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Baixe Livro - Curso B?sico Mec?nica dos Solos - Carlos de Souza Pinto e outras Manuais, Projetos, Pesquisas em PDF para Engenharia Civil, somente na Docsity!
USA PINTO | O. a / ui 4 CURSO BÁSICO DE MECÂNICA DOS SOLOS 3º EDIÇÃO COM EXERCÍCIOS RESOLVIDOS OCopyright 2006 Oficina de Textos 1º reimpressão 2009 2º reimpressão 2011 Grafia atualizada conforme o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, em vigor no Brasil a partir de 2009. Capa: Mauro Gregolin Diagramação: Anselmo Trindade Ávila Ilustrações: Mauro Gregolin e Anselmo T. Ávila Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Pinto, Carlos de Sousa Curso Básico de Mecânica dos Solos em 16 Aulas/3º Edição Carlos de Sousa Pinto. — São Paulo: Oficina de Textos, 2006. Bibliografia. ISBN 978-85-86238-51-2 1. Mecânica dos Solos 2. Mecânica dos Solos — Estudo e Ensino 1. Título 00-0430 — CDD-624.151307 Índice para catálogo sistemático: 1. Mecânica dos solos: Estudo e Ensino: Engenharia 624.151307 Todos os direitos reservados à Oficina de Textos Rua Cubatão, 959 04013-043 São Paulo SP Brasil Fone: (11) 3085-7933 Fax: (11) 3083-0849 site: www.ofitexto.com.br e-mail: ofitexto(Dofitexto.com.br APRESENTAÇÃO É com grata emoção e orgulho que edito este livro do Prof. Carlos de Sousa Pinto, sem dúvida, um dos mais queridos e respeitados professores de Mecânica dos Solos da Poli, onde há quase 40 anos vem formando as gerações que aí se sucedem. Ninguém como ele para apresentar os primeiros conceitos e fundamentos com clareza e precisão, as primeiras impressões do que vem a ser Mecânica dos Solos. Por serem claras e cristalinas as ideias com que o Prof. Carlos Pinto apresenta os fundamentos, permanecem nas jovens mentes pelo resto da vida e permitem o desenvolvimento sólido do profissional, porque fundado em conceitos firmes. Há 30 anos fui aluna de graduação do Prof. Carlos Pinto e, estimulada por seu entusiasmo e instigada por esta nova área de conhecimento que nos apresentava, escolhi a Engenharia Geotécnica como minha profissão, e assim é até hoje. Ao final daquele ano pedi-lhe um estágio no IPT e posteriormente ainda viria a ser sua aluna na pós-graduação. Como não sentir enorme satisfação em editar seu livro? Isto sem falar no excelente profissional e prestimoso e solidário colega! Assistir às aulas do Prof. Carlos Pinto é um prazer que esperamos transmitir aos leitores deste livro. Façam bom proveito! Sobre o Autor: O Prof. Carlos de Sousa Pinto nasceu em Curitiba, Paraná, onde realizou seus estudos até o curso de Engenharia Civil, pela Escola de Engenharia da Universidade do Paraná, em 1956. Iniciou suas atividades profissionais na ABCP - Associação Brasileira de Cimento Portland, em São Paulo, atuando na implantação da técnica de pavimentos de solo-cimento no Brasil. No IPT, Instituto de Pesquisas Tecnológicas de São Paulo, foi pesquisador de 1959 a 1985, sempre no campo da Engenharia de Solos, e participou de atividades de pesquisa e de acompanhamento tecnológico, sucessivamente, em diversos setores: prospecção dos solos e engenharia de fundações; estabilização de solos e comportamento de pavimentos; aterros sobre solos moles e geotecnia de barragens de terra; e escavações e acompanhamento de PREFACIO Os estudantes do curso de Engenharia Civil, quando começam a frequentar as aulas de Mecânica dos Solos, percebem rapidamente que essa matéria tem características muito distintas das demais ciências da Engenharia. Acostumados a tratar mais dos esforços sobre materiais cujas propriedades são razoavelmente bem definidas, deparam-se agora com uma disciplina que se inicia mostrando a grande diversidade dos solos, para os quais existem modelos específicos de comportamento. O objetivo desta publicação é colocar ao alcance dos estudantes de Engenharia Civil e de especialidades correlatas uma coletânea de textos iniciais sobre a Mecânica dos Solos, de tal forma que facilite o estudo do tema e se constitua em fundação adequada para estudos mais desenvolvidos que sejam requeridos no exercício de suas atividades profissionais. Em muitos setores do conhecimento, o desenvolvimento do aprendizado ocorre por etapas sucessivas; não é possível penetrar em profundidade em um aspecto qualquer sem que se tenha adquirido um compatível conhecimento dos demais que o influenciam. Isso é uma especificidade da Mecânica dos Solos. Seus modelos de comportamento partem de hipóteses simplificadoras necessárias para o seu desenvolvimento. Conhecer bem essas hipóteses é tão importante quanto conhecer os próprios modelos, pois fica-se sabendo como ajustá-los às condições que fogem das hipóteses inicialmente adotadas. Os textos desta coletânea são originários de notas de aula que possibilitavam aos alunos o acompanhamento das exposições sobre o assunto, sem a preocupação de anotar o que era exposto, pois julgamos que a melhor maneira de aprender é acompanhar o sentido do que é apresentado na própria ocasião. O estudo posterior da matéria com consulta bibliográfica deve servir para questionar, aprofundar e consolidar os conhecimentos. Por esse motivo, a matéria é apresentada de maneira simples, como ensinada em sala de aula. Na Escola Politécnica da USP, a disciplina de Mecânica dos Solos é ministrada durante um semestre. O tema é exposto em aulas de duas horas.Os temas dessas aulas constituem os capítulos desta coletânea de textos. À complementação é feita por aulas práticas semanais, com três horas de trabalho em exercícios sobre o tema da aula expositiva da semana, e por sessões mensais de laboratório de quatro horas, nas quais os alunos podem praticar os ensaios mais simples e receber uma demonstração dos mais elaborados. A formação dos engenheiros civis em geotecnia, na Escola Politécnica, é completada por duas outras disciplinas, Obras de Terra e Fundações, para cada uma das quais são dedicadas duas horas semanais de aula expositiva e duas horas semanais de aula prática e de projeto. O conhecimento do assunto e a organização da matéria por parte do autor é fruto de estudos que se desenvolveram e amadureceram naturalmente durante muitos anos. Para isso, foi imprescindível o trabalho em conjunto com muitos colegas, especialmente no IPT, Instituto de Pesquisas Tecnológicas de São Paulo, e na Escola Politécnica da USP. Com cada um desses colegas, tão numerosos que a citação individual não deixaria de ser incompleta, o autor deseja repartir o mérito do trabalho realizado. O trabalho em conjunto com candidatos ao mestrado e ao doutorado, por outro lado, sempre foi um motivo de aprendizado e sintetização dos conhecimentos, cujos débitos do professor não são menores do que os dos alunos. Desnecessário realçar que em todos esses trabalhos foi intensa a pesquisa bibliográfica. A organização do texto foi fruto do trabalho interativo com os alunos que, ao questionarem os temas apresentados, obrigavam o professor a escolher novos caminhos para transmitir os conhecimentos básicos, sem deixar de incentivar o permanente espírito de curiosidade necessário para a formação do engenheiro criador de soluções. Ao agradecer os alunos, desejo dirigir-me especialmente à ex-aluna e atual engenheira Flavia Cammarota, que te iniciativa de digitar o texto antigo, incentivando-me a concluir a tarefa, pelo menos em respeito ao que ela já havia feito. a Ainda assim, foi necessário que a colega Shoshana Signer trouxesse todo o seu entusiasmo para que o trabalho fosse concluído. Mais do que isso, assumiu ela a tarefa de, além de editora, participar diretamente da organização do livro, tornando-o agradável para o estudante. Desejo agradecer à Fátima Aparecida F. S. Maurici a elaboração primeira de vários desenhos incluídos neste livro. Especial agradecimento é feito ao Prof. Dr. José Jorge Nader, pela leitura cuidadosa do texto, alertando-me para os trechos menos claros ou imprecisos; suas observações sobre o conteúdo e a maneira de apresentação foram muito importantes para se atingir o objetivo de apresentar um livro didático que despertasse o interesse dos alunos. Carlos de Sousa Pinto u 6 “ Exercícios resolvidos COMPACTAÇÃO DOS SOLOS 4.1 Razões e histórico da compactação ................eresereseeemsesentenees 4.2 O Ensaio Normal de Compactação . 4.3 Métodos alternativos de compactaçã 4.4 — Influência da energia de compactação ...............i teses 82 4.5 — Aterros experimentais... 4,6 — Estrutura dos solos comp: 4.7 A compactação no campo 4.8 Compactação de solos granulares Exercícios resolvidos ..... TENSÕES NOS SOLOS — CAPILARIDADE 5.1 Conceito de tensões num meio particulado 5:2 5.3 5.4 Ação da água capilar no solc devidas ao peso próprio do solo o neutra e conceito de tensões efeti Exercícios resolvido: A ÁGUA NO SOLO — PERMEABILIDADE, FLUXO | UNIDIMENSIONAL E TENSÕES DE PERCOLAÇÃO....... 113 6.1 A água no solo .... 6.2 A permeabilidade dos solos... 6.3 A velocidade de descarga e a velocidade real da água 6.4 Cargas hidráulicas 6.5 Força de percolação ... 6.6 — Tensões no solo submetido a percolação 6.7 Gradiente crítico... 6.8 Redução do gradiente de saída 6.9 Levantamento de fundo ... 6.10 Filtros de proteção 6.11 Permeâmetros horizontais Exercícios resolvidos... FLUXO BIDIMENSIONAL............... iireeremeeeeeeereeereeerereererereeees 7.1 Fluxos bi e tridimensionais .. 7.2. Estudo da percolação com redes de fluxo . Tt Rede-de fluxo bidimensional anssumuumaana nana 7.4 Traçado de redes de fluxo .... 7.5 - Outros métodos de traçado de 7.6 | Interpretação de redes de fluxo... 7.7. Equação diferencial de fluxos tridimension: 7.8 | Condição anisotrópica de permeabilidade 8 10 11 12 TENSÕES VERTICAIS DEVIDAS A CARGAS APLICADAS NA SUPERFICIE DO TERRENO . .163 8.1 Distribuição de Tensões... =163 8.2 Aplicação da Teoria da Elasticidade. 165 8.3 Considerações sobre o emprego da Teoria da Elasticidade .. 173 «174 Exercícios resolvidos .......meeerseeeeeere DEFORMAÇÕES DEVIDAS A CARREGAMENTOS VERTICAIS 9.1 Recalques devidos a carregamentos na superfície ... 183 183 183 187 «190 194 195 9.2 Ensaios para determinação da deformabilidade dos solos 9.3 Cálculo dos recalques . 9.4 O adensamento das argilas saturadas ...... 9.5 Exemplo de cálculo de recalque por adensamento . Exercícios resolvidos ............emeceereeresermeremes TEORIA DO ADENSAMENTO — — EVOLUÇÃO DOS RECALQUES COM O TEMPO .. 10.1 O processo do adensamento .. 205 «205 206 209 10.4 Exemplo de aplicação da Teoria do Adensamento ............ 216 219 10.2 A Teoria de Adensamento Unidimens onal Ide Terzaghi 10.3 Dedução da teoria ... Exercícios resolvidos TEORIA DO ADENSAMENTO — TÓPICOS COMPLEMENTARES .. 11.1 Fórmulas aproximadas relacionando recalques com fator tempo. 223 223 11.2 Obtenção do coeficiente de adensamento a partir do ensaio . 225 11.3 Condições de campo que influenciam o adensamento .......... 228 11.4 Análise da influência de hipóteses referentes ao comportamento dos solos na teoria do adensamento ............ 231 233 «237 «230 240 242 11.5 Adensamento secundário 11.6 Emprego de pré-carregamento para redu 11.7 Recalques durante o período construtivo 11.8 Interpretação de dados de um aterro instrumentado Exercícios resolvidos ....... ESTADO DE TENSÕES E CRITÉRIOS DE RUPTURA 12.1 Coeficiente de empuxo em repouso 283 253 255 260 263 12.2 “Tensões num plano genérico 12.3 A Resistência dos Solo: 12.4 Critérios de ruptur: 12.5 Ensaios para determinar a resisi Exercícios resolvidos .........m meme AULA | ORIGEM E NATUREZA DOS SOLOS 1.1 A Mecânica dos Solos na Engenharia Civil Todas as obras de Engenharia Civil assentam-se sobre o terreno e inevitavelmente requerem que o comportamento do solo seja devidamente considerado. À Mecânica dos Solos, que estuda o comportamento dos solos quando tensões são aplicadas, como nas fundações, ou aliviadas, no caso de escavações, ou perante o escoamento de água nos seus vazios, constitui uma Ciência de Engenharia, na qual o engenheiro civil se baseia para desenvolver seus projetos. Este ramo da engenharia, chamado de Engenharia Geotécnica ou Engenharia de Solos, costuma empolgar os seus praticantes pela diversidade de suas atividades, pelas peculiaridades que o material apresenta em cada local e pela engenhosidade frequentemente requerida para a solução de problemas reais. Trabalhos marcantes sobre o comportamento dos solos foram desenvolvidos em séculos passados, como os clássicos de Coulomb, 1773; Rankine, 1856; e Darcy, 1856. Entretanto, um acúmulo de insucessos em obras de Engenharia Civil no início do século XX, dos quais se destacam as rupturas do Canal do Panamá e rompimentos de grandes taludes em estradas e canais em construção na Europa e nos Estados Unidos, mostrou a necessidade de revisão dos procedimentos de cálculo. Como apontou Terzaghi em 1936, ficou evidente que não se podiam aplicar aos solos leis teóricas de uso corrente em projetos que envolviam materiais mais bem definidos, como o concreto e o aço. Não era suficiente determinar em laboratório parâmetros de resistência e deformabilidade em amostras de solo e aplicá-los a modelos teóricos adequados àqueles materiais. O conhecimento do comportamento deste material, disposto pela natureza em depósitos heterogêneos e de comportamento demasiadamente complicado para tratamentos teóricos rigorosos, deveu-se em grande parte aos trabalhos de Karl Terzaghi, engenheiro civil de larga experiência, sólido preparo científico e acurado espírito de investigação, internacionalmente reconhecido como o fundador da Mecânica dos Solos. Seus trabalhos, por Mecânica dos Solos identificarem o papel das pressões na água no estudo das tensões nos solos e a apresentação da solução matemática para a evolução dos recalques das argilas com o tempo após o carregamento, são reconhecidos como o marco inicial dessa nova ciência de engenharia. Apesar de seu nome, hoje empregado internacionalmente, a Mecânica dos Solos não se restringe ao conhecimento das propriedades dos solos que a Mecânica pode esclarecer. A Química e a Física Coloidal, importantes para justificar aspectos do comportamento dos solos, são parte integrante da Mecânica dos Solos, enquanto que o conhecimento da Geologia é fundamental para o tratamento correto dos problemas de fundações. A Engenharia Geotécnica é uma arte que se aprimora pela experiência, pela observação e análise do comportamento das obras, para o que é imprescindível atentar para as peculiaridades dos solos com base no entendimento dos mecanismos de comportamento, que constituem a essência da Mecânica dos Solos. Os solos são constituídos por um conjunto de partículas com água (ou outro líquido) e ar nos espaços intermediários. As partículas, de maneira geral, encontram-se livres para deslocar-se entre si. Em alguns casos, uma pequena cimentação pode ocorrer entre elas, mas num grau extremamente mais baixo do que nos cristais de uma rocha ou de um metal, ou nos agregados de um concreto. O comportamento dos solos depende do movimento das partículas sólidas entre si e isto faz com que ele se afaste do mecanismo dos sólidos idealizados na Mecânica dos Sólidos Deformáveis, na qual se fundamenta a Mecânica das Estruturas, de uso corrente na Engenharia Civil. Mais que qualquer dos materiais tradicionalmente considerados nas estruturas, o solo diverge, no seu comportamento, do modelo de um sólido deformável. A Mecânica dos Solos poderia ser adequadamente incluída na Mecânica dos Sistemas Particulados (Lambe e Whitman, 1969). As soluções da Mecânica dos Sólidos Deformáveis são frequentemente empregadas para a representação do comportamento de maciços de solo, graças a sua simplicidade e por obterem comprovação aproximada de seus resultados com o comportamento real dos solos, quando verificada experimentalmente em obras de engenharia. Em diversas situações, entretanto, O comportamento do solo só pode ser entendido pela consideração das forças transmitidas diretamente nos contatos entre as partículas, embora essas forças não sejam utilizadas em cálculos e modelos. Não é raro, por exemplo, que partículas do solo se quebrem quando este é solicitado, alterando-o, com consequente influência no seu desempenho. 1.2 As partículas constituintes dos solos A origem dos solos Todos os solos originam-se da decomposição das rochas que constituíam inicialmente a crosta terrestre. A decomposição é decorrente de agentes físicos Mecânica dos Solos 16 Tab. 1,1 Limites das frações de solo pelo tamanho dos grãos e pedregulho é denominado fração grossa ou grosseira do solo. Por outro lado, a fração argila é considerada, com frequência, como a fração abaixo do diâmetro de 0,002 mm, que corresponde ao tamanho mais próximo das partículas de constituição mineralógica dos minerais-argila. Fração Limites definidos pela ABNT Matacão de25cmatm Pedra de 7,6cm a 25cm Pedregulho de 4,8mm a 7,6cm Areia grossa de 2 mma 4,8 mm Areia média de 0,42 mma 2mm Areia fina de 0,05 mm a 0,42 mm Silte de 0,005 mm a 0,05 mm Argila inferior a 0,005 mm Constituição mineralógica As partículas resultantes da desagregação de rochas dependem da composição da rocha matriz. Algumas partículas maiores, dentre os pedregulhos, são constituídas frequentemente de agregações de minerais distintos. É mais comum, entretanto, que as partículas sejam constituídas de um único mineral. O quartzo, presente na maioria das rochas, é bastante resistente à desagregação e forma grãos de siltes e areias. Sua composição química é simples, SiOs, as partículas são equidimensionais, como cubos ou esferas, e apresentam baixa atividade superficial. Outros minerais, como feldspato, gibsita, calcita e mica, também podem ser encontrados nesse tamanho. Os feldspatos são os minerais mais atacados pela natureza e dão origem aos argilominerais, que constituem a fração mais fina dos solos, geralmente com dimensão inferior a 2 mm. Não só o reduzido tamanho mas, principalmente, a constituição mineralógica faz com que essas partículas tenham um comportamento extremamente diferenciado em relação ao dos grãos de silte e areia. Os argilominerais apresentam uma estrutura complexa. Uma abordagem detalhada desse tema foge ao escopo deste livro e pode ser encontrada em livros clássicos, como o pioneiro do Prof. Ralph Grim, da Universidade de Illinois, de 1962, ou o do Prof. James Mitchell, da Universidade da Califórnia, de 1976. Uma síntese do assunto, que permite compreender o comportamento dos solos argilosos perante a água, é apresentada a seguir, com o exemplo de três dos minerais mais comuns na natureza (a caulinita, a ilita e a esmectita), que apresentam comportamentos bem distintos, principalmente na presença de água. Na composição química das argilas, existem dois tipos de estrutura: uma estrutura de tetraedros justapostos num plano, com átomos de silício ligados a quatro átomos de oxigênio (SiO2) e outra de octaedros, em que átomos de alumínio são circundados por oxigênio ou hidroxilas [A(O H)3]. Essas estruturas ligam-se por meio de átomos de oxigênio que pertencem simultaneamente a ambas. Alguns mincerais-argila são formados por uma camada tetraédrica e uma octaédrica (estrutura de camada 1:1), que determinam uma espessura de aproximadamente 7 À (1 Angstron = 10:19 m), como a caulinita, cuja estrutura está representada na Fig. 1.1. As camadas assim constituídas encontram-se firmemente empacotadas, com ligações de hidrogênio que impedem sua separação e a introdução de moléculas de água entre elas. A partícula resultante fica com uma O Oxigênio espessura da ordem de 1.000 À, É Hidroxila e sua dimensão longitudinal é de O fumírio So Silício cerca de 10.000 À. Noutros minerai s, O atranjo (b) octaédrico é encontrado entre duas estruturas do arranjo tetraédrico (estrutura de camada 2:1), com uma espessura de cerca de 10 À. Com essa constituição estão as esmectitas e as ilitas, cujas estruturas simbólicas são apresentadas na Fig. 1.2. Nesses minerais, as ligações entre as camadas ocorrem por íons O? e O?* dos arranjos tetraédricos, que são mais fracos do que as ligações entre camadas de caulinita, em que íons O? da estrutura tetraédri à se ligam ao OH * da estrutura octaédrica. As camadas ficam livres, e as partículas, no caso das esmectitas, ficam com a espessura da própria camada estrutural, que é de 10 À. Sua dimensão longitudinal também é reduzida, ficando com cerca de 1.000 À, pois as placas se quebram por flexão. As partículas de esmectitas apresentam um volume 10-4 vezes menor do que as de caulinita e uma área 102 vezes menor. Isto significa que, para igual volume ou mass a, à superfície das partículas de esmectitas é 100 vezes maior do que das partículas de caulinita. A superfície específica (superfície total de um conjunto de partículas dividida pelo seu peso) das caulinitas é da ordem de 10 m2/g, enquanto que a das esmectitas é de cerca de 1.000 m?2/g. As forças de superfície são muito importantes no comportamento de partículas coloidais, e a diferença de superfície específica é uma indicação da diferença de comportamento entre solos com distintos minerais-argila. O comportamento das argilas seria menos complexo se não ocorressem imperfeições na sua composição mineralógica. É comum um átomo de alumínio (AB?) substituir um de silício (Sit) na estrutura tetraédrica e, na estrutura octaédrica, átomos de alumínio serem substituídos por outros átomos de menor valência, como o magnésio (Mg**). Essas alterações são definidas como substituições isomórficas, pois não alteram o arranjo dos átomos, mas as partículas ficam com uma carga negativa. Para neutralizar as cargas negativas, existem cátions livres nos solos, por exemplo cálcio, Ca**, ou sódio, Naf, aderidos às partículas. Esses cátions atraem camadas contíguas, mas com força relativamente pequena, o que não impede a entrada de água entre as camadas. À liberdade de movimento das Aula 1 Origem e Natureza dos Solos 17 Fig. 11 Estrutura de uma camada de caulinita; (a) atômica, (b) simbólica a 14 À, Uma maior umidade provoca o aumento dessa distância basal até a completa liberdade das camadas. As ilitas, que apresentam estruturas semelhantes às das esmectitas, não absorvem água entre as camadas, pela presença de íons de potássio, provocando uma ligação mais firme entre elas, como mostrado na Fig. 1.2 (b). Em consequência, seu comportamento perante a água é intermediário entre o da caulinita e o da esmectita. Com a elevação do teor de água, forma-se no entorno das partículas a conhecida camada dupla. É a camada em torno das partículas na qual as moléculas de água são atraídas a íons do solo, e ambos à superfície das partículas. As características da camada dupla dependem da valência dos íons presentes na água, da concentração eletrolítica, da temperatura e da constante dielétrica do meio. Devido às forças eletroquímicas, as primeiras camadas de moléculas de água em torno das partículas do solo estão firmemente aderidas. À água, ne: condições, apresenta comportamento bem distinto da água livre, e esse estado as é chamado de água sólida, pois não existe entre as moléculas a mobilidade das moléculas dos fluidos. Os contatos entre partículas podem ser feitos pelas moléculas de água a elas aderidas. As deformações e a resistência dos solos quando solicitados por forças externas dependem, portanto, desses contatos. Nota-se que os átomos de hidrogênio das moléculas de água não estão numa situação estática. Ao contrário, encontram-se em permanente agitação, de forma que a sua orientação é uma situação transitória. Em qualquer momento, uma molécula de água pode ser substituída por outra, no contato com as partículas argilosas. Esse fenômeno interfere na transmissão de forças entre as partículas e justifica a dependência do comportamento reológico dos solos ao tempo de solicitação, como será estudado nas Aulas 11 e 15. Quando duas partículas de argila, na água, estão muito próximas, ocorrem forças de atração e de repulsão entre elas. As forças de repulsão são devidas às cargas líquidas negativas que elas possuem e que ocorrem desde que as camadas duplas estejam em contato. Às forças de atração decorrem de forças de Van der Waals e de ligações secundárias que atraem materiais adjacentes. Da combinação das forças de atração e de repulsão entre as partículas resulta a estrutura dos solos, que se refere à disposição das partículas na massa de solo e às forças entre elas. Considera-se a existência de dois tipos básicos de estrutura: flocnlada, quando os contatos se fazem entre faces e arestas, ainda que através da água adsorvida; e dispersa, quando as partículas se posicionam paralelamente, face a face. Às argilas sedimentares apresentam estruturas que dependem da salinidade da água em que se formaram. Em águas salgadas, a estrutura é bastante aberta, embora haja um relativo paralelismo entre partículas, em virtude de ligações de valência secundária. Estruturas foculadas em água não salgada resultam da atração das cargas positivas das bordas com as cargas negativas das faces das partículas. A Fig. 1.3 ilustra esquematicamente os três tipos de estrutura, O conhecimento das estruturas permite o entendimento Aula 1 Origem e Natureza dos Solos 19 Mecânica dos Solos 20 HG. 17 Exemplo de estruturas de solos sedimentares: (a) floculada em água salgada, (b) floculada em água não salgada, (c) dispersa (Mitchel, 1976). Fig. 1.4 Exemplo de estrutura de solo residual, com micro e macroporos. (a) (b) (e) de diversos fenômenos notados no comportamento dos solos, como, por exemplo, a sensitividade das argilas. O modelo de estrutura mostrado é simplificado. No caso de solos residuais e de solos compactados, a posição relativa das partículas é mais elaborada. Existem aglomerações de partículas argilosas que se dispõem de forma a determinar vazios de maiores dimensões, como se mostra na Fig. 1.4. Existem microporos nos vazios entre as partículas argilosas que constituem as aglomerações, e macroporos entre as aglomerações. Esta diferenciação é importante para o entendimento de alguns comportamentos dos solos como, por exemplo, a elevada permeabilidade de certos solos residuais no estado natural, ainda que apresentem considerável parcela de partículas argilosas, como se estudará na Aula 6. Observa-se que, em solos evoluídos pedologicamente, principalmente em climas quentes e úmidos, aglomerações de partículas minerais se apresentam envoltas por deposições de sais de ferro e de alumínio, um aspecto determinante para seu comportamento. 1.4 Sistema solo-água-ar Quando o solo não se encontra saturado, o ar pode se apresentar em forma de bolhas oclusas (se estiver em pequena quantidade) ou em forma de canalículos intercomunicados, inclusive com o meio externo. O aspecto mais importante com relação à presença do ar é que a água, na superfície, se comporta como Ate, DE EB Ep ua Mód dass a se fosse uma membrana. As moléculas de água, no contato com o ar, orientam-se em virtude da diferença da atração química das moléculas adjacentes. Esse comportamento é medido pela tensão superficial, uma característica de qualquer líquido em contato com outro líquido ou com um gás. Em virtude desta tensão, a superfície de contato entre a água e o solo nos vazios pequenos das partículas