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Análise da Obra de Vitor Marinho na Educação Física: Um Olhar Teórico-Epistemológico, Notas de aula de Educação Física

Este artigo analisa as obras de vitor marinho, um intelectual da educação física, buscando identificar sua perspectiva teórica-epistemológica em relação à reorganização coletiva da educação física a partir da década de 1980. Além disso, o texto aborda as aproximações e distanciamentos de determinadas correntes filosóficas, a visão de mundo de vitor marinho e a representação política presente em sua obra, e sua atuação como intelectual na educação física.

Tipologia: Notas de aula

2022

Compartilhado em 07/11/2022

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Amanda_90 🇧🇷

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O PENSAMENTO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DE VITOR MARINHO:
CONTRIBUIÇÕES PARA A FORMAÇÃO PROFISSIONAL E HUMANA
Leon Ramyssés Vieira Dias¹, Jennifer Aline Zanela³, Marcelo Ribeiro de Castro³
1. mestre em Tecnologia para o Desenvolvimento Social; professor de Educação Física
Escolar em Prefeitura Municipal de Araruama-RJ
2. mestre em Educação Escolar pela "Universidade Estadual Paulista Júlio Mesquita Filho",
professora do departamento de Educação Física do Colégio de Aplicação João XXIII da
Universidade Federal de Juiz de Fora.
3. doutor em História Social, professor de Polo Aquático da Prefeitura Municipal de Vila
Velha.
Correspondência para: leon_mv1@hotmail.com
Submetido em 20 de novembro de 2020
Primeira decisão editorial em 18 de fevereiro de 2021.
Segunda decisão editorial em 26 de março de 2021
Aceito em 05 de maio de 2021
RESUMO
A formação do pensamento político-pedagógico incide diretamente na compreensão sobre a
formação profissional e humana. O presente artigo busca analisar três obras de um autor da
Educação Física, Vitor Marinho, buscando identificar na obra desse intelectual um olhar através
do prisma teórico-epistemológico, compreendendo os avanços e limites na reorganização
coletiva da Educação Física a partir da década de 1980, bem como identificar aproximações e
distanciamentos de determinadas correntes filosóficas à luz de Antonio Gramsci. Como
resultado, identifica-se que Vitor Marinho rompe com a corrente epistemológica
fenomenológica e pode ser compreendido enquanto um intelectual orgânico para a Educação
Física, deixando, em sua obra, elementos fundamentais para apropriação aos professores no
sentido da formação profissional e humana.
Palavras-chave: Pensamento Político-pedagógico; Vitor Marinho; Intelectual Orgânico.
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O PENSAMENTO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DE VITOR MARINHO:

CONTRIBUIÇÕES PARA A FORMAÇÃO PROFISSIONAL E HUMANA

Leon Ramyssés Vieira Dias¹, Jennifer Aline Zanela³, Marcelo Ribeiro de Castro³

  1. mestre em Tecnologia para o Desenvolvimento Social; professor de Educação Física Escolar em Prefeitura Municipal de Araruama-RJ
  2. mestre em Educação Escolar pela "Universidade Estadual Paulista Júlio Mesquita Filho", professora do departamento de Educação Física do Colégio de Aplicação João XXIII da Universidade Federal de Juiz de Fora.
  3. doutor em História Social, professor de Polo Aquático da Prefeitura Municipal de Vila Velha.

Correspondência para: leon_mv1@hotmail.com Submetido em 20 de novembro de 2020 Primeira decisão editorial em 18 de fevereiro de 2021. Segunda decisão editorial em 26 de março de 2021 Aceito em 05 de maio de 2021

RESUMO

A formação do pensamento político-pedagógico incide diretamente na compreensão sobre a formação profissional e humana. O presente artigo busca analisar três obras de um autor da Educação Física, Vitor Marinho, buscando identificar na obra desse intelectual um olhar através do prisma teórico-epistemológico, compreendendo os avanços e limites na reorganização coletiva da Educação Física a partir da década de 1980, bem como identificar aproximações e distanciamentos de determinadas correntes filosóficas à luz de Antonio Gramsci. Como resultado, identifica-se que Vitor Marinho rompe com a corrente epistemológica fenomenológica e pode ser compreendido enquanto um intelectual orgânico para a Educação Física, deixando, em sua obra, elementos fundamentais para apropriação aos professores no sentido da formação profissional e humana. Palavras-chave: Pensamento Político-pedagógico; Vitor Marinho; Intelectual Orgânico.

VITOR MARINHO'S POLITICAL-PEDAGOGICAL THINKING: CONTRIBUTIONS

TO PROFESSIONAL AND HUMAN FORMATION

ABSTRACT

The formation of political-pedagogical thinking directly affects the understanding of professional and human formation. This article seeks to analyze three works by a Physical Education author, Vitor Marinho, seeking to identify in this intellectual's work a look through the theoretical-epistemological prism, understanding the advances and limits in the collective reorganization of Physical Education from the 1980s, as well as to identify approaches and distances from certain philosophical currents in the light of Antonio Gramsci. As a result, it is identified that Vitor Marinho breaks with the phenomenological epistemological current and can be understood as an organic intellectual for Physical Education, leaving, in his work, fundamental elements for appropriation to teachers in the sense of professional and human formation. Keywords: Political-pedagogical thinking; Vitor Marinho; Organic Intellectual.

EL PENSAMIENTO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DE VITOR MARINHO: CONTRIBUCIONES A LA FORMACIÓN PROFESIONAL Y HUMANA

RESUMEN La formación del pensamiento político-pedagógico incide directamente en la comprensión de la formación profesional y humana. Este artículo busca analizar tres trabajos de un autor de Educación Física, Vitor Marinho, buscando identificar en el trabajo de este intelectual una mirada a través del prisma teórico-epistemológico, entendiendo los avances y límites en la reorganización colectiva de la Educación Física de los años ochenta, así como identificar acercamientos y distancias a determinadas corrientes filosóficas a la luz de Antonio Gramsci. Como resultado, se identifica que Vitor Marinho rompe con la corriente epistemológica fenomenológica y puede entenderse como un intelectual orgánico para la Educación Física, dejando, en su obra, elementos fundamentales de apropiación a los docentes en el sentido de formación profesional y humana. Palabras-clave: Pensamiento político-pedagógico; Vitor Marinho; Intelectual Orgánico.

1. INTRODUÇÃO A política está aliada a componentes como sociedade e cultura, de maneira que para compreendê-la torna-se necessário abordar também estes elementos. Esse tripé, de forma consciente ou reproduzida, faz parte da construção do pensamento humano. No entanto, ao conhecê-los potencializam-se as orientações das nossas próprias ações, individualmente e coletivamente. Entre as tantas definições atribuídas à política, podemos entendê-la como manifestação da arte, da ciência ou do modo de administrar a vida coletiva da sociedade. Compreender as questões políticas sugere, necessariamente, conhecer a própria sociedade em que se vive e a cultura em que se está inserido. Assim, possibilita-se a formação de indivíduos

de cunho bibliográfico. Para apresentação dos dados coletados, dividimos o artigo em três momentos. Inicialmente, faremos a discussão de três importantes obras de Vitor Marinho, posteriormente, apresentaremos uma relação entre Vitor Marinho e o conceito de intelectual orgânico de Antonio Gramsci e, por fim, apresentaremos as considerações finais.

2. A OBRA DE VITOR MARINHO: COMPROMISSO COM A FORMAÇÃO PROFISSIONAL E HUMANA 2.1 Educação Física Humanista e O que é Educação Física O livro Educação Física Humanista (publicado em 1985) foi escrito em 1981, fruto da dissertação de mestrado de Vitor Marinho. Nessa produção, o autor relaciona a educação às teorias comportamentalistas de estímulo-resposta estudadas e aprofundadas por Skinner. Embasado teoricamente na psicologia humanista de Rogers, Vitor Marinho faz críticas às teorias comportamentalistas presentes na educação. O livro teve influência no meio docente ao apresentar uma proposta que até então era nova na Educação Física, pensá-la por um viés humanista. Assim, a produção ficou marcada pela presença dos princípios filosóficos em torno do indivíduo, valorizando sua identidade e introduzindo o princípio não-diretivo de ensino (MARINHO, 2010). A concepção política presente em Marinho (2010) não se manifesta explicitamente no texto, pois Vitor Marinho não faz um debate específico sobre política. No entanto, não se deve negá-la. Apesar da ausência do debate político, deve-se compreender que a produção representa as circunstâncias históricas do pensamento crítico da década de 1980 (MALINA; AZEVEDO, 2010). O viés pelo qual Vitor Marinho constrói suas críticas à Educação Física naquela época

  • o humanismo – nesse momento, não foi capaz de ultrapassar as quadras ou as salas de aula e penetrar na maneira de compreender a sociedade. Isso porque apesar do contexto histórico que culminou na quebra dos paradigmas e em uma nova maneira de pensar a Educação Física, a questão política não é tratada diretamente por Vitor Marinho no livro, que se limita em apenas discutir a Educação e a Educação Física numa perspectiva psicologista. Em Gramsci (1999), pode-se entender que a política e a ideologia têm um papel fundamental na organização social. É a política – práxis , elemento de catarse – que possibilita a elevação do nível de consciência, formada nas determinações imediatas da vida cotidiana. Dessa maneira, compreende-se que a quebra de paradigmas comportamentalistas que o livro propõe representa a tentativa de uma demarcação política de Vitor Marinho.

Por outro lado, ainda com Gramsci (1999), podemos compreender que na construção do texto, ao não se manifestar teoricamente a aproximação da política à educação, a crítica construída por Vitor Marinho não é fundamentada na filosofia da práxis , se aproximando do senso comum. Isso porque, Gramsci (1999) afirma que uma filosofia da práxis só pode apresentar-se, inicialmente, em atitude polêmica e crítica, como a superação da maneira de pensar precedente e do pensamento concreto existente. Logo, uma introdução ao estudo da filosofia deve expor os problemas nascidos no processo de desenvolvimento da cultura geral que só parcialmente se reflete na história da filosofia. A posição da filosofia da práxis deve se fundamentar do elemento político, de maneira que permita conduzir os indivíduos a uma concepção de vida superior. A ausência do componente político fica evidente nas conclusões do autor, no capítulo 5. Após as críticas ao comportamentalismo e o longo trajeto de construção de uma prática humanista no ensino da Educação Física, ao sintetizar suas ideias, Vitor Marinho não aborda o papel social transformador que o professor pode desenvolver e nem a direção que a proposta humanista deve tomar. Desse modo, em Marinho (2010), o pensamento crítico sobre as questões do ensino e do papel do professor, por não serem pensadas a partir do prisma político, não extravasa as questões de ordem pedagógica. Ao discutir apenas os aspectos do âmbito educacional e não tratar como esses aspectos estão relacionados a outras contradições da sociedade, Vitor Marinho parece considerar a educação como elemento isolado e imune das mazelas sociais. No entanto, a contradição que parece haver na relação entre a representatividade – ao propor, de forma indireta, o rompimento com os valores hegemônicos da sociedade capitalista que se manifestam na Educação e na Educação Física – e a não sistematização dessa representação política no livro, pode ser explicada. No final da década de 1970, início dos anos 80, período de escrita dos livros Educação Física Humanista e O que é Educação Física (OLIVEIRA, 2008), os enfoques fenomenológicos nas pesquisas em Ciências Sociais se acentuaram na medida em que a tradição imperativa do positivismo diminuía. Segundo Triviños (1987) nessa época, o entusiasmo da utilização de uma nova corrente contagiava os pesquisadores na área da educação. Aos poucos se perdia o hábito positivista^3 que amarrava os

(^3) O Positivismo quanto método aprofunda a preocupação excessiva com a observação dos fatos e suas relações, trazendo maior importância ao “como fazer” em detrimento do “o que fazer”, “por quê fazer” e “para que fazer”. O Positivismo busca a objetividade do conhecimento e propõe a aplicação desses pressupostos às ciências humanas e sociais (MARINHO, 2005).

se possível afirmar que a partir da compreensão de Vitor Marinho todos esses aspectos são indissociáveis para compreendê-la. Mais que isso, esses aspectos são e ajudam a entender a Educação Física em sua essência, além de como ela se manifesta no próprio pensamento pedagógico de Vitor Marinho. O autor se embasa nesses preceitos para construir suas conclusões. Ao se aproximar do referencial de análise à luz das Ciências Humanas e Sociais, na perspectiva fenomenológica, foca no conhecimento que se destina ao estudo das atividades do homem. Ao fazer um resgate da concepção de Educação Física e de seu papel social em diferentes momentos históricos, desde a Pré-História até seu tempo, Vitor Marinho introduz o pensamento político e as questões políticas na construção de suas ideias. Isso pode ser notado na escolha de Vitor Marinho em categorizar a política e suas questões para observar como o homem se comportou em diferentes tempos históricos, utilizando-a enquanto embasamento para a manifestação das ações humanas. Desse modo, o pensamento político começa a tomar forma na obra e permeia a análise do autor na construção de seu pensamento. Outras manifestações dessa categoria em Oliveira (2008) é que Vitor Marinho, além de trazer o prisma político para olhar as diferentes sociedades, também procurou entender como o homem se manifestava politicamente e qual era a relação com a Educação Física. Mais que isso, o autor procurou evidenciar o papel político que era atribuído à Educação Física em diferentes períodos históricos, como é feito no tópico “Antes de tudo o poder” e ao tratar da área no Brasil. No livro também é possível observaras conotações políticas que o autor associa ao esporte nesse modelo de sociedade em que vivemos, acreditando ele tem tomado caráter de aparelho ideológico; o entendimento de que a ginástica foi usada historicamente para disciplinar os corpos tornando-os obedientes e preparando-os para servir ao Estado; o entendimento da escola como reprodutora do projeto societário vigente; as influências políticas estão presentes em todas as épocas, como no caso em que as lideranças se utilizavam da Educação Física, seja para preparar os corpos para a guerra; como instrumento ideológico para falsear a realidade social; como mecanismo de poder; ou para mostrar uma falsa superioridade como nação ou por controle social. Diferente do que foi visto em Marinho (2010) e em Oliveira (2008), Vitor Marinho não destina suas análises apenas ao campo educacional e ao trabalho do professor, apesar de também abordá-los, mas trata a Educação Física como uma prática social e a pensa junto aos demais segmentos da sociedade. No livro, as questões abordadas ganham conotação política que foram pensadas pela ótica dos acontecimentos políticos foram sintetizadas pelo autor nos tópicos

“Educação física é política?”, “A Educação física e a sociedade”, “A função do professor” e “Ser ou não ser, eis a resposta”. No entanto, outra questão a ser observada é que Vitor Marinho compreende no embate político-ideológico não há espaço apenas para os valores dominantes, esboçando uma proposta contra-hegemônica. As questões evidenciadas no pensamento do autor demonstram o início da transição do pensamento teórico-epistemológico fenomenológico para o pensamento teórico-epistemológico marxista – que se consolida, de forma explícita, na obra “ Consenso e Conflito ” –, pois, implicitamente, demonstra compreender que há classes sociais que lutam pela hegemonia e que reproduzem seus valores nos mais diversos campos da sociedade. Como evidência do início transição para a consciência crítica concreta, ao tratar dos assuntos educacionais, Vitor Marinho não aborda apenas o caráter educativo como fez em Educação Física Humanista , mas já se refere ao papel político da escola e do professor, aprofundando o nível de criticidade em relação ao seu primeiro livro. O autor entende que as escolas e os meios de comunicação trabalham para produzir indivíduos adaptados à sociedade a que pertencem, formando pessoas dependentes, acríticas e submissas, visto que “o restabelecimento dos laços que identificam o homem com a sociedade implica, inicialmente, a identificação desse homem consigo mesmo” (OLIVEIRA, 2008, p.96). Já, quanto às funções da Educação Física na sociedade o autor afirma:

As funções da Educação Física, porém, não se esgotam no seu relacionamento com o indivíduo. Este não deve ficar isolado do contexto no qual está inserido, pois corre o risco de se transformar num simples paciente (agora no sentido social) das forças que interagem à sua volta (OLIVEIRA, 2008, p.97).

No entanto, o que se pode notar no livro é que apesar da evolução da radicalidade no pensamento crítico de Vitor Marinho, trazendo uma visão mais crítica da sociedade, a referida obra também não aponta para a transformação social e emancipação humana, mesmo mostrando em seus escritos que entende a necessidade das mudanças no âmbito educacional. O que é Educação Física parece marcar o início da transição de Vitor Marinho da fenomenologia para o pensamento marxista, em que o entendimento crítico da Educação e da Educação Física pelo autor se alinha com o fundamento político, eliminando a contradição entre entendimento teórico e prático^4. À luz de Gramsci (1999), pode-se afirmar que o desenvolvimento da filosofia da práxis é um processo de autoconsciência.

(^4) No posfácio da segunda edição do livro O que é Educação Física escrito em 2011, sem o intuito de realizar uma atualização do livro, mas assumindo sua mudança, Vitor Marinho amplia a crítica do livro em aspectos políticos e

O pensamento marxista promoveu algumas mudanças significativas no entendimento de Vitor Marinho para algumas questões. Entre elas, o referencial teórico-epistemológico do autor, culminando em nova maneira de fazer pesquisa e desenvolver seus estudos; a utilização de um novo método em suas produções – o materialismo histórico – lhe orientou uma nova visão de mundo. Como consequência disso, a maneira de enxergar o homem, a sociedade e a educação também se modificaram. No que se refere ao homem, Vitor Marinho entende-o como fruto de múltiplas determinações, diferente da visão holística que rejeita o dualismo entre corpo e mente, mas aprisiona o homem a si mesmo por negar a dimensão política dos indivíduos e por descartar as relações sociais no entendimento do homem. As determinações históricas são essenciais para compreender o homem e a sociedade em que se vive. Desse modo, na dimensão política, Vitor Marinho assume uma luta contra o capitalismo. A questão central não está relacionada apenas a reivindicar a manifestação dos problemas, mas sim a raiz desses problemas, no caso o modo de produção capitalista (MARINHO, 2005). Diante da perspectiva marxista, no que se refere à sociedade, Vitor Marinho além de reconhecer a gêneses dos problemas sociais que, consequentemente, são os problemas da Educação e da Educação Física, aponta para uma intervenção concreta. Desse modo, defende o rompimento com esse modelo de sociedade, apontando para o comunismo como superação do capitalismo e como meio de atingir a realização plena do ser humano. Vitor Marinho vê a necessidades de resgatar os valores autenticamente marxistas para atingir não somente a elevação do nível de consciência dos trabalhadores, mas também a alteração da base econômica da sociedade. Segundo o autor, deve-se compreender que essas duas etapas não são momentos diferentes, mas que acontecem de forma simultânea: a conscientização se dá no processo de luta para a transformação da sociedade. É a práxis que recupera dialeticamente as unidades teoria/prática e sujeito/objeto (MARINHO, 2005). No que se refere à educação o entendimento do autor é de que as correntes que representam o pensamento pedagógico da Educação, bem como da Educação Física brasileira, transitam entre tendências conservadoras e progressistas. Isso o faz acreditar que a Educação Física só dará um salto qualitativo quando os envolvidos na área entenderem quais são os valores presentes em nossa sociedade e que, ainda assim, na sociedade em que vivemos não circulam apenas os valores dominantes. Assim, a escola acaba se tornando um instrumento pelo qual a classe dominante instaura e reproduzem os seus interesses e o máximo que se consegue

alcançar na sociedade de classes é diminuir as desigualdades. Pode-se afirmar que para Vitor Marinho a educação deve estar pautada na pedagogia do conflito^5 , trazendo elementos apresentados na pedagogia socialista, na escola unitária e no princípio educativo^6 , buscando romper com a hegemonia burguesa através da proposta contra-hegemônica marxista (MARINHO, 2005). O professor, nessa perspectiva, deve ser o intelectual orgânico que tem o papel transformador, elevando a classe trabalhadora o máximo de consciência possível. Segundo Vitor Marinho, as massas não vão despertar espontaneamente para a necessidade da transformação social, então, se torna papel do professor, através do seu trabalho, ajudar na superação do senso comum. A perspectiva crítica auxilia é ponto central nesse processo, pois permite ter a visão da totalidade, resultando no entendimento da sociedade em que se vive. Diferente dessa perspectiva, as críticas serão referidas ao sistema educacional ou nas práticas pedagógicas ou ainda mesmo nas próprias pessoas, o que dá uma visão atomizada da sociedade e enfraquece a luta contra o sistema capitalista (MARINHO, 2005). Dessa maneira, a mudança epistemológica de Vitor Marinho para o marxismo o fez acreditar na necessidade de uma postura mais radical, pois não se modifica a Educação ou a Educação Física sem se transformar a sociedade. Na sua concepção não se deve evitar o confronto entre a pedagogia do consenso e a pedagogia do conflito, pois as duas por serem antagônicas não devem ser conciliadas dentro da perspectiva marxista de transformação. Em suas conclusões ou, como o próprio Vitor Marinho se refere “na agenda para o conflito”, o autor radicaliza seu pensamento crítico à essência marxista quando comparado ao pensamento crítico que ele desenvolveu na escrita norteada pela fenomenologia. Entre as principais diferenças da concepção do autor nas diferentes perspectivas é que, em Marinho (2005) compreende-se a necessidade de reconhecer essa sociedade como capitalista. Outra questão é o entendimento do autor de que os valores postos nessa sociedade, por mais que pretendam algum tipo de justiça – diminuir as desigualdades – , estão a favor da organização

(^5) A pedagogia do conflito é embasada por Vitor Marinha nos conceitos de escola unitária e no princípio educativo de Gramsci, bem como na pedagogia socialista de Charlot. Nela, não há espaço para as dicotomias de corpo e mente, trabalho manual e trabalho intelectual, escola de dirigentes e escola profissional. A formação proposta por Vitor Marinho visa à formação integral do indivíduo, desenvolvendo as múltiplas capacidades. Na perspectiva do conflito a Educação Física deve destruir os valores que a pedagogia do consenso vem legitimando e difundir seus próprios valores: cooperação, auto-organização, entre outros. Desse modo, escolhe a escola como uma o meio de realização de parte desse processo. Para a pedagogia do conflito Vitor Marinho se embasa na teoria marxista e seus desdobramentos, como a pedagogia socialista (MARINHO, 2010). 6 Ver: GRAMSCI, Antonio. Cadernos do cárcere. Os intelectuais. O princípio educativo. Jornalismo. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. Volume 2, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.

hegemônicas, Vitor Marinho não apenas rompe com a fenomenologia, mas, inaugura, ao lado de outros autores, uma possibilidade de refletir a Educação Física apontando para uma direção distinta no que diz respeito à formação humana, bem como da formação profissional. O debate sobre a política se potencializa ao longo de sua obra. Em contraposição à produção da época, o autor redimensiona a questão da técnica. Identificamos, assim, que Vitor Marinho não desconsidera a importância do elemento técnico na formação do homem, na prática do professor ou nas aulas de Educação Física, mas entende que é preciso compreender qual é a proposta da técnica nesse contexto e por isso a necessidade da discussão política. Desse modo, a introdução do elemento político é quem vai esclarecer a perspectiva que a técnica pode assumir na vida do homem, no trabalho do professor ou nas aulas de Educação Física. Se o debate político é omitido da ação humana ou tende para a “neutralidade”, a técnica se manifestará de forma assimilada, acrítica. Se o pensamento político está atrelado ao componente técnico, a técnica pode ser entendida como instrumento para a superação da alienação do indivíduo, afastando toda e qualquer ação da perspectiva tecnicista. Logo, pode- se entender que a técnica e a política assumem um caráter pedagógico na obra de Vitor Marinho em que o componente técnico sem o fundamento político recai sobre uma prática alienada e que o pensamento político sem a técnica não cumpre o papel da Educação Física na sociedade. A análise da obra de Vitor Marinho faz-se necessária para entender o seu pensamento epistemológico. A escrita é a maneira pela qual alguns intelectuais se expressam e, mais que isso, intervém na sociedade, manifestando algumas questões relacionadas ao contexto histórico que estão inseridos. Gramsci (2001) apresenta que os intelectuais orgânicos são possuidores de um conhecimento amplo, para além da especificidade de sua atividade. Nesse caso, a relação entre Vitor Marinho e a Educação Física não se limitou a relação “ professor x ensino ” ou “ professor x aluno ”, mas ultrapassou os paradigmas tradicionais do ensino e de suas concepções fundantes – as perspectivas: militar, eugenista, médica e higienista. A visão contestadora de Vitor Marinho, seja para as questões do ensino da Educação Física ou para a função social que ela manifesta, o colocou na condição de intelectual orgânico da Educação Física brasileira. É importante sinalizar que o conceito de intelectual em Gramsci (2001) não se refere necessariamente, a um letrado, um universitário ou a um honoris causa. Ao contrário disso. Devido a diversos fatores sociais, durante o processo de aprendizado ou surgimento de oportunidades da vida, algumas pessoas não conseguem alcançar o desenvolvimento pleno das capacidades, porém, continuam com o potencial de se tornarem intelectuais. O indivíduo, produto de um grupo social, que dentro de suas próprias fileiras é organizador ou dirigente da

sociedade, pode ser denominado de intelectual orgânico. Esse indivíduo é fundamental à busca por uma nova ordem vigente para a sociedade a partir de determinada classe social (MALINA, 2016). Vitor Marinho enquanto intelectual orgânico contribuiu plenamente para a organização de uma visão crítica na Educação Física e na formação humana e profissional. Gramsci (2001) nos ajuda a compreender que os intelectuais orgânicos além de especialistas na profissão que exercem – fato que os vinculam com o modo de produção de seu tempo – elaboram uma concepção ético-política própria que os permitem exercer funções educativas, culturais e organizativas, de modo a assegurar a hegemonia social e o domínio estatal da classe que representam. Os intelectuais orgânicos não manifestam sua concepção política de forma inconsciente; pelo contrário, conscientes de seus vínculos de classe, manifestam sua atividade intelectual de diversas formas e em diversos espaços: na sociedade civil de modo a construir o consenso em torno do projeto de classe que defendem, no trabalho, como especialistas dos conhecimentos mais avançados; na sociedade política para garantir a manutenção do poder de seu grupo social, entre outras maneiras. Nesse mesmo sentido, podemos compreender a relevância e a representatividade de Vitor Marinho, não apenas por sua obra, mas por sua própria figura. Apesar da formação inicial em Educação Física, Vitor Marinho sentiu a necessidade de recorrer a outras áreas do conhecimento para expandir seus estudos e o seu entendimento sobre a Educação Física. Desse modo, sem abandonar seu objeto de estudo, Vitor encontrou no aporte das Ciências Humanas, das Ciências Sociais e da Educação os elementos necessários para subsidiar suas análises. Sem negar sua visão de mundo, seu posicionamento político-ideológico norteou sua concepção pedagógica e o seu trabalho docente. Por se entender como classe trabalhadora, suas produções foram à maneira que Vitor encontrou de militar no segmento social da educação em prol dos interesses de sua classe, seja em debates direcionados à Educação Física ou à Educação, no geral. Pelo Conflito , Vitor Marinho tentou romper com os valores dominantes e estabelecer os valores da classe trabalhadora. Esses valores contra-hegemônicos, fruto das determinações históricas no qual o autor esteve submetido, constituíram seu pensamento político-pedagógico. A contribuição deixada por Vitor Marinho oferece elementos para pensar não somente a Educação Física, mas toda a Educação, a formação profissional e humana, bem como o ensino e o homem, ou seja, toda a sociedade e os elementos que a compõe. Sua obra mostra isso. A organização temporal de suas produções permite essa afirmação. Ela explicita a consolidação do pensamento formado a partir de uma continuidade histórica e que não foi interrompida nem mesmo pelas mais complicadas e radicais modificações das formas sociais e políticas. De

No livro Consenso e Conflito, Educação Física Brasileira, Vitor Marinho rompe com a fenomenologia e inaugura para a área a sistematização da produção acadêmico-científica localizada no consenso e/ou no conflito. Nesse processo, a política ganha ênfase para o autor e suas produções contribuem para uma reformulação da Educação Física brasileira. Nesse sentido Vitor pode ser considerado um intelectual orgânico da Educação Física e, consequentemente, da nossa sociedade, pois, os intelectuais orgânicos estão interligados ao mundo do trabalho, da política e da cultura, sendo os mais avançados em seu grupo social, desenvolvendo-se para dirigir a sociedade, fazendo parte de um organismo em expansão. Em uma sociedade de supressão e cooptação dos intelectuais orgânicos, o pensamento epistemológico de Vitor Marinho mostra a trajetória de um intelectual que transitou entre diferentes correntes filosóficas do pensamento contemporâneo, porém, não deixando de lado a essência humanista de seu pensamento evidencia a postura de um intelectual atuante que lutou contra os valores hegemônicos da sociedade vigente e a favor de uma sociedade sem classes, entendendo as mazelas causadas pelo capitalismo não apenas à esfera político-econômica, mas às próprias relações interpessoais que afastam a essência humanista dos indivíduos. Nesses termos, a apropriação de Vitor Marinho contribui para o processo de formação humana e profissional de professores de Educação Física e para a sociedade de forma geral.

6. REFERÊNCIAS GRAMSCI, Antonio. Cadernos do cárcere. Antonio Gramsci: introdução ao estudo da filosofia. A filosofia de Benedetto Croce.Ed. e trad. de Carlos N. Coutinho. Coed. de Luiz S. Henriques e Marco A. Nogueira. v. 1. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1999.

GRAMSCI, Antonio. Cadernos do cárcere. Os intelectuais. O princípio educativo. Jornalismo. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. Volume 2, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.

KOSIK, Karel. Dialética do Concreto. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

MALINA, André; AZEVEDO, Ângela Celeste Barreto de. Prefácio à 2ª Edição. In: MARINHO, Vitor. Educação Física Humanista. 2ª ed. - Rio de Janeiro: Shape, 2010.

MALINA, André. Gramsci e a questão dos intelectuais. Editora UFMS, 2016

MARINHO, Vitor. Educação Física Humanista. 2ª ed. - Rio de Janeiro: Shape, 2010.

MARINHO, Vitor. Consenso e Conflito : Educação Física Brasileira, 2ª ed. - Rio de Janeiro: Shape, 2005.

OLIVEIRA, Vitor Marinho. O que é Educação Física. São Paulo: Brasiliense, 2008.

TRIVIÑOS, A. N. S. Introdução à Pesquisa em Ciências Sociais : a pesquisa qualitativa em Educação. São Paulo: Atlas, 1987.