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Uma análise detalhada do poema 'a educação pela pedra' de joão cabral e 'no meio do caminho' de alcides nelson drummond. O texto aborda temas relacionados à recepção crítica, valor, imagem, metapoetry, manipulação de fontes literárias e a relação entre poesia e mitologia. Além disso, o documento discute as influências bíblicas e andinas no poema, as luta pela expressão na criação artística e a importância do título na obra.
Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas
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Committee: Ivan Teixeira, Supervisor Leopoldo Bernucci, Co-Supervisor Sonia Roncador Nicolas Shumway Enrique Fierro
iv Agradecimentos Quero aqui deixar consignada minha gratidão a todos os professores membros de meu comitê pelo apoio e pela confiança constantes que depositaram em meu projeto. Em particular, gostaria de agradecer ao supervisor, Prof. Ivan Teixeira, e ao co-supervisor, Prof. Leopoldo Bernucci, com quem tive a oportunidade de conversar mais longamente, em diversos momentos, sobre algumas especificidades da minha pesquisa e do meu texto. Por fim, agredeço a Paula, minha esposa, pelo suporte familiar sem o qual este trabalho não se realizaria. M. H.
v
Mario Auriemma Higa, Ph.D. The University of Texas at Austin, 2009 Supervisors: Ivan Teixeira, Leopoldo Bernucci This dissertation investigates the representation of the image of the stone in poems by four modern Latin-American poets. To do this, I selected one key poem by Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto, Pablo Neruda, and Octavio Paz. Based on pertinent principles of literary criticism and analysis, I perform close readings of each of these texts. Despite the use of the same image, the semantic results in each poem present significant variation. That is my starting point for discussions of related historical and theoretical issues such as critical reception, value, (“No meio do caminho” by Drummond), the representation of the lyrical speaker, imagery, metapoetry, (“A educação pela pedra” by João Cabral), the role of the history in poetry, the manipulation of literary sources, (Poema XVII by Pablo Neruda), the concept of “logos” and the relationship between poetry and myth (“Como las piedras del Principio” by Octavio Paz). The basic goal of this dissertation is to put into practice critical and theoretical approaches that optimize the reading of poetry.
considerado pelo leitor menos avisado como marginal ou exótico. E em certo sentido o é, se comparado a outros como rio, lua, Sol, estrela, mar, olhos, só para citar imagens visuais. Para comprovar o contrário, isto é, que há uma longa e vigorosa tradição do motivo da pedra na literatura, também não faltariam exemplos, desde o mito cosmogônico de Deucalião e Pirra, descrito por Ovídio em suas Metamorfoses , até a muiraquitã macunaímica, de Mário de Andrade. Se se considerar derivações lexical-metonímicas da pedra, tais como rocha, penha, colina, montanha, ruína, deserto, então a tarefa de compor um quadro de excertos literários tornar-se-ia ainda menos complicada. No entanto, não se trata aqui de imitar o modelo de Melville, mas apenas de usá-lo como referência para justificar inicialmente o motivo literário da pedra, tomado aqui como um ponto de partida para este trabalho. ALGUNS PRESSUPOSTOS TEÓRICOS: MOTIVO, IMAGEM, SÍMBOLO E TEMA Na literatura, o termo motivo está implicado em princípio à arte da narrativa; por ele, designam-se situações ou unidades narrativas recorrentes que, por sua recorrência, mostram-se significativas. Assim, por exemplo, no conto popular, o herói ser desafiado a executar uma tarefa de extrema dificuldade; no romance romântico, a heroína ver-se dividida entre o casamento determinado pela vontade paterna e a união amorosa ditada pelo sentimento; na poesia épica, o herói participar de um banquete em que se celebra uma vitória militar; todas estas situações, enfim, formam matrizes narrativas que se tornaram convencionais dentro do gênero a que pertencem. Estas convenções são motivos literários. Na poesia lírica, algumas imagens da natureza, geral ( flor ) ou particular ( lírio ), sentimental ( amor ) ou natural ( morte ), espacial ( mar, lua ) ou temporal ( outono , noite ), histórica ( exílio ) ou acidental ( devaneio ), compõem motivos universais (Kayser 80 - 100 ). O motivo, portanto, é uma categoria discursiva de frequência e não de sentido. Sua dimensão semântica está vinculada ao conceito de
imagem, que o motivo carrega consigo. Os vocábulos imagem , imaginação e imitação possuem mesma raiz etimológica que se associa à ideia de simulação. Uma imagem simula uma realidade que, em princípio, lhe antecede. Um retrato é um exemplo típico de imagem. Todo retrato possui um enquadramento, que valoriza alguns aspectos e desconsidera ou relega a planos secundários outros do retratado. Logo, todo retrato é uma imagem parcial (toda imagem é parcial) e nessa parcialidade, ou ato de parcializar, que ocorre na formação da imagem, reside seu aspecto semântico primário. Outro exemplo: o signo linguístico é uma imagem acústica e conceitual de um referente ou designatum. Nesta imagem, o referente tem sua primitiva unidade, reconhecível pelos sentidos, segmentada pela percepção cultural. Em outras palavras, o referente puro , tal como utopicamente o sonhou Alberto Caeiro, ao ingressar no universo verbal, ganha uma imagem acústica à qual se atribuem, por operação metonímica e/ou metafórica, conceitos variados. Estes conceitos abstraem o referente, tornando-o um ser culturalmente volátil. Se as relações entre signo ou imagem linguística e referente são arbitrárias, como afirmou Saussure, a formação do signo linguístico obedece a vetores culturais pré-estabelecidos, que o semantizam desde o nascedouro. Tome-se, por exemplo, o referente rio , uma realidade física e extralinguística que participa da natureza. Em português e espanhol, os signos linguístico que o designam ( rio e río , respectivamente) pertencem ao gênero masculino; em inglês ( river ), o vocábulo não recebe traço de gênero. Todavia, em um clássico da canção popular americana, “Ol’ man river”, de Jerome Kern e Oscar Hammerstein II, o rio é referido como ser masculino; já na canção country “The River and the Highway”, da cantora Pam Tillis, para citar outro exemplo extraído da cultura popular, o rio é uma mulher caprichosa e vibrante. Em francês, há dois vocábulos para designar rio : fleuve , rio que desemboca no mar, e rivière , rio afluente ou tributário. O primeiro termo pertence ao gênero masculino, o segundo, ao feminino. Em suma, os lexemas rio , río , river , fleuve e rivière são formas de
Beijo-flor O beijo é flor no canteiro ou desejo na boca? Tanto beijo nascendo e colhido na calma do jardim nenhum beijo beijado (como beijar o beijo?) na boca das meninas e é lá que eles estão suspensos invisíveis. ( PP 495 vv. 1-12) Por sua recorrência, o beijo constitui um motivo no poema de Drummond. Por relação metonímica, determinada por convenção sócio-cultural, a imagem do beijo está associada a sentimentos como amor e afeto. Ou seja, o ato de beijar alguém ou algo pressupõe, no código da sociedade e da cultura, a ideia de demonstração de amor e afeto. Vinculado ao amor, o beijo também associa-se à noção de desejo sexual. É neste ponto, e com esta perspectiva, que o poema se vale desta imagem. Isto é, complexa na cultura, a imagem do beijo é reduzida no poema, através de marcas textuais como “desejo na boca”, “jardim” e “boca das meninas”, a uma de suas possibilidades semânticas: a de simulação do desejo sexual. E onde se encontra a dimensão simbólica da imagem do beijo no poema de Drummond?
A imagem do beijo torna-se símbolo quando a ela se atribui uma dúvida de caráter filosófico: quem beija o beijo? Ou seja: o desejo que o narrador sente de beijar possui motivações intrínsecas ou extrínsecas? Onde se localiza o desejo de beijar, na boca de quem beija ou na flor que o pássaro beija no jardim e que ao ser beijada incita o desejo de beijar no narrador? A partir destas questões que o poema levanta, o beijo assume condição simbólica: sua imagem simboliza no poema a ambiguidade do desejo, cujo lugar de origem o narrador põe em questão. Enfim, do símbolo chega-se ao tema, que é uma depreensão de leitura ou uma abstração dos elementos dispostos no texto. No caso do poema de Drummond, o tema relaciona-se à dicotomia natural-artificial. Ou seja: o poema problematiza a noção de que o desejo sexual, e também amoroso, por contiguidade, seja uma manifestação espontânea; e assim, questionando a fonte dos instintos e sentimentos, o texto discute os limites da natureza e da cultura: até que ponto esta intervém na modelagem e determinação dos impulsos humanos? Até que ponto o amor e o desejo de beijar são forças autônomas ou invenções culturais que o homem moderno repete e usa sem perceber? Pelo que se vem tentando demonstrar, a relação referente-imagem é primariamente metonímica e determinada pela cultura; as relações imagem-símbolo e símbolo-tema são metafóricas e determinadas pelos limites textuais, no caso da literatura. Veja-se mais um exemplo utilizando-se o beijo como referência. O beijo, retomando conceito já exposto, é uma imagem de afeto instituída pelos costumes sócio-culturais. Na narrativa bíblica sobre a vida de Cristo, no entanto, o beijo de Judas em Jesus é um símbolo associado à valores como ambição, deslealdade, emboscada, covardia e delação. O tema do episódio está relacionado à noção de venalidade da ética. O poder, representando pelo dinheiro, se mostra uma ameaça à integridade moral dos homens.
A pedra é um motivo na literatura ocidental desde suas primeiras manifestações. Trata-se de uma imagem significativa em mitos antigos como os de Orfeu, Deucalião-Pirra, Sísifo e Medusa,
antiga esta ideia cresce e se dissemina na cultura. Neste sentido, parece bastante sintomática a afirmação de Maurice Bowra em seu estudo sobre o poeta Simônides de Ceos, que viveu entre 556 e 468 a.C.: “The contemporaries of Simonides assumed, as indeed Theognis did and Pindar after him, that, whatever a man’s life may be after death, he is able to win a special immortality in the memory of men, through song or stone” ( 370 ). Provavelmente no fim do século IV a.C., como extensão de ensinamentos de Aristóteles, de quem foi discípulo, Teofrasto ( 372 - 287 a.C.) compôs seu tratado de mineralogia ( On Stones , na tradução inglesa). O estudo descreve pedras de diversas partes da Europa e Oriente, considerando suas propriedades físicas, como cor, transparência, brilho, densidade, resistência. Às pedras se atribuem valores sobretudo estético, social e comercial, por sua beleza, utilidade arquitetônica e raridade, respectivamente. Algumas são supostamente mágicas, como as que atraem outros materiais, as que transformam em pedra outras substâncias ao tocá-las, e as que, grávidas, dão à luz pedras mais jovens. Aristotélico e experimental, Teofrasto, no entanto, não se detém no valor místico das pedras. Delas, o filósofo destaca um aspecto material que unifica o objeto de seu estudo: a origem comum. Segundo afirma em On Stones , todas as pedras nascem de uma mesma substância telúrica pura e homogênea. As variações físicas que apresentam derivam, em suma, do modo como são formadas ( 45 ). A percepção de Teofrasto atesta um sentido que apresenta importantes desdobramentos na cultura: a noção de unidade. A esta noção associam-se, por operação metafórica, ideias como divindade e conhecimento: entende-se o divino como um ser puro cuja sabedoria sobrepassa o limitado discernimento dos homens. A pedra, assim, perspectivada pela cultura, assume a condição de divino natural. Por essa via, caminharam por séculos juntas alquimia e mineralogia. No rastro do estudo de Teofrasto, muitos tratados científicos ou paracientíficos foram escritos na Antigüidade e Idade Média sobre as pedras e suas propriedades e funções.
A atribuição de um sentido metafísico às pedras depende, em geral, de sua condição de ser ou não transformada pela ação humana. Uma vez que o homem altera sua forma natural, para fazer delas peças arquitetônicas ou decorativas, as pedras perdem sua unidade original, a que está associada sua dimensão divina ou semidivina. A tradição bíblica registra este argumento. No livro Êxodo, Jeová diz a Moisés: “Se me edificares porém algum altar de pedra, não o edificarás de pedras lavradas; porque se levantares sobre ele o cinzel, ficará poluto” (20:25). A passagem reitera o conceito idealista de panteísmo, já antes presente na obra de Heráclito, segundo o qual Deus (ou a ideia de divino) e o mundo natural formam uma unidade indissolúvel. Ainda que a natureza virgem, como um todo, corporfique a concepção do sublime sobrenatural, cada elemento, por suas propriedades intrínsecas, estabelece uma forma de associação com o divino. No caso específico das pedras, seu aspecto maravilhoso advém, entre outros fatores, de sua relação com tempo: a resistência das pedras lhes dota de uma temporalidade que Bachelar denomina “litocronos” ( 18 ), a temporalidade da permanência natural, próxima da eternidade, já destacada algumas linhas acima, mas não sob a perspectiva do sagrado religioso. Este sentido, ainda dentro da tradição bíblica, comparece na cena em que Jesus renomeia Simão como Pedro ( Kepha em aramaico, nome derivado de “pedra”, “rocha”), ao reconhecer no filho de Jonas o bastião inaugural da doutrina cristã: “Também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela” ( Mat. 16: 18 ). Em consonância com certas culturas primitivas, a renomeação de Simão por Cristo é um ato a um só tempo linguístico e mágico-pragmático; de certo modo, Jesus funda sua doutrina e lhe empresta um sentido temporal ao renomear o principal representante dela, depois de seu fundador. A função de Pedro é acomodar as bases do cristianismo sobre fundações sólidas para que a doutrina cristã seja
restos mortais de uma sociedade são fonte de pensamento e beleza, contribuem para a filosofia e arte, combinam imagens de pujança e morte. A matéria lítica das ruínas constitui o veículo por meio do qual múltiplos significados se constroem. As pedras de monumentos antigos corroídas pelo tempo são imagens que fundem, numa única dimensão material, conceitos de apogeu e declínio, crítica e estética, memória e esquecimento, história e silêncio, civilização e sepultura. Daí que as figuras retóricas de oposição (antítese, paradoxo, oxímoro) sejam constantemente acionadas no discurso lírico da poética das ruínas: “¡Oh, Roma!, en tu grandeza, en tu hermosura, / huyó lo que era firme, y solamente / lo fugitivo permanece y dura.” (Quevedo 418; vv. 12- 14 ). A volatilidade semântica da imagem das ruínas, ou seja, seu caráter agregador de significados vários e contraditórios, é por assim dizer sua condição potencial de objeto artístico. A arte é, por tradição (e não por condição), um discurso polissêmico, ou que tende à polissemia, e com esta identidade retórica ela se opõe à univocidade buscada pelo texto científico. Nesse sentido, um outro aspecto que singulariza a imagem da pedra na cultura ocidental é sua dupla funcionalidade, como matéria para a engenharia e substância para a arquitetura. Em outros termos, como objeto que funcionalmente se divide entre a ciência e a arte, incorporando de modo significativo ambas as dimensões. A PEDRA COMO CIÊNCIA NA POESIA As relações entre arte e ciência possuem uma longa e sinuosa história na arte e na literatura, que não cabe aqui discutir. Todavia, um capítulo importante desta trajetória encontra-se em uma cena do Livro Quinto do poema autobiográfico The Prelude; or, Growth of a Poet’s Mind (cito a versão de 1850), de William Wordsworth. Na passagem, o narrador relata o conteúdo de um misterioso e revelador sonho que teve na juventude. Mais que uma experiência pessoal, a digressão poética parece ter sido inspirada no célebre sonho epifânico de Descartes, ocorrido em 10 de novembro de 1619.
No poema de Wordsworth, o narrador descansa sobre um penhasco, diante do mar, depois de ler algumas páginas do Quixote, e está pensando no privilégio de formas de existência duradoura, como a poesia e a geometria, quando adormece: On poetry and geometric truth, And their high privilege of lasting life, From all internal injury exempt, I mused, upon these chiefly: and at length, My senses yielding to the sultry air, Sleep seized me, and I passed into a dream. (155; vv. 65 - 70) Em seu sonho, o narrador vê um beduíno sobre um dromedário no deserto. O árabe leva uma lança e carrega consigo dois objetos, “livros”, na linguagem onírica: uma pedra e uma concha espiralada de caracol marinho. O beduíno é uma transfiguração do Quixote, e a linguagem ou terminologia livresca, uma reminiscência da leitura de Cervantes. O narrador indaga o significado da pedra e da concha, e o árabe lhe diz que a pedra são Os elementos , de Euclides; e a concha, algo ainda mais valioso. A obra de Euclides, escrita por volta do ano 300 a. C., é o tratado matemático e geométrico mais influente da história, com número de edições sendo apenas superado pela Bíblia; no entanto, segundo o beduíno, a concha ainda excede o valor deste livro monumental. O narrador recebe a concha, “so beautiful in shape, / In colour so resplendent” (157; vv. 90- 91 ), e a aproxima do ouvido. And heard that instant in an unknown tongue, Which yet I understood, articulate sounds, A loud prophetic blast of harmony; An Ode, in passion uttered, … (157; vv. 93-96)