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Este artigo analisa o blog escreva lola escreva, um dos principais blogs feministas do brasil, e sua influência na cobertura de questões relacionadas a gênero pela mídia. A pesquisa utiliza a teoria semiolinguística de patrick charaudeau para analisar 102 textos publicados no blog e identificar a percepção dos leitores sobre a influência do blog na sociedade e na mídia. O artigo também explora as questões sociodemográficas e as opiniões dos leitores sobre a importância dedicada a temas como invisibilidade da mulher, estereótipos, violência contra a mulher e padrão de beleza.
O que você vai aprender
Tipologia: Notas de estudo
1 / 23
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Não perca as partes importantes!
Carla Rizzotto
As experiências de resistência e crítica midiática têm sido chamadas de “quinto po-
der” e constituem o foco desta pesquisa. O blog Escreva Lola Escreva é objeto deste
artigo pois visa alfabetizar midiaticamente seus leitores no que diz respeito à cober-
tura midiática das questões de gênero. É objetivo deste artigo compreender, através
de uma pesquisa com sua audiência, em que medida o blog influencia a formação da
consciência política feminista do seu público. Para isso, são analisadas as 612 respos-
tas do questionário direcionado aos leitores do blog em cruzamento com a análise
discursiva de 102 posts****. A análise dos resultados sugere que o público vê a autora
como uma “referência”, uma “professora” e uma “amiga”, além de compartilhar com
ela um alto grau de correspondência de opiniões.
Palavras-chave: Comunicação e Gênero. Quinto Poder. Estudo de Audiência.
The experiences of media resistance and criticism have been called “fifth power”
and are the main focus of this research. The blog Escreva Lola escreva is the research
object of this article because it aimes to media literacy its readers in regards to media
coverage of gender issues. It is the aim of this article to understand, through a survey
of its audience, to what extent the blog influences the formation of feminist political
consciousness of its audience. Thus, 612 responses from the questionnaire directed
to blog readers are analysed in intersection with the discursive analysis of 102 posts.
The analysis suggests that the public sees the author as a “reference” a “teacher” and
a “friend”, and achieve a high degree of correspondence of opinions.
Keywords: Gender and Communication. Fifth Power. Audience Study.
Los experimentos de resistencia crítica a los medios de comunicación se han llamado
“quinto poder” y son el foco de esta investigación. El blog Escreva, Lola , escreva es
el objeto de este artículo pues tiene como objetivo alfabetizar midiaticamente a
sus lectores con respecto a la cobertura mediática de las cuestiones de género. Es
el objetivo de este artículo entender, a través de una encuesta con su audiencia, en
qué medida el blog influye en la formación de la conciencia política feminista de su
público. Por lo tanto, 612 respuestas del cuestionario dirigido a los lectores del blog se
analizan en intersección con el análisis discursivo de 102 mensajes. El análisis sugiere
que el público ve la autora como una “referencia”, una “maestra” y una “amiga”, y
comparten un alto grado de correspondencia de opiniones.
Palabras-clave: Comunicación y Género. Quinto Poder. Estudio de Audiencia.
enriquecer a discussão que permeia o pro- blema central desta pesquisa: afinal, o quin- to poder exerce poder de fato?
Adjacentes a esta encontram-se ques- tões mais específicas que direcionam o estu- do de recepção: a instância de recepção deve compartilhar a mesma estrutura ideológica que a instância de produção para ser persu- adida? Como se relacionam as duas instân- cias? E qual é a influência do blog ELE na formação da consciência política feminista do seu público?
A teoria semiolinguística do discurso de Patrick Charaudeau (2007), através do chamado “Contrato Comunicacional”, que só pode ser traçado e firmado com a participa- ção das duas instâncias que o compõem – a de produção e a de recepção –, é ponto de parti- da para esta análise. Em pesquisas anteriores, buscou-se compreender as características do contrato comunicacional direcionando o olhar somente para a instância de produção; o entendimento das questões levantadas, en- tretanto, não seria completo sem que o pro- cesso de circulação do discurso fosse levado em conta. Por essa razão, este artigo analisa as 612 respostas do questionário direcionado aos leitores do ELE , cruzando-as com a aná- lise discursiva dos textos do blog , de maneira a lançar luz à questão de pesquisa levantada.
Entre as diversas experiências de crítica midiática estão os observatórios de mídia, cujos objetivos podem ser assim resumidos: limitar a prioridade econômica adotada
pelos grandes conglomerados midiáticos; instituir a participação social de fora para dentro; e garantir o interesse social nos conteúdos veiculados. Christofoletti (2008, p. 78) trata da função deste “quinto poder” em um artigo em que relaciona os papéis do jornalista, do consumidor da informação e do crítico da mídia com os atos de olhar, ver e observar. Segundo o autor, o papel do jor- nalista se refere ao olhar : “olhar é fitar, mi- rar, contemplar […] sondar, cuidar, ponderar […] admirar, julgar, estudar […] apreender o mundo […] encarar, pesquisar, examinar […] captar, receber, ler o mundo […] é uma for- ma de compreensão”. O que quer dizer que o jornalista empresta o seu olhar ao públi- co, repassando a ele sua visão do mundo, sempre motivado pelas características fun- damentais do jornalismo: a atualidade, a variedade, a interpretação, a periodicidade, a popularidade e a promoção.
Já o público possui um olhar mais passivo, lê os meios de comunicação a par- tir do olhar dos jornalistas, ou seja, a leitu- ra acontece sempre de maneira mediada, o que só se torna um problema na medida em que ele acolhe ilimitadamente os produtos midiáticos. A análise dessa tradução da re- alidade é uma das funções dos observató- rios de mídia, aqueles que adotam para si o verbo mais analítico das funções visuais: o observar , caracterizado como uma leitura muito mais crítica dos fatos mediados pelos meios de comunicação.
Esse observar é, portanto, um olhar mais amadurecido, com vistas a estabelecer um contato mais comedido com as informa- ções. Não é o olhar jornalístico, pois este é o da captura das notícias na superfície dos acontecimentos. Não é apenas ver, pois este é o acolhimento acrítico, sem prote- ções e inquietações, acomodado e passivo.
O observar é um exercício de leitura de alguma profundidade, preocupado com as condições de veracidade daquelas in- formações, com as circunstâncias de pro- dução e de difusão daqueles conteúdos e mensagens. (Christofoletti, 2008, p. 92)
Essa observação pode ser feita tanto pelos críticos de mídia como pela parce- la da população consumidora da visão de mundo dos meios de comunicação e inte- ressada na conduta ética dos meios. Porém, para que o olhar passivo do público ( ver ) se transforme em um olhar crítico ( observar ), o autor considera fundamental que ocorra um processo de educação para os meios – mostrando ao público o funcionamento da mídia e alertando -o sobre a importância da comunicação para o desenvolvimento hu- mano – e, ainda, a conscientização de que a comunicação é um direito humano central.
Christofoletti e Damas (2006) expli- cam que os observatórios de meios possuem dois papéis principais: o de fiscalizadores, através do qual cumprem as funções de revi- sar o conteúdo dos meios, elaborar estudos, informes e análises, difundir sua atuação, recolher queixas, críticas e comentários dos consumidores; e o de educadores, buscando capacitar a audiência para o consumo crítico dos meios e os profissionais para a produção de jornalismo de qualidade.
Rebouças e Cunha (2010, p. 10), em estudo realizado para entender as relações entre os observatórios e a democracia, ex- plicam que
[...] devido à característica comum de pos- sibilitar o controle da mídia por parte do público, seja através da educação deste, seja diretamente como canal de participa-
ção, a democracia participacionista pode ser tomada como a almejada pelos obser- vatórios de mídia progressistas de maneira geral. Ela tenta retomar algumas caracte- rísticas da democracia ateniense e inserir o povo no processo de decisões políticas. Daí decorre a classificação dos observatórios como fomentador e/ou articulador da prá- tica política e sempre como instrumento da democracia, mesmo que esse conceito as- suma as mais diversas características.
Assim, indo ao encontro das fun- ções descritas por Christofoletti e Damas (2006), Rebouças e Cunha (2010) defen- dem que os observatórios, através da di- versificação de práticas (a observação, a fiscalização, a reflexão, a informação e a intervenção), abrem possibilidade para a participação da população.
Os Contratos Comunicacionais abarcam as condições do ato de comunicação que auxi- liam o entendimento do discurso por parte da instância de recepção, fazendo com que esta legitime a instância de emissão como detentora do direito (ou poder) de falar. Pa- trick Charaudeau (2007) elaborou um con- trato referente ao discurso midiático e outro referente ao discurso político, que inspiraram a elaboração do “Contrato Comunicacional da Crítica Midiática” na pesquisa doutoral da au- tora deste artigo. Essa pesquisa aplicou a Te- oria Semiolinguística de Patrick Charaudeau a uma amostra de 102 textos publicados no blog Escreva Lola Escreva.
de construir una estimación válida de la recepción, usos e impacto de los medios de comunicación, tiene que convertirse em un análisis de audiencia-cum-contenido”. O que significa que o estudo dos efeitos deve ser complementar à análise dos textos e seus significados, de maneira a abordar com sucesso tanto os aspectos discursivos como os aspectos sociais da comunicação. Compreender o receptor implica compreen- der o conteúdo e seu contexto de produção. Sendo assim, a pesquisa de audiência aqui apresentada é fundamentalmente ligada à análise discursiva realizada na citada pes- quisa doutoral, que será retomada neste ar- tigo quando necessário.
Ainda que nesse tipo de estudo se- jam utilizados com maior frequência en- trevistas em profundidade e observação participante para capturar e interpretar o discurso da instância de recepção (JACKS; ESCOSTEGUY, 2005, p. 45), para este arti- go optou -se pela utilização de questionário composto por perguntas fechadas e abertas, com a intenção de – inicialmente – traçar o perfil da audiência e pontuar as principais questões que permeiam o relacionamento entre as instâncias de emissão e de recep- ção. Em momento futuro pretende -se rea- lizar entrevistas em profundidade e grupos focais com os participantes que indicaram positivamente que desejam participar das etapas posteriores desta pesquisa, objeti- vando agregar aos resultados aqui descri- tos uma leitura interpretativa que possa indicar como um tema particular é assimi- lado por um grupo específico.
No questionário, as perguntas foram divididas em dois tipos: as de Tipo 1 – ques- tões sociodemográficas –, com o objetivo de traçar o perfil dos leitores, bem como bali- zar a comparação das respostas de Tipo 2
[ TABELA 1 ] QUESTÕES TIPO 1
1 Idade Resposta aberta
2 Você é:
3 Orientação sexual
[2] Essa questão gerou certa polêmica – percebida a partir da leitura da caixa de comentários do post em que o questionário foi divulgado. Uma leitora, identifi- cada como feminista radical, disse: “Também não ‘pude’ responder o questionário. ‘Mulher cissexual’ é uma pia- da considerando o que eu me ferro por ser GNC. Além de eu discordar do termo ‘cis’, que implica que mulheres que não transionam se identificam com os esteriótipos de gênero atribuidos ao sexo feminino. Faria mais sen- tido se a autora tivesse separado a pergunta em “Qual seu sexo?” e “Qual seu gênero?”, com as opções “femini- no, masculino e intersex” para a primeira pergunta e “feminino, masculino, crítico de gênero/GNC/agênero (ou semelhantes)” para a segunda. Anyway, apenas é importante que a autora saiba que parte do público do blog vai decidir não responder o questionário devido a esse problema, então você obterá respostas parciais de apenas um pedaço dos leitores”.
4
Com que frequência você lê o blog Escreva, Lola, escreva?
5
Há quanto tempo você conhece o blog?
Fonte: Rizzotto, 2017.
O objetivo principal das questões de Tipo 2 (conforme Tabela 2 abaixo) é verificar o grau de correspondência entre as opiniões expressas no blog e as opiniões dos leitores, assim como perceber a relação estabelecida entre canal e público. Para isso, a questão 1 indaga de maneira direta a respeito do
grau de concordância; a questão 2 busca descobrir como a autora do blog é vista pe- los leitores; a questão 3 – você é feminista?
[ TABELA 2 ] QUESTÕES TIPO 2
1 A respeito das opiniões da Lola, você diria que geralmente:
8 Qual é o seu posicionamento em relação às opiniões da Lola destacadas abaixo:
8.
"[...] crer que homens e mulheres têm funções no mundo é crer em determinismo, em destino, na impossibilidade de mudanças. E é também dizer que, se eu não sou mãe, sou uma anomalia da natureza, pois estou rejeitando minha função. Isso de “homem manda, mulher aconselha” é péssimo pra todo mundo. Pra homens, mulheres e crianças. E este ainda é o modelo adotado na nossa sociedade. É o único modelo testado. Se funcionasse, o planeta estaria um tantinho melhor, não?" ("As confissões de Maria Mariana sobre maternidade e cuecas sujas" – http://escrevalolaescreva.blogspot.com.br/2009/05/as-
8.
"Eu sabia, antes de ler a reportagem, que esse Rafinha [Bastos] foi escolhido por não sei quem o homem mais influente do Twitter. Tipo, grandes coisas da humanidade. Não sei se foi ele ou o tal Danilo [Gentili] que já fez declarações racistas e, do alto de seu privilégio branco, não viu nada de mais em chamar negros de macacos. Sei que eles fazem humor com vítimas de terremoto, com gente com necessidades especiais, com gordos, enfim, com tudo. E deve ter gente que adora esse tipo de humor e faz dele uma bandeira: uma bandeira contra o politicamente correto. Pra essa galera (que não é pequena; aliás, é muito mais gente do que nós que criticamos), a pior praga que tem neste planeta é o politicamente correto. Não é a fome. Não é a guerra. Não é o fato que mulheres são estupradas. Não, tudo isso nem é problema. Problema mesmo é o politicamente correto. Porque como é que pode?! Durante séculos esse pessoal pôde escrever e falar besteiras à vontade, fazer piada com tudo, e de repente vem uma patrulha criticá-los?! Onde é que esse mundo vai parar?". (“Politicamente incorreto não é transgressor, Rafinha” – http://escrevalolaescreva. blogspot.com.br/2011/05/politicamente-incorreto-nao-e.html).
8.
"Esportistas mulheres só recebem destaque se forem bonitas (em outras palavras, dentro do padrão de beleza vigente). Como dependem de patrocínio, existe uma pressão enorme pra que sejam atraentes. Sendo bonitas e “femininas”, elas podem se contrapor à imagem masculinizada da mulher que pratica esportes. Talvez por isso o futebol feminino não consiga transmissão no Brasil, apesar do futebol ser nossa paixão nacional, e da seleção feminina estar entre as melhores do mundo e contar com Marta, uma jogadora excepcional. Mas experimente fazer um joguinho de futebol beneficiente com modelos que mal sabem chutar uma bola. Isso sim rende manchetes!" ("Mulheres não podem praticar esportes" – http://escrevalolaescreva.blogspot.com.br/2011/03/ mulheres-nao-podem-praticar-esportes.html).
8.
"A indústria da beleza quer é vender, pura e simplesmente. Mas, pra isso, precisa criar um clima que diga que a gente é feia e errada se não comprar batom, cílios postiços, creme, tinta pra cabelo, salto alto, tal roupa, tal plástica. A indústria da beleza nos diz, diariamente, várias vezes por dia, como somos horríveis. Mas como a beleza está ao nosso alcance. Não será barato (se fosse só passar batom...), nem fácil, nem indolor. Mas estamos prontas pra passar nossa existência inteira achando que correr atrás de um padrão inatingível é o nosso ideal de vida. Isso não tem nada a ver com beleza. Tem a ver com consumo." (“Boticário, vá lamber batom!” – http://escrevalolaescreva. blogspot.com.br/2008/07/boticrio-v-lamber-batom.html).
9 Quais são as principais contribuições do blog Escreva, Lola, escrevana sua vida? Resposta aberta nãoobrigatória
Fonte: Rizzotto, 2017.
O questionário foi divulgado no Face- book e no próprio blog , em guest post escrito pela autora da pesquisa. Em 20 dias o ques- tionário obteve 621 respostas, dentre as quais foram identificadas e eliminadas da análise 9 respostas de trolls^3 , totalizando, assim, 612 respostas. Os trolls são muito frequentes na caixa de comentários do ELE , bem como na maioria dos blogs feministas, e foram identi- ficados principalmente a partir das respostas oferecidas para a questão 2 do segundo tipo de questões, que possibilitava resposta aber- ta. Dentre essas respostas destacam-se: “é uma pneumoultramicrospicossilicovulcanió- tica”, “gorda jabba filha da puta”, “baleia”.
A partir das respostas das questões de Tipo 1 foi possível traçar um perfil dos leitores do blog. Mais de 80% são mulheres; a maior parte (52,93%) tem entre 20 e 29 anos e são poucos (7,98%) os que têm mais de 40 anos; a maio- ria (73,04%) é heterossexual, e chama atenção o número de leitores que se declaram como assexuados (3,27%), o que pode ser explicado pelo fato do tema da assexualidade já ter sido abordado mais de uma vez nos post s do blog.
Quanto ao tempo de acesso, a maior parte dos respondentes da pesquisa conhece o ELE há mais de 2 anos, somente cerca de um quarto deles acessou o blog há menos de 2 anos ou nos últimos 6 meses (Gráfico 1). Assim como a maioria, quase 80%, acessa o blog pelo
[3] Na gíria da internet, troll é a pessoa que se comporta de maneira a desestabilizar uma discussão.
menos uma vez por semana, e poucos pesqui- sados, menos de 5%, podem ser considerados não-leitores por acessarem o blog raramente ou só terem lido alguns post s (Gráfico 2).
[ GRÁFICO 1 ] TEMPO DE ACESSO 38 (6.21%) 26 (4.25%)
115 (18.79%) 187 (30.56%)
246 (40.20%)
Há mais de 4 anos
Desde o comecinho (há 7 anos)
Há mais de 2 anos Há menos de 2 anos Conheci nos últimos 6 meses
Fonte: Rizzotto, 2017.
[ GRÁFICO 2 ] FREQUÊNCIA DE ACESSO 11 (1.80%) 14 (2.29%)
102 (16.67%)
138 (22.55%) 181 (29.58%)
166 (27.12%)
De 3 a 5 vezes por semana
Todos os dias Algumas vezes por mês Raramente
Toda semana Só li alguns posts
Fonte: Rizzotto, 2017.
A fidelidade também é variável que afeta a questão ideológica: 91,96% dos leito- res fiéis se declaram feministas; esse núme- ro cai para 86,14% dos leitores ocasionais e para 68% dos considerados não -leitores. Ainda assim o número de não-leitores fe- ministas é bastante alto se comparado à so- ciedade brasileira em geral^4. Isso pode ser explicado por duas razões: em primeiro lu- gar, pela forma de acesso ao questionário, que foi divulgado principalmente em cír- culos acadêmicos e compartilhado nas re- des sociais sobretudo por leitores do blog e por militantes feministas. Como os sujeitos tendem a pertencer a círculos mais ou me- nos fechados que compartilham as mesmas opiniões e ideologias, a pesquisa alcançou um maior número de pessoas que se reco- nhecem como feministas. Em segundo lu- gar, porque esses números podem indicar uma resposta ao dilema levantado no início desta sessão: ainda que o ELE influencie a consciência política feminista dos seus leitores – como é comprovado pelos depoi- mentos e respostas dadas à questão aberta (número 9), que indagava sobre as influ- ências do blog na vida dos participantes –, são direcionados ao blog e/ou permanecem como leitores somente aqueles sujeitos au- toidentificados como feministas.
O tempo de leitura é um pouco me- nos significativo nesse quesito: 92,49% dos leitores que conhecem o blog desde o seu início são feministas contra 77,78% dos lei- tores que acompanham o blog há menos de
[4] Pesquisa realizada pela Expertise em parceria com a plataforma online Heap Up, realizada em 2014 com 1.258 pessoas, mostrou que uma em cada três mulhe- res brasileiras se considera feminista. Disponível em: <http://site.expertise.net.br/pesquisa-feminismo/#! prettyPhoto>. Acesso em: 20 jul. 2014.
6 meses. A faixa etária mostrou -se variável sem interferência alguma.
Uma das questões objetivava investigar os aspectos da relação estabelecida entre Lola Aronovich e o seu público. Na análise discursiva dos textos do blog , verificou-se que a autora estabelece uma relação de dis- tanciamento com alguns sujeitos. O “outro” é representado na figura do “machista”, do “conservador”, do “politicamente incorreto” e do “preconceituoso”. Já com os leitores, a relação estabelecida é de proximidade e in- timidade, e pode ser percebida a partir de algumas marcas discursivas apreendidas da leitura dos textos: a exposição de fatos e experiências pessoais; o humor; a pre- sença constante da autora no espaço de comentários, participando ativamente dos debates provocados pelos textos publica- dos; a participação dos leitores através dos comentários e dos guest posts ; e, por fim, a “auto-representação” da autora, que trans- mite ao público características como “mo- dernidade”, através do uso de expressões idiomáticas em outras línguas, “autoridade”, através da divulgação de reconhecimento profissional, “bom-humor”, através da iro- nia e sarcasmo e também sobre suas posi- ções políticas e ideológicas.
Sendo assim, não é surpresa que a maior parte dos pesquisados considere a Lola como uma professora (43,83%) e uma grande amiga (39,72%), conforme mostra o Gráfico 5.
[ GRÁFICO 5 ] O QUE A AUTORA DO BLOG REPRESENTA
14 (1.99%) 6 (0.85%)
96 (13.62%)
280 (39.72%) 309 (43.83%)
Uma professora
Uma grande amiga Uma pessoa distante que leio às vezes Uma mãe Outro Fonte: Rizzotto, 2017.
A questão oferecia a possibilidade de respondê-la abertamente, e algumas respos- tas merecem destaque: “Uma profissional cuja opinião eu respeito”, “formadora de opi- nião”, “Uma pessoa que eu aprecio muito pela vontade de produzir mudanças significati- vas e positivas na sociedade através do em- poderamento das mulheres e na educação das pessoas em geral, por um mundo sem discriminação de gênero, raça e classe”, “uma referência de diálogo feminista”, “é uma mu- lher admirável”, “É uma pessoa por cuja opi- nião tenho profundo respeito e que orienta meu aprendizado quanto ao feminismo”.
O Escreva Lola Escreva dedica parte signi- ficativa do seu conteúdo à crítica ao modo
como a mídia representa as mulheres e trata as questões de gênero. O trecho a se- guir, no qual a autora fala sobre a tragédia de Realengo^5 , ocorrida no Rio de Janeiro em 2011, é exemplificador:
Até lá, que tal a mídia descobrir o assunto e começar a falar de misoginia e feminicí- dio? Não é possível que um blog pessoal, escrito por uma só mulher que não é jor- nalista nem vive do blog, seja o único que ligue os pontinhos. Vocês juram, edito- res de veículos de comunicação, que este tema não merece uma pauta?^6
Questionados sobre a contribuição da mídia para as demandas feministas os lei- tores do ELE apontam que, em geral, a mí- dia mais atrapalha tais demandas, como se lê no Gráfico 6:
[5] Na manhã do dia 7 de abril de 2011, Wellington Menezes de Oliveira invadiu a Escola Municipal Tasso da Silveira, localizada no bairro de Realengo, no Rio de Janeiro, e disparou tiros, ferindo dezenas de alunos e matando 12 deles, com idades entre 13 e 16 anos. Des- tes, 10 eram meninas. [6] ARONOVICH, Lola. Realengo e a prisão dos Sanc- tos. E não se fala em misoginia. In: Escreva Lola Escre- va.Disponível em: <http://escrevalolaescreva.blogspot. com.br/2012/04/realengo-e-prisao-dos-sanctos-e-nao- se.html.>. Acesso em: 20 jul. 2014.
que tem como função desestabilizar o mundo (homem, 20 anos).
Diante disso, a maioria dos leitores
[ GRÁFICO 7 ] O BLOG CONTRIBUI PARA UMA DISCUSSÃO CRÍTICA DA MÍDIA?
14 (2.29%)
581 (94.93%)
17 (2.78%)
Sim Não Não sei
Fonte: Rizzotto, 2017.
Como já citado, as temáticas mais discuti- das nos posts do blog são a violência come- tida contra as mulheres, principalmente em uma tentativa de desconstruir a cha- mada “cultura do estupro”, a estereotipa- ção da mulher difundida e reforçada pela mídia, o padrão de beleza e a invisibilida- de da mulher nos meios de comunicação. Um dos objetivos propostos por esta pes- quisa trata de desvendar se essas temáticas
são também consideradas importantes pelo público. O Gráfico 8 mostra que todas as te- máticas são consideradas relevantes, sendo a discussão sobre a violência de gênero a mais importante e a discussão sobre o pa- drão de beleza a menos importante.
[ GRÁFICO 8 ] RELEVÂNCIA DA TEMÁTICA
Relevante Não sei
Muito relevante Irrelevante
433
573
456 405
162
Esteriótipos Violência de gênero
Invisibilidade da mulher na mídia
Padrão de beleza
13 33 4 2 15 1 26 8
140 173
4
650 600 550 500 450 400 350 300 250 200 150 100 50 0
Fonte: Rizzotto, 2017.
Uma análise interpretativa dessa questão leva à seguinte conclusão: a violên- cia de gênero alcançou – ainda que tardia- mente – o patamar de problema social no Brasil. Alguns acontecimentos do ano de 2015 comprovam essa afirmação: milhares de mulheres foram às ruas de diferentes ci- dades do país entre o final de outubro e o início de novembro de 2015, contra o Pro- jeto de Lei 5069/2013, que dificulta a rea- lização de abortos pelas mulheres vítimas de violência sexual; as mulheres também se mobilizaram contra o assédio sexual in- fantil nas redes sociais utilizando a hashtag #meuprimeiroassédio a partir do assédio sofrido por uma participante, de apenas 12
anos de idade, do reality show de culinária Master Chef Júnior, transmitido pela Rede Record; ainda, o tema da redação do Exa- me Nacional de Ensino Médio (Enem) foi “A persistência da violência contra a mu- lher na sociedade brasileira”. Sendo assim, ainda que as soluções para o problema da violência de gênero estejam longe de serem alcançadas e que muitos aspectos da vio- lência ainda não sejam levados em conta, as discussões sobre o tema são cada vez mais frequentes e a sociedade está mais empática em relação a tal questão.
Por fim, para compreender a influência do Escreva Lola Escreva sobre a consciência política feminista de seu público, o cami- nho escolhido por esta pesquisa foi o de verificar o grau de equivalência entre as opiniões expressas nos posts e as opiniões dos leitores. De acordo com Jensen,
Una definición sumaria de las metodo- logías de la recepción puede referirse a un análisis textual comparativo de los discursos de los medios de comunicación y de los discursos de la audiencia, cuyos resultados se interpretan enfáticamente em función del contexto, tanto del mar- co histórico como del cultural y del “con-
Em um primeiro momento os pesqui- sados foram questionados sobre essa equiva- lência de maneira genérica, sem especificar
um tema ou opinião. As respostas podem ser visualizadas no Gráfico 9 abaixo:
[ GRÁFICO 9 ] EQUIVALÊNCIA DE OPINIÕES
280 (45.75%) 309 (50.49%)
14 (2.29%) 3 (0.49%) 6 (0.98%)
Mais concorda que discorda
Concorda com quase tudo Mais concorda que discorda Discorda de Em geral, nem concordanem discorda quase tudo
Fonte: Rizzotto, 2012.
Como se pode observar, a maioria absoluta – mais de 95% – dos responden- tes geralmente concorda com as opiniões da autora do ELE. Esse número se alte- ra um pouco quando se faz o cruzamento de duas variáveis. As mulheres tendem a concordar mais com a autora do que os homens, ainda que a alteração não seja sig- nificativa: pouco mais de 10% dos homens aparecem como neutros ou discordantes, enquanto para as mulheres esse número cai para 2,53%. Quando se faz o cruzamen- to da equivalência de opiniões com a faixa etária, o resultado é bastante aproximado: apresentam concordância 95,38% dos res- pondentes com idade abaixo de 20 anos, 95,78% dos entre 20 e 29 anos, 96,57% dos entre 30 e 39 anos e 95,92% dos que têm 40 anos ou mais. Esses números demonstram que a ideia de que os mais jovens são mais
posicionamento é a afiliação ideológica. Os leitores feministas apresentam grau de dis- cordância muito próximo de inexistente (Gráfico 11). Para os não -feministas, espe- cialmente a respeito dos estereótipos e da violência de gênero, o grau de discordância é significativo (Gráfico 12).
GRÁFICO 11 ] POSICIONAMENTO EM RELAÇÃO ÀS OPINIÕES DA AUTORA – FEMINISTAS
Concordo parcilamente Nem concordo nem discordo
Discordo totalmente Outro
Concordo totalmente Discordo parcialmente
506
476
445
441
39
58
85
94
Esteriótipos
Violênciade gênero
Invisibilidadeda mulher
na mídia
Padrãode beleza
3
5 5
11
7
2
3
6
0
4
3
1
1
3
4
2 0 50100150200250300350400450500550600650
Fonte: Rizzotto, 2017.
[ GRÁFICO 12 ] POSICIONAMENTO EM RELAÇÃO ÀS OPINIÕES DA AUTORA – NÃO‑FEMINISTAS
Concordo parcilamente Nem concordo nem discordo
Discordo totalmente Outro
Concordo totalmente Discordo parcialmente
9 6 1 7 0
0
0
0
0
0
0
2
8 7
6
12
12
5
6
Esteriótipos
Violênciade gênero
Invisibilidadeda mulher
na mídia
Padrãode beleza
1 2
2
3
3
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Fonte: Rizzotto, 2017.
A partir de estudo de recepção preliminar, que utilizou como ferramenta de coleta de dados um questionário que obteve 612 respostas, este artigo procurou fornecer respostas a alguns questionamentos sobre
o grau de influência das experiências on- line de crítica de mídia. Aqui se tratou es- pecificamente do blog Escreva Lola Escreva , um dos maiores blogs feministas do Brasil. Utilizando os contratos comunicacionais de Patrick Charaudeau (2007), este artigo é complementar à pesquisa doutoral que re- alizou análise discursiva dos textos do blog e discutiu as estratégias discursivas utiliza- das pela sua autora, Lola Aronovich, com vistas à estabelecer uma relação de proxi- midade com os leitores.
Com a análise das respostas cole- tadas foi possível identificar o perfil so- ciodemográfico e também ideológico do público. Mais especificamente vimos que a instância de recepção compartilha da mesma estrutura ideológica que o ELE – os leitores são em sua maioria progressistas e feministas, parte deles instigados a assim se reconhecerem pela leitura do próprio blog. Mesmo que esporadicamente os tex- tos sejam lidos por sujeitos com posições políticas divergentes, permanecem como leitores quase tão somente aqueles que concordam com a maioria das posições ali defendidas. Este resultado, corroborado pela posição de Van Dijk (2010), que afirma que a instância de recepção deve compar- tilhar a mesma estrutura ideológica que a instância de produção para ser influencia- da por esta, aponta afirmativamente para a questão levantada por essa pesquisa a res- peito do grau de poder das experiências de crítica de mídia.
Quanto à relação entre as duas instân- cias, viu-se que o público atende às intenções da autora – percebidas na análise das estra- tégias discursivas – e também se considera próximo a ela, caracterizando-a como uma “amiga”, uma “professora” e, algumas vezes,
uma “referência”. Ainda, para além das res- postas fechadas, que confirmaram um alto grau de correspondência entre as opiniões de Aronovich e de seus leitores, a questão aberta possibilitou a coleta de diversos de- poimentos que demonstram e comprovam a influência do ELE na formação da consciên- cia feminista de seus leitores.
A pesquisa mostrou que a crítica de mídia atua como um movimento de con- trainformação que visa alterar o esquema comunicacional tradicional, elevando o receptor a protagonista do processo. O lei- tor de um observatório de mídia combina o acontecimento construído e veiculado pelos meios de comunicação com a crítica a este acontecimento oferecida pelo ob- servatório para a geração da sua própria interpretação do acontecimento. Assim, conclui -se que, ainda que o ELE não in- tervenha diretamente sobre o modo de pensamento de seus leitores, ele continu- amente oferece ferramentas que auxiliam o processo de interpretação realizado pela instância protagonista do contrato: o re- ceptor. Ou seja, mesmo que o público não compartilhe integralmente das posições es- pecíficas da autora sobre as questões de gê- nero, é motivado por ela a pensar e discutir sobre o feminismo, e aí reside o seu poder de influência.
As limitações existentes nesta pes- quisa justificam-se sobretudo pela fer- ramenta de coleta de dados utilizada – o questionário não permite a interação en- tre pesquisador e pesquisado, necessá- ria para interpretar mais precisamente o discurso dos sujeitos receptores. Mas foi ferramenta essencial para possibilitar uma pesquisa dessa dimensão. Em pesqui- sa futura pretende-se realizar grupos de