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Guias e Dicas
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Análise da Trajetória Artístico-Social do Fundador da Orquestra e seu Contexto, Provas de Música

Este documento analisa a trajetória artística-social do fundador da orquestra, o compositor cergio prudencio, e suas relações eurocentrada e colonial / modernas. O autor faz referências a ideias de 'colonialidade do saber' e a relação música/colonialismo, além de discutir a música andina e folclórica como música popular. O texto também relata o taller de música da universidade católica boliviana e a contribuição de alberto villalpando na música acadêmica boliviana do século xx.

Tipologia: Provas

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Raimundo
Raimundo 🇧🇷

4.6

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
FACULDADE DE COMUNICAÇÃO E ARTES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM
ESTUDOS DE CULTURA CONTEMPORÂNEA
GLAUCOS LUIS FLORES MONTEIRO
ORQUESTA EXPERIMENTAL DE INSTRUMENTOS NATIVOS DE LA PAZ:
AMÁLGAMA DE BAMBU
Cuiabá MT
2019
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO FACULDADE DE COMUNICAÇÃO E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DE CULTURA CONTEMPORÂNEA GLAUCOS LUIS FLORES MONTEIRO ORQUESTA EXPERIMENTAL DE INSTRUMENTOS NATIVOS DE LA PAZ: AMÁLGAMA DE BAMBU Cuiabá – MT 2019

GLAUCOS LUIS FLORES MONTEIRO

ORQUESTA EXPERIMENTAL DE INSTRUMENTOS NATIVOS DE LA PAZ:

AMÁLGAMA DE BAMBU

Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Estudos de Cultura Contemporânea da Universidade Federal de Mato Grosso como requisito para a obtenção do título de Mestre em Estudos de Cultura Contemporânea na Área de Concentração Estudos Interdisciplinares de Cultura, Linha de Pesquisa Poéticas Contemporâneas. Orientadora: Profa. Dra. Teresinha Rodrigues Prada Soares Cuiabá - MT 2019

Dedicado à Pachamama tão permanentemente espoliada, que é a Mãe–Terra, a própria vida, tempo e espaço; mas também a Pacha que não é só a Terra em si, mas sim a simbolização de todo o ser vivo que nos cerca e que, por sua vez, é sistêmico, isto é, dá vida e recebe vida. Pacha é tudo e somos todos Pacha.

RESUMO

Esta pesquisa propõe examinar de uma forma interdisciplinar, o funcionamento de uma ensemble específica, a Orquesta Experimental de Instrumentos Nativos (sediada na cidade de La Paz, na Bolívia). Pretende analisar mais especificamente a trajetória artística-social do fundador dessa orquestra, o compositor Cergio Prudencio e suas relações com o pensamento decolonial – de acordo com as definições de Anibal Quijano, Walter Mignolo e outros. A fonte primária da pesquisa reside em uma etnografia iniciada em agosto de 2017, no Programa de Residencias de Composición 2017 , realizando intensas atividades junto à OEIN. A análise científica – que dialoga com autores como Coriun Aharonián, Cergio Prudencio, Juan Pablo González, Ximena Sologuren, entre outros – parte da interlocução do pensamento decolonial com as ideias de cosmovisão andina, da musicologia com a poética, para uma reflexão sobre educação e propostas musicológicas contemporâneas em nosso continente. Palavras chave : Decolonialidade; Música boliviana; Educação musical; Etnomusicologia; Interdisciplinaridade.

RESUMEN

Esta investigación propone examinar de una forma interdisciplinaria, el funcionamiento de un conjunto específico, la Orquesta Experimental de Instrumentos Nativos (con sede en la ciudad de La Paz, Bolivia). Pretende analizar más específicamente la trayectoria artística-social del fundador de la orquestra, el compositor Cergio Prudencio y sus relaciones con el pensamiento decolonial – en conformidad con las definiciones de Anibal Quijano, Walter Mignolo y otros. La fuente primaria de la investigación reside en una etnografía iniciada en agosto de 2017, en el Programa de Residencias de Composición 2017, realizando intensas actividades junto a la OEIN. El análisis científico – que dialoga con autores como Coriún Aharonián, Cergio Prudencio, Juan Pablo González, Ximena Sologuren, entre otros – parte de la interlocución del pensamiento decolonial con las ideas de cosmovisión andina, de la musicología con la poética, para una reflexión sobre educación y propuestas musicológicas contemporáneas en nuestro continente. Palabras clave : Decolonialidad; Música boliviana; Educación musical; Etnomusicología; Interdisciplinariedad.

LISTA DE FIGURAS

LINKS DE EXEMPLOS MUSICAIS

Afinação de siku Arca/Ira em sol (G) - https://www.youtube.com/watch?v=B75DSDPVrQE Sikuriada - https://www.youtube.com/watch?v=amKCiv8f7gk Tarkeada - https://www.youtube.com/watch?v=sM49LeGCOqg Mohoceñada - https://www.youtube.com/watch?v=0z_XLJ3lonc Notas de siku Arca/Ira - https://www.youtube.com/watch?v=Q4xpEhe4TlY Transcrição de Khantus - https://www.youtube.com/watch?v=B75DSDPVrQE Del Peabiru hasta Capaq Ñan - https://www.youtube.com/watch?v=38gD44jfhus&t=182s

SUMÁRIO

  • Figura 1. Pico do Huayna Potosi visto do Aeroporto Internacional de El Alto __________________________
  • Figura 2. Trânsito na Plaza del Estudiante, em La Paz _____________________________________________
  • Figura 3. Paja Brava ou Sikuyas ______________________________________________________________
  • Figura 4. Arquitetura Andina Cholets __________________________________________________________
  • Figura 5. Grafite de cholita ___________________________________________________________________
  • Figura 6. Bloqueio de uma rua no centro de La Paz _______________________________________________
  • Figura 7. Torre do Congresso Nacional e Fachada do Ministério das Relações Exteriores ________________
  • Figura 8. Manifestação política de Cholitas em La Paz ____________________________________________
  • Figura 9. Luzmila Carpio no lançamento de sua biografia em La Paz, 2017 ____________________________
  • Figura 10. La Paz com o nevado Illimani ao fundo ________________________________________________
  • Figura 11. Sikuris em frente à igreja de San Francisco ____________________________________________
  • Figura 12. Notas de um par de siku Arca/Ira afinado em sol ________________________________________
  • Figura 13. Tarka, Mohoceño e Pinkillo - flautas de bico - se tocam no jallupacha _______________________
  • Figura 14. Sikus e Quena - flautas sem bico - se tocam no awtipacha _________________________________
  • Figura 15. Mohoceñada - OEIN Juvenil C _______________________________________________________
  • Figura 16. Um músico callejero, uma cholita e um sikuri em La Paz __________________________________
  • Figura 17. Cergio Prudencio _________________________________________________________________
  • Figura 18. Coriún e Graciela _________________________________________________________________
  • Figura 19. Cergio Prudencio e OEIN ___________________________________________________________
  • Figura 20. Anúncio do Programa de Residencias en Composición 2017 _______________________________
  • Figura 21. Formatura do PIM - La Paz, Teatro Municipal - novembro 1999 ___________________________
  • Figura 22. “Trançando Toyos” _______________________________________________________________
  • Figura 23. Sikuriada de finalização do PRC 2017 _________________________________________________
  • Figura 24. Señorios aymaras _________________________________________________________________
  • Figura 25. Taller PIM de Alto Llojeta __________________________________________________________
  • Figura 26. ECOEIN - Divulgação de concerto em Colonia (Alemanha, 2017) __________________________
  • Figura 27. Convocatória para o PIM 2018 ______________________________________________________
  • Figura 28. OEIN Juveniles ___________________________________________________________________
  • Figura 29. Tarkeada - OEIN Juvenil B __________________________________________________________
  • Figura 30. Vicente Torres - luthier de aerófonos andinos ___________________________________________
  • Figura 31. Conjunto de sikus, quenas e percussão da OEIN _________________________________________
  • Figura 32. Afinações de sikus _________________________________________________________________
  • Figura 33. Notas de Arca/Ira na pauta _________________________________________________________
  • Figura 34. Notas de Arca/Ira no instrumento _____________________________________________________
  • Figura 35. Sincronicidade sonora num conjunto de Khantus ________________________________________
  • Figura 36. Transcrição de Khantus ____________________________________________________________
  • Figura 37 - Trecho de Sawatanaka (Alejandro Cardona) ___________________________________________
  • Figura 38 - La permanencia (Canela Palacios) __________________________________________________
  • Figura 39. Mapa do Caminho de Peabiru _______________________________________________________
  • Figura 40. Mapa do Peabiru até as nascentes do Pilcomayo ________________________________________
  • Figura 41. Isla de la Luna e picos nevados da Cordilheira Real vistos do Lago Titicaca _________________
  • Figura 42. Mapa da campanha Capac Ñan Patrimônio Mundial da UNESCO _________________________
  • Figura 43 - Vista do complexo de Tiwanaku – um dos centros do Capaq Ñan __________________________
  • Figura 44. Primeira versão da Guia principal da partitura. ________________________________________
  • Figura 45 - Guia geral da composição ________________________________________________________
  • Figura 46 - Trecho de Mborayu e Avati kyri ____________________________________________________
  • Figura 47 - Trecho de Mabaya-Guaicuru_______________________________________________________
  • Figura 48 - Trecho de Akapacha______________________________________________________________
  • Figura 49 - Trecho Jallupacha anata __________________________________________________________
  • Figura 50 - Trecho Mbaya-Guaicuru __________________________________________________________
  • Figura 51. Segunda versão da Guia (2019). _____________________________________________________
  • Figura 52. Família de sikus __________________________________________________________________
  • Figura 53. Família de tarkas e detalhes de flautas de bico _________________________________________
  • Figura 54. Família de Quenas e detalhes ______________________________________________________
  • Introdução
  • Capítulo 1 – Conhecendo as sikuyas
  • 1.1 La Paz – caldeirão cultural contemporâneo a orillas del Titicaca
  • 1.1.1 Conhecendo as sikuyas
  • 1.1.2 Arte, resistência e decolonialidade
  • 1.1.3 A relação Modernidade/Colonialidade..................................................................
  • 1.1.4 Cholitas y coca
  • 1.1.5 Línguas e ancestralidade em La Paz
  • 1.2 Música em Bolívia
  • 1.2.1 “A unidade é o par”...............................................................................................
  • 1.2.2 Musicologia boliviana............................................................................................
  • 1.3 Trajetória artística-social de Cergio Prudencio: um giro decolonial?
  • 1.3.1 Influências de Cergio Prudencio
  • 1.3.2 O “giro”?
  • Capítulo 2. – OEIN – Amálgama de bambu
  • 2.1 Histórico e atualidade da OEIN
  • 2.2 Elementos de Cosmovisão andina na OEIN
  • 2.3 Música nas alturas
  • 2.4 Corpos estáveis da OEIN
  • 2.5 Elementos da Organologia Andina observados na OEIN
  • 2.6 Sikus – variedade e complexidade dentro da OEIN
  • 2.7 Formas de representação musical na OEIN..................................................................
  • Capítulo 3 – Pontes de Bambú
  • 3.1 Gatilhos do processo de criação artística para uma ensemble de bambu
  • 3.2 Pontes de Bambu
  • 3.3 O Peabiru................................................................................................................
  • 3.4 El Capaq Ñan
  • 3.5 “Del Peabiru hasta Capaq Ñan”
  • Considerações transitórias
  • REFERÊNCIAS
  • Glossário

16 Aos poucos, esse rótulo (música andina) tão perigoso quanto qualquer outro, já abarcava sonoridades tão distintas quanto Mercedes Sosa (Argentina) e Tarancón (Brasil), do Inti-Illimani (chileno) ao León Gieco (argentino). Ouvia indistintamente músicas criollas como milongas e chacareras , também tarkeadas e sikuriadas^3 sem saber bem o que era aquilo, mas percebia que haviam diferenças enormes entre o som rural e o urbano. A vida seguiu seu curso normal e, paralelamente a uma graduação em Comunicação Social, acabei desenvolvendo toda uma carreira de professor de música; sempre atuando em escolas de música no ensino de instrumentos, regência de bandas marciais em municípios do interior do estado, trabalhos como músico “da noite”, desenvolvi a habilidade e o gosto por elaborar arranjos para coletivos musicais. O trabalho da OEIN especificamente, com um poderoso discurso musical, me foi apresentado pela professora Dra. Teresinha Prada, em uma conversa durante os intervalos da disciplina “Tópicos Especiais em Poéticas Contemporâneas II: Latinidade, Brasilidade e Música Contemporânea”, ministrada em 2016, no Programa de Pós-graduação em Cultura Contemporânea da Faculdade de Comunicação e Artes da UFMT (PPG-ECCO). Ao mesmo tempo, numa outra disciplina do PPG-ECCO, ministrada pelo professor Dr. José Carlos Leite, os textos dos autores decoloniais^4 me surgiram como uma proposta epistêmica extremamente atual e pertinente, neste tumultuado início de século, no tocante às reflexões político-filosóficas e até mesmo no permanente devir dos pensamentos artísticos. Dado esse pequeno prelúdio, preciso informar que o interesse pelo potente discurso sonoro da OEIN – da mesma maneira pelo discurso acadêmico de pensadores como Coriún Aharonián ou de Cergio Prudencio (musicólogos), Aníbal Quijano ou Walter Mignolo (teóricos decoloniais), sugerindo uma vívida resistência latino-americana contra as inúmeras imposições (culturais/econômicas/políticas, etc.) vindas “do norte” – foi imediato, me arremetendo para uma pesquisa de mestrado inicialmente intitulada “Orquestras de Instrumentos Nativos: Uma leitura interdisciplinar do tradicional e do contemporâneo em contextos de resistência”. (^3) Tipos de música autóctone executada de maneira coletiva dos andes. (^4) Pensamento Decolonial – entendido como o conjunto de ideias/propostas defendidas por acadêmicos e ativistas da América Latina, formuladas na desde a segunda metade do século XX, contou com a pesquisa interdisciplinar de nomes como Walter Mignolo, Enrique Dussel, Aníbal Quijano e outros. Além de fazer uma atualização crítica para tentar compreender a modernidade, também invoca uma epistemologia, um sujeito e um projeto político que questionam os modelos eurocentristas do conhecimento. (BALLESTRIN, 2013, p. 95).

17 Certamente que, assim como a realidade da OEIN tem se modificado constantemente, desde o início dos contatos ainda em 2016, o título inicial mudou, assim como a maneira de pensar diversos elementos culturais que foram tomando outras formas em minhas reflexões. Todavia, apesar de transformadas, algumas proposições se mantiveram em essência, por exemplo: a pesquisa propunha examinar, de forma interdisciplinar, influências do pensamento decolonial nos diferentes discursos da Orquesta Experimental de Instrumentos Nativos ; perceber a própria OEIN como fruto do giro decolonial de um artista/compositor/pensador boliviano – o maestro Cergio Prudencio, me pareceu mais objetivo e sensato. A pretensão inicial de descrever as atividades cotidianas da orquestra analisando estratégias de resistência, práticas musicais de culturas tradicionais, formas de legitimação/significação, questionando ainda possíveis resultados significativos na práxis de uma orquestra contemporânea, se mostrou inviável em sua totalidade, dado o tamanho gigantesco do trabalho que isso tudo exigiria. Por forças do próprio objeto a ser pesquisado – o elemento humano navegando entre o tradicional e o contemporâneo, a pesquisa se manteve atenta à advertência do Manifiesto Inaugural do grupo M/C, de que “não se trata de desenvolver novos métodos para estudar ao subalterno, mas de construir novas relações entre nós e aqueles seres humanos que tomamos como objeto de estudo”^5. Objetivando uma reflexão sobre uma proposta musicológica sui generis em nosso continente, a análise – que dialoga com autores como os já citados Coriún Aharonián e Cergio Prudencio, ainda com Juan Pablo González, Walter Canedo, John Blacking e outros – parte da interlocução do pensamento decolonial com as ideias de cosmovisão andina, com as reflexões de Luigi Pareyson sobre as relações arte/vida, onde “o conteúdo é arrastado pelo gesto formativo” (PRADA, 2015, p. 15 ), ainda que as possibilidades de análises certamente não se esgotem aqui. Algumas vezes o texto aparece redigido em primeira pessoa, isso denota resultado de minhas observações pessoais. Por outras vezes aparecerá em terceira pessoa, indicando o harmonioso e necessário diálogo entre orientadora e orientado, no esforço pela construção de um texto coerente. Além de toda metodologia e instrumentação acadêmica canônica adotada, tais como entrevistas, revisão bibliográfica e outras, a fonte primária da pesquisa reside em uma etnografia (^5) CASTRO-GÓMEZ, Santiago, e Eduardo MENDIETA. “"Teorías sin disciplina " - MANIFIESTO INAUGURAL”. (Fonte: ensayistas.org. 1998.).

19 Capítulo 1 – Conhecendo as sikuyas 1.1 La Paz – caldeirão cultural contemporâneo a orillas del Titicaca “La Paz está cercada por sus Dioses. Por eso se perdona siempre antes de pecar.” Cergio Prudencio La Paz, a mais alta capital do mundo com os seus 3.600 metros de altitude, está localizada em um vale das encostas do monte Illimani. Segundo censo de 2012, possuía naquela época cerca de 2.719.344 habitantes (INE, 2018). A localidade nativa original era chamada Chuquiago Marka; em outubro de 1548, Alonso de Mendoza a mando do rei da Espanha, funda a cidade de Nuestra Señora de La Paz. A primeira vista pode aparentar uma cidade envelhecida, ocre, onde, provavelmente, uma das primeiras impressões causadas aos turistas – sobretudo aos brasileiros acostumados às imagens estereotipadas dos morros no Rio de Janeiro – é de que as encostas ocupadas parecem com uma imensa favela. Essa ideia se mostra totalmente equivocada! A cidade aos poucos vai se revelando. Cosmopolita e ao mesmo tempo tradicionalíssima, La Paz luta pela permanência de sua peculiaridade cultural e pela consolidação da narrativa de uma identidade que reúne “a partir da prática do diálogo intercultural, uma diversidade de expressões e manifestações ancestrais, tradicionais e contemporâneas da área andina e nacional” (GOBIERNO AUTONOMO MUNICIPAL, 2017, p. 5). A capital federal boliviana é uma cidade de tirar o fôlego, tanto na forma figurada quanto literalmente: assim que você chega, além do impressionante cenário da Cordilheira Real, com o impassível Huayna Potosii^ bem na frente do saguão do Aeroporto Internacional de El Alto, cidade vizinha de La Paz, já é tomado pelos 4.150 m de altitude, aí o tempo começa a passar mais lentamente. O aumento da frequência respiratória, a aceleração dos batimentos cardíacos, a multiplicação da concentração de glóbulos vermelhos no sangue pode causar dores de cabeça, tontura, assim como uma profunda sensação de que qualquer esforço físico está muito mais difícil de se fazer, ao menos para um habitante das terras planas e baixas do pantanal de Mato Grosso. No trajeto entre El Alto e La Paz, provavelmente a primeira coisa que o visitante observa deve ser a imponência e a persistência da vista do nevado Illimani sobre a cidade. Com mais de

20 6.400 metros, se destaca como o de maior altitude da Cordilheira Real; além de ser a segunda montanha mais alta da Bolívia, é também personagem de diversas lendas ancestrais indígenas. Seguindo o trajeto, uma das coisas que mais se percebe é o intenso movimento de pessoas por todos os lados. Poderia dizer: como em qualquer outra grande cidade de país subdesenvolvido – ou naquele eufemismo contemporâneo ‘em desenvolvimento’ – mas não é. A velha Chuquiago Marka se transformou numa metrópole muito peculiar, onde o tradicional e o contemporâneo convivem sem estranhamentos, sui generis e interessantíssima, totalmente diferente de qualquer outra que já tenha conhecido. Figura 1. Pico do Huayna Potosi visto do Aeroporto Internacional de El Alto (Foto do autor). Ademais da dinâmica vida laboral urbana, existe uma vitalidade cultural que salta aos olhos: feiras por todos os lados, comércio ambulante e tradicional muito forte, cholitas^6 com seus trajes típicos, estudantes uniformizados os mais variados, jovens, adultos e idosos num intenso vai-e-vem, e a forte presença de manifestações da chamada arte contemporânea (grafites, instalações ao ar livre, esculturas, etc.). (^6) O termo ¨chola¨ no início tinha uma conotação pejorativa e se referia às mulheres nativas aimarás que, ao se mudarem para a cidade grande, esqueciam as tradições e costumes de seus antepassados e se rendiam ao estilo de vida dos mestiços urbanos. Hoje esse visual se tornou símbolo de resistência e está relacionado ao orgulho que essas mulheres têm de sua identidade indígena. Fonte: https://trotamerica.wordpress.com/2010/01/08/quem- sao-as-cholas/