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O "Abominável Mistério" do surgimento das Angiospermas, Notas de estudo de Evolução

4 Charles Robert Darwin, A Origem das Espécies (Londres: John Murray, 1859). Page 3. 62. Valdir Lamim-Guedes. Volume 10, 2014 – pp ...

Tipologia: Notas de estudo

2022

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O "Abominável Mistério" do surgimento das
Angiospermas
____________________________________
Valdir Lamim-Guedes
Resumo
Charles Robert Darwin (1809-1882) chamou de “Abominável Mistério” o
surgimento, rápida diversificação e dominância das Angiospermas no registro
fóssil. A explicação encontrada por Darwin foi de que a origem das angiospermas
teria sido restrita geograficamente com uma rápida expansão. Contudo, ele
próprio considerou tal hipótese conjecturalmente pobre. Uma hipótese
alternativa foi proposta por Louis Charles Joseph Gaston de Saporta (1823
1895): um conjunto de eventos evolutivos de interações entre angiospermas e
insetos teria um papel central na rápida diversificação das angiospermas no
Jurássico. A hipótese de Gaston de Saporta foi confirmada, posteriormente, pela
ampliação do conhecimento sobre o registro fóssil e por estudos moleculares. A
fantástica diversificação dos insetos e angiospermas atuais deve-se, em grande
parte, a um padrão de etapas coevolutivas graduais. A evidência geral sugere
que, em parte, a coevolução conduziu os insetos e as plantas a cobrirem o globo
atual.
Palavras-chave: Angiospermas; Coevolução; Darwin, Charles Robert;
Saporta, Louis Charles Joseph Gaston de.
Abstract
Charles Robert Darwin (1809-82) called “Abominable Mystery” the appearance,
rapid diversification and dominance of the Angiosperms in the fossil record. The
explanation found by Darwin was that the source of angiosperms have been
geographically restricted, with a rapid expansion. However, he considered this
hypothesis tentatively poor. An alternative hypothesis was proposed by Louis
Charles Joseph Gaston de Saporta (182395): a set of evolutionary events of
interactions between angiosperms and insects have a central role in the rapid
diversification of angiosperms during the Jurassic. The hypothesis of Saporta was
further confirmed then by the expansion of knowledge about the fossil record
and molecular studies. The fantastic diversification of insects and angiosperms
suggests, largely, that coevolution led the insects and plants to cover the globe
today
Keywords: Angiosperms; Coevolution; Darwin, Charles Robert; Saporta, Louis
Charles Joseph Gaston de.
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O "Abominável Mistério" do surgimento das

Angiospermas

____________________________________ Valdir Lamim-Guedes

Resumo Charles Robert Darwin (1809-1882) chamou de “Abominável Mistério” o surgimento, rápida diversificação e dominância das Angiospermas no registro fóssil. A explicação encontrada por Darwin foi de que a origem das angiospermas teria sido restrita geograficamente com uma rápida expansão. Contudo, ele próprio considerou tal hipótese conjecturalmente pobre. Uma hipótese alternativa foi proposta por Louis Charles Joseph Gaston de Saporta (1823– 1895): um conjunto de eventos evolutivos de interações entre angiospermas e insetos teria um papel central na rápida diversificação das angiospermas no Jurássico. A hipótese de Gaston de Saporta foi confirmada, posteriormente, pela ampliação do conhecimento sobre o registro fóssil e por estudos moleculares. A fantástica diversificação dos insetos e angiospermas atuais deve-se, em grande parte, a um padrão de etapas coevolutivas graduais. A evidência geral sugere que, em parte, a coevolução conduziu os insetos e as plantas a cobrirem o globo atual. Palavras-chave : Angiospermas; Coevolução; Darwin, Charles Robert; Saporta, Louis Charles Joseph Gaston de.

Abstract Charles Robert Darwin (1809-82) called “Abominable Mystery” the appearance, rapid diversification and dominance of the Angiosperms in the fossil record. The explanation found by Darwin was that the source of angiosperms have been geographically restricted, with a rapid expansion. However, he considered this hypothesis tentatively poor. An alternative hypothesis was proposed by Louis Charles Joseph Gaston de Saporta (1823–95): a set of evolutionary events of interactions between angiosperms and insects have a central role in the rapid diversification of angiosperms during the Jurassic. The hypothesis of Saporta was further confirmed then by the expansion of knowledge about the fossil record and molecular studies. The fantastic diversification of insects and angiosperms suggests, largely, that coevolution led the insects and plants to cover the globe today Keywords : Angiosperms; Coevolution; Darwin, Charles Robert; Saporta, Louis Charles Joseph Gaston de.

INTRODUÇÃO

O mundo é azul, como afirmou o cosmonauta soviético Yuri Gagary (1934-1968) ao ver o Planeta Terra do espaço em 1961^1. Mas o planeta poderia ser verde, já que a superfície da Terra é verde por causa das plantas; a superfície do mar também seria se o seu tapete flutuante de fotossintetizantes fosse formado por plantas macroscópicas em vez de microrganismos pequenos demais para refletir quantidades perspectivas de luz verde^2.

As plantas usam a energia do Sol para fixar o carbono e todos os animais dependem da energia armazenada pelas plantas. Apesar disso, os animais não comem todas as plantas. Charles Robert Darwin (1809-1882) propôs uma solução para este paradoxo: a adaptação evolutiva por seleção natural. Ele possibilitou o entendimento do surgimento e manutenção das defesas das plantas e a habilidade de insetos e outros herbívoros de driblar estas defesas^3. Darwin, com muitos exemplos e evidências de diferentes áreas, provou que ocorre evolução e que o processo é a seleção natural. Em “A Origem das Espécies”^4 , Darwin usou o caso das adaptações mútuas entre plantas e abelhas como um exemplo de como a seleção natural atua; concluiu da seguinte forma:

e isso me faz compreender como podem as flores e as abelhas tornarem-se pouco a pouco, seja de forma simultânea, seja de maneira subsequente, modificadas e adaptadas umas às outras do modo mais perfeito, através da preservação continuada dos indivíduos portadores de desvios estruturais favoráveis à sua

(^1) Quarta-feira, 12 de abril de 1961; a bordo da nave Vostok 1, na qual deu uma volta completa em órbita ao redor do planeta. 2 Richard Dawkins, A Grande História da Evolução: Na Trilha dos Nossos Ancestrais (São Paulo: Companhia das Letras, 2009). 3 Henry F. Howe & Lynn C. Westley, Ecological Relationships of Plants and Animals (New York: Oxford University Press, 1988). 4 Charles Robert Darwin, A Origem das Espécies (Londres: John Murray, 1859).

carbônico que as plantas superiores, a mim, a hipótese parece muito precipitada.^8

O “Abominável Mistério” é o surgimento, rápida diversificação e dominância das Angiospermas no registro fóssil^9. Considerando a mudança evolutiva gradual, defendida por Darwin, esse surgimento repentino causou certo desconforto no cientista, especialmente quando, em uma carta datada de 1875, Oswald Heer (geólogo e botânico suíço, 1809-1883) sugeriu uma rápida evolução para as angiospermas, em essência, saltacionista^10. Já que as espécies novas eram perfeitamente adaptadas e não existiam evidências de produção frequente de espécies mal adaptadas, Darwin deparou-se com apenas duas hipóteses: a criação de novas espécies por um criador ou a evolução gradual de espécies preexistentes por um processo lento, que mantinha sua adaptação a cada estágio. Foi essa segunda opção que Darwin adotou, distanciando-se drasticamente da tradição, ou seja, de uma perspectiva essencialista - as espécies são entidades discretas, com pouca variabilidade, que foram criadas como são atualmente -, com a qual as teorias saltacionistas eram perfeitamente compatíveis^11. Segundo Ernest Mayr^12 , Darwin passou grande parte de sua vida reconstruindo um fenômeno de evolução gradual que, à primeira vista, era claramente o resultado de uma origem súbita. Darwin explicou a distribuição restrita dos primeiros fósseis de angiospermas usando um argumento biogeográfico. A origem desse grupo de plantas teria, provavelmente, ocorrido em uma região limitada, talvez no Hemisfério Sul, e depois colonizou rapidamente outras regiões. Contudo, ele próprio considerou esta hipótese conjecturalmente pobre (na

(^8) Francis Darwin & Albert Charles Seward, More Letters of Charles Darwin, vol 2 (London: John Murray, 1903). 9 , Ruth A. Stockey, Sean W. Graham, & Peter R. Crane, “Introduction to the Darwin Special Issue: The Abominable Mystery,” 10 American Journal of Botany 96, nº 1 (2009): 3-4. 11 Friedman,^ “The Meanung of Darwin's ‘Abominable Mystery’”. Ernest Mayr, Biologia, Ciência Única: Reflexões sobre a Autonomia de uma Disciplina Científica (São Paulo: Companhia das Letras, 2005), 119. 12 Ernest Mayr, The Growth of Biological Thought: Diversity, Evolution, and Inheritance (Cambridge, MA: Harvard University Press, 1982), 509.

carta a J. D. Hooker de 22-nov-1879). Assim, a opinião de Darwin é a de que a diversificação das angiospermas foi gradual, mas que não ficou registrada em fósseis.

UMA HIPÓTESE ALTERNATIVA Uma hipótese alternativa foi proposta pelo paleobotânico francês Louis Charles Joseph Gaston de Saporta (1823–95). Segundo Gaston de Saporta, o conjunto de interações mútuas entre angiospermas e insetos teve um papel central na rápida diversificação das angiospermas no Jurássico:

Saporta acredita que houve um surpreendentemente rápido desenvolvimento das plantas superiores, assim como os insetos que frequentam flores foram desenvolvendo e favorecendo intercruzamentos. Eu gostaria de ver este problema resolvido.^13

Gaston de Saporta foi o primeiro a sugerir um crítico e independente papel dos insetos na emergência e diversificação das angiospermas^14. Agora se pode compreender muito bem que as angiospermas, das quais as combinações florais e o cruzamento entre indivíduos e entre flores depende do papel dos insetos, pôde apenas surgir e desenvolver-se pelo impulso do último, e o último, por sua parte, pôde tornar-se numeroso e ativo [como polinizador], e ligar-se a determinado tipo, por esta razão o aparecimento de plantas favoreceu sua existência; insetos e plantas têm, portanto, sido simultaneamente causa e efeito através das conexões entre si, plantas não sendo hábeis para diversificar sem insetos e estes não sendo hábeis para provir pólen e néctar tanto quanto o reino vegetal é pobre em combinações e é composto quase exclusivamente de plantas anemófilas.^15

(^13) Trecho da carta de Charles R. Darwin (22 julho de 1879) a Joseph Hooker. Disponível em Darwin & Seward 14_._ 15 Friedman,^ “The Meanung^ of Darwin's ‘Abominable Mystery’”. Yvette Conry, Correspondance entre Charles Darwin et Gaston de Saporta (Paris: Presses Universitaires de France, 1972).

partir de estudos com fósseis e, complementariamente, com espécies atuais. Têm sido identificadas tendências na evolução das angiospermas e o possível efeito sobre a diversificação. Por exemplo, a importância de características biológicas, como as interações bióticas (polinização e dispersão de semente) e flexibilidade na história de vida^20. Por fim, avanços em estudos moleculares têm lançado luz sobre esta questão, ainda que evidências de mecanismos fisiológicos, moleculares, genéticos e epigenéticos têm sido geralmente utilizadas por programas de pesquisas reducionistas, identificando atributos básicos entre plantas viventes^21.

Mas, ainda, persiste uma dúvida: o que levou a esta grande diversificação das Angiospermas, isto é, riqueza de espécies e sucesso ecológico? Esse poderia ser considerado um segundo abominável mistério ou uma segunda dimensão deste?^22 , levando-se em conta a dominância desse grupo nos ambientes terrestres e, ainda, a variedade de formas de vida como, ervas, lianas e árvores, por exemplo.

Alguns táxons são muito mais ricos em espécies que outros; isso, muitas vezes, é explicado pelo surgimento de inovações chaves ( key innovations ) que influenciam a especiação e extinção^23. No caso dos humanos, o uso de ferramentas foi uma inovação chave, assim como o crescimento do cérebro. Entre plantas, a imensa diferença na riqueza de espécies entre as angiospermas (>250.000 spp.) e as gimnospermas (±758 spp.) tem sido atribuído à inovação chave representada pela evolução da flor^24.

(^20) T. Jonathan Davies, Timothy G. Barraclough, Mark W. Chase, Pamela S. Soltis, Douglas E. Soltis, & Vincent Savolainen, “Dawin's Abominable Mystery: Insights from a Supertree of the Angiosperms,” 21 Proceedings of the National Academy of Sciences 101, nº 7 (2004): 1904-1909. William L. Crepet & Karl J. Niklas, “Darwin's Second ‘Abominable Mystery’: Why Are There So Many Angiosperm Species?” 22 American Journal of Botany 96, nº 1 (2009): 366-381. 23 Ibid. Michael E. Dodd, Jonathan Silvertown, & Mark W. Chase, “Phylogenetic Analysis of Trait Evolution and Species Diversity Variation Among Angiosperm Families,” Evolution 53, nº 3 (1999): 73224 - 744. George Ledyard Stebbins, “Why Are There So Many Species of Flowering Plants?” Bioscience 31 (1981): 573-577.

Em princípio, o registro fóssil tem sido suficiente para testar efeitos de algumas novidades evolutivas na diversificação e sucesso ecológico, particularmente quando se trata da história evolutiva entre insetos e plantas^25. Certamente, a radiação das angiospermas no Mesozoico e Cenozoico criou oportunidades para os visitantes florais também se diversificarem; sobretudo, se considerarmos a interdependência entre angiospermas e visitantes florais que podemos observar atualmente^26.

Estudos sobre a variação na riqueza de espécies entre famílias têm focado três variáveis explicativas: modo de dispersão de sementes (biótica X biótica), modo de polinização (biótica X biótica) e formas de vida (ervas X árvores). No caso da dispersão de sementes e polinização, acredita-se que a interação biótica promova o isolamento reprodutivo, necessário para a especiação simpátrica, porque os polinizadores podem ser espécie-específicos na transferência de pólen e os dispersores de sementes podem depositar sementes em locais remotos. Quanto à distinção ervas/árvores, esta consiste no fato de que as ervas são plantas com tempo de geração menor e com populações mais efêmeras, aumentando a taxa de especiação^27.

Alguns trabalhos têm apontado a existência de uma correlação positiva entre a polinização biótica e a forma de vida com uma maior riqueza de espécies nas famílias de angiospermas^28 , existindo uma inconsistência na relação entre o modo de dispersão e a riqueza de espécies^29. Isso demonstra, pelo menos, uma influência importante e positiva da polinização sobre as taxas de especiação.

(^25) Conrad C. Labandeira, David L. Dilcher, Don R. Davis, & David L. Wagner, “Ninety Seven Million Years of Angiosperm Insect Association: Paleobiolocal Insights Into the Meaning of Co-evolution,” Proceedings of the National Academy of Sciences 26 91 (1994): 12278-12282. Peter Feinsinger, “Coevolution and Pollination,” in Coevolution , org. Douglas Futuyma & Montgomery 27 Slatkin (Sunderland: Sinauer Associates Inc Publishers, 1983), 282-310. 28 Dodd et al, “Phylogenetic Analysis of Trait Evolution”. Ove Eriksson & Birgitta Bremer, “Pollination Systems, Dispersal Modes, Life Formas, and Diversification Rates in Angiosperm Families,” Evolution 46 (1992): 258- 266 ; Robert E. Rickflefs & Susanne S. Renner, “Species Richness Within Families of Flowering Plants,” Evolution 48 (1994): 161929 - 1636.; Dodd et al, “Phylogenetic Analysis of Trait Evolution”. Dodd et al, “Phylogenetic Analysis of Trait Evolution”.

  • Artigo recebido em 12 de dezembro de
  • Aceito para publicação em 30 de março de