









Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity
Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium
Prepare-se para as provas
Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity
Prepare-se para as provas com trabalhos de outros alunos como você, aqui na Docsity
Os melhores documentos à venda: Trabalhos de alunos formados
Prepare-se com as videoaulas e exercícios resolvidos criados a partir da grade da sua Universidade
Responda perguntas de provas passadas e avalie sua preparação.
Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium
Comunidade
Peça ajuda à comunidade e tire suas dúvidas relacionadas ao estudo
Descubra as melhores universidades em seu país de acordo com os usuários da Docsity
Guias grátis
Baixe gratuitamente nossos guias de estudo, métodos para diminuir a ansiedade, dicas de TCC preparadas pelos professores da Docsity
Uma análise do evangelho de mateus, com ênfase na perícope que condensa a característica fundamental da nova comunidade: o desprendimento dos bens materiais. O autor examina a autoria do evangelho, a formação da comunidade cristã e a importância do estilo de vida alternativo que jesus desejava instaurar. O documento oferece uma interpretação teológica para o evento da destruição do templo por roma e liga-o aos ditos que foram recolhidos sobre a vida de jesus.
Tipologia: Exercícios
1 / 15
Esta página não é visível na pré-visualização
Não perca as partes importantes!
Faculdade Dehoniana Bíblia IV: Marcos e Mateus Lucas Ferreira da Silva 01/06/
Análise da perícope Mateus 6,19- 21
Todo fiel que, após ser tocado em seu mais profundo íntimo pelas palavras de Jesus, deseja iniciar o seguimento do Senhor, deve ter por pressuposto estar adentrando em um processo que compreende uma mudança radical de sua vida. A sua mensagem não é simples e, por isso, exige de cada indivíduo estar disponível para um desprendimento total de tudo aquilo que possui a fim de, descentrando-se, configurar-se totalmente a Ele, assumindo como próprio o seu estilo de vida que é anunciado. Nesse sentido, as narrativas evangélicas possuem uma missão muito precisa ao nos deixar descrito em detalhes o programa de vida que Jesus deseja instaurar. Os textos sagrados, portanto, não têm a pretensão de serem apenas uma narrativa informativa de um acontecimento já passado, sem qualquer relevância normativa para a atualidade, mas está direcionado primordialmente para a formação ininterrupta da vida do discípulo que deseja assemelhar-se ao seu mestre.^1 Deste modo, no presente trabalho de estudo bibliográfico, com o auxílio didático das obras de grandes estudiosos da área bíblica, enveredar-nos-emos em uma preciosa perícope que, apesar de sua diminuta extensão, condensa uma característica fundamental a ser assumida pela nova comunidade, isto é, o desprendimento dos bens materiais. A perícope de Mt 6,19- 21 encontra-se na considerada Carta magna dos Evangelhos – Sermão da Montanha - e possui uma sentença que desafia profundamente cada um nós, ainda mais na sociedade contemporânea que se encontra repleta de comodidades, num espírito intensamente consumista que prega o enriquecimento como a grande meta da vida. Por isso, constatamos a grande relevância de se tratar a temática do relacionamento do cristão com o dinheiro, pois corremos o risco de esquecermos a ordem verdadeira dos valores e, assim, nos tornamos escravos de um acúmulo desenfreado enquanto alguns irmãos na fé necessitam do básico para viver. (^1) CARTER, Warren. O evangelho de São Mateus: comentário sociopolítico e religioso a partir das margens.
Uma coisa tenhamos por certo: nenhum texto está desvinculado do seu contexto de nascimento. Ainda que os Evangelhos sejam considerados escritos sagrados e inspirados, eles não foram diretamente enviados do céu, mas tiveram a colaboração formal de pessoas que o desenvolveram na história com os parâmetros próprios da sua estrutura pessoal e social. Os redatores, assim, não são instrumentos inertes que, tomados de um transe místico, escreveram aquilo que lhes era ditado por um possível espírito divino. Na verdade, toda a história que eles transcreveram possui, de certo modo, uma perspectiva que foi dada pela sua intencionalidade pessoal, trazendo aspectos da sua experiência e da sua cultura, visto que não é possível uma objetividade absoluta na descrição dos fatos. O escritor, claramente, não teve a pretensão de falsear a história e não o fez, contudo, em razão dos seus condicionamentos, somente consegue realizar o seu trabalho redacional pela única ótica que lhe era possível. Além disso, temos que levar em consideração que o redator, para cumprir a sua missão, tem que ter a preocupação se o público específico a que se dirige conseguirá compreender aquilo que ele ali descreve. Assim sendo, é fundamental termos presente, antes de tirarmos uma mensagem de uma perícope específica, os diversos fatores que se encontram subjacentes a formulação do texto em que nos dispomos a analisar, pois tais elementos interferem diretamente na compreensão do sentido amplo do texto: a autoralidade, o período de redação, o contexto cultural da comunidade destinatária a motivação da escrita. 2.1 Autoria Ainda que a tradição da Igreja, desde Papias de Hierápolis com Eusébio de Cesareia, tenha conferido a autoria desse relato evangélico ao apóstolo Mateus, diversos estudo nos últimos tempos nos impedem de realizar uma direta ligação entre ele e esse texto.^2 Como nos aponta, em relação a essa questão, Benito MARCONCINI, seria desnecessário, para uma testemunha ocular, o uso de qualquer tipo de fonte externa se ele fosse o verdadeiro autor de tal relato e, com grande probabilidade, a estruturação da narrativa estaria com uma ordenação diversa, além de que sentiríamos uma maior vivacidade afetiva nas palavras de Jesus.^3 Outro aspecto a ser notado é o fato de que discípulo, durante o transcurso do Evangelho, não possui nenhum papel de destaque que acentue a sua presença em alguns momentos fundamentais da (^2) Cf. BROWN, Raymon E., Introducción al Nuevo Testamento. 2002. p. 292- 293. (^3) Cf. MARCONCINI, Benito, Os Evangelhos Sinóticos. 2001. p. 121.
rejeição do povo escolhido ao envio de seu Filho Jesus. Assim, o evangelista realiza uma interpretação teológica para o evento da destruição do templo por Roma e liga-o aos ditos que foram recolhidos sobre a vida de Jesus. Vale lembrar, como exemplificação, a parábola do Rei e o banquete que é dado pelas núpcias do seu filho presente no início do capítulo 22.^7 Assim, levando essas questões em consideração, podemos conjecturar em datar a redação por volta dos anos 80 a 90 d.C., contudo sem qualquer tipo de certeza.^8 Em relação a localização de sua redação, a mais comum referência se faz com proeminência a Antioquia. Embora exista uma forte impregnação de conteúdos de tradições judaicas, poucos são os que apostam na tese de que se trate de um escrito de proveniência palestinense.^9 A aposta em relação a localização de Antioquia se faz devido alguns fatores que se encontram subjacentes ao texto e colocamos a seguir: a) o papel de relevância que o apóstolo Pedro possui em momentos cruciais da história narrada; b) A menção presente somente em Mt 4,24 de que a fama de Jesus se espalhava por toda a Síria e que está ausente na passagem fonte de Mc 1,28- 39 ; c) as amplas citações presentes nos escritos de Santo Inácio de Antioquia^10 ; d)Não existe provas de presença de sinagogas na galileia no primeiro séculos. Elas são uma realidade que tem sua origem entre os Judeus da diáspora.^11 Em suma, por mais que consideramos Antioquia como o local de redação, frente as diversas possibilidades com suas convincentes justificativas, não podemos fechar a questão plenamente. 2.3 Breve comentário Literário-teológico A formação de uma comunidade com as características deixadas pela mensagem de Jesus não foi algo que espontaneamente se desenvolveu após a sua Páscoa. Levando em consideração que muitos não tiveram contato com os eventos fundantes e nem puderam conviver com a pessoa de Jesus durante seu ministério público, era necessário desenvolver uma forma de anúncio que conseguisse manter o essencial para que as futuras gerações não se desviassem do estilo de vida que fora preconizado pelo Senhor. Nesse sentido, as narrações evangélicas dos ditos e feitos do Mestre não eram apenas um registro memorativo de acontecimentos marcantes, mas possuía uma intenção de deposito da identidade cristã fundamental. (^7) Cf. CARTER, Warren. 2002. p. 35- 36. (^8) Cf. Bíblia TEB : Notas integrais tradução ecumênica. 2020. p.1824. (^9) Cf. Ibidem. (^10) Cf. CARTER, Warren. 2002. p.34. (^11) MARQUES, Maria Antônia. “Deus conosco: o Messias da Justiça e da Misericórdia – uma introdução ao Evangelho de Mateus”, in Vida Pastoral (n. 298 ). 2014. p. 4.
Devemos considerar que, evidentemente, a comunidade não estava isolada do contato com as diversas culturas religiosas que lhe circundavam e, assim, corria-se um forte risco de assimilar estilos de comportamentos que fossem contrastantes com aqueles traçados pelo mestre, vale ressaltar que a sociedade greco-romana possuía como valor eminente a busca de acúmulo de riqueza, poder e prestígio social. Além disso, foram surgindo modos diversos de interpretação da mensagem e das práticas feitas de Jesus que iam gradativamente minando a harmonia interna e gerando alguns escândalos entre os fiéis mais ingênuos.^12 Deste modo, para evitar agravamentos que poderiam esfacelar a perpetuação do Evangelho, o hagiógrafo Mateus lança um projeto audacioso de redação textual que intencionava deixar expresso, por meio de uma narração dos ditos e feitos, os traços característicos fundamentais da Pessoa de Jesus que deveriam ser assumidos por todos aqueles que adentrassem na nova comunidade. Para ele, assim, o Evangelho lança um estilo de vida alternativo daquele ordenado pelo império que deve ser marcado por uma marginalidade voluntária, como elucida CARTER.^13 Em relação a isso, ao tomarmos as diversas perícopes com grande frequência encontramos elementos distintivos que manifestam esse estilo contrastante da nova comunidade e que podem ser condensados na experiência da pobreza de espírito (Mt 5,3): Jesus, por conseguinte, nasce em uma família pobre, seus discursos enfatizam a simplicidade e sempre se cerca de pessoas menos favorecidas que viviam à margem da sociedade de então. Tendo essa preocupação pela identidade da comunidade nascente, um dos interesses distintivos dessa narrativa, em comparação com os outros quatro evangelhos, é o tema da eclesialidade. Temos, por exemplo, no capítulo 18 um discurso que visiona traçar o modo como deve ser exercida a autoridade pelos dirigentes tendo como diretrizes o espírito de Cristo.^14 Podemos ser mais ousados e afirmar que, para o hagiógrafo, todo integrante da comunidade, principalmente os seus líderes, deve ter por inspiração de ação o modo próprio como o seu Senhor agia no trato com aqueles que o circundavam. Os exemplos contidos nesse capítulo auxiliam-nos a ter claro que o caminho da humildade é inegociável. Alguns elementos do texto nos levam a perceber uma familiaridade do autor com uma comunidade que tinha forte experiência com a tradição Judaica, pois a lei mosaica em alguns momentos é posta em um patamar de grande relevo e com validade indiscutível. Mas, também (^12) NAKANOSE, Shigeyuki. “Pois onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, ali estou no meio deles” (Mt 18,20), in Vida Pastoral (n.298). 2014. p. 34. (^13) Cf. CARTER, Warren. 2002. p. 72. (^14) Cf. BROWN, R. E., FITZMYER, J. A., MURPHY, R. E.. Novo Comentário Bíblico de São Jerônimo. 2011_._ vol. 2. p. 135.
19,1 – 25,46 Quinta parte: viagem e ministério em Jerusalém I. Narrativa combinada com muito diálogo: ensinamento, parábolas de julgamento, terceira predição da paixão, entrada em Jerusalém, purificação do templo, conflito com as autoridades (19,1 – 23,39) II. Discurso : Sermão Escatológico (24,1 – 25,46) 26,1 – 28,20 Clímax: Paixão, morte e ressurreição
1. Conspiração contra Jesus, Última Ceia (26,1-29) 2. Prisão, julgamentos judaico e romano, crucifixão, morte (26,30 – 27,56) 3. Sepultamento, vigilância do túmulo, abertura do túmulo, suborno dos guardas, aparições do ressuscitado (27,57 – 28,20) 2.4 Considerações Após essas colocações iniciais dos aspectos gerais da carta, percebemos o projeto autoral do hagiógrafo de delinear a identidade específica cristã, instituindo um estilo de vida para todo o seguidor do Senhor. Para tanto, ele não realiza um falseamento e nem inventa um manual de prescrições segundo os seus gostos ou princípios, mas coloca como referência basilar os ditos e ações do Mestre como realidades categóricas a serem assumidas por aqueles que fazem parte da comunidade. Não por acaso temos nessa redação, pela boca do próprio Jesus, o convide de assemelhar-se e aprender d’Ele que é manso e humilde de Coração. (Cf. Mt 11,29) O Senhor, pois, não somente impõem aos seus seguidores um radical modo próprio de viver, mas se mostra como o parâmetro possível de realização, portanto, não cobra dos seus seguidores nada do que já não tenha conseguido realizar. Como veremos na perícope que tomamos para análise, os padrões de valores propostos pelo Senhor são altos e desconcertantes, pois vão na contramão da busca mundana de riquezas e seguranças. Em suma, para o escritor sagrado, a vivência da pobreza é uma das marcas fundamentais do Mestre, sendo, assim, uma disposição fundamental que o permite realizar a sua missão com integridade.
A perícope que tomamos para análise se encontra posta, no conjunto da obra mateana, no primeiro discurso proferido por Jesus: o Sermão da Montanha. Este discurso possui um destaque proeminente por conter uma tonalidade programática e lançar as novas exigências do discipulado. Se outrora Moisés subiu ao monte para encontrar com Javé e receber diretamente dos céus as leis para a constituição do povo, agora o próprio Jesus se coloca no centro da cena e ensina ao povo o modo de fazer a vontade daquele que ele chama de Pai. Existe, pois uma renovação religiosa tanto comportamental como de relacionamento com Deus; e o hagiógrafo
faz questão de realizar um paralelismo do seu escrito com os fatos fundantes da história do povo de Israel.^17 No conjunto do sermão da montanha, a perícope está no terceiro bloco que trata sobre comportamentos no relacionamento com as pessoas e alguns aspectos do mundo. Mais especificamente ela encabeça o primeiro de três grupos de ditos sapienciais.^18 Levando em consideração a exposição de BERGER, por estar no conjunto do sermão da montanha e tendo em sua composição o uso de materiais diversos, ela pode ser enquadrada, de modo geral, num discurso de gênero protréptico visto que a intenção do discursista é convencer o seu ouvinte para o melhor caminho a ser seguido.^19 Em relação a sua estruturação, uma possível forma é considerando os termos iniciais que, por sua conotação própria, dão a tonalidade para o restante da frase. Percebemos, espontaneamente, que nas duas primeiras premissas, caso eles fossem retirados ou invertidos, o sentido da mensagem seria gravemente alterado e, portanto, inferimos que eles possuem uma indicação imprescindível para a reta comunicação do preceito evangélico. Vejamos abaixo, considerando tal observação, como optamos por fazê-la: a) Proposição Negativa : Não ajunteis para vós tesouros na Terra... (adverbio de negação) b) Proposição Indicativa : Mas ajuntei para vós tesouros no Céu... (conjunção adversativa) c) Proposição Temática-explicativa : Pois onde está o teu coração está o seu tesouro. (conjunção explicativa) 3.1 Quadro comparativo A prescrição sobre a relação do discípulo com os bens materiais que trabalhamos nesse trabalho tem seu correlato apenas no escrito de tradição Lucana. Não encontrá-la na redação de Marcos, demostra o uso de uma fonte diversa e própria de ambos os evangelistas. Apesar da correspondência do adágio final entre ambos, as premissas do discurso se estruturam de modo diverso. Segue abaixo um quadro comparativo entre as versões desse texto, onde conseguiremos notar mais claramente os pontos que os distinguem nos seus modos próprios de explanação do conteúdo. Notemos, por antecedência, que o evangelista Mateus realiza as suas premissas em uma contraposição de ações, enquanto Lucas se limita a uma direta prescrição.^20 (^17) GRILLI, Massimo; LANGER, Cordula. Comentario al evangelio de Mateo. 2012_._ p. 112. (^18) Cf. Ibidem. p. 171. (^19) BERGE, Klaus. As formas do Novo Testamento. 1994_._ p. 23. (^20) DATTLER, Frederico. Sinopse dos quatro evangelhos. 2020. p. 76.
ações negativas que nos ajudam a inferir o que se trada tais objetos, eles estão suscetíveis a serem destruídos pelo tempo ou mesmo de perdê-los para alguém que os roubem.^22 Assim, despender tanta energia para proteger e guardar coisas que por sua própria constituição estão condenadas a desaparecerem é um ato de insanidade. Nesse sentido, os nossos esforços não podem estar direcionados a colocar toda a preocupação naquilo que, ainda que pareça importante, não tem valor. Por isso, o hagiógrafo escolhe o termo entesourar, pois nos denota uma conotação de estima, ou seja, a nossa disposição interior perante tais realidades não podem exageradamente nos consumirem, pelo contrário, precisamos assumir uma atitude de indiferença que nos permita não turvar o nosso coração por temer perdê-los.^23 Outro aspecto relevante, considerando a realidade social da época de redação, é que a recomendação visa uma abertura interior que se materialize externamente na partilha dos próprios bens com os necessitados que fazem parte da comunidade. A intenção do evangelista é conscientizá-los que para a sobrevivência material do grupo era necessário que se vivesse um espírito fraterno de partilha que, por consequência, impediria que ambicionasse acúmulos para si. O Coração do discípulo deveria estar preparado a dar daquilo que possuía a fim de que os menos favorecidos pudessem ter uma vida digna.^24 É necessário, pois, haver uma unidade entre os seguidores de Jesus de modo que todos se sintam parte de uma mesma família sem constrangimentos desnecessários. (^20) θησαυρίζετε δὲ ὑμῖν θησαυροὺς ἐν οὐρανῷ, ὅπου οὔτε σὴς οὔτε βρῶσις ἀφανίζει καὶ ὅπου κλέπται οὐ διορύσσουσιν οὐδὲ κλέπτουσιν· Mas ajuntai para vós tesouros no céu, onde nem a traça, nem o caruncho corroem, e onde os ladrões não arrombam nem roubam; Uma leitura simplicista dessa promessa futura de um tesouro no céu que deve ser buscado, levou muitos estudiosos a uma concepção errada da mensagem evangélica. Chegou- se a afirmar que tratar-se-ia da fomentação de esperanças ilusórias de aquisição de recompensas em um mundo futuro para pessoas que não teriam a possibilidade, devido seu estado de pobreza, de conseguir as suas ambições terrenas satisfeitas. Assim, os cristãos seriam pessoas que frustradas em seus objetivos de conquista material, idealizaram uma possibilidade religiosa de amenizar o peso que a vida naturalmente lhes acarretava. No entanto, como vemos no discurso mateano, a questão se dá diversamente. Os cristãos não devem desprezar os bens materiais por (^22) FABRIS, Rinaldo; BARBAGLIO, Rinaldo. Os Evangelhos I. 2 014. p. 134. (^23) Cf. CARTER. Op. Cit. p.230. (^24) LIMA, Anderson de Oliveira. Acumulai Tesouros no Céu: estudo da linguagem econômica do evangelho de Mateus. p. 83.
frustração pessoal devido o seu estado de vida desfavorecido, mas verdadeiramente eles acreditam que os tesouros celestes são mais valiosos, visto serem indestrutíveis, do que os terrestres.^25 A linguagem sobre o tesouro era uma questão conhecida, naquela época, para a literatura sapiencial e se referia aquilo que há de maior valor aos olhos de Deus. O Discípulo, portanto, deveria buscar realizar e crescer nas obras que agradam a Deus, fazer a vontade do Senhor em sua vida cotidiana. O critério de valor, assim, está em uma escala diversa daquilo que comumente se realiza; agora, não se tem mais tanto destaque as conquistas que se fazem de bens materiais, de objetos externos que te colocam em uma posição de superioridade referente aos demais, pelo contrário, na vida da nova comunidade se destacam verdadeiramente aqueles que buscam adquirir os valores interiores que desenvolviam o caráter e tornava-os mais humildes e comunitários pela partilha dos seus bens.^26 (^21) ὅπου γάρ ἐστιν ὁ θησαυρός σου, ἐκεῖ ἔσται καὶ ἡ καρδία σου. Pois onde está o teu tesouro aí estará teu coração. Esse versículo final da perícope tem uma conotação explicativa de tudo aquilo que foi posto nos versículos precedentes e justifica o motivo de o discípulo ter de buscar proeminente
amado.”^28 Por isso, o nosso coração deve se dedicar àquilo que tem sentido de eternidade para gradativamente irmos nos transformando, novamente, à imagem e semelhança daquele que nos (^25) LIMA, Anderson de Oliveira. Acumulai Tesouros no Céu: estudo da linguagem econômica do evangelho de Mateus. 2010. p. 85. Disponível em http://tede.metodista.br/jspui/handle/tede/553#preview-link0. Acesso em 17/05/2023. (^26) FABRIS, Rinaldo; BARBAGLIO, Rinaldo. Os Evangelhos I. 2014. P. 134 - 135. (^27) CARTER, Warren. 2002. p. 231. (^28) JOÃO DA CRUZ. Obras completas. 2002. p. 148.
infiltrados” e realizam um malabarismo teológico para conseguirem ratificar as suas vontades, colocando-as como inferidas pelo próprio Jesus. Nessa linha, podemos constatar tantas pregações que se firmam numa certa teologia da prosperidade na qual supostamente Deus favorece economicamente os que fazem a sua vontade e, assim, proliferam-se cultos, orações e liturgias que mais se parecem com um mercado com ofertas de conquistas do que a reunião dos eleitos do Senhor que foram redimidos por sua Cruz. Para não se desviar do reto caminho, podemos nos recordar, novamente, daquela salutar indicação que o Papa Francisco nos lançou em sua primeira celebração eleito bispo de Roma em 2013. Naquele momento, ele nos disse que: “quando caminhamos sem a Cruz, edificamos sem a Cruz ou confessamos um Cristo sem Cruz, não somos discípulos do Senhor: somos mundanos, somos bispos, padres, cardeais, papas, mas não discípulos do Senhor.”^29 À vista disso, seria prudente por parte de todo Pastor que, antes de qualquer ação ou palavra que fosse proferida em nome do Senhor, visionasse o mistério Pascal de Cristo como parâmetro indispensável e conferisse se suas palavras está de acordo com tal realidade. Existem, pois, pregações muito bonitas, mas que não passam de um coaching barato e não o anúncio da verdade do Evangelho.
Por fim, consideremos que o seguimento da mensagem de Jesus, ainda que nos aponte um caminho de felicidades e belezas, possui uma grande exigência a ser realizada. O Senhor, por sua vez, convida-nos a mudarmos radicalmente o nosso comportamento e a formarmos em nós um estilo de vida modesto conforme aquele que Ele mesmo escolheu para si. O grande desafio que tal caminho traz é que ele não corresponde aos valores comumente assumidos pelo mundo e, assim, estaremos em uma constante tensão interior e mesmo exterior para conseguirmos viver em plenitude os preceitos que nos foram deixados por Ele. Será, por isso, a custa de muito sacrifício que precisaremos escolher renunciar ao acúmulo exagerado de bens materiais, ainda que nossa condição de vida o permita, para partilhar aquilo que temos com aqueles que mais necessitam e que formam conosco uma mesma família, pois o verdadeiro tesouro que o Cristão anseia possuir é aquele que se esconde no céu e, para tanto, ele necessita se desapegar de tudo aquilo que atrapalha tal realização. (^29) PAPA FRANCISCO. Homília com os cardeais de encerramento do conclave 2014. Disponível em: <Papahttps://www.vatican.va/content/francesco/pt/homilies/2013/documents/papa-francesco_20130314_omelia- cardinali.html>. Acesso em 25/05/2023.
Em suma, um discípulo do Senhor deve buscar imprescindivelmente um estilo de vida que priorize a sobriedade, o despojamento de tudo que seja supérfluo e a solidariedade efetiva com os pobres. Os preceitos evangélicos, por si, não são um ato exclusivo para as pessoas consagradas, mas é um convite feito a todos aqueles que foram batizados e, assim, se inseriram na comunidade cristã. Ou seja, ninguém pode se desculpar por viver em desacordo com aquilo que está expresso nas páginas do Evangelho. Outro aspecto a ser destacado é que um cristão que não se compromete a realizar qualquer tipo de trabalho social não vivencia a sua fé integralmente, porque um dos aspectos inerentes ao pertencimento ao povo de Deus é o sentimento de partilha.
BERGER, Klaus. As formas do Novo Testamento. São Paulo: Loyola, 1994_. Bíblia de Jerusalém._ São Paulo: Paulus, 2002. Ed. Rev. e Ampl. Bíblia NA28. Disponível em: <https://www.academicbible.com/en/onlinebibles/novumtestam entum-graece-na-28/readthebibletext/bibel/text/lesen/stelle/50/60001/69999/ch/225d2e2906ce 400afce5ae098d78ad1b/>. Acesso em 17/05/2023. Bíblia TEB , São Paulo: Loyola, 2020. BROWN, Raymon E.. Introducción al Nuevo Testamento: cuestiones preliminares, evangelios y obras conexas. Madrid: Editorial Trotta, 2002. _______, R. E.; FITZMYER, J. A.; MURPHY, R. E.. Novo Comentário Bíblico de São Jerônimo: Novo Testamento e Artigos Sistemáticos. São Paulo: Academia Cristã, Paulus, 2011. CARTER, Warren. O evangelho de São Mateus: comentário sociopolítico e religioso a partir das margens. São Paulo: Paulus, 2002. DATTLER, Frederico. Sinopse dos quatro evangelhos. São Paulo: Paulus, 2020. FABRIS, Rinaldo; BARBAGLIO, Giuseppe. Os Evangelhos I. São Paulo: Loyola, 2014.