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Este documento discute as medidas de conservação e reabilitação de redes hidrográficas e zonas ribeirinhas, enfatizando a importância da vegetação ripícola. A limpeza e desobstrução de alveos de água, reabilitação de linhas de água e zonas ribeirinhas, e a importância de evitar a maximização do escoamento em cada secção são abordados. Além disso, estruturas vegetais associadas a linhas de água torrenciais e suas funções específicas são discutidas.
O que você vai aprender
Tipologia: Notas de aula
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João Paulo Fernandes (Universidade de Évora (ICAAM), APENA)
Carlos Souto Cruz Universidade de Évora
Nascentes para a Vida 5
O presente trabalho pretende ser um simples contributo para as inúmeras dúvidas que, no quadro do projecto "Nascentes para a Vida" nos foram sendo colocadas acerca das obrigações que a nova Lei da Água coloca aos proprietários e municípios.
Procurou-se assim esclarecer o enquadramento normativo e fazer uma pequena in- trodução técnica à problemática da gestão das linhas de água no sentido da promoção da sua qualidade e funcionalidade.
Deu-se particular atenção às necessidades específicas dos pequenos proprietários, pro- curando apresentar exemplos e casos de estudo que reflectissem as mais frequente situações registadas em Portugal.
Esperamos, portanto dar o nosso pequeno contributo a esta complexa tarefa que exige de todos nós um envolvimento consciente e particularmente, informado.
Queríamos agradecer a colaboração da Prof.ª Maria do Céu Tereno na elaboração de muitos das figuras e da Prof.ª Marízia Menezes e do Engº Nuno Guiomar na revisão do original.
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Quando falamos de Linhas de Água em que é que estamos a pensar?
Uma linha de água corresponde no essencial a uma estrutura de drenagem hidráulica permanente ou efémera de uma vasta área de concentração (a Bacia Hidrográfica). Por essa razão o seu carácter e funcionalidade dependem directa e indissoluvelmente das características da Bacia Hidrográfica por ela drenada e obviamente dos processos climáticos e hidrogeológicos nela ocorrentes, assim como, de uma forma determinante das características do uso do solo na superfície da Bacia.
Neste quadro, as linhas de água (incluindo as linhas de drenagem mais ou menos efémeras) são intrinsecamente dependentes do modo de manifestação local do ciclo hidrológico:
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que, integrando todas estas influências não funcionam como mera consequência determinística desses processos dinâmicos, mas apresentam uma individualidade e dinâmica específica que conferem natureza autónoma a cada sistema local de per si.
Temos ainda que os ecossistemas de águas interiores são muito mais que os corpos de água individualizáveis e incluem todos os ecossistemas que, de uma forma ou de outra são afectados e determinados pelos sistemas hidrológicos. Destes ecossistemas permitam-me realçar as várzeas e todas as planícies de inundação e leitos de cheia, normal e inadequadamente tratados como ecossistemas terrestres, quando a sua ligação aos ecossistemas hidrológicos não é conjuntural mas sim estrutural.
Os ecossistemas ribeirinhos constituem ecossistemas particulares, dado que a sua articulação a linhas e planos de água lhes confere características de ecótone com as consequentes trocas intensas de substâncias e materiais de acordo com gradientes de humidade, luminosidade e de natureza do substrato. Por outro lado, no caso das linhas de água, o carácter variável do seu caudal e energia de escoamento ao longo do seu traçado determina, igualmente, gradientes dinâmicos geradores de intensas variações na natureza intrínseca desses ecossistemas (Fig. 1.1).
Estas duas razões fundamentam a afirmação que os ecossistemas ribeirinhos preenchem funções charneira no espaço, em termos locais, articulando ecossistemas de natureza totalmente diversa e funcionando como planos dinâmicos de intercâmbio ecológico assim como, em termos regionais, espaços de diferente natureza, quer em termos do carácter variável do corpo de água, quer da ecologia dos terrenos atravessados ao longo do seu trajecto.
Estes gradientes característicos de variação transversal possuem uma diversidade extremamente grande, podendo assumir um carácter abrupto (caso de rios encaixados como o Tâmega entre Fridão e Atei ou o Douro Internacional), constituir amplos planos de interface como são os sistemas de várzea (Tejo em Santarém ou Trancão em Loures) ou as estruturas diversificadas de terraços antigos (Minho) ou articularem, de forma complexa e subtil, ecossistemas terrestres de planalto com estruturas complexas de vales encaixados, encostas erodidas e sistemas aluvionares distantes como é o caso do Alva e do Mondego. Da mesma forma, os gradientes longitudinais assumem também padrões muito variáveis, inter-relacionando domínios distintos dentro do mesmo troço (através, por ex. do diferente carácter dos afluentes), ou chegando mesmo a, aparentemente, perder a individualidade na paisagem, sem perder o seu carácter de eixo de concentração e transporte (caso de muitos cursos intermitentes no domínio mediterrânico.
Em suma, os ecossistemas ribeirinhos assumem uma diversidade e um carácter de tal modo rico que, a sua gestão no quadro mais global da gestão do território e dos recursos hídricos, constitui uma prioridade básica no quadro de uma política de uso sustentável do território.
Com efeito, as linhas e outros corpos de água, longe de constituírem simples estruturas hidráulicas, como infelizmente muitas vezes são consideradas, são capazes de, apenas
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vias de intercâmbio genético capazes de contribuir para a existência de populações viáveis, ao favorecerem ou ao associarem-se a condições ecológicas locais particulares, potenciadoras de formações e capacidades particulares.
Estas funções e potenciais não se associam, contudo, a uma estrutura ecológica estável e mantida como tal. Grande parte do potencial anteriormente referido decorre da intensa dinâmica associada a estes ecossistemas e que se espelha na diferenciação registada nos substratos aluvionares (decorrente de diferentes regimes passados de correntes e de cheias e indutora de distintas condições ecológicas na matriz aluvionar) ou na diferenciação permanente das estruturas de várzea, em função do regime de cheias ou de secas, induzindo perturbações localizadas, responsáveis pela permanente criação do focos locais de diversidade estrutural e específica.
Por estes motivos, a articulação destes ecossistemas com os espaços de uso, sendo mutuamente benéfica em algumas situações, é historicamente fonte de conflitos pela incompatibilidade entre a necessidade de variação desses ecossistemas e a necessidade de estabilidade dos sistemas de produção económica. Contudo, as tentativas de simplificação e de controle dessa necessidade de variação têm redundado, regularmente, em perdas a médio ou longo prazo, por geração de perturbações de grande magnitude (por ex. cheias, erosão, sedimentação, secas, eutrofização) anteriormente amortecidas pela variabilidade localizada e pela ocorrência de micro-perturbações dentro do sistema estável.
A necessidade de conciliar estes dois sistemas, assegurando que os ecossistemas ribeirinhos preencham todas as suas funções duma forma compatível com a necessidade de os sistemas económicos usufruírem plenamente dos seus recursos e potencial produtivos, levanta problemas complexos de gestão que não são conciliáveis com visões parcelares (dominantemente hidráulicas ou conservacionistas) e que implicam uma abordagem tão criativa quanto diversificados são esses ecossistemas.
Dois princípios têm de reger a gestão destes espaços:
Estes dois princípios tomados com a necessária maleabilidade decorrente da enorme diversidade de exigências de uso colocadas relativamente a estes sistemas, permitem orientar a gestão das linhas de água e restantes ecossistemas ribeirinhos de uma forma muito mais equilibrada do que tem sido conduzida até agora.
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Assim, a primeira regra de gestão é a de que se impõe uma perspectiva integrada de gestão do conjunto da bacia, já que as afluências e o seu regime decorrem directamente da natureza do uso de toda a bacia.
A segunda regra é a de que quanto mais próximos do natural forem os sistemas construtivos empregues, maior será a viabilidade e longevidade do sistema ou da estrutura construída.
A terceira regra é a da adequação das intensidades de uso à natureza e condicionantes do território. Assim, por ex. as várzeas não podem ser encaradas como espaços de vocação múltipla sem restrições, mas têm de ser consideradas e geridas como espaços de elevada capacidade de uso, condicionada e potenciada pela sua natureza de espaços de acumulação, inundáveis e de freático superficial, exigindo, portanto zonamento do uso em função da frequência dos riscos de inundação.
A quarta regra é a da rede ecológica. Os ecossistemas ribeirinhos ao constituírem uma rede que percorre duma forma extremamente diversificada o território da bacia hidrográfica, tem de ser preservado na capacidade de manter essas funções articuladas, num quadro de preservação da diversidade dos restantes ecossistemas terrestres.
Os ecossistemas ribeirinhos são sistemas ecológicos complexos de grande variabilidade e funcionando no território como sistemas charneira, não só entre os ecossistemas aquáticos e os terrestres, mas também dentro de cada um dos diversos tipos destes ecossistemas. O elevado potencial e produtividade apresentados por estes sistemas determina que sobre eles se exerçam grandes pressões de uso, que conduzem a práticas gestoras parcelares, normalmente indutoras de desequilíbrios gravosos em termos ecológicos e económicos. Impõe-se, portanto, uma perspectiva multifacetada de gestão, preservando e promovendo a funcionalidade e a particularidade destes espaços, numa articulação valorizadora com o conjunto da sua bacia hidrográfica.
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Definindo no que respeita aos responsáveis pela execução das referidas medidas:
_4. (...)
O Artigo 46º, por seu lado, define os objectivos a atingir com estas intervenções de conservação e reabilitação da rede hidrográfica e zonas ribeirinhas:
Tendo os conceitos utilizados, sido anteriormente definidos no Art.º 4º da mesma lei:
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Finalmente, no DL 77/2006 são clarificados os conceitos de estado ecológico "excelente", "bom" e razoável" dos rios, no que se refere aos distintos elementos e, no caso concreto das margens e zonas ribeirinhas, os Elementos de qualidade hidromorfológica (QUADRO N.º 1.2.1 do Anexo V):
Elementos de qualidade hidromorfológica Elemento: Regime hidrológico Estado Excelente Os caudais e condições de escoamento, e as consequentes ligações às águas subterrâneas, reflectem totalmente ou quase condições não perturbadas. Bom Condições compatíveis com os valores acima especificados para os elementos de qualidade biológica. Razoável Condições compatíveis com os valores acima especificados para os elementos de qualidade biológica. Elemento: Continuidade do rio Excelente A continuidade do rio não é perturbada por actividades antropogénicas e permite a migração de organismos aquáticos e o transporte de sedimentos sem perturbação. Bom Condições compatíveis com os valores acima especificados para os elementos de qualidade biológica. Razoável Condições compatíveis com os valores acima especificados para os elementos de qualidade biológica. Elemento: Condições morfológicas Excelente As estruturas do leito, as variações de largura e profundidade, as velocidades de escoamento, as condições do substrato e a estrutura e condição das zonas ripícolas correspondem totalmente ou quase às que se verificam em condições não perturbadas. Bom Condições compatíveis com os valores acima especificados para os elementos de qualidade biológica. Razoável Condições compatíveis com os valores acima especificados para os elementos de qualidade biológica.
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O factor determinante de uma linha de água é a sua corrente. Esta depende, em primeiro lugar da hidrologia do local, ou seja, das características da Bacia Hidrográfica e do modo como ela gera escoamento fluvial na sequência de uma chuvada. Este escoamento resulta do Balanço Hídrico ocorrente na Bacia e depende prioritariamente da sua geologia, solos, morfologia e uso (Fig. 3.1).
Fig. 3.1. Representação esquemática do balanço hídrico numa Bacia Hidrográfica tipo.
Como a distribuição da precipitação ao longo do ano e inter-anualmente é muito variável, existem momentos em que os caudais escoados são reduzidos ou muito reduzidos e outros em que o escoamento é extremamente caudaloso, podendo atingir velocidades elevadas e ocupando uma ampla secção de escoamento (Fig. 3.2).
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Contudo essas situações excepcionais ocorrem apenas durante poucos dias do ano, pelo que, uma adequada gestão das margens e zonas ribeirinhas de uma linha de água tem de ter em consideração todos os regimes de escoamento ocorrentes ao longo do ano. O modo como este escoamento flui numa dada secção de uma linha de água é determinado por dois factores essenciais (Fig. 3.3):
Fig. 3.2. Curva anual padrão dos caudais, indicando a frequência média de duração dos diferentes níveis de água durante o ano, em correlação com o perfil da vegetação existente (Seibert, 1968)
Fig. 3.3. Principais características hidráulicas de uma secção de uma linha de água (A - área trans- versal, U - perímetro molhado, h - profundidade, JW - inclinação, v - velocidade da água, Q - Caudal, τo - resistência à tracção (rugosidade)) (Rauch, 2008)
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Regressando aos factores determinantes do escoamento, importa saber que, devido à rugosidade do leito, uma linha de água apresenta em cada secção uma distribuição de velocidades como a representada na Fig. 3.4. Esta distribuição diferenciada (mais reduzida junto ao fundo e margens onde a fricção é maior e mais elevada no centro da secção), determina que a água não flua de modo linear e uniforme ao longo de um troço, mas antes que flua num trajecto em espiral que vai originar que uma linha de água natural tenda sempre a meandrar porque existem secções onde a velocidade é mais elevada numa das margens e menor na outra originando erosão na margem onde se regista uma maior velocidade e deposição na margem oposta.
Fig. 3.4 .Distribuição típica da velocidade da água numa secção de uma linha de água e conse- quente acção na forma do escoamento longitudinal, originando um padrão espiralado e a formação de meandros com margens de erosão e margens de sedimentação
Este processo determina que qualquer linha de água apresente, naturalmente, uma dinâmica de variação do seu traçado e um permanente processo de erosão/sedimentação que contribuem para a diversidade dos biótopos que estão associados a qualquer linha de água.
Esta característica é da maior importância no processo de definição das abordagens de gestão a aplicar em cada troço.
Mas uma linha de água não é só o escoamento, mas também as características do substrato, a velocidade da corrente, as condições de luz e temperatura, o conteúdo em oxigénio, o quimismo da água, o input de substâncias orgânicas e inorgânicas a partir do meio e as afluências que, pela sua natureza ou quantidade podem afectar a qualidade da água (matéria orgânica, turvação, sedimentos ou substâncias tóxicas).
Todas essas características contribuem para que cada linha de água tenha características próprias e constitua ecossistemas e paisagens muito diversificados que importa valorizar e promover. Por exemplo, nas águas correntes geram-se em diferentes circunstâncias, zonas de águas calmas, que apresentam um elevado significado em termos biológicos,
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quer por permitirem a fixação de uma fauna e flora consideráveis, quer por assegurarem condições de refúgio e alimento a inúmeros seres vivos.
Tanto elas como as zonas de águas correntes são partes integrantes e fundamentais das linhas de água, pelo que nas intervenções construtivas há que assegurar a sua protecção, viabilidade e eventual promoção, tendo em conta que uma linha de água é uma estrutura transversal e longitudinalmente integrada. A linearização e a simplificação de fundos, margens e regime hidráulico implicam o comprometimento de inúmeros habitats e um empobrecimento na fauna e flora da linha de água (logo uma redução da sua qualidade ecológica) (Fig. 3.5).
Fig. 3.5. Ilustração do impacte na fauna piscícola da simplificação e homogeneização de um troço de linha de água (Blab, 1993)
Nenhuma intervenção deve, pois, simplificar a estrutura ou traçados naturais, importando salvaguardar o espaço natural de expressão de cada linha de água. Obviamente que este espaço pode estar condicionado por utilizações das margens que, pelo seu carácter, forma de instalação, antiguidade ou valor particular, não possam ser condicionadas ou retiradas. Nestas situações importa identificar quais as reais condicionantes do processo de escoamento e gerir a linha de água e os seus diferentes componentes em consonância, sempre dentro do princípio da maximização da naturalidade e funcionalidade.