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INTRODUÇÃO A CIÊNCIA DO DIREITO
COMPÊNDIO DE DIREITO
MARIA HELENA DINIZ
Prefácio Neste livro não pesquisamos o direito, mas a própria ciência que se ocu-pa dos fenômenos jurídicos, ou seja, a ciência jurídica, porque a introdução à ciência do direito pretende dar aos que se iniciam no estudo do direito não só uma visão panorâmica e sintética das principais fundamentações doutrinárias da ciência jurídica, sem repudiar qualquer delas, mas também delimitar os conceitos básicos da elaboração científica do direito. Procuramos oferecer, de modo simples e objetivo, a base informativa necessária aos estudantes do direito, para que eles, compreendendo como se constitui e se caracteriza o conhecimento do jurista, possam iniciar uma via-gem nos domínios da ciência jurídica e adotar uma atitude analítica e crítica diante das questões de direito. É mister deixar bem claro que este ensaio está longe de ser um tratado completo da ciência jurídica, pois não tem a pretensão de esgotar todas as questões relativas ao conhecimento jurídico-científico. Trata-se de uma obra com cunho didático, por isso colocamos ao final de cada ponto um quadro sinótico, para proporcionar uma visão global da matéria ministrada. As referências bibliográficas auxiliarão os estudiosos na busca de leituras complementares mais profundas e ricas em investigações científico-jurídicas. Ante o grande número de concepções epistemológico-jurídicas que pretendem explicar a ciência do direito, cada qual sob um prisma diverso, concluímos que não se deve aceitar rótulo doutrinário que a circunscreva dentro de certo sectarismo, uma vez que o jurista contemporâneo tem necessidade de acolher todas as contribuições teóricas, para nelas identificar as diretrizes comuns e essenciais, mediante um trabalho de reflexão e comparação, pois todas as concepções surgidas na história da ciência jurídica, por mais hostis que sejam, trazem sua parcela para o patrimônio geral do conhecimento científico-jurídico. Evitamos o monopólio de uma teoria, visto que os problemas epistemológicos não mais se resolvem por uma especulação abstrata ou por um mergulho no pensamento puro, por ser impossível compreender, em todo o seu alcance científicotjlosólìco, a ciência do direito sem o recurso a todas as noções fundamentais con- XVI tidas nas teorias clássicas e modernas. Todavia, reconhecendo que há pontos discutíveis e opiniões prováveis, confessamos que certas posições tomadas pelo nosso espírito advieram de princípios filosóficos assentados como base, por nos parecerem mais expressivos para configurarem a ciência do direito e os conceitos jurídicos fundamentais. Maria Helena Diniz i
CAPÍTULO I
Natureza epistemológica da introdução a ciência do direito
- INTRODUÇÃO À CIÊNCIA DO DIREITO E SEU CARÁTER PROPEDÊUTICO OU ENCICLOPÉDICO A introdução à ciência do direito é uma matéria, ou um sistema de conhecimentos, que tem por escopo fornecer uma noção global ou panorâmica da ciência que trata do fenômeno jurídico, propiciando uma compreensão de conceitos jurídicos comuns a todas as disciplinas do currículo do curso de direito e introduzindo o estudante e o jurista na terminologia técnico-jurídica. É, por isso, uma enciclopédia, por conter, além dos conhecimentos filosóficos, os conhecimentos de ordem científica - sem, contudo, resumir os diversos ramos ou especializações do direito - e por abranger, não só os aspectos jurídicos, mas também os sociológicos e históricos. Trata-se de uma disciplina essencialmente preparatória ou propedêutica ao ensino dos vários ramos jurídicos, devido às noções básicas e gerais que visa transmitir, constituindo uma ponte entre o curso médio e o superior. Poder-se-ia trazer à colação, para justificar essa matéria no curso de direito, as sábias palavras de Victor Cousin, ao pleitear, em 1814, a sua criação, em França, transcritas por Lucien Brun: "Quando os jovens estudantes se apresentam em nossas escolas, a jurisprudência é para eles um país novo do qual ignoram completamente o mapa e a língua. Dedicam-se de início ao estudo do direito civil e ao do direito romano, sem bem conhecer o lugar dessa parte do direito no conjunto da ciência jurídica, e chega o momento em que, ou se desgostam da aridez desse estudo especial, ou contraem o hábito dos detalhes e a antipatia pelas vistas gerais. Um tal método de ensino é bem pouco favorável a estudos amplos e profundos. Desde muito tempo os bons espíritos reclamam um curso preliminar que tenha por objeto orientar de algum modo os jovens estudantes no labirinto da jurisprudência; que dê uma vista geral de todas as partes da ciência jurídica, assinale o objeto distinto e especial de cada uma delas e, ao mesmo tempo, sua recíproca dependência e o laço íntimo que as une; um curso que estabeleça o método geral a seguir no estudo do direito, com as modificações particulares que cada ramo reclama; um curso, enfim, que faça conhecer as obras importantes que marcaram o progresso da ciência. 4 Um tal curso reabilitaria a ciência do direito para a juventude, pelo caráter de unidade que lhe imprimiria, e exerceria uma influência feliz sobre o trabalho dos alunos e seu desenvolvimento intelectual e moral". A introdução à ciência do direito não consiste apenas no conjunto de noções propedêuticas necessárias para que o estudante possa embrenhar-se, com proveito, na selva emaranhada dos estudos jurídicos, nem no instrumento que há de guiar o
Forense, 1959; A. L. Machado Neto, Compêndio, cit.; J. Flóscolo da Nóbrega, Introdução ao direito, 3. ed., Rio de Janeiro, Kontino, 1965; Luiz Fernando Coelho, Teoria, cit.; Francisco Uchoa de Albuquerque e Fernanda Maria Uchoa, Introdução, cit., p. 26 e 27; A. Machado Pauperio, Introdução, cit.; Daniel Coelho de Souza, Introdução, cit.; André Franco Montoro, Introdução à ciência do direito, 3. ed., São Paulo, Livr. Martins Ed., 1972, v. I e 2; François Rigaux, Introduction à la science du droit, Bruxelles, Ed. Vie Ouvrière, 1974; Wilson de Sou-za Campos Batalha, Introdução ao direito, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1967; Djacir Menezes, Introdução, cit.; A. B. Alves da Silva, Introdução à ciência do direito, São Paulo, Ed. Salesianas, 1940; Julien Bonnecase, lntroduction à /'elude du droit, Paris, Sirey, 1931; Carlos Mouchet e Ricardo Zorraquín Becu, lntroducción al derecho, 7. ed., Buenos Aires, Abeledo-Perrot. 1970; Legaz y Lacambra. erNo c r /nnrulucciôn a Ia ciem•iu del derecho, Barcelona, Bosch, 1943 _ , Alessandro GrcPPali, Av warilc /lo Eduardo CGarcia Mãynez lmroducción aI estudio del dereclto ctu/iode/ diruic, Milano, Criu(Irè, 195 I; Eduurd México, Porrúa, 1972; Gastou May, Introdaction à la science chi droit, Paris, Ed. M. Giard, 1932; J. Haesaert, Théorie générale du droit, Emile Bruylant, Bruxelles, 1948; Altalión, Garcia Olano e J. n. : Miguel RealeLi Vilanova, bvruducción (11 derrete, 5 .. cd., Buenos Aucs, 1.1 Alcnc0I956 2 v.; M~ ç•de.s de direito, São Paulo, Saraiva, 1976; Hermes Linir, in!rodiç ao à ciência do direito Rio de l rc luninures Janeiro Freitas Bastos 1970; Vicente Ráo, (1 direito e a vida dos direitos, São Paulo, Max I.inionad, 1952; BenIamin de Oliveira Filho, /nnvchiçãu à ciêru ia do direito, Tip. Jornal do Comércio, Rio de Janeiro, 1954; Tércio Sampaio Ferraz. Jr., Introdução ao estudo do direito, São Paulo, Atlas, 1988. 6 Natureza epistemológica da introdução à ciência do direito 7 desenrola através dos tempos. Falta-lhe, portanto, unidade de objeto, ou seja, um campo autônomo e próprio de pesquisa. Não é uma ciência por não ter objeto próprio, mas, apesar disso, é uma disciplina epistemológica, como nos ensina A. L. Machado Neto, porque: a) Responde às seguintes questões: O que é a ciência do direito? Qual o seu objeto específico? Qual o seu método? A que tipo de ciência pertence? Como se constitui e caracteriza o conhecimento do jurista? Essas interrogações existem, surgem a cada momento na vida do cientis-ta do direito, pois concernem a um dos problemas jusfilosóficos fundamen-tais, tornando necessário procurar-lhes, senão uma resposta definitiva, pelo menos um esclarecimento à altura de sua importância para o mundo jurídico. Compete à filosofia do direito solucionar o problema do conhecimento jurídico, na sua parte especial designada epistemologia jurídica, que, no sentido estrito, tem a incumbência de estudar os pressupostos, os caracteres do objeto, o método do saber científico e de verificar suas relações e princípios. Nesse sentido a epistemologia jurídica é a teoria da ciência jurídica, tendo por objetivo investigar a estrutura da ciência, ou seja, visa o estudo dos problemas do objeto e método da ciência do direito, sua posição n0 quadro das ciências e suas
relações com as ciências afins. A epistemologia é considerada, em sentido amplo, como sinônimo de gnoseologia, parte integrante da filosofia que estuda crítica e reflexivamente a origem, a natureza, () alcance, os limites e o valor da faculdade humana de conhecimento e os critérios que condicionam a sua validade e possibilidade. É a teoria do conhecimento em geral e não apenas do saber científico; é a teoria do conhecimento jurídico em todas as suas modalidades: conceitos jurídicos, proposições, raciocínio jurídico etc. Depreende-se daqui que a epistemologia difere da teoria do conhecimento ou gnoseologia, visto que estuda o conhecimento na diversidade das ciências e dos objetos, enquanto aquela o considera na unidade do espírito. Logo, a epistemologia jurídica é a teoria da ciência do direito, um estudo sistemático dos pressupostos, objeto, método, natureza e validade do conhecimento jurídico-científico, verificando suas relações com as dentais ciências, ou seja, sua situação no quadro geral do conhecimento'.
- 0 vocábulo epistemologia advém do grego episténie que significa ciência e logos, ou seja, estudo: e o termo gnoseologia é oriundo do grego gnosis que indica conhecimento. V A. Franco Montoro, hnrodução, cu., v. I, p. 130; A. L. Machado Neto, Teoria da ciência jurídica, cit., p. t; Miguel Reate, f•ïlosolìa do direito, 5. ed., São Paulo, Saraiva, v. I , p. 40 e 160; Johannes Hessen, Teoria tje'l ccmoc'imiento, Buenos Aires, Losada, p. 21; André Lalande, Épistémologie e gnoséologie, in Vocahupure technique et critique de Ia /rhiloso/rhie 4. e d., Paris, `PU F : , 1968, v. 2; A. Xavier Teles, /ntrrdu(.io au estudo da filoso/ia, Atica 1965, p. 55; bury rhiloso rlt . Victor F. Lenten, Philosophy of science, in 7icentieth cu. I! )• New York. Pd. Runes, 1943, p. 109. Ante o exposto, fácil é concluir que a introdução à ciência do direito é uma epistemologia jurídica, já que alude não ao direito, mas à ciência que trata dos fenômenos jurídicos, de maneira a responder à questão sobre o que é a ciência jurídica como uma introdução, a fim de que o estudante não a confunda com direito, que é seu objeto, o que levaria a uma inversão de conceitos, comprometendo o nível teórico dos juristas. O autor de uma obra sobre "introdução à ciência do direito" deve dar, pelo menos, uma idéia do que seja a ciência jurídica, deixando claro que não está tratando do direito, que é tarefa do jurista. O professor de introdução à ciência do direito, situando-se na categoria intelectual de quase jusfilósofo, ocupa-se, no dizer de Ortega y Gasset, com algo que tem que ver com o direito, mas que não se identifica com ele. Quem trata do direito está elaborando ciência jurídica, mas quem se ocupa com a ciência do direito está fazendo epistemologia. Daí o nítido teor epistemológico da introdução à ciência do direito, que busca apresentar, esquematicamente, os vários problemas ou questões que se apresentam à ciência jurídica. b) Define e delimita, com precisão, os conceitos jurídicos fundamentais que serão utilizados pelo jurista para a elaboração da ciência jurídica. Tais conceitos básicos abrangem os de relação jurídica, fonte jurídica, direito objetivo e subjetivo, direito público e privado, fato jurídico, sanção e interpretação, integração, aplicação da norma no tempo e no espaço etc. Sem a determinação desses conceitos, o jurista não poderá realizar sua tarefa intelectual. Este estudo, que é objeto da teoria geral do direito, segundo muitos autores, por ser considerado o centro vital da introdução à ciência do
levar para a consciência do sujeito cognoscente algo que está fora dele. É o ato de pensar um objeto, ou seja, de torná-lo presente à inteligência'-. O conhecimento é a apreensão intelectual do objeto. É, na magistral lição de Goffredo Telles Jr., o renascimento do objeto conhecido, em novas condições de existência, dentro do sujeito conhecedor. Apresen-ta-se, portanto, o conhecimento como uma transferência das propriedades do objeto para o sujeito pensante. Esse renascimento vai alterar de uma I. Goflhedo Telles Jr., Tratado da conseqüência, 2. ed., Bushatsky, 1962, p. 7.
- Goffredo Telles Jr., Tratado, cit., p. 7 e 8; Miguel Reale, Filoso/ìu do (lireito, 5. ed., Saraiva, v. I, p. 48. O sujeito é aquele que conhece. O termo objeto advém do latim ob e jectum - aquilo que se põe diante de nós. -Objeto- é tudo aquilo de que se pode dizer alguma coisa. Ou. como dizem Romero c Pucciarclli (Lógica, Buenos Aires, 1948, p. 16, § 2u): "Do ponto de vista formal, denomina-se objeto tudo o que é capaz de admitir um predicado qualquer, tudo o que pode ser sujeito de um juízo. E, pois, a noção mais geral possível, j i que não importa que o mencionado objeto exista ou não: hasta que dele se possa pensar e dizer algo-. Sobre conhecimento, consulte Frmcisco Uchoa dc Albuquerque e Fernanda Maria Uchoa, Introdu(im uo estudo do direito, São Paulo, Saraiva, 1982, p. I e 2.
- Goflredo'l'clles Jr., Tratado, cil., p. 7 e 8. Conhecimento para esse autor é "a tradução cerebral de um objeto''. Salienta esse mestre que o vocábulo "conhecimento" decorre de "coçnasci'', significan-do "cnnosrimentn" (r. 0 direito yuiuuico, 5. ed., São Paulo, Max I,imonad, 1980, p. 204 e 189 e s.l.
- ~...E.c.K..v uc truroauçao a ctencia ao direito Ciência jurídica 15 certa maneira o sujeito cognoscente, porque a coisa conhecida será sua par-te integrante. Sendo o conhecimento a representação do objeto dentro do sujeito cognoscente, torna-se fácil evidenciar os liames que se estabelecem entre os dois elementos inseparáveis do binômio sujeito e objeto'. No conhecimento encontram-se frente a frente a consciência cognoscente e o objeto conhecido. A dualidade de sujeito e objeto é uma relação dupla, ou melhor, é uma correlação em que o sujeito é sujeito para o objeto e o objeto é objeto para o sujeito, de modo que não se pode pensar um sem o outro. O sujeito cognoscente tende para o objeto cognoscível. Esta tendência é a intencionalidade do conhecimento, que consiste em sair de si, para o objeto, a fim de captá-lo mediante um pensamento; o sujeito produz um pensamento do objeto. O ato cognoscitivo refere-se a algo heterogêneo a si ou diferente de si. Todo pensamento é apreensão de um objeto; pensar é dirigir a atenção da mente para algo. O objeto, por sua vez, produzirá uma modificação no sujeito conhecedor que é o pensamento. Este, visto do sujeito, nada mais é senão a modificação que o sujeito produziu em si mesmo para apossar-se do objeto; visto do objeto é, como já dissemos, a modificação que o objeto, ao entrar no sujeito, produziu no seu pensamento. Assim sendo, aquilo que o "eu" é, quando se torna sujeito cognoscente, o é em relação ao objeto que conhece. A função do sujeito consiste em apreender o objeto e esta apreensão apresenta-se como uma saída do sujeito de sua pró-pria esfera, invadindo a do objeto e captando as suas propriedades. O objeto captado conserva-se heterogêneo em relação ao sujeito, por ser transcenden-te, pois existe em si, tendo suas propriedades, que não são aumentadas, dimi-nuídas ou
modificadas pela atividade do sujeito que o quer conhecer. Mas, na relação cognoscitiva, segundo os moldes kantianos, não é um "ser em si",
- Goffredo Telles Jr., O direito quântico, cit., p. 204. Oportuno é lembrar a esse respeito o ensinamento kantiano, segundo o qual com o conhecimento do sujeito transferem-se ao objeto as estru-turas próprias do pensamento do conhecedor e se reduz o ser, que é o simples termo do "eu" que conhece. O objeto não é mais do que um produto do sujeito, de sorte que a realidade fica aprisionada às condições em que funcionou o pensamento. V. Manuel G. Morente. lluu/a nenlu.r de,/ileso/iu - lições preliminares, trad. Guillertno de Ia Cruz Coronado, 4. ed., São Paulo, Mestre Jou, 1970, p. 125.
- Jaspers. Gururlut da ao pensamento /ìlusví/ìco, Cultrix, p. 36: Joseph Maréchal. O ponto de partida da meta/iri -a, cad. V, sec. 11, cap. I. § 22, citado por Goffredo ]'cites Jr.. O direito quântico. cil., p. 204; N. Hartmann, Ontologia v fundamentos, México, 1954, p. 147; Miguel Reale (Sentido do pensar no nosso tempo, XBF, fase. 100, p. 391) escreve: "O caráter intencional da consciência e a correlação funcional subjetivo-objetiva são condições do c•onhecimenui".
- Johannes Hessen, koria do conhecimento. 5. ed., Coimbra, Arménio Amado Ed., 1970,It. 26; P Stanislavs Ladusar s t. F enontenologia da estrutura dinâmica do conhecimento. Anuis du VIU Con- ,4re.cso /uterumcrirmio de Nlasu/ia, v. I , p. 379 e 380; Manuel G. Morente. Fundamentas de i/oso l fra, p. 145-6 e 167: Miguel Reale, Sentido do pensar ent nosso tempo, HBF, cif., fase 100, p. 392-5. como uma realidade transcendente; despoja-se desse caráter de existente por si e em si e converte-se em um ser "para" ser conhecido, em um ser posto, logicamente, pelo sujeito pensante como objeto de conhecimento. Aquilo que o objeto a conhecer é, o é não "em si" mas em relação ao sujeito conhecedor'. O objeto enquanto conhecido é uma imagem e não algo do mundo extramental. Essa imagem não é uma cópia de um objeto, apesar de ser a tradução cerebral desse objeto, não é idêntica a ele por ser mais pobre em elementos determinantes'. O sujeito cognoscente é sujeito apenas enquanto há objeto a apreender e o objeto é somente objeto de conhecimento quando for apreendi-do pelo sujeito. Logo, todo conhecimento envolve três ingredientes: o "eu" que conhece; a atividade ou ato que se desprende desse "eu" e o objeto atingi-do pela atividade'. Nítida é a correlação entre o sujeito pensante e o objeto pensado. Esse relacionamento intelectual entre ambos é o que chamamos de conhecimento. Há dualidade de pensamento e objeto10.
- Manuel G. Morente, Fundamentos de, filosofia, cit., p. 147-217, 143 e 244-63.
- Goffredo Telles Jr. (O direito quântico, cit., p. 209-14, 217-74, 277-82) escreve: Mesmo quan-do o estímulo deixa de excitar um órgão sensório, perdura o conhecimento. Esse conhecimento é a imagem. que é o que fica no cérebro, de unia sensação cessada. As sensações é que são objetos do conhecimento. Os objetos do mundo exterior permaneceriam inacessíveis ao conhecimento, pois, ao estimularem os órgãos dos sentidos, apenas produzem impulsos nervosos sempre iguais. Esta afirma-ção não nega o mundo exterior• isto porque o conhecimento é efeito da ação dos objetos sobre os órgãos dos sentidos: se assim não fosse não haveria explicação possível para a existência de sensações. Cada sensação é a tradução
SUJEITO E OBJETO relação ao objeto que conhece, e aquilo que o objeto a conhecer é, o é não "em si", mas em relação ao sujeito pensante, isto é, converte-se em um ser "para" ser conhecido, em um ser posto, logicamente, pelo sujeito cognos-cente como objeto de conhecimento.
- Goffredo Telles Jr. (O direito quântico, cit., p. 284-93) entende que o sistema de referência é produto de muitas causas: do legado genético, aprendizagem, experiências etc. Cada homem possui seu próprio universo cognitivo, mas seu sistema de referência pode não pertencer exclusivamente a ele, por ser de unia comunidade inteira. Oriundos das mesmas contingências, é natural que os sistemas de referência de pessoas de uni mesmo grupo sejam semelhantes uns aos outros. Tais sistemas constituem um patrimônio cultural comum.
- V. Ladusans, Fenomenologia, Anai.c do VIU Congresso lnteranrericano de Filosofia, cit., p. 386; Miguel Reale, Filosofia do direito, cit., v. I, p. 54; Gofliedo Telles Jr., O direito qucóntico, cit., p. 292 e 293. Sobre conhecimento e correlação entre sujeito cognoscente e objeto, consulte M. Helena Diniz, A ciênciaJjurídica 2. ed. São Paulo, Resenha Universitária, 1982, p. 7, notas 21 e 22; p. 168-72, nota 59.
- CONHECIMENTO CIENTÍFICO A. CARACTERES E CONCEITO Chegados a essa altura, cremos que não soaria como um despropósito respondermos à indagação: o que é ciência? Antes de iniciarmos nosso estudo sobre o tema, ouçamos, pela sua oportu-nidade e sabedoria, a lição de Tércio Sampaio Ferraz Jr.", que evidencia que o vocábulo "ciência" não é unívoco, se bem que com ele se designe um tipo espe-cífico de conhecimento; mas não há um critério único que determine a extensão, a natureza e os caracteres deste conhecimento, isto porque os vários critérios têm fundamentos filosóficos que extravasam a prática científica e, além disso, as modernas disputas sobre tal termo estão intimamente ligadas à metodologia. Entendemos que, na acepção vulgar, "ciência" indica conhecimento, por razões etimológicas, já que deriva da palavra latina scientia, oriunda de scire, ou seja, saber. Mas, no sentido filosófico, só merece tal denominação, como veremos logo mais, aquele complexo de conhecimentos certos, ordenados e conexos entre si". A ciência é, portanto, constituída de um conjunto de enun-ciados que tem por escopo a transmissão adequada de informações verídicas sobre o que existe, existiu ou existirá. Tais enunciados são constatações. Logo, o conhecimento científico é aquele que procura dar às suas constatações um caráter estritamente descritivo, genérico, comprovado e sistematizado. Cons-titui um corpo sistemático de enunciados verdadeiros. Como não se limita apenas a constatar o que existiu e o que existe, mas também o que existirá, o conhecimento científico possui um manifesto sentido operacional, constituin-do um sistema de previsões prováveis e seguras, bem como de reprodução e inferência nos fenômenos que descreveu
- Direito, retórica e connuucot•do, São Paulo, Saraiva, 1973, p. 159 e 160.
- Alves da Silva /ntrodu1 r no ô ciência lo dircei!o São Paulo, Lr1. i a s. 1940, p. _ 5. C 'in- S:dcsana suite Yulo Brandão, O problema do conhecimento e a sua exala posição, RBF, fase. 105, p. 92-8.
- Tércio Sampaio Ferraz Ji., A ciência do direito, São Paulo, Alias, 1977, p. 10 e I I ; Charles W. Morris, / ur,gurr~e and brhari ir, New York, 1955, cap. V. 18 Ciência jurídica 19 À vista disso, tentaremos ensaiar algumas de suas características pri-mordiais. Em oposição ao saber vulgar, que faz constatações da linguagem coti-diana, a ciência é um saber metodicamente fundado, demonstrado e sistema-tizado. A sistematicidade é o principal argumento para afirmar a cientificidade10. O conhecimento científico não é um saber que se receba pronto e acaba-do; é, isto sim, um saber obtido e elaborado deliberadamente, com consciên-cia dos fins a que se propõe e dos meios para efetivá-lo, visando sua justifica-ção como saber verdadeiro ou certo". Para tanto, procura dar uma explicação satisfatória da realidade, fundamentada em rigorosas comprovações ou de-monstrações. O conhecimento vulgar, por sua vez, não decorre de uma atividade deli-berada; é mesmo anterior a uma reflexão do pensamento sobre si mesmo e sobre os métodos cognitivos. É, em regra, assistemático, pois as noções que o integram derivam da experiência da vida cotidiana: de ver atuar, da leitura acidental, de ouvir etc. São exemplos de saber vulgar a verificação de que ao dia sucede a noite, de que o fogo queima, de que o relógio marca as horas etc. Enfim, são idéias que se vão depositando por aluvião, sem que nada as orde-ne. É um saber parcial ou fragmentário, casuísta, desordenado ou não metódi-co, pois não estabelece, entre as noções que o constituem, conexões, nem mesmo hierarquias lógicas. Tais conteúdos do conhecimento vulgar ou co-mum não contam com outra garantia de verdade, senão o fato de serem geral-mente aceitos, porque não se procura verificar a exatidão das observações em que se baseiam, desconhecendo, assim, as verdadeiras causas que os expli-cam e as regras que os regem; e tampouco se invoca a correção lógica do pensamento de que provieram`. O método é a garantia de veracidade de um conhecimento. Método é a direção ordenada do pensamento na elaboração da ciência. Logo, a ciência requer uma atividade ordenada segundo princípios próprios e regras peculia-res. É ele que guia a investigação científica, provando que o resultado de suas pesquisas é verdadeiro. Não se deve confundir método com técnica, pois o
- Tércio S:unpaio Ferraz Jr., Direito, retaricu e conuaricaç•ão, cit., p. 160 e 161, e A ciência do direito, cit., p. 10; C'. W. Morris, Lungrwge, cil. Elyana Barbosa. O que constitui a ciência, o método ou o objeto'?, RBF, fase. 94.1). 153-7.
- Expressivas , s' i ar , st hre o assunto, as palavras de Miguel Reale (Liçvnac prrliminure.c de direi-to, Bushatsky, 1973, p. 11)1): "Todo conhecimento científico pressupõe unia ordenação intencional da inlcli g ê yuxiu e da vontade, capaz de permitir ao investigador alcançar um resultado dotado pelo cornos de relativa certe,a••.
- V. Júlio Luis Moreno, Leis s'upura7as',/ì/u.cú/ìcn.c de la cicio 'ia jurídica. Montevideo, 1963, p, c. Romeno y 1 ucciurelli, Lógica, cit., Buenos Aires, 1948, p. 1..7, Liará, Lú•gicu, Buenos Aires, 1943, p. 269. A. Tomé. Irurodurción til drveehu. 6. ed., Buenos Aires, Abelalo-
them", logo da iml i. i is- sr. hill dade kí ~ -w ico ciolúbpica de existir unia cimcia social desinteressada MYrd:dl conclui a nebaç•ão da ~ c neutralidade científica; I lans FreYer, ter sociologia, cienciade la realidarl, Buenos Aires, Locada, 1944. 20 Ciência jurídica 21 Estas considerações sublinham a importância do método para a ciência, já que só ele é que possibilita fundamentar a certeza e a validade desse saber, por demonstrar que os enunciados científicos são verdadeiros''. Cada ciência tem seu objeto, pois, "para que haja ciência, é essencial a unicidade epistemológica, isto é, unidade de objeto"". Logo, é um saber me-todicamente fundado sobre um objeto. O conhecimento científico, portanto, está condicionado pelo ser e pela estrutura do objeto, pois visa transmitir um enunciado verdadeiro; assim sendo, deve ter por escopo a sua coincidência com aquilo a que se propõe conhecer. Essa relação de mútua dependência entre a ciência e seu objeto é condição da fecundidade da tarefa científica". Não se julgue que o objeto de uma ciência seja algo que o cientista encon-tre determinado de modo rígido antes de dar início a sua tarefa cognoscitiva; pelo contrário, é ele, em grande parte, um produto de sua livre eleição. Ele elege com relativa liberdade o objeto com que há de se ocupar, escolhendo, ainda, o prisma sob o qual há de considerá-lo. A investigação científica não inventa seu objeto, ela o descobre tal como ele se mostra sob uma certa perspectiva. Em outras palavras, a ciência escolhe, dentro dos limites da multiplicidade de estru-turas do objeto a conhecer, o ponto de vista que tomará sobre ele''-a. A determinação do objeto e da forma pela qual será examinado''-5 pressu-põe uma reflexão sobre as finalidades cognoscitivas, que se aspira conseguir, sobre o tipo de conhecimento que se deseja obter'.
- Júlio L. Moreno, Los supuestosJilosó/ico.s, cit., p. 19, 21. 27 e 28; Jaspers. Esencia y valor de Ia ciencia, Re+t Universidad Nacional del Litoral, Santa Fé, Imprenta de Ia Universidad, 1939, n. 5, p. 161; Jolivet• Curso de,/ilosofia, cit.. p. 77: Lalande. Épistémologie e gnoséologie, in Voc•obuloire téchnique et critique de la philosophie, 4. ed., Paris, PUF, 1968, v. 2. p. 735 e s.; Hessen. Tratado de jìlosofa. Buenos Aires, Ed. Sudamericana. 1957, t. I, p. 392: Lastra. Que es el derecho?, La Plata, Ed. Platense, 1972, p. 87; Van Acker, Curso de filosofia do direito. Revista da PUCSP, 3d(65-6): 122, 1968; Juan A. Nuno, Metodologia científica: e1 problema dei conocimiento, in Filasa/ìa-1, Anais do VIU Congresso Interamericano de Filosofia e V da Sociedade huerume, u anu de Filoso¡ia, cit., p. 425-32.
- Machado Neto, Teoria da ciência jurídica, São Paulo, Saraiva. 1975, p. 3.
- J. L. Moreno, Los supuestos filosví¡ïcos, cit., p. 31 e 33.
- J. L. Moreno, Los supuesto.r./ìlosóficos, cit, p. 33-8; Golfredo Telles Jr. (O direiro yuiuuicu, cit.. p. 266-88) pondera que o ato de escolha não é um ato de liberdade, depende do patrimônio genéti-co, do confronto de unia informação,
provinda do inundo exterior, com todo o cabedal de aprendiza-gem já armazenado pelo agente.
- J. L. Moreno (Los supuestos,lilos(;/ico.s, cit., p. 34) observa que uni mesmo objeto da expe-riência pode ser considerado sob vários pomos de vista e cada uni deles pode converter-se em tensa de unia ciência distinta.
- A. Franco Montoro (Introdução d ciência do direito, 3. ed., Livr. Martins Ed., v. I, p. 76) esclarece, em poucas linhas, quais são os fins perseguidos pela ciência. O objetivo de toda ciência é conhecer, mus os objetivos finais são diferentes. A ciência teórica tem por finalidade o próprio conhe-ci menk. A prática ou normativa é a que conhece para dirigir a ação, e nas p. 8. e 83 apresenta as três acepções (te ciência: a lunssinru, segundo a qual ciência é o conhecimento certo pelas causas, aplica-se neste sentido a Iodos os conhecimentos denlenlxtrados. abrangendo tanto as ciências teóricas como as I taUCUS; a estrita, que se refere apenas :IS ciências teóricas ou puras Untareis, culturais, formais e metafísicas); e a e.stritíssima, apenas às teóricas de tipo natural e matemático. A operação pela qual se constitui o objeto deve ser, obviamente, governa-da pelo método, que, por sua vez, fixará as bases de sistematização da ciência 27. Importa acentuar que o fim e o objeto do conhecimento científico se su-põem e se determinam reciprocamente, de modo que a ciência pode ser consi-derada como sendo a "síntese dialética do objeto e do fim, porque é o fim do conhecimento o que faz do objeto um objeto do conhecimento e o determina sob um certo prisma; e a finalidade é o fim de conhecer esse objeto"25. A ciência é um saber condicionado por seu objeto e objetivo. Mas esse condicionamento não implica marcos definitivos, dentro dos quais se deve desenvolver o labor científico. A ciência não é um conhecimento acabado de seu objeto, mas o processo de investigação em que o objeto vai sendo conhe-cido"'. Todavia, isto não indica que a investigação científica seja auto-suficien-te e completa. É ela limitada, em razão de sua natureza teorética; por ela a ciência aparece como saber do que é ou do que deve ser, sendo seu campo de ação a experiência em que o ser se manifesta. Conseqüentemente, limitará sua indagação, se for ciência natural, ao que a realidade é, sem qualquer preten-são de verificar o que deve ser axiologicamente. A ciência natural é teoria e, enquanto tal, seu fim é o conhecimento do dado e não sua valoração. Já a ciência humana, ao estudar seu objeto, pode reproduzir, como vimos alhures, o seu sentido, valorando-o. A ciência natural ou humana não pode conhecer nada fora do objeto, nem dar o fundamento último a seus métodos, nem mes-mo justificar as noções primeiras que estão na base de suas construções e a sua atitude cognoscitiva. Realmente, a ciência é o conhecimento de seu objeto e não dos modos de conhecê- lo; ela não conhece seu método; ela apenas o pressupõe e nele tem seu ponto de apoio, por ser ele uma garantia para o pensar científico'0. Sinteticamente podemos dizer que a ciência é um complexo de enuncia-dos verdadeiros, rigorosamente fundados e demonstrados, com um sentido limitado, dirigido a um determinado objeto. Para que haja ciência, deve haver as seguintes notas: caráter metódico, sistemático, certo, fundamentado ou demonstrado, limitado ou condicionado a um certo setor do objeto.
- J. L. Moreno, Las .+'upuesto.s /iluso/i os, cit., p. 38. 28. J. L. Moreno, Los supueslo.s,/ilosó%ic•os, cit., p. 41. 29. J. L. Moreno, Los sunarstos /ìlu.vd/ìe•os, cit., p. 41. Diz Hessen (Tratado
a demarcação entre filosofia e ciência, in F'ilo.co/ìa-/, Anais do VIII Congresso Interanserieano de h'ilosa/iu e V dn Socieda-de Interarnerú ana de I•'ilo.ca/ìa, cit., p. 309-15; Karl Popper. Conjectures sutil re/ututions; dte ,Grou7h of rcienti/ìr knou•le(/ge, London, Routledge and Kegan Paul, 1962; e Yulo Brandão, Digressão em torno de um problema de sempre: a filosofia como fundamento, k/F, fase. 58, p. 2O7-25. Augusto Cocote" classificou as ciências em abstratas, também designa-das teóricas ou gerais, e concretas, consideradas particulares ou especiais, partindo de três critérios: a) o da dependência dogmática, que consiste em agrupar as ciências, de modo que cada uma delas se baseie na antecedente, preparando a conseqüente; b) o da sucessão histórica, que indica a ordem cronológica de formação das ciências, partindo das mais antigas às mais re-centes; e c) o da generalidade decrescente e da complexidade crescente de cada ciência, que procede partindo da mais geral para a menos geral e da menos complexa para a mais complexa. As ciências abstratas são as que estudam as leis gerais que norteiam os fenômenos da natureza, e apenas a elas se aplicam os critérios supra-arrola-dos. Abrangem:
- Matemática, ciência do número e da grandeza, a mais simples e uni-versal. Realmente, é a menos complexa, porque só se refere às relações de quantidade, e a mais geral, porque se estende a todos os fenômenos.
- Astronomia, física celeste, ou mecânica universal, ciência que estuda as massas materiais que existem no universo.
- Física, ciência que se ocupa dos fenômenos físicos, ou seja, das forças da natureza.
- Química, ou físico-química, ciência que tem por objeto a constituição dos corpos particulares.
- Biologia, ou física biológica, ciência que estuda os fatos biológicos, isto é, os seres vivos ou os corpos muito complexos que se apresentam com vida.
- Sociologia, ou física social, ciência das relações sociais. Esta ciência é a mais complexa de todas, visto que o fato social abarca relações matemáti-cas, mecânicas, físicas, químicas e biológicas, e a menos geral, por se aplicar tão- somente à vida social do homem. Infere-se desta classificação que todas as ciências são do tipo físico-natu-i- al, devendo ser estudadas com o rigor e a precisão dos métodos matemáticos. Augusto Cocote não chegou a classificar as ciências concretas por enten-der que não se prestavam a uma discriminação perfeita, por não apresentarem as condições de irredutibilidade e de indivisibilidade das abstratas. As ciências concretas, para esse filósofo, são as que aplicam as leis gerais aos seres naturais, realmente existentes. A biologia é ciência abstrata, explica ele, porque investiga e descobre as leis da vida, ao passo que a botânica e a zoologia são concretas, dependentes da biologia, visto que têm por escopo descrever o modo de existên-cia de cada corpo vivo. Igualmente, a geografia, a geologia e a mineralogia são
- Augusto ('multe, ('ours de Irlrilo.soplrie positive, Paris. 1949. 24 Ciência jurídica 25 ciências concretas em relação à física e à química, das quais derivam. A ciência do direito e a economia são ciências concretas, oriundas da sociologia. Wilhelm Dilthey35, adotando o critério dicotômico, inspirado na classifi-cação
de ciência de Ampère, tendo em vista o seu objeto de estudo, distingue:
- Ciências da natureza, que se ocupam dos fenômenos físico-naturais, empregando o método da explicação. Explicar, ensina-nos Miguel Reale, con-siste em ordenar os fatos segundo nexos ou laços objetivos e neutros de causa-lidade ou funcionalidade.
- Ciências do espírito, também designadas por ciências humanas, noológicas ou culturais, como prefere Rickert, que se subdividem em: a) ciências do espírito subjetivo, ou psicológicas, que estudam o espírito humano no próprio sujeito, isto é, têm por objeto o mundo do pensamento; b) ciências do espírito objetivo, que consideram o espírito humano nos objetos ou nos produtos culturais, isto é, descrevem e analisam a realidade histórica e social, produto das ações humanas. Constituem as ciências cultu-rais propriamente ditas, históricas, morais, sociais e jurídicas. O método de estudo das ciências culturais é o da compreensão. Compreender é, na lição de Miguel Reale, ordenar os fatos sociais segundo suas conexões de sentido, isto é, finalisticamente, segundo uma ordem de valores. Na ciência humana, o cientista, por mais que pretenda ser cientificamente neutro, não vê os fatos sociais apenas em seus possíveis enlaces causais, porque há sempre uma to-mada de posição perante os fatos, que se resolve num ato valorativo. Logo, pode e deve existir objetividade no estudo dos fatos sociais, mas é impossível uma atitude comparável à "neutralidade avalorativa" de um analista em seu laboratório ante uma reação química. Daí a célebre afirmação de Wilhelm Dilthey: "a natureza se explica, enquanto que a cultura se compreende". A mais famosa das classificações da ciência é a de Aristóteles36, que aqui reproduzimos com as alterações feitas pelo pensamento científico e filo-sófico ulterior. A classificação aristotélica, baseada no critério da função de cada ciên-cia, subdivide-se em:
- Ciência teórica ou especulativa, que tem por finalidade o próprio co-nhecimento. A ciência teórica conhece por conhecer, limitando-se a ver a rea-
- Inn'oda('tion à Vende r/es (rienr es li m .. ~ unne.c, paris, 1942, cap. 2.., In[rodureirín a Ias c iencius dei esIrírinr México, 1 ~o 1944,1). 69. V. Miguel Reale (/,iç rïcs' prelintinore.c, cit.. I861 so hrc ' a distinção entre explicação e ccnnpreensão. Sobre Eduardo Spranger, discípulo de UihheY. cons te Juan Roma-Parella S'¡nang~ery tas cic•r tu.s de l u l ~ s/ rruu. México, 1?d. Minerva, 1944, p. 240.
- Meta/isu t, IU2-_5. b, 2.._5. W. U. Ross, ArisnNr. Ii i'aris, Iay'•ol, 19 30,1). 34 e 9. ) I Vico, .Seien;p nor'a, Padova, ('h;l)AM, 1953; Miguel Reale, Filoxofia do direito, cit., cap.
lidade, reproduzindo-a como existe. Tem sempre em vista a verdade. As ciên-cias teóricas, por sua vez, subdividem-se, conforme o grau de abstração de cada uma delas, em: a) ciências físicas ou naturais, que abrangem não só as ciências naturais, propriamente ditas, que se referem aos seres da natureza, considerados em sua
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