Docsity
Docsity

Prepare-se para as provas
Prepare-se para as provas

Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity


Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos para baixar

Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium


Guias e Dicas
Guias e Dicas

Etica e Filosofia Moral: Conceitos, História e Aplicação, Notas de estudo de Ética

Este texto aborda os objetivos de um trabalho sobre ética e moral, incluindo a elucidação de conceitos, história de grandes filosofias morais, aplicação prática e a importância de grandes autores. Discutem-se as ideias gregas, aristotélicas, cristãs, platônicas, agostinianas, tomistas e cartesianas, além da perspectiva de spinoza, hume e schopenhauer. O papel de deus, a natureza do homem e a relação com a natureza e outros seres também são abordados.

O que você vai aprender

  • Como as ideias morais se relacionam com a natureza e outros seres?
  • Quais são os principais conceitos de ética e moral?
  • Qual é a importância de Deus na ética e moral?
  • Como aplicamos as ideias morais em nossas vidas?
  • Quais são as principais filosofias morais e quais são as ideias de seus fundadores?

Tipologia: Notas de estudo

2022

Compartilhado em 07/11/2022

usuário desconhecido
usuário desconhecido 🇧🇷

4.5

(402)

853 documentos

1 / 28

Toggle sidebar

Esta página não é visível na pré-visualização

Não perca as partes importantes!

bg1
PRINCÍPIOS BÁSICOS DE ÉTICA
Henrique Breviglieri
RESUMO: O presente trabalho coloca em tela alguns dos diversos sistemas
teórico-filosóficos que tratam do tema “ética”. A ética é uma disciplina que
aplica o método filosófico ao estudo dos diversos pressupostos e atitudes que
que precedem o comportamento social dos indivíduos. A esse conjunto de
valores, princípios, normas, proibições e permissões formados socialmente e
internalizados pelo sujeito, que orientam sua conduta, é dado o nome de
“moral” objeto de estudo da ética, por excelência. Como principais objetivos
desse trabalho estão: a elucidação dos conceitos de ética e moral, bem como
suas respectivas distinções e apropriadas aplicações; o resumo das principais
filosofias morais forjadas por grandes expoentes da história da filosofia; o
apontamento das mudanças em relação às finalidades das filosofias morais
descritas; a demonstração da importância dos grandes autores da filosofia e de
seus constructos teóricos no concernente à influência que ressoa sob o
comportamento dos indivíduos em suas vidas cotidianas e em suas tomadas
de decisões perante as exigências de deliberação e ação. Como método para o
alcance dos objetivos ressaltados fora utilizada uma revisão bibliográfica a
respeito do tema, realizada pela leitura e interpretação de fontes primárias e
secundárias, procurando sempre associar os diversos conceitos, juízos e
raciocínios analisados. O empreendimento para a concretização desse trabalho
deu-se pela vontade do autor de sistematizar as diversas doutrinas filosóficas
que tiveram a ética como seu objeto de estudo, almejando, ao final, esclarecer
os caminhos histórico-filosóficos que esse objeto trilhou até os tempos
hodiernos. Após a sua conclusão, o autor conseguiu vislumbrar o alcance
dessa nobre disciplina bem como a ampla variedade de suas concepções e
juízos e sua influência sob o comportamento humano. A ação (prática) humana
nunca é desprendida de uma deliberação (teoria) e somente com a
compreensão desses julgamentos a respeito da melhor maneira de agir
perante as diversas situações que se apresentam diante do indivíduo é
possível compreender, de modo rigoroso, a sua conduta.
Palavras-Chave: Filosofia; Ética; Moral; História.
1. Introdução
Todos os indivíduos possuem princípios, valores e normas
internalizadas que regem as suas ações frente a diversas situações.
Chamamos de moral esse conjunto de atitudes internalizadas que subjaz o
comportamento dos indivíduos. A ética é uma disciplina que aplica o método
crítico e reflexivo, próprio da filosofia, ao estudo da moral.
É importante ressaltar que a moral não é constante para todos os
sujeitos e todas as culturas, as normas e valores estão em constante
transformação no tempo e no espaço. Desse modo, aquilo que parece “correto”
para uma sociedade, não é da mesma maneira para outra, e assim se procede
pf3
pf4
pf5
pf8
pf9
pfa
pfd
pfe
pff
pf12
pf13
pf14
pf15
pf16
pf17
pf18
pf19
pf1a
pf1b
pf1c

Pré-visualização parcial do texto

Baixe Etica e Filosofia Moral: Conceitos, História e Aplicação e outras Notas de estudo em PDF para Ética, somente na Docsity!

PRINCÍPIOS BÁSICOS DE ÉTICA

Henrique Breviglieri RESUMO: O presente trabalho coloca em tela alguns dos diversos sistemas teórico-filosóficos que tratam do tema “ética”. A ética é uma disciplina que aplica o método filosófico ao estudo dos diversos pressupostos e atitudes que que precedem o comportamento social dos indivíduos. A esse conjunto de valores, princípios, normas, proibições e permissões formados socialmente e internalizados pelo sujeito, que orientam sua conduta, é dado o nome de “moral” – objeto de estudo da ética, por excelência. Como principais objetivos desse trabalho estão: a elucidação dos conceitos de ética e moral, bem como suas respectivas distinções e apropriadas aplicações; o resumo das principais filosofias morais forjadas por grandes expoentes da história da filosofia; o apontamento das mudanças em relação às finalidades das filosofias morais descritas; a demonstração da importância dos grandes autores da filosofia e de seus constructos teóricos no concernente à influência que ressoa sob o comportamento dos indivíduos em suas vidas cotidianas e em suas tomadas de decisões perante as exigências de deliberação e ação. Como método para o alcance dos objetivos ressaltados fora utilizada uma revisão bibliográfica a respeito do tema, realizada pela leitura e interpretação de fontes primárias e secundárias, procurando sempre associar os diversos conceitos, juízos e raciocínios analisados. O empreendimento para a concretização desse trabalho deu-se pela vontade do autor de sistematizar as diversas doutrinas filosóficas que tiveram a ética como seu objeto de estudo, almejando, ao final, esclarecer os caminhos histórico-filosóficos que esse objeto trilhou até os tempos hodiernos. Após a sua conclusão, o autor conseguiu vislumbrar o alcance dessa nobre disciplina bem como a ampla variedade de suas concepções e juízos e sua influência sob o comportamento humano. A ação (prática) humana nunca é desprendida de uma deliberação (teoria) e somente com a compreensão desses julgamentos a respeito da melhor maneira de agir perante as diversas situações que se apresentam diante do indivíduo é possível compreender, de modo rigoroso, a sua conduta.

Palavras-Chave: Filosofia; Ética; Moral; História.

1. Introdução Todos os indivíduos possuem princípios, valores e normas internalizadas que regem as suas ações frente a diversas situações. Chamamos de moral esse conjunto de atitudes internalizadas que subjaz o comportamento dos indivíduos. A ética é uma disciplina que aplica o método crítico e reflexivo, próprio da filosofia, ao estudo da moral. É importante ressaltar que a moral não é constante para todos os sujeitos e todas as culturas, as normas e valores estão em constante transformação no tempo e no espaço. Desse modo, aquilo que parece “correto” para uma sociedade, não é da mesma maneira para outra, e assim se procede

para todos os outros conceitos fundamentais na investigação ética: “bom e ruim”, “bem e mal”, “justo e injusto”. A moral é, antes de tudo, construção social que orienta a conduta dos indivíduos através de princípios, regras, valores, proibições, permissões. É um conjunto de conteúdos (teóricos) que precedem a ação (prática) (ACHA; PIVA, 2013). Apesar de os indivíduos internalizarem os valores, princípios e normas da cultura dos grupos e instituições sociais aos quais pertencem, a moral também é variável no nível intersubjetivo, mesmo em uma mesma cultura. Dessa maneira, dois indivíduos criados em uma mesma família, por exemplo, podem ter princípios e condutas completamente discrepantes. Finalmente, Donzelli (2016) ajuda-nos com uma distinção conceitual importante no que concerne às noções de “ética” e “moral”. A moral é generalista, prescrevendo códigos de conduta rígidos, gerais, inflexíveis e intransponíveis aos indivíduos, não avaliando o contexto ou as circunstâncias que exigem a ação do sujeito. A ética, por sua vez, avalia as situações singularmente, não generalizando normas e valores a todos os contextos, mas indicando a reflexão crítica para o melhor modo de agir perante cada tomada de decisão imposta ao sujeito. O psicólogo contemporâneo Lawrence Kohlberg (apud CHAUÍ, 2012) aponta exemplos de “Dilemas” que nos levam a questionar as generalizações morais. Roubar parece ser proibido e repugnado veementemente em nossa cultura, por exemplo, mas roubar um medicamento de uma farmácia para salvar a vida do seu filho pode nos parecer louvável e digno de elogio. Destarte, no âmbito moral, o ato de roubar estaria fora de cogitação em qualquer contexto, mas na reflexão ética, como foi demonstrado, as circunstâncias singulares podem modificar essa prescrição. Não é meu objetivo estudar, através desse texto, todos os códigos morais que perpassaram as diversas sociedades e civilizações humanas ao longo do tempo, mas sim, apontar alguns conceitos e juízos norteadores da filosofia ética de alguns autores que se dedicaram a essa matéria.

2.Percorrendo a História da Ética 2.1 Mitologia grega Na concepção ética mitológica grega, haveria sempre “o lugar do homem no Universo”, portanto, o indivíduo não possuiria liberdade para

identificou o conhecimento com a virtude e a ignorância com o vício de maneira que, se o indivíduo age mal, age dessa maneira por falta de conhecimento do Bem. Ademais, Sócrates também vislumbrou a necessidade de estabelecer as virtudes verdadeiras (universais e não-convencionadas) e distingui-las das virtudes aparentes (convencionadas e particulares), pois as virtudes existem como ideais ou formas puras, verdadeiras, essenciais, universais e imutáveis (ACHA; PIVA, 2013).

2.4 Platão Através da “Teoria das Ideias ou Formas”, Platão considerou dois mundos distintos: “Mundo Sensível” e “Mundo Inteligível”. O Mundo Sensível era concebido como o mundo físico, da matéria e dos dados sensíveis, imperfeitos, mutáveis e finitos. De maneira distinta, o Mundo Inteligível era o universo ideal, das ideias e formas inteligíveis e suprassensíveis que, por assim serem, eram perfeitas, essenciais, imutáveis e eternas. As virtudes essenciais estariam localizadas no Mundo Inteligível, podendo ser alcançadas mediante o uso pleno da Razão e através do método dialético. Em sua principal obra, “A República” (2008), Platão configura mentalmente o Estado Ideal à procura de uma resposta para a indagação “o que é Justiça?”. O Estado justo pensado por Platão seria formado por três estratos em ordem hierárquica de poder: 1) Classe dos Magistrados ou Governantes, que teriam como principal virtude a sabedoria; 2) Classe dos Guerreiros ou Guardiões, possuidores da coragem como virtude sobressalente;

  1. Classe dos Trabalhadores (artíficies, lavradores, comerciantes, sapateiros etc), que teria como principal virtude a moderação. O Estado justo seria aquele em que, com cada cidadão desempenhando uma função adequada à sua natureza, a classe dos magistrados, com o auxílio dos guerreiros, governaria sob os trabalhadores das classes mais baixos. A injustiça estaria na inversão

ou desvirtuação dessa hierarquia ou pela não-execução por parte do indivíduo de sua função na divisão social do trabalho adequado às suas aptidões inatas. Em analogia ao estado ideal, a alma humana também seria dividida em três partes com a seguinte ordem hierárquica de dominação: 1) Alma Racional – assim como a Classe dos Magistrados no Estado, é responsável pela inteligência, pela governância e pela deliberação na alma humana. Também de maneira idêntica à Classe dos Magistrados, sua principal virtude é sabedoria; 2) Alma Irascível – análoga à Classe dos Guerreiros, é responsável pela defesa da alma humana. Como os guerreiros no Estado, é detentora da coragem na alma; 3) Alma Concupiscente – correspondendo à Classe dos Trabalhadores no Estado Ideal, é a fonte de todos os desejos na alma humana. Sua principal virtude, como era para os trabalhadores, é a temperança/moderação. Da mesma maneira em que um estado justo seria definido pela manutenção da hierarquia de dominação entre classes e o estado injusto por sua corrupção, o homem justo também deveria possuir mantida a relação hierárquica das partes descritas de sua alma, possuindo cada uma das virtudes correspondentes a essas partes. A ética platônica visa, como fim último, a felicidade. No seu cerne está a “Ideia de Bem” ou o “Sumo Bem”, ou seja, a forma perfeita, essencial, eterna e imutável do Bem, que deveria ser alcançada no Mundo das Ideais mediante o uso da razão e da dialética (PLATÃO, 2008).

2.5 Aristóteles Aristóteles discorda do Idealismo ou “Mundo das Ideias” de seu mestre Platão. Para o estagirita, tudo na natureza tem uma finalidade que contribui para o funcionamento do Cosmos, e o Homem também tem seu papel dentro da natureza, o que legitima o poder, a dominação e a desigualdade de funções. Assim como em Platão, Aristóteles considera o fim último da ação humana a felicidade. O fim de toda a trajetória do sujeito estaria no alcance do estado de felicidade supremo (Eudaimonia). A noção de “Bem”, na Ética Aristotélica, identifica-se com a felicidade. Dessa maneira,

aos deuses; 3) autossuficiência; 4) resistência interna para suportar os golpes do destino; 5) desfrute dos prazeres simples e moderados; 6) liberdade (KRASTANOV, 2013). Sobre esse último pilar epicurista, a liberdade, essa noção ética baseia-se na doutrina do “movimento espontâneo” dos átomos formulada pelos epicuristas. Epicuro e seus discípulos aderiram parcialmente ao atomismo dos pré-socráticos Demócrito e Leucipo. Entretanto, diferente dos fundadores da doutrina que afirmavam o movimento passivo dos átomos, os epicuristas apontaram três tipos de movimentos atômicos: pelo peso dos átomos, pelo choque entre eles e o desvio espontâneo. Assim como aos átomos – substâncias primordiais do Universo – era possível desviar-se de suas trajetórias, o ser humano também poderia alterar seu percurso e recriar seu destino (KRASTANOV, 2013). Considerando a busca dos prazeres moderados e necessários, há uma divisão dos prazeres em: 1) naturais necessários (comer, dormir, beber, estar em boa companhia); 2) naturais desnecessários (comer muito, dormir em demasia); 3) não-naturais desnecessários (busca de glória, busca de títulos, busca de status). A ética epicurista visava a felicidade e a realização humana através desses prazeres simples e naturais possíveis ao homem.

2.7 Estoicismo A filosofia estóica possuía dois princípios fundamentais: matéria (princípio passivo) e logos (princípio ativo). O logos era um princípio de inteligência e razão universal que regia toda a matéria, o tempo e todos os fenômenos cósmicos. Dessa maneira, para os estóicos, a melhor maneira de agir era aceitar aquilo que foi ordenado pelo logos, pois isso não era passível de mudança, ou seja, aceitar o destino, não criar expectativas e não ser refém das paixões. A melhor forma de agir seria aquela a não se perturbar, não se preocupando com aquilo que não merece atenção e que possa causar desequilíbrio ao espírito, mantendo a resistência e o equilíbrio interno do espírito. Diferente dos epicuristas, os estóicos eram pautados por um rigorosismo moral bem mais acentuado, considerando a virtude como o único

bem e a perversão como o único mal. O determinismo e a conformidade às prescrições do destino (vinculados à doutrina da governância do logos ), a austeridade e a resignação são os principais aspectos da Ética Estóica (KRASTANOV, 2012; ACHA; PIVO, 2013).

2.8 Cristianismo A moral cristã privilegiava a liberdade para escolher entre o caminho do bem (Deus) ou do mal, visando todos os seres humanos como irmãos (fraternidade) e iguais. Cristo revolucionou os alicerces morais de seu tempo, sempre dando primazia ao ato de amor e caridade aos outros seres humanos. Viver para conhecer, servir e amar a Deus, sendo diretamente ou em seus “irmãos” era o eixo norteador dos ensinamentos cristãos. A Ética Cristã busca o ideal de uma vida espiritualizada baseada no amor e na fraternidade. Os imperativos e valores morais do cristianismo retiram do mundo terreno os fins últimos da conduta humana, elevando-os para um mundo sobrenatural, além de exteriorizar do Homem e do fenômeno humano o bem último, redirecionando-o a Deus. No Período Medieval, sob o feudalismo e o domínio ideológico, cultural e ético da Igreja Católica, as desigualdades explícitas em uma sociedade extremamente estratificada, hierarquizada e vertical, eram solucionadas pelos ideais ascetas da igualdade espiritual em um mundo idealizado (o Paraíso), e pela confiança na justiça suprema de Deus, governador máximo de todo o Universo, onipotente, onipresente e onisciente, razão e bondade soberana que imperaria sobre o mundo (VÁSQUEZ, 1990).

2.9 Santo Agostinho de Hipona A ética de Agostinho pode ser considerada a “cristianização” da ética platônica, considerando a notória influência da segunda sob a primeira. A ascensão ao Mundo das Ideias através da dialética em Platão transforma-se em elevação ao reino de Deus através da fé em Agostinho. A Ideia ou Forma Pura do Bem na filosofia platônica se identifica com Deus, como Bem

alcançada através de sua contemplação, como o bem e fim supremo subjetivo. O intelectualismo e o racionalismo na ética tomista, como vias de alcance de Deus, marcam, ainda mais, sua aproximação com a ética peripatética. Para Tomás de Aquino, a moral é uma ciência prática que dirige as ações do Homem à felicidade eterna no encontro com o Criador, no entanto, generalidades não são úteis a essa ciência, para Aquino, deve-se levar em conta, acima de tudo, as particularidades de cada situação, evitando determinar as normas ou princípios universais regentes de toda ação independentes dos sujeitos e dos objetos. Por fim, a ética tomista afirma que as ações devem estar em concordância com as leis da natureza – derivadas da lei eterna de Deus – que são comuns a todos os povos.

2.11 Maquiavel A obra mais famosa de Maquiavel é “O Príncipe” (MACHIAVELLI, 2012), um livro que indica como um governante deve agir. Essa obra faz uma cisão entre a ética cristã e a ética política. Para a primeira é necessário sempre fazer o bem (de acordo com os valores cristãos), não importando o contexto, pois assim o indivíduo alcançará a salvação da alma. Na visão de Maquiavel, para ser um bom governante é necessário ser mal quando necessário, podendo ser mentiroso, ser cruel, utilizar máscaras, fazer falsas promessas, roubar, matar entre outros atos negados pela moral tradicional cristã. Todos esses atos negativos seriam justificados quando fossem praticados pelo bem da cidade ou para a manutenção no poder.

Maquiavel faz, definitivamente, a cisão entre a ação virtuosa nas esferas pública e privada. Na vida privada, os valores cristão ainda prevaleciam sob a conduta do indivíduo, entretanto, na vida pública ou política fazia-se necessário que houvesse a corrupção desses valores em prol de fins direcionados à boa gestão pública e ao poder. Essa divisão refletiu na mentalidade de diversos governantes e homens públicos na história e continua ecoando na atualidade.

2.12 Descartes e Moral Provisória Por achar que a ocupação com a preocupação ética tomaria tempo de sua busca pela verdade e por uma maneira segura de se conhecer, aliado à consideração de Descartes de que na vida prática, de maneira oposta às especulações teóricas, deve-se adotar uma postura resoluta e pouco indagadora, uma vez que a experiência cotidiana exige decisões rápidas, o filósofo francês resolveu assumir uma postura baseada em valores provisórios ao invés de refletir e criar sua própria filosofia moral. Sua postura prática era baseada em quatro princípios máximos: 1) seguir as normas, leis e costumes de sua nação e seguir a religião em que Deus lhe permitira ser educado desde sua infância; 2) ser o mais firme e resoluto o possível em suas decisões (opondo-se ao campo das ciências teóricas em que a dúvida e a irresolução seriam princípios fundantes), não se arrependendo de suas ações como fazem “os espíritos mais fracos”; 3) procurar vencer seus próprios desejos e paixões, adotando uma postura moderada e conformada (aqui nota-se a nítida influência da filosofia estoica na moral cartesiana); 4) cultivar aquela atividade da qual já vinha cultivando desde a sua infância, ou seja, o exercício da razão e da ciência. (DESCARTES, 2001).

2.13 Spinoza

Substância) e desvelando os seus afetos, permitindo à mente agir (DONZELLI, 2016; SPINOZA, 2016). Portanto, segundo essa concepção epistemológica, o homem não é livre nos dois primeiros gêneros de conhecimento, pois no primeiro ele apenas sente os efeitos dos encontros, no segundo ele já consegue descrevê-los e explica-los racionalmente, mas somente no terceiro ele conseguirá agir de maneira a transformar sua vida, pois desvendará a natureza dos seus afetos e paixões, o que caracteriza o caminho para a liberdade.

2.14 David Hume Representante da corrente empirista britânica, David Hume não segue a tendência utilitarista predominante na atitude filosófica moral dos outros empiristas, tampouco elege a razão como sendo a faculdade prevalecente na elaboração de juízos morais, o escocês atenta-se à dimensão emotiva dos sujeitos para considerar a elaboração dos juízos morais. Para Hume, todos os indivíduos possuem em sua alma uma “capacidade emotiva”, que lhes permite elogiar e enaltecer determinadas ações e avaliar negativamente e desaprovar outras. Essa capacidade traduz-se em uma percepção moral que, semelhante à percepção sensorial, apreende as ações de forma imediata, qualificando-as como boas ou ruins, desejáveis ou indesejáveis, dignas de elogio ou de repúdio. Desse modo, quando algum indivíduo age, desperta nos outros essa avaliação realizada não pela razão, mas pela percepção emotiva. O fundamento da moral de Hume é a motivação. Uma ação virtuosa só pode ser considerada tal quando possuir um motivo virtuoso. Nossa percepção moral consegue apreender os motivos e quando estes são virtuosos, assim nossa percepção os qualifica. Portanto, para o empirista

escocês, a virtude é consequência do motivo virtuoso e a boa ação é originada por um bom motivo (DONZELLI, 2016). Hume também divide as virtudes em “naturais” e “artificiais”, sendo as primeiras aquelas que recebem aprovação de modo inato na avaliação sob o crivo emocional dos avaliadores e as segundas resultantes das convenções sociais (HUME, 2009).

2.15 Utilitarismo (Jeremy Bentham e John Stuart Mill) Para os pensadores dessa escola de pensamento britânica, preconizando Jeremy Bentham, James Mill e John Stuart Mill, a virtude identifica-se com a obtenção do prazer e a evitação da dor; esse fundamento fica elucidado na famosa frase de Jeremy Bentham: “o homem é virtuoso e feliz quando, com um minimum de dores, se assegura um maximum de prazeres” (apud Franca S.J., 1967, p.62). Entretanto, para os utilitaristas essa busca pela felicidade e pelo prazer deve ocorrer visando o bem do maior número de pessoas. Uma boa ação deve, sobremaneira, perseguir o bem coletivo, o bem da maioria (como ocorreria em regimes autenticamente democráticos e republicanos igualitários), gerando o maior prazer ao maior contingente de pessoas.

2.16 Iluminismo Os autores iluministas defendiam a valorização da liberdade e da autonomia individual. O Homem deveria ter autonomia, autodeterminação e liberdade para agir conforme a sua deliberação e a sua razão apontassem. Essa mentalidade liberalista é refletida na esfera política, em que as críticas ao regime monárquico absolutista sustentaram uma proposta republicana e liberalista no âmbito político-econômico. Ademais, as críticas ao dogmatismo clerical cercearam a apologia à razão e ao progresso científico realizado pelos iluministas. No âmbito estritamente moral, os iluministas, em sua grande maioria, aderiram ao utilitarismo.

2.17 Kant

dentro de uma proposição hipotética condicional (“se eu agir do modo x, então terei como consequência y”). Sendo assim, os imperativos hipotéticos estariam submetidos a situações individuais específicas. De maneira oposta, os imperativos categóricos seriam universais, incondicionados, incontingentes e estariam submetidos ao fundamento do dever (“devo agir tal como x, independentemente de qualquer consequência). Desse modo, os imperativos categóricos estariam para o comportamento e para a Razão Prática assim como os juízos sintéticos a priori estariam para o conhecimento e para a Razão Teórica, ou seja, ambos são os direcionamentos universais e essenciais da Razão e do comportamento. Os dois principais imperativos categóricos kantianos são: 1) erigir a sua ação como norma universal – “Age de tal modo que a máxima de tua vontade possa sempre valer ao mesmo tempo como princípio de uma legislação universal” (KANT, 2015, p.63); 2) tomar os homens sempre como fim, nunca como meio (KANT, 2015; DONZELLI, 2016). Kant trabalha os conceitos de autonomia e heteronomia, sendo a primeira a caracterização daquilo que o homem consegue fazer por deliberação própria, através de um movimento livre de sua razão, e o segundo como tudo que o indivíduo executa por coerção externa, daquilo que ele não próprio criou ou deliberou sobre. Por fim, Kant distingue os conceitos de “máxima” e “lei”. A máxima é formulada subjetivamente e, por assim ser, sujeita-se ao parecer individual. A Lei, por outro lado, é objetiva e está contida na Razão, impondo-se a todos os seres racionais de modo indistinto, isto é, universal (KANT, 2015).

2.18 Rousseau Com a convicção de que o Homem é essencialmente bom, mas a sociedade o corrompe (“Mito do Bom Selvagem”), Rousseau pensa a melhor maneira de agir como a conduta primitiva e sentimental, fora dos preceitos morais criados pela socialização e pela racionalização. Dentre as principais virtudes ressaltadas por Rousseau está aquela que o

autor francês apontou como predominante na natureza humana: a compaixão ou piedade. Em sua posição ética, Rousseau defende que os atos se justificam pelos sentimentos de quem os comete. Rousseau traz como ideal de sociedade um lugar onde as pessoas deixam de pensar individualmente e começam a pensar no “Bem Comum” - uma sociedade justa, igualitária. Os sentimentos naturais do “bom selvagem”, como a amabilidade, a compaixão, a piedade e a sinceridade deveriam sobressair-se sob os valores arraigados em uma civilização que forjou as desigualdades e as injustiças entre os homens. Para isso, faz-se necessária uma mudança paradigmática na educação, em que a práxis pedagógica deixe de pautar-se por preceitos arraigados pela civilização e permita o desenvolvimento natural e pouco influenciado do educando. O papel do educador é ser um instrutor que permita a liberdade ao educando para que essa possa se desenvolver seguindo a ordem natural (CRESPO, BOTELHO & KRASTANOV, 2016).

2.19 Hegel O ideal ético, para Hegel, estaria em um estado livre, um estado de direito que garantisse a liberdade individual das pessoas e as cobrassem por seus deveres. A liberdade se construiria na consciência e nas estruturas, visando essa “tomada de consciência” como fundamental à liberdade. O Estado seria um “harmonizador universal” e funcionaria como garantia de liberdade aos seus indivíduos (VALLS, 2008). Dentro do movimento dialético, fundamental a todos os âmbitos da filosofia de Hegel, o estado prussiano seria a síntese ou o “espírito absoluto”, fim do movimento dialética da história (RUSSELL, 2013).

2.20 Schopenhauer O filósofo alemão Arthur Schopenhauer pode ser considerado um dos precursores do pós-modernismo por sua desconfiança na supremacia da

Nietzsche (1844-1900) é um filósofo alemão que veio para desconstruir o constructo de ideias que o pensamento e as sociedades humanas ocidentais haviam criado. Ele criticou os preceitos e os valores morais que a humanidade se baseava. Nietzsche propõe uma transmutação dos valores tradicionais, questionando os conceitos vigentes na sociedade, como os de “bem e mal”, “bom e ruim”, “belo e feio”, “justo e injusto”. Nietzsche não procura criar um sistema teórico, sua filosofia serve como um instrumento para questionar as verdades e convicções que as sociedades humanas criaram. Inspirado pelo Romantismo Alemão e pela filosofia de Schopenhauer, ele questiona a Razão e valoriza as aspirações do Homem, seus instintos, seus prazeres. Além disso, ele irá questionar essa racionalidade que coloca o ser humano como magnânimo diante do mundo, dominando a natureza e os outros seres humanos, criando diversas regras para reger seu comportamento. A esse desejo de dominação Nietzsche denomina de “Vontade de Potência”. Esse conceito é uma expansão do conceito de “Vontade” forjado por Schopenhauer, no entanto, diferencia-se deste por seu caráter expansivo, ampliativo e sedento por poder. Para o autor, o Universo é regido por “Forças Ativas” e “Forças Reativas”. As Forças Ativas são manifestações de desejo genuínos e possuem existência independentes de qualquer outro objeto. As Forças Reativas, de modo contrário, existem para se opor e contrariar uma Força Ativa, dependendo de tal para seu surgimento. Todos nós somos movidos por forças ativas e reativas, visto que elas sempre surgem juntamente com seu par antagônico. O forte é prevalentemente movido por forças ativas. O fraco é movido por forças reativas. A moral, da forma que conhecemos segundo a tradição, para Nietzsche, é o triunfo das forças reativas sob as ativas. Na obra “O Nascimento da Tragédia”, Nietzsche questiona essa tentativa humana de organizar o caos, transformar a realidade em algo belo e

ordenado, não aceitando a presença da fatalidade, da desorganização, do acaso e da transitoriedade. Nietzsche representa nosso espírito e nossa existência divididos em duas partes, análogas a dois deuses da Mitologia Grega: Apolo e Dionísio. O “Espírito Apolíneo” é o representante da ordem, da razão, da medida, do equilíbrio, da serenidade e da austeridade. O “Espírito Dionisíaco” representa a emoção, o caos, a desmesura, o excesso, a paixão, o entusiasmo e o transe. Para o filósofo alemão, a realização da existência, manifestada na Tragédia Grega, é a síntese entre esses dois princípios, o da harmonia apolínea e o do êxtase dionisíaco, confluindo numa manifestação que contém aspectos de ambos e realizando-se em potências de vida e de morte. No concernente ao conhecido conceito de “Niilismo”, em sua forma usual, ele era tido negação de valores transcendentes que funcionam como critérios reguladores da conduta. O niilista de Nietzsche, por sua vez, é aquele que possui valores transcendentais e age de acordo com eles, adorando mundos e entidades que extrapolam o plano da imanência. Para Nietzsche, esse niilista nega o "mundo da vida" e vive na busca de um mundo idealizado (contrário do Niilismo comum). Segundo o autor, “o Homem prefere adorar o Nada a nada adorar” (NIETZSCHE, 2009). O Nada, na concepção do autor, seriam os mundos idealizados e os seres superiores que fazem o Homem negar a vida, o imanente, e adorar o transcendente, como ocorre no Platonismo, no Cristianismo e no Marxismo, em que “Mundo das Ideias”, “Paraíso” e “Sociedade sem classes” são ideais de busca e realização que revelam as falhas e fragilidades do “aqui agora”. A Filosofia Nietzscheana é muitas vezes chamada de “Filosofia do Martelo”, pois o autor desconstrói modelos ideais e constructos transcendentais que chamou de “Ídolos” - modos de inibição da liberdade de pensamento do ser humano e de escravização de suas vidas em prol da adoração de idealizações. A famigerada e mal compreendida “morte dos deuses” (“Deus está morto”) representa o fim da estrutura religiosa-metafísica do pensamento, modo que se baseava na convicção da superioridade do transcendente sob o imanente. Para Nietzsche, a “morte de Deus” representa o fim do modo religioso de existência ao qual se dedicaram os povos antigos, medievos e modernos. O despontar do Racionalismo e do Cientificismo na