais pontos de convergência. PSICOLOGIA E DIREITOS HUMANOS: PONTOS DE CONVERGÊNCIA NA TEORIA E NA PRÁTICA Feito esse preâmbulo sobre a trajetória desenvolvido pela Psicologia como ciência e profissão e os Direitos Humanos, enquanto direitos, deveres e cidadania para todos, pode parecer que não há ponto de interseção entre esses campos. No entanto, considerando que, por excelência, a Psicologia trabalha com seres humanos em suas mais diversas condições, situações e contextos, o mesmo se aplica aos Direitos Humanos. Não se quer dizer aqui que se trata da mesma intervenção, mas, sim, do mesmo objeto de trabalho, ou seja, o ser humano. Elegendo a dignidade humana como eixo fundante dos Direitos Humanos, torna-se possível pensar nessa meta também para a Psicologia,
26 Cássia Maria Rosato Apenas a título exemplificativo dessa realidade, é possível tomar o Movimento de Luta Antimanicomial^2 como expressão da proximidade entre Psicologia e Direitos Humanos. Após décadas de violações de direitos em instituições psiquiátricas, os trabalhadores dos serviços, usuários e fami- liares se organizaram para enfrentar uma realidade cotidiana de violência e arbitrariedade. Entendendo esse movimento como importante instrumento de mudança, foi através dele que se tornou possível estabelecer diretrizes de intervenção com o objetivo de resgatar a dignidade dessas pessoas e iniciar a Reforma Psiquiátrica. Funda-se, nesse movimento, um fecundo diálogo entre a Psicologia e os Direitos Humanos, na medida em que se passou a questionar o tratamento dispensado nos hospitais psiquiátricos, ensejando uma verdadeira mudança de paradigma na saúde mental brasileira. Isso evidencia a necessidade dos Direitos Humanos, cada vez mais, integrarem a formação a ação profissional da Psicologia, para fortalecer e qualificar o pensar teórico e a práxis psicológica. Essa nova perspectiva de análise e compreensão do ser humano, baseada no diálogo entre a Psicologia e os Direitos Humanos, é fundamental para se construir uma sociedade menos injusta e que tenha como princípio norteador o respeito à dignidade humana. REFERÊNCIAS Anistia Internacional. (2008). Informe 2008: O Estado dos Direitos Humanos no mundo. Porto Alegre: Gráfica e Editora Algo Mais. Arendt, H. (2000). A condição humana. (10ª ed.). Rio de Janeiro: Forense Universitária. Bobbio, N. (2004). A era dos direitos. (3ª ed.). Rio de Janeiro: Elsevier. 2 Para maiores informações e aprofundamento do tema, ver Correia, L. C. (2007). O movi- mento antimanicomial: movimento social de luta pela garantia e defesa dos direitos humanos. Prim@ Facie (UFPB), v. 2006.1, p. 83-97.
Psicologia e Direitos Humanos: cursos e percursos comuns 27 Bock, A. M. B. (2001). História da organização dos psicólogos e a concepção de fenômeno ideológico. Em: Jacó-Vilela, A. M.; Cerezzo, A. C.; Rodrigues, H. de B. C. (Org.). Clio-Psyquê Hoje – Fazeres e dizeres psi na história do Brasil. Rio de Janeiro: Relume Dumará. Brasil. Decreto n. 53.464 de 21 de janeiro de 1964. Regulamenta a Lei nº 4.119, de agosto de 1962, que dispõe sobre a Profissão de Psicólogo. Brasil. Lei n. 4.119 de 27 de agosto de 1962. Dispõe sobre os cursos de formação em Psicologia e regulamenta a profissão de Psicólogo. Camino, L. (2000). Direitos Humanos e Psicologia. Em: Psicologia, Ética e Direitos Humanos. São Paulo – Brasília: Casa do Psicólogo: Conselho Federal de Psicologia. Coimbra, C. (1995). Guardiões da ordem: uma viagem pelas práticas psis no Brasil do “milagre”. Rio de Janeiro: Oficina do Autor. Foucault. M. (1979). Microfísica do poder. (18ª ed.). Rio de Janeiro: Graal. Foucault, M. (2003). A verdade e as formas jurídicas. (3ª ed.). Rio de Janeiro: NAU. Mondaini, M. (2006). Direitos Humanos. São Paulo: Contexto. Piovesan, F. Proteção internacional dos direitos econômicos, sociais e culturais. Consultor Jurídico. Acesso em 26 de agosto, 2002, em http://www.conjur.com.br/2002-ago-26/direitos_economicos_ sociais_culturais_desafios Rabenhorst, E. R. Teoria do direito e teoria dos direitos humanos. Em: Tosi, G. (Org.). Direitos Humanos: história, teoria e prática. João Pessoa: Editora Universitária/UFPB, 2005. Sader, E. (1988). Quando novos personagens entraram em cena: experiências, falas e lutas dos trabalhadores da Grande São Paulo, 1970-80. Rio de Janeiro: Paz e Terra. Spink, M. J. & Spink, P. (2007). A psicologia social na atualidade. Em: Jacó- Vilela, A. M. & Ferreira, A. A. L. & Portugal, F. T. (Orgs.). História da Psicologia: rumos e percursos. (2ª ed.). Rio de Janeiro: Nau. Torraca de Brito, L. M. (1999). Temas de Psicologia Jurídica. Rio de Janeiro: Relume Dumará.