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(1937) -, e do filme The Green Mile (À Espera de um Milagre - 1999), ... grande depressão, na busca por emprego nas plantações e em busca do sonho americano ...
Tipologia: Notas de estudo
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Vânia Soares Barbosa
Apresentação
A década de 30 foi marcada pela grande catástrofe econômica mundial que fez pairar sobre as nações capitalistas nuvens negras de desesperança, de perdas e danos, de incredulidade num futuro, e mesmo num presente, promissor. Isso a faz, até os dias de hoje, fonte de inspiração para os artistas que, dentro de uma visão mimética, buscam retratar a eterna luta do homem pela sobrevivência, numa tentativa de fazer mudar o curso da vida, mas, na maioria das vezes, logo descobrindo que a vida precisa seguir seu próprio curso. Seguindo esta inspiração, apresentamos duas obras de arte que se entrelaçam através de alguns de seus elementos e nos fazem reforçar o sentimento de que, a despeito das maldades, crueldades e injustiças do mundo; a simplicidade, a sensibilidade e a humildade ainda são capazes de contagiar as pessoas; de que a sabedoria não é sinônimo de beleza, de aparência física, e pode ser encontrada onde se menos espera, onde se menos imagina estar. Falamos da obra literária do escritor americano John Steinbeck – Of Mice and Men (1937) -, e do filme The Green Mile (À Espera de um Milagre - 1999), dirigido e produzido por Frank Darabont. Sabemos que há muitos anos a literatura e o cinema têm estado juntos num processo cultural que atrai, cada vez mais, um número maior de leitores e expectadores, amantes da arte. Nesta junção, se por um lado a literatura é fonte de inspiração para o cinema fornecendo estórias para serem contadas, por outro lado o cinema dá vida, cor, som e imagem à obra literária, como diz Mcluhan: Cinema, rádio e televisão situam certas personalidades num novo plano de existência. Elas existem não tanto em si mesmas, mas como tipos de vida coletiva sentidos e percebidos por um meio de massa (MCLUHAN, 2002, p. 161). Ou seja, o que antes era uma leitura individual, ao ser vivido num desses meios de comunicação, passa a ser coletivo, passa a ter vida própria. No livro, Steinbeck presenteia o leitor com um personagem – Lennie Small -, que, apesar de não ser considerado uma mente brilhante, traz em si uma sabedoria própria, uma pureza de espírito que vai aos poucos contagiando os que o rodeiam, assim como o próprio leitor, despertando a esperança que lhes foi roubada através dos anos difíceis da grande depressão. Mesmo seu final trágico deve ser visto não como um fim em si, mas como a continuidade da luta, a continuidade da vida.
Anos mais tarde, Darabont, baseado no romance seriado de Sthepen King, fez brilhar nas telas de cinema John Coffey, um personagem que em muitos aspectos, que vão além da aparência também robusta e da desabilidade mental, nos faz lembrar o Lennie de John Steinbeck. A relação entre Coffey e Lennie, entre a literatura e o cinema, dentro de uma visão onde não apenas a vida imita a arte, mas a arte se faz presente na própria arte, numa relação de intertextualidade onde um texto é construído a partir de outro texto, onde um elemento é transportado, recortado, de uma obra de arte para outra levando consigo não a sua história em si, mas os aspectos que a norteiam, constitui o objeto de estudo que nos propomos a investigar.
O encontro das artes
O romance de John Steinbeck, intitulado “Of Mice and Men” (De homens e de ratos), conta a trajetória de dois trabalhadores americanos, George Milton e Lennie Small, vítimas da grande depressão, na busca por emprego nas plantações e em busca do sonho americano de uma vida melhor através da posse da terra própria, fruto de seu próprio trabalho, e com o fim de encontrar suas próprias raízes. A relação existente entre George e Lennie é uma relação de interdependência, onde um completa o outro. George é aquele que pensa, é o ser racional, e Lennie é aquele que sente, diria que Lennie seja o coração de George assim como George é o cérebro de Lennie. Assim, o que falta em um, existe no outro, portanto, ambos se completam. Além de certo retardamento, Lennie traz em si uma pureza de espírito, uma ingenuidade infantil que contrasta com seu enorme porte físico e contagia o leitor através do laço de amizade que o liga a George. Não há como não se cruzar os dedos na torcida para que os dois amigos consigam o que tanto buscam. John Coffey, personagem coadjuvante do filme “The Green Mile” , é um negro americano enviado à Penitenciária de Lousiana – Estado Unidos, por ter sido condenado à pena de morte pelo estupro seguido de assassinado de duas irmãs gêmeas de nove anos. Ao chegar à penitenciária, ele é conduzido ao Bloco E, tendo, lá, seu primeiro contato com Paul Edgecomb, encarregado deste bloco onde ficam alojados os presos antes de receberem a pena fatal. A partir de então, nasce entre Coffey e Edgecomb uma relação de confiança mútua surpreendente, a princípio, devido ao fato de que a aparência rústica e enorme de Coffey e seu
extensividade-intrusidade não somente nos permite olhar melhor o mundo, mas também ver- nos como nos vêem os outros [...] (ECO, 1989, p. 18). A lembrança de Lennie presente em Coffey, e vice-versa, é parte dessa magia que norteia os espelhos e fez de ambos um só texto, um só signo, uma só arte, sem, contudo, perder suas características próprias. Nesta noção de um mesmo signo dentro de contextos diferentes, podemos compreender, ainda de acordo com Eco, que, o valor de signo figurativo ou de uma figura possa se modificar a cada leitura profunda, variar quando varie a situação recíproca dos signos do sistemas (ECO, 1989, p. 34). Neste sentido, a produção cinematográfica passa a ser uma re-leitura da obra literária, Coffey passa a ser uma re-leitura de Lennie inserido num outro sistema não deixando, todavia, de ser o mesmo signo existente. Poder-se-ia então chamá-lo de Clone? Seria Coffey um Lennie clonado? E, neste caso, teriam ambos seus valores diminuídos por se tratarem de uma duplicação? Segundo Baudrillard: A multiplicação só é positiva em nosso sistema de acumulação. Na ordem simbólica, equivale a uma subtração [...] cada gêmeo, pelo fato de que se duplica, nada mais é, no fundo, do que a metade de um indivíduo clonado ao infinito, seu valor é igual a zero (BAUDRILLARD, 1987, p. 172). Neste caso, Lennie e Coffey teriam sim seus valores reduzidos e transformados não em um objeto de arte, mas em um objeto da arte, ou seja, um objeto para se usado pela própria arte a não para ser admirado com tal. Entendemos, no entanto, que esta seja uma concepção bastante rígida, mesmo em termos gerais, uma obra literária adaptada ao cinema não perde seu valor literário. Apesar das diferentes versões cinematográficas existentes de Hamlet, a obra de William Shakespeare continua sendo imortal e ainda, aplicável a diversas áreas, como a psicologia e administração, por exemplo, e, neste sentido, tal aplicação só é possível através da leitura e re-leitura que a obra literária proporciona. No sentido de re-leitura, podemos, ainda, nos voltar para uma antiga prática comum particularmente nos círculos eclesiásticos e que “[...] se constituía na lavagem ou raspagem de um manuscrito para que o pergaminho, onde fora fixado, fosse reutilizado para outro texto” (DIAS, 1980, p. 5). Estamos nos referindo ao palimpsesto que, segundo uma das definições do Dicionário Eletrônico do Aurélio, significa “[...] um manuscrito sob cujo texto se descobre [...] a escrita ou escritas anteriores” e ainda, segundo Dias: Textos falam através de outros textos. Palimpsestos subvertem o conceito do autor como única fonte geradora de sua obra,
assim o significado da obra é atribuído a uma cadeia interminável de significações. (DIAS, 1980, p. 5). Sendo assim, diríamos que, ao constituir o personagem, ao dar as diretrizes pra que o ator Michael Clarke Duncam interpretasse Coffey, Darabont teria se utilizado do que já existia sobre Lennie, ou seja, teria reaproveitado, refeito um Lennie não em sua totalidade, mas em cima daquilo que, numa linguagem figurada, o tempo não foi capaz de apagar, daquilo que foi mais realçado na obra de Steinbeck. Finalmente, voltando para as semelhanças apontadas anteriormente entre Lennie e Coffey, ao encontro da obra literária e a produção cinematográfica, nos apoiamos em L. Althusser ao afirmar que [...] essas semelhanças aparentes, atuando sobre elementos isolados, podem enganar uma análise superficial que ignore a função da estrutura na constituição dos elementos de um objeto, (apud KRISTEVA, 2002, p. 312) para reportarmos a uma outra técnica/recurso na criação de artes plástica e literária, que também se situa dentro de uma visão intertextual e que, portanto, pode ser aplicada ao objeto de estudo que pretendemos investigar. Nos referimos à colagem, ao trabalho de recortar-colar cujo termo proposto por Kristeva: [...] recobre práticas escriturais tão antigas quanto fundamentais que consideram que nenhum texto pode se escrever independentemente do que já foi escrito e que este texto carrega, de modo mais ou menos visível, o rastro e a memória de uma herança e de uma tradição (ARBEX, 2002, p. 208). Como o próprio termo sugere, o trabalho de recortar-colar, a colagem, consiste no fato do artista plástico apoderar-se de materiais já prontos, recortá-los e faze-los constituírem-se em um novo texto a partir da colagem destes recortes. Nas artes plásticas, esta técnica pode ser visualizada claramente, já na literatura e nas artes cênicas, ela deve ser vista metaforicamente sem, contudo, perder sua essência já que [...] o gesto arcaico de recortar- colar, como diz Compagnon, pertence, pois, tanto ao escritor quanto ao artista: este opera com o material pictural-figurativo ou não - da mesma forma que aquele trabalha com as palavras (ARBEX, 2002, p. 208). Assim como no romance-colagem de Max Ernest intitulado “ Rêve d’une petite fille qui voulut rentrer au Carmel” (Sonho de uma menina que quis entrar para o Carmelo), 1930, há a presença de elementos transtextuais seja no texto como um todo onde elementos difusos são transportados da biografia de Santa Teresa de Lisieux, seja apenas no nome da personagem principal – Marceline-Marie-, que a faz dividida em duas, seja na própria personagem cuja vida faz referência à vida da própria santa. O filme “The Green Mile” também traz consigo
KRISTEVA, Julia. A Semiologia: ciência crítica e/ou crítica da ciência. In: LIMA, Luiz Costa. Teoria da cultura de massa. São Paulo: Paz e Terra, 2002. McLUHAN, Marshall. Visão, som e fúria. In: LIMA, Luiz Costa. Teoria da cultura de massa. São Paulo: Paz e Terra, 2002.
OLIVEIRA, Solange Ribeiro de. Literatura & Artes Plásticas – O Kunstelerroman na Ficção Contemporânea. Ouro Preto: UFOP, 1993.
RAVETTI, Graciela. Narrativas Perfomáticas. In: RAVETTI, Graciela; ARBEX, Márcia. Performance, Exílio, Fronteiras – Errâncias territoriais e textuais. Belo Horizonte: Departamento de Letras Românticas, Faculdade de Letras/UFMG: Poslit, 2002.
RUIZ, Raúl. Poética Del Cine. Chile: Editorial Sudamericana, 2000.