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Robert nozick defende a teoria do estado mínimo, onde a única função legítima do estado é proteger os indivíduos contra a violência e garantir os contratos livremente firmados. Nozick opõe-se à expansão do papel do estado e à ideia de utopias universais, defendendo a autonomia individual e a diversidade de formas de vida.
O que você vai aprender
Tipologia: Notas de estudo
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Fevereiro 2017
Resumo
Este texto para discussão é parte de uma pesquisa de maior envergadura sobre os fundamentos do que se costuma designar de “neoliberalismo”. Ele foi pensado também para subsidiar as discussões da disciplina CE-878 C – Tensões no pensamento liberal: do liberalismo reformista ao “neoliberalismo”. O propósito é pouco ambicioso: destacar os elementos centrais da interpretação de Robert NOZIK presentes em Anarchy, State and Utopia Oxford: Blackwell, 1999 [1974]. Para tornar o texto sucinto, economizei nas notas e não fiz referências aos debates laterais que o livro ensejou (e ainda enseja). Todas as referências de página são desta edição. Começo expondo o argumento central do autor para, na sequência, discutir os seus fundamentos. Na parte 2 desenvolvo alguns temas e aponto parte dos problemas que deles decorrem.
Palavras-chave : Robert Nozik; Liberalismo; Pensamento libertário.
Argumento central
Por partir da tese que os indivíduos são autônomos e intrinsecamente heterogêneos, Nozik propõe uma perspectiva rigorosamente individualista: a despeito do meio social, vivemos vidas distintas, isto é, possuímos existências separadas (p. 33). Disto ele conclui que é errado sacrificar uma pessoa – ou alienar seu tempo, os produtos do seu trabalho, confiscar suas posses etc. – em favor de outra. Nenhuma circunstância social justificaria este tipo de conduta. Em última instância, este raciocínio está radicado na tese de que, enquanto indivíduos, possuímos direitos absolutos à vida e à liberdade que devem proteger todos os indivíduos da agressão sobre sua pessoa ou sobre sua propriedade. Tratam-se, no entanto, de direitos negativos, que não podem ser confundidos com o direito (positivo) a receber ajuda dos semelhantes quando estivermos em dificuldades, seja de forma direta ou por intermédio de qualquer aparelho social como, por exemplo, o Estado. Para ele, a única interferência legítima à vida e à propriedade dos indivíduos envolve os casos de autodefesa ou de punição/reparação a atos fraudulentos. A rigor, Nozik exclui a própria pertinência da justiça distributiva que, em seu entender, viola necessariamente
Robert Nozik em Anarquia, Estado e Utopia : argumentos centrais
eu colho uma maçã de uma macieira que não pertence e não foi plantada por ninguém, a maçã é minha por direito (justiça na aquisição). Já no que concerne à troca, ela só é justa se não existir coação ou fraude (por isso o princípio 2, regulamenta a transferência justa). No caso de fraude ou roubo, a reparação deve vir do infrator, e não do poder público, pois os demais indivíduos nada tem a ver com o caso.
1.2 Papel do Estado
No entanto, o simples fato de possuirmos estes direitos nada, a princípio, garante que eles serão respeitados. Esse é, de certo modo, o preço da liberdade. É a partir daí que, opondo-se aos anarquistas e aos adeptos da ampliação do papel do Estado, ele defende o Estado mínimo : sua única função legítima é proteger-nos uns dos outros e de ameaças externas, cumprindo um conjunto claramente restrito de funções: proteger as pessoas do uso da força, da fraude, do roubo e garantir os contratos livremente firmados entre as partes. Estas são as únicas funções legítimas do Estado. Toda e qualquer ampliação do Estado que vá além destes limites irá necessariamente violar os direitos individuais e, portanto, é injustificável.
1. 3 Moral e Compulsão
O ponto, na realidade, repousa no que o Estado não pode fazer. Afinal, o Welfare State também realiza – necessariamente – as funções do Estado Mínimo proposto por Nozik. O limite da ação justa do Estado é a proteção dos indivíduos contra a violência e a garantia dos contratos. Qualquer outra função viola as liberdades individuais e atenta contra os direitos individuais de propriedade. Não há e não deve haver espaço para políticas públicas: assistência social, caridade e ajuda humanitária são ações que dizem respeito apenas aos indivíduos em sua esfera pessoal.
contrato social centrado no consenso. Não: basta a liberdade individual e o direito de se apropriar da natureza. Caso esta apropriação (ou os seus efeitos) crie algum monopólio sobre bens essenciais (apropriação da única fonte de água no deserto ou, por algum motivo, todas as fontes de água (privadas) de uma região secam, menos uma), o princípio da compensação pode ser utilizado. Somente neste tipo de caso – raro – seria possível interferir sobre a propriedade, mas preferencialmente sem confisco e a redistribuição (linha mais próxima de Locke) , mas permitir o usufruto dos afetados. Neste caso, Nozik admite enfraquecer uma dimensão dos direitos da propriedade: o de proibir que os demais a utilizem, caso o proprietário assim deseje.
Eduardo Mariutti
Este raciocínio está parcialmente fundamentado em um subjetivismo radical (que, como se sabe, está na base da economia neoclássica): no reino dos valores não existe nenhuma objetividade. Isto é: os códigos morais são fruto de preferências morais subjetivas que, portanto, não podem se codificadas em direitos universais sancionados pelo poder coercitivo do Estado. Toda ação moral só faz algum sentido ser for voluntária. Pagar compulsoriamente impostos para alimentar os mais pobres não é, portanto, uma ação moral. Todo esse raciocínio opera em uma distinção que Nozik julga fundamental: o que é moralmente correto (que tem um grau elevado de subjetividade) e o que é compulsório. A defesa do Estado máximo rompe esta distinção e, por conta disso, além de atentar contra a liberdade, desvaloriza as ações morais, ao institucionalizá-las. É moralmente correto ajudar uma pessoa desmaiada na rua ou se afogando, mas isto depende do arbítrio do indivíduo que, entretanto, não deve ser compelido por um aparelho coercitivo a fazer esta ação, caso não queira. Só você tem o direito de decidir os rumos da sua vida e, exatamente por ser livre para agir, é o único responsável pela sua própria vida e pelas consequências de seus atos.
1.4 Indivíduo: autonomia e sentido
Como já foi apontado, a autonomia do indivíduo é o pilar fundamental da perspectiva construída por Nozik. E seres autônomos não podem tratar seus semelhantes meramente como meios, algo degradante e que atenta contra a própria autonomia individual. Dois problemas aparecem imediatamente (e ele discute minuciosamente ambos, oscilando entre uma criatividade cativante e enfadonhos exercícios retóricos). Problema 1: será mesmo possível viver em sociedade sem que, pelo menos em algumas circunstâncias, tratemos os demais como meio? Em que circunstâncias isso deveria ser permitido? Problema 2: Se somos seres sociais, fadados a estabelecer relações duradouras com os demais, como é possível ser autônomo? Ou melhor, em que sentido preciso podemos definir a autonomia individual.
Frente a este duplo problema, ele propõe uma resposta bastante original. Quando não se parte axiomaticamente do jusnaturalismo, a defesa do homem enquanto portador de direitos geralmente acentua ou se baseia em um dos seguintes atributos: autoconsciência; racionalidade (i.e.: capacidade de usar
Eduardo Mariutti
escorar a(s) Utopia(s). Para entender o argumento é necessário destacar dois dos fundamentos do seu raciocínio que já foram apresentados: i) as pessoas são extremamente complexas e diferentes; ii) no fim das contas, a despeito dos inúmeros vínculos sociais, os indivíduos possuem existências separadas. Logo, dificilmente a utopia de um será aceita como o melhor mundo possível por todos os demais homens vivos e por nascer. Tendo isto em mente, Nozik lança um irônico desafio aos planejadores sociais:
Wittgenstein, Elizabeth Taylor, Bertrand Russell, Thomas Merton, Yogi Berra, Allen Ginsburg, Harry Wolfson, Thoreau, Casey Stengel, Lubavitcher Rebbe, Picasso, Moses, Einstein, Hugh Heffner, Socrates, Henry Ford, Lenny Bruce, Baba Ram Dass, Gandhi, Sir Edmund Hillary, Raymond Lubitz, Buda, Frank Sinatra, Colombo, Freud, Norman Mailer, Ayn Rand, Barão Rothschild, Ted Williams, Thomas Edison, H. L. Mencken, Thomas Jefferson, Ralph Ellison, Bobby Fischer, Emma Goldman, Peter Kropotkin, você e seus parentes. Existe realmente um tipo de vida que é o melhor para toda essa gente? (p. 310). Portanto, cada um – e cada grupo/comunidade voluntária – pode e deve ter a sua própria utopia. Mas como? Aí entra a defesa do estado-mínimo como suporte das variadas utopias que cada grupo formaria de acordo com os seus entendimentos mútuos e voluntários. Nozik entende que toda e qualquer função estatal adicional à garantia da segurança restringe alguns modos de vida. Para garantir o que alguém ou alguns – o arquiteto ou os implementadores da utopia
O ponto é que, dada a diversidade dos indivíduos não há – e nem poderia haver – apenas uma utopia, mas “(…) utopias, compostas por várias
Robert Nozik em Anarquia, Estado e Utopia : argumentos centrais
comunidades diferentes e divergentes nas quais as pessoas levariam tipos distintos de vidas sob instituições diferentes” (p. 312). Logo, o Estado mínimo é a estrutura (framework) que possibilita diversas configurações sociais que, exatamente por ter um sustentáculo tão minimalista, estão sujeitas às pressões dos processos evolucionários e, portanto, são em grande medida imprevisíveis^2_._ Os problemas só podem ser resolvidos na medida em que forem aparecendo na prática e, portanto, seria ocioso – e terrível, do ponto de vista da liberdade – tentar encontrar uma solução teórica capaz de desenhar um tipo de sociedade perfeita, onde todos pudessem viver de acordo com seus próprios critérios. O pensamento utópico “convencional” imagina sociedades hipotéticas perfeitas, mas que só poderiam operar de forma totalitária. Mas, no fundo, além disto, para Nozik o grande problema do pensamento utópico é que ele tende a idealizar e descrever comunidades particulares (e, exatamente nisto, o utopista revela toda a sua idiossincrasia) ao invés de tentar destacar a estrutura que geraria a(s) condição(ões) de possibilidade das utopias a serem concretizadas na prática, por homens sedentos pela liberdade. É isso que, no livro, ele se propôs a fazer.
Logo, além de legítimo, o Estado mínimo é “inspirador”, pois é o único que pode maximizar a liberdade em criar um mundo heterogêneo e essencialmente dinâmico que, dada a sua grande abertura, assistiria ao declínio e o florescimento de grandes comunidades que poderiam viver isoladas ou se interligar das mais variadas formas. Este mundo multiforme, por ser aberto à livre movimentação^3 , todos poderiam descobrir ou criar um lugar onde poderiam viver de acordo com o seu próprio entendimento do que consiste na boa vida e que, essencialmente, ninguém seria capaz de impor sobre os demais a sua própria visão da utopia.
(2) Esta tendência evolucionária já está nitidamente presente em Anarchy, State and Utopia. Mas Nozik acentua esta tendência em Philosohical Explanations (1981) e, sobretudo em Invariances (2001), seu último livro. (3) Na verdade, a saída ou entrada de novos membros pode estar sujeita a condicionalidades, definidas de acordo com as características de cada comunidade. Nozik chega a sinalizar que a probabilidade maior é que as comunidades tenham algumas regras com relação a admissão, saída e até a expulsão de membros. Mas discutir isto só faz sentido frente a casos concretos. O fato é que, em todos os casos, as comunidades só durariam enquanto fossem capazes de persuadir os seus membros a nelas permanecerem. Uma utopia regulada pelo princípio da concorrência...
Robert Nozik em Anarquia, Estado e Utopia : argumentos centrais
limites sobre as opções disponíveis para alguém, a situação é similar às limitações naturais, desde que as ações que resultaram na limitação tenham sido legítimas (cf. p. 262- 26 3).
Mas, no limite, se alguém passa fome sem ter sido vítima de fraude ou de roubo, do ponto de vista do Estado e de suas instituições, nada deveria ser feito. Porém, de uma perspectiva moral, devemos esperar a caridade e ações humanitária, desde que, como já foi adiantado, sejam medidas realmente voluntárias. O ponto é que, de acordo com Nozik, se insistirmos em direitos positivos à renda, educação e saúde, além de invadirmos necessariamente a liberdade e as posses dos demais, estamos na prática criando uma cultura de dependência que deixa as pessoas mais descuidadas e impede que elas encontrem soluções próprias para seus problemas. Isto é: estas medidas não somente reduzem a liberdade e interferem ilegitimamente sobre as posses dos demais, como reduz a liberdade de quem recebe a assistência. Um belo sofisma!
Um segundo aspecto por ele destacado – e bastante controverso – é que o assistencialismo do Estado tende a suplantar as formas voluntárias e privadas de caridade. Os ricos costumam gastar muito dinheiro e parte considerável do seu tempo com um arco amplo de ações filantrópicas. O fato é que, muitas vezes, elas não são realmente filantrópicas, mas estratégias para lavar dinheiro ou fugir do fisco. Mas, deixando isto de lado, e levando em conta apenas a filantropia genuína, Nozik apresenta mais um argumento contrafactual: se o Estado deixasse de ofertar a assistência, a redução da carga fiscal provavelmente encorajaria a multiplicação da filantropia de caráter privado, desde pequenos atos até a criação de grandes organizações, como ocorrera no século XIX^5. Por fim, a própria iniciativa privada oferta um conjunto variado e significativo de seguros e cooperativas que se ramificam em diversos campos, como a saúde (planos médicos, odontológicos, etc.), proteção ao patrimônio e previdência privada. As pessoas recorrem a esses seguros mesmo contribuindo forçosamente para o Estado. Se este peso fiscal – que é, muitas vezes,
(5) E daí emerge um debate capcioso. O Welfare State passou a limitar este tipo de filantropia ou, pelo contrário, a sua emergência é a prova de que estas formas são insuficientes e muito seletivas? Pelo menos na retórica, as políticas públicas do estado de bem-estar são universalistas.
Eduardo Mariutti
redundante – fosse eliminado, mais soluções privadas apareceriam e a eficácia geral dos serviços tenderia a aumentar.
2.2 Emergência do Estado
Nozik não define com muita clareza o que entende por Estado. Mas é possível destacar dois traços que são essenciais à sua perspectiva: i) para poder ser qualificado deste modo, o Estado deve possuir o monopólio (legítimo?) do uso da força em uma “determinada área geográfica” e ii) o Estado – ao contrário das agências de proteção privadas que poderiam surgir no “estado de natureza”
Escrevendo para tentar convencer sobretudo os anarquistas, Nozik argumenta que, frente ao problema de segurança, vivendo no Estado de natureza e na busca de seus interesses, as ações dos indivíduos tendem a espontaneamente resultar no Estado ultra-mínimo, isto é, uma agência (ou um conjunto ramificado de agências) que garante o monopólio sobre a autorização do uso da força em sua jurisdição. Pessoas ao estilo John Wayne (o exemplo é dele) poderiam insistir na autodefesa, mas teriam de aceitar algumas condicionalidades ou, no limite, serem compensados pela proibição de se defender privadamente. E precisamente neste ponto surge o limiar para o próximo estágio, isto é, o Estado Mínimo (que, para ele, ao contrário da forma anterior, já é um Estado de fato (e a sua melhor forma)), que tem como característica básica a capacidade de coibir a autodefesa privada em seu território, oferecendo em compensação^6 a proteção a todos. Daí decorre o papel de administrar a justiça e garantir o cumprimento dos acordos.
Não precisamos acompanhar Nozik em seus exercícios contrafactuais e na retórica que deles emana. O ponto básico que ele tenta mostrar é que, mesmo sem nenhuma intenção ou desígnio, o Estado mínimo tende a se formar, em grande medida por ser a forma mais eficiente de se lidar com o problema da proteção contra a violência entre os indivíduos sem afrontar os direitos
(6) Ele escolheu essa palavra com cuidado: não se trata de um princípio redistributivo – o que entraria em choque com seus pressupostos – mas sim uma compensação para a renúncia da defesa privada que, no limite, não viola a dignidade e a liberdade individual.