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Análise do Significado Linguístico: Níveis, Contradições, Confusão Categorial e Hiponímia, Manuais, Projetos, Pesquisas de Linguística

Este documento aborda o estudo do significado linguístico, dividido em dois níveis: o nível da combinação de fonemas para formar palavras e morfemas, e o nível da combinação de morfemas para formar sentenças. Além disso, discute conceitos como contradição lógica, confusão categorial, hiponímia, significado associativo e lexical, e as regras de seleção, combinação e sentido global (pragmático).

Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas

Antes de 2010

Compartilhado em 29/10/2022

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(…)? Aqui se faz necessária uma breve indicação de distinções
lingüísticas. O conceito de forma está claramente conectado com o de
estrutura. Nossas expressões lingüísticas são estruturalmente
compostas em dois níveis, (a) o nível da combinação de fonemas para
formar as menores unidades portadoras de significado palavras e
morfemas e (b) o da combinação de morfemas para formar sentenças. “Composição
estrutural” quer dizer que a composição é dirigida por regras: as menores unidades não
podem ser arbitrariamente combinadas com outras, mas sim apenas enquanto são
elementos de certas classes. No âmbito de combinação de unidades portadoras de
significado para formar sentenças, existem dois modos possíves de análise: de um lado, o
sintático, que investiga a composição exterior ou “da superfície” das sentenças, em não
toma em consideração nem o significado das sentenças nem o das partes das sentenças.
Com isto, as classes de componentes de sentença não são definidas semanticamente; ao
contrário, elas são determinadas exclusivamente a partir do chamado princípio de
“distribuição”, isto é, a substituibilidade de seus elementos por outros, sendo que a única
condição para isso é que o resultado deve ser também uma sentença. Em contrapartida,
chama-se semânticaqualquer modo de análise quew diz respeito ao significado das
expressões lingüísticas. Trata-se aqui, ou do significado de vocábulos individuais, ou de
como o significado das sentenças depende do significado de suas partes. Ernst
Tugendhat (1930-2019 vivo).
(…) existe uma possibilidade inexplorada de genuína semântica além dos
limites da linguagem discursiva.
Tanto Russell como Carnap encaram esse “além” lógico, que
Wittgenstein chama de “indizível”, como a esfera de experiência,
emoção, sentir e desejo subjetivos, do qual chegam a nós apenas
sintomas, na forma de fantasias metafísicas e artísticas. Eles relegam o
estudo de tais produtos à psicologia e não à semântica. E aí reside o ponto de minha
divergência radical com eles. (…). Sem dúvida, a poeisa significa mais do que uma
exclamação; há razão para que seja articulada; e a metafísica é mais do que a cantiga com
a qual poderíamos aconchegar ao mundo em atitude confortável. Estamos lidando aqui,
e o que expressam é, com freqüência, altamente intelectual. Apenas, a forma e função de
tais simbolismos não são aquelas investigadas por lógicos, sob o cabeçalho de
“linguagem”. O campo da semântica é mais amplo do que a da linguagem, como certos
filósofos Schopenhauer, Cassirer, Delacroix, Dewey, Whitehead e alguns outros
descobriram; mas está bloqueado ára nós pelos dois dogmas fundamentais da
epistemologia atual, que acabamos de discutir. Suzanne Langer (1895-1986).
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(…)? Aqui se faz necessária uma breve indicação de distinções lingüísticas. O conceito de forma está claramente conectado com o de estrutura. Nossas expressões lingüísticas são estruturalmente compostas em dois níveis, (a) o nível da combinação de fonemas para formar as menores unidades portadoras de significado – palavras e morfemas – e (b) o da combinação de morfemas para formar sentenças. “Composição estrutural” quer dizer que a composição é dirigida por regras: as menores unidades não podem ser arbitrariamente combinadas com outras, mas sim apenas enquanto são elementos de certas classes. No âmbito de combinação de unidades portadoras de significado para formar sentenças, existem dois modos possíves de análise: de um lado, o sintático , que investiga a composição exterior ou “da superfície” das sentenças, em não toma em consideração nem o significado das sentenças nem o das partes das sentenças. Com isto, as classes de componentes de sentença não são definidas semanticamente; ao contrário, elas são determinadas exclusivamente a partir do chamado princípio de “distribuição”, isto é, a substituibilidade de seus elementos por outros, sendo que a única condição para isso é que o resultado deve ser também uma sentença. Em contrapartida, chama-se “ semântica ” qualquer modo de análise quew diz respeito ao significado das expressões lingüísticas. Trata-se aqui, ou do significado de vocábulos individuais, ou de como o significado das sentenças depende do significado de suas partes. Ernst Tugendhat (1 930 - 2019 vivo).

(…) existe uma possibilidade inexplorada de genuína semântica além dos limites da linguagem discursiva. Tanto Russell como Carnap encaram esse “além” lógico, que Wittgenstein chama de “indizível”, como a esfera de experiência, emoção, sentir e desejo subjetivos, do qual chegam a nós apenas sintomas , na forma de fantasias metafísicas e artísticas. Eles relegam o estudo de tais produtos à psicologia e não à semântica. E aí reside o ponto de minha divergência radical com eles. (…). Sem dúvida, a poeisa significa mais do que uma exclamação; há razão para que seja articulada; e a metafísica é mais do que a cantiga com a qual poderíamos aconchegar ao mundo em atitude confortável. Estamos lidando aqui, e o que expressam é, com freqüência, altamente intelectual. Apenas, a forma e função de tais simbolismos não são aquelas investigadas por lógicos, sob o cabeçalho de “linguagem”. O campo da semântica é mais amplo do que a da linguagem, como certos filósofos – Schopenhauer, Cassirer, Delacroix, Dewey, Whitehead e alguns outros – descobriram; mas está bloqueado ára nós pelos dois dogmas fundamentais da epistemologia atual, que acabamos de discutir. Suzanne Langer (1895-1986).

Ele promete, e tem, de fato, a intenção de vir, mas depois muda de idéia e não vem. Ora, isso é um abuso, pois ele levantou certas expectativas em relação a seu comportamento sem chegar a cumpri- las. Portanto, é uma inconseqüência. (…) não nos podemos limitar simplesmente à proposição, quando queremos explicar o que não está certo, mas devemos levar em consideração “toda a situação” na qual a expressão lingüística ocorre. John L. Austin (1911- 1960 ).

Nas linguagens melanésias existem certos instrumentos gramaticais, usados na flexão de verbos, que expressam, um tanto vagamente, as relações de tempo, definição e seqüência. (…). Na linguagem trobriandesa, por exemplo, existe uma partícula adverbial, boge , que, colocada antes de um verbo modificado, dá-lhe o significado, de maneira um tanto vaga, ou de um acontecimento pretérito ou de um definido. (…). Assim, a raiz ma (venha, caminhe para cá), se usada com o pronome prefixado da terceira pessoa do singular i , tema forma ima e significa (aproximadamente) ele vem. Com o pronome modificado ay – ou mais enfaticamente, lay – significa ele veio. A expressão boge ayna ou boge layma pode ser aproximadamente traduzida por ele já veio , tornando-a o particípio boge mais definida. (…). Nas gramáticas e interpretações das linguagens melanésias, quase todas escritas por missionários para fins práticos, as modificações gramaticais de verbos foram simplesmente determinadas como equivalentes dos tempos verbais indo- europeus. Quando comecei usando a linguagem trobriandesa no meu trabalho de campo, ignorava completamente que pudesse haver algumas ciladas em adotar a gramática nativa pelo seu valor aparente e segui a prática missionária de usar a inflexão nativa. Contudo, aprenderia cedo que isso não era correto e aprendi-o mediante um erro prático (…). Certa vez, (…) estava registrando e fotografando as atividades que se desenrolavam entre as choupanas quando comelou circulando a notícia, “eles já chegaram” – boge laymayse. Larguei meu trabalho na aldeia, (…) e corri uns quatrocentos metros até a praia para ver, para minha mortificação e desapontamento, as canoas ainda distantes, aproando vagarosamente rumo à praia! (…). Foi preciso algum tempo e uma apreensão geral muito melhor da linguagem para que, finalmente, compreendesse a natureza do meu erro e o uso apropriado de

II – APÊNDICE 

Princípios de investigação da Semântica

Hiponímia / Pressuposição-Implicatura / Valor / Componentes Semânticos / Campos / Frases Idiomáticas = Fusão. / Generalização e Restrição: Semântica. Significados e Precisão: Semântica e Pragmática.

A palavra desempenha um papel de tal modo decisivo na estrutura da língua que necessitamos de um ramo especial da lingüística para examinar em todos os seus aspectos. Chama-se a este ramo de lexicologia^379 , e constitui, a seguir da Fonologia, a segunda divisão básica da ciência da lingüística. A Lexicologia não tratará apenas das palavras, mas também de todos os tipos de morfemas que entram em sua composição. (ULMANN, 1973: 62).

Assim, como é mais coerente – didaticamente falando – iniciarmos uma análise dos menores constituintes (denominados elementos no Estruturalismo) para galgarmos os maiores^380 , então:

A Lexicologia, por definição, trata de palavras e dos morfemas que as formam, isto é, de unidades significativas. Conclui-se, portanto, que estes elementos devem ser investigados tanto na sua forma como no seu significado. A Lexicologia terá, por conseguinte, duas subdivisões: a morfologia, estudo das formas das palavras e dos seus componentes, e a semântica, estudo dos seus significados. (...). A lexicologia não deve ser confundida com a Lexicografia, ou seja, a elaboração ou compilação de dicionários, que é uma técnica especial, mais do que um ramo da lingüística. (ULMANN, 1973: 64).

(^379) Do grego lexis , léxicos . (^380) Parafraseando Augusto Comte: Do mais simples para o mais complexo...

1 – Hiponímia

(...) levar-nos à noção de INCLUSÃO no sentido em que tulipa e rosa estão incluídas em flor, e leão e elefante em mamífero , (ou talvez animal). (...) A inclusão tem portanto a ver com a inserção numa determinada classe. (PALMER, 1979: 91).

Para que haja esta relação hiponímia, faz-se mister algumas condições necessárias: os termos inclusos devem pertencer à mesma classificação; e, o critério da classificação é aquilo que têm em comum, tornando assim a multiplicidade organizada (conjuntivamente) numa unidade. A unidade é conjunto assim como a multiplicidade é subconjunto daquela. Se tulipa e rosa são casos de flor , então tulipa e rosa pertencem ou estão contidos – agrupados – num conjunto maior que lhes é característico: se por um lado, tulipa e rosa sejam reconhecidos, discriminados ou diferenciados em sua singularidade; por outro, são identificadas, unificadas por sua particularidade: ambas são espécies dum gênero a que se submetem a serem classificadas. Por que classificamos? Para organizar os dados sensíveis de modo em que gêneros e espécies estejam hierarquizados em formas conjuntivas que pressupõem ou implicam relações hiponímicas: conjuntos/subconjuntos. O trâmite da Lógica^381 das combinações dependem desse extrato lingüístico, pois o pensamento (movimento) está subordinado aos elementos da língua ou tipo de linguagem (formato e conteúdo). Em suma, a relação hiponímica é uma relação de dependência lógica entre subordinados e sobre-ordenadores. Detalhe, como categoria de relação, o que é gênero numa relação com seus elementos agrupados será espécie para um conjunto ou classe maior de que faz parte. Por exemplo: se ‘flor’ é gênero de suas espécies ‘tulipa’ e ‘rosa’, por sua vez, ‘flor’ é espécie ou aspecto de vegetal. Flor, folha, caule, frutos e raiz são hipônimos de vegetal, uma vez que vegetal é um

(^381) Tanto a Lógica Formal ( Silogismos ) como a Lógica Transcendental ( Categorias ) são amplamente estudadas por Edmund Husserl e Nicolai Hartmann, desenvolvendo a tradição Kantiana. Ambos estudos lógicos dependem-se mutuamente, pois são momentos constituintes do processo maior de compreensão: identificação, dedução, conclusão, comparação, diferenciação etc.

contingente (duas flores serem belas) como algo necessário estendido ao seu gênero (as flores são belas). Se no primeiro momento temos uma contradição lógica – de caráter predominantemente sintagmático – ; no segundo momento temos uma confusão categorial (a tomada de um pelo outro), sendo tal fenômeno um desdobramento semântico da noção necessário/contingente – de caráter predominantemente paradigmático III^382 –. Para sintetizar o conteúdo citarei Luciano Amaral Oliveira:

Lyons (1996) lembra, ainda, que os lexemas de um campo lexical estabelecem um outro tipo importante de relação: a hiponímia , que é a relação hierárquica existente entre o significado de um termo específico e o significado do termo mais genérico de um campo. Pode-se dar o exemplo de futebol e natação em relação a esporte , ou ainda rosa e tulipa em relação a flor. Observe-se que, nessa relação, há uma implicação unilateral: natação implica esporte, mas exporte não implica natação. Dessa forma, futebol e natação são ambos hipônimos de esporte e, portanto, co- hipônimos em relação um ao outro. (...). Para se referirem à relação entre esporte e os lexemas futebol e natação, alguns lingüistas usam o termo hiperonímia, mas Lyons prefere o termo superordenação, já que hiperonímia e hiponímia são muito parecidos. Dessa forma, esporte é o hiperônimo de futebol e natação. (OLIVEIRA, 2008: 82-83).

2 – Pressuposição

(...) Podemos fazer contrastar É significativo que o João chegasse cedo com É provável que o João chegasse cedo e, da mesma maneira, Lamento que ela o dissesse com Suponho que ela o dissesse. Na primeira frase de cada par a afirmação contida na oração subordinada é pressuposta (...); na segunda não é.

(^382) Chamo de Paradigma I , o mesmo significado atribuído por Sausurre: um campo de seleção de palavras (por verossimilhança por exemplo). Denomino Paradigma II , uma operação de sentido que permite associar um significado ao significante. Batizo de Paradigma III , a uma operação de sentido mais abstrato, que incide sobre categorias mais amplas que os gêneros: essencial/acidental; necessário/contingente; causa/efeito etc. Um desvio do primeiro aspecto do eixo paradigmático é uma contradição de seleção conjuntivo- classificatória, é um caso a Elipse; um desvio do segundo aspecto do eixo paradigmático é uma contradição semântica (a que denomino de destituição semântica); e, por fim, um desvio do terceiro aspecto do eixo paradigmático é um erro categorial. Este último termo é explicado por MARILENA CHAUÍ e GILBERT RYLE.

(...) aquilo que é pressuposto pode ser identificado pelo facto de as pressuposições não serem afectadas pela negativa, isto é, logicamente implícitas tanto na frase afirmativa como na negativa correspondente. Assim, (...) não lamento que ela o dissesse continua a implicar que ela o disse. Assim, a pressuposição é aquilo que está implícito numa frase positiva e na negativa correspondente. (PALMER, 1979: 167).

Interessantemente, se na hiponímia, a relação está no âmbito das palavras (lexical); a pressuposição, por sua vez, encontra-se no âmbito frasal (oracional). Outro detalhe: na pressuposição temos uma condição, ou seja, uma oração subordinada. Afirmar “cortei o cabelo” pressupõe que tenho cabelo, ou melhor, que pelo menos antes de cortar tive. Afirmar “continuo ou não continuo a comer”, pressupõe que é verdadeiro que comi antes de ou continuar ou parar. Vejamos outros exemplos:

(...) O João casou / não casou com a irmã de Fred implica que Fred tinha uma irmã; (...) Ele bebeu / não bebeu outro copo de cerveja implica que ele já tinha bebido pelo menos um copo. (...). O João estava / não estava preocupado com a infidelidade da mulher sugere-se que o que é pressuposto é que a mulher do João era infiel. Mas em relação à negativa isso não é necessariamente verdade, podendo a frase negativa significar ou que ela era infiel mas ele não se preocupava com isso, ou que ele não se preocupava porque ela não era fiel. Por outras palavras, a negativa pode negar aquilo que se alega ser ao mesmo tempo pressuposição e asserção, e nesse caso o teste pela negativa tem de falhar. (PALMER, 1979: 167 e 168).

Ao examinarmos o critério do teste negativo, no último caso apontado por PALMER, a oração somente não pode ser interpretada na negativa também como uma pressuposição porque a construção sintática é ambígua: permitindo duas interpretações quanto ao que João não se preocupava: ou com a presença da infidelidade da mulher ou com a possibilidade da infidelidade da mesma. Em português, o verbo preocupar, na negativa, não infere a presença ou a possibilidade de algo, pois deixa em aberto os dois sentidos. Já quando afirmamos: João não se preocupava com a atitude infiel da mulher temos pressuposição tanto na afirmativa como na negativa, pois “a atitude infiel” é uma expressão que denota a atualidade do ser infiel, não deixando margem para uma possibilidade ou hipótese. Obs.: veremos em Karl Manheimm a aplicação deste estudo quando ele comentar sobre análise dos pressupostos das ideias de grupos!

= conjuntos/subconjuntos – mas como especificamente sentencial, afirmando o passado pelo tempo verbal empregado como extensão do mesmo ato. Então, (29) não é hipônima de (28), pois falta-lhes a classificação – apesar de serem implicativas – mas (28) acarreta (29) por condições morfológicas (no caso aqui é o verbo em seu aspecto temporal) de modo a derivar outra sentença como condição necessária de (29) = (28). Voltemos à explicação das autoras^383 :

Entretanto, enquanto a relação de hiponímia é uma relação que pode se estabelecer também entre sentidos, acarretamento é uma relação que se estabelece exclusivamente entre referências. Define-se formalmente a noção de acarretamento, fazendo-se uso do conceito de verdade, que é a referência de uma sentença. Uma sentença acarreta uma outra sentença se a verdade a primeira garante, necessariamente, a verdade da segunda, e a falsidade da primeira garante, necessariamente, a falsidade da segunda. (FIORIN Vol. II, 2007: 145).

Segunda a definição das autoras, se na hiponímia temos relações de sentido, no acarretamento temos relações correspondentes entre discurso e realidade externa (referência). Uma sentença acarreta outra na condição de implicar um acontecimento antecedente para a atual sentença (tida como conseqüente).

Ducrot (1972) fala de três tipos de implícitos. O primeiro tipo é aquele baseado no enunciado, o qual deixa “não-expressa uma afirmação necessária para a completude ou para a concorrência do enunciado, afirmação à qual a sua própria ausência confere uma presença de um tipo particular: a proposição implícita é assinalada – e apenas assinalada – por uma lacuna no encadeamento das proposições explícitas”. Um exemplo (...): “Zé ta muito educado e solícito, logo ele ta querendo pedir alguma coisa”. Nesse exemplo, fica implícito que Zé não costuma ser educado nem solícito a não ser quando quer pedir alguma coisa. (OLIVEIRA, 2008: 131-132).

Por uma questão de hábito verbal, habituamo-nos a comentar a irregularidade das pessoas quando contrastamos com a regularidade delas. Partimos da premissa (critério para aplicarmos um significado, intenção) que quando alguém quebra uma regularidade; ou seja, quando alguém varia algo que

(^383) São elas: Ana Lúcia de Paula Müller e Evani de Carvalho Viotti. Elas escreveram o texto do capítulo sobre Semântica Formal.

não é de seu feitio, inclinamo-nos a afirmar: há algum interesse diferenciado para que haja uma ação diferenciada. É um modo analógico de pensar: “Conduta regular, intenção costumeira; conduta irregular, intenção ou motivo diferente do habitual”. Um comportamento costumeiro deve estar motivado para tal, pois todo ato humano é motivado. Uma atitude incomum requer por analogia à sua motivação um desejo ou meta também incomum. Interpretamos atos por uma questão de freqüência: conduta usual , motivo relacionado ao temperamento próprio da pessoa; conduta inusitada , motivo interpretado como um intento (um meio) para atingir um objetivo (finalidade). O meio de que nos servimos para atingir a finalidade almejada é calculada ou avaliada mediante ao contexto interno do motivo perante o ato incomum: “quem age para agradar (mais do que de costume) pretende pedir algo: um favor”. Este estudo que proponho adicionado às citações de S. Freud sobre apraxia e de K. Manheimm sobre função dos pensamentos e práticas por implicação envolve uma interdisciplinaridade entre tais autores e o Ato Ilocutório de J. L. Austin: meu contributo é explicitar por quais critérios predicamos a intencionalidade do agente informacional = Teleologia. Tal resultado da interpretação já não seria possível caso a pessoa em questão tivesse o hábito de ser assim – independentemente do resultado; ou mesmo se a pessoa estivesse habituada a agir assim quando recebesse um favor: aí o motivo da ação seria para retribuir o favor feito. Contudo, para alguém que com freqüência age querendo ajudar somente na condição de “pedir algo em troca” fica estigmatizado como interesseiro, ou seja, alguém incapaz de dar algo por gratuidade (no sentido de estar satisfeito por dar). Aqui está um exemplo de ação instrumental (que faz das pessoas como meios: uma ação extrinsecamente motivada ) da ação social (que age para atingir a pessoa, uma ação intrinsecamente motivado ).

O segundo tipo de implícito é o baseado na enunciação, o chamado subentendido do discurso, que não está no conteúdo do enunciado, como no caso anterior. Um exemplo encontra-se na seguinte situação: uma mulher diz ao seu marido “O dia está lindo”, num dia de sábado, no terceiro ano de um casamento que caiu numa rotina que os levou a ficar sempre em casa nos fins de semana assistindo a algum programa de auditório na TV. O que está subentendido no enunciado é um pedido da mulher para que ela e o marido saiam de casa para fazer algo divertido. Contudo, é importante ressaltar que esse implícito não se encontra no enunciado. Ele se deriva do próprio ato de enunciação a partir de quem diz o que para quem e em que circunstâncias. Por isso,

presença de dois elementos: o posto e o pressuposto. (...) No enunciado “O Brasil não está mais na Copa do Mundo”, o pressuposto é o Brasil esteve na Copa do mundo e o posto é “o Brasil não está na Copa do Mundo”. (...). Vogt lembra que “o posto constitui a significação explícita do enunciado e o pressuposto, a sua significação implícita”. (OLIVEIRA, 2008: 132).

Vimos as duas espécies de implicitações como fatores de inferência intencional. No primeiro caso relevamos o histórico da pessoa em comparação com a conduta atual e inferimos seu propósito pelo contraste de comportamento e pelas conseqüências plausíveis de se agir assim. No segundo caso relevamos os fatores de estados interno da segunda pessoa e o estado externo em que a primeira e segunda pessoa se encontram; para, a partir daí, analisarmos o discurso da primeira pessoa: a conclusão será uma inferência da motivação, da sugestão a que a pessoa se utiliza. Temos aqui um eufemismo^385. Outro critério para também diferenciarmos o primeiro e o segundo tipo de implicitação está aqui: no primeiro caso temos algo necessário, porém de não tão fácil inferência como o terceiro caso. Uma ação para ser modificada carregará em seu bojo a vontade específica que a engendra, escolhe e atua. No segundo caso temos algo hipotético – ainda que plausível e que não deriva dos códigos empregados: a mensagem subliminar ou subentendida não decorre da frase emitida, mas do enunciado enquanto considerações pragmáticas (com quem em qual estado e em qual circunstância). Se na primeira é necessário, na segunda só será quando as condições dos dois fatores já mencionados estiverem combinados com a frase emitida, tornando-a uma enunciação. Neste terceiro e último caso, também é necessário (como no primeiro), porém, é uma relação lógica entre tempos verbais: antecedente-conseqüente duma ação. Se nos outros foi inferência intencional, neste é uma necessidade lógica entre eventos ou ações. A pressuposição guarda relações similares com a primeira implicitação, pois ambas são comparações temporais: a primeira por comparação do contraste; a terceira por reconhecimento da sucessão de ocorrências. À primeira, motivações correspondentes a diferentes ações; à terceira, reprodução

(^385) Figura de linguagem a revelar uma maneira dócil de nos reportarmos a alguém: geralmente empregado para diminuir o impacto duma emoção já esperada por parte da segunda pessoa (para quem se fala).

implicativa entre antecessor-sucessor, sendo a dependência necessária do sucessor em relação ao antecessor.

4 - Implicaturas

As implicitações ou tecnicamente mais conhecido como implicaturas são discriminadas ou classificadas em duas: implicatura convencional e implicatura conversacional. Comentarei apenas sobre a implicatura convencional, pois para fins relacionados à interpretação intencional apenas esta auxiliar-nos-á a aprofundarmos um pouco os recursos expressivos empregados pelos agentes comunicativos.

(...) Um dos raros exemplos de Grice diz respeito à implicatura que resulta do uso de “mas” em vez de “e” em uma frase como “O João é dirigente desportivo, mas é honesto” – que tem não só o significado explícito de que o João é um dirigente desportivo, mas também o implícito (por implicatura convencional), de que a combinação dessas duas características em uma mesma pessoa é inesperada. Uma vez que a versão “mas” induz a implicatura e a versão “e” (“o João é dirigente desportivo e honesto”) não induz, então, dado que ambas têm exatamente as mesmas CONDIÇÕES DE VERDADE , conclui-se que as implicaturas convencionais não derivam das condições de verdade da frase que as induzem e, logo, que não são identificáveis com IMPLICAÇÕES. (MURCHO, GOMES e BRANQUINHO Org. ANTÔNIO HORTA BRANCO e PEDRO SANTOS, 2006: 398 e 399).

Comparando este exemplo com o primeiro tipo de implicitação temos similaridades. Aqui temos um conectivo entre as orações coordenadas “mas”^386. É tal conectivo que permite – a despeito de qualquer conteúdo veiculado – significarmos o que o falante pensa ou imagina sobre a classe de desportistas. No primeiro tipo de implicitação temos um conjunto de operações dedutivas que conferem à pessoa pelo qual estamos interpretando. Porém, aqui no caso de “João”, é o locutor que deixa implícito que ele (o locutor) qualifica de maneira geral João por ser um dirigente desportista. Se no primeiro tipo de implicitação

(^386) Advérbio de intensidade. Outros exemplos: todavia, porém, contudo e entretanto.

Vejamos o conceito de valor e sistema, pois eles são antecedentes cronomicamente em relação à formação daquilo que se convencionou chamar: teoria dos campos. A noção de CAMPO também aparece na escola psicológica denominada de Gestalt^387. Esta noção será deduzida da atividade de atribuir significado (significação) e das associações ou os critérios pelos quais elas se dão. Discorrerei na seguinte seqüência os temas: valor, sistema, associações de campo e, finalmente, campos semânticos. Este último será valiosíssimo como técnica ou método de explicitação do significado através de determinadas operações associativas para, depois, abrir campo de investigação na e para a Pragmática.

5. Valor/Sistema/Associações

Como atribuímos um significado a um símbolo? É através de específicas associações. Tais ocorrem numa relação estímulo-resposta. O significante é um estímulo para a associação ou vinculação entre este e um significado “qualquer”. Mas como um significado vincula-se a um significante? É necessário um histórico, ou seja, um outro evento (percepção sensorial ou evento interno) pareado com o significante. Parear significa ou simultaneamente ou em sucessão em relação ao significante. O termo ‘árvore’ só suscitará a imagem ou conceito de árvore após um pareamento entre o significante árvore (geralmente, primeiro pela fala, e depois pela escrita) e a percepção sensorial da árvore. Qualquer relação duma espécie de árvore com nossa família ou parentes; ou seja, qualquer vínculo afetivo resultante dum contato com uma árvore em específico será conteúdo para ser significado na presença da palavra ‘árvore’ + o tipo de árvore. Após ouvirmos tal fala, por retro-cognição associaremos o conteúdo afetivo à noção de árvore que estamos acostumados a um contato direto.

(^387) Ou Psicologia da Forma (Configuração). Dos principais autores iniciadores temos: Christian E HRENFELS e Max W ERTHEIMER. Um pouco depois dele – e ainda contemporâneos a ele – temos: Paul G UILLAUME (francês), Kurt K OFFKA (estadunidense) e Wolfgang K ÖHLER (russo, radicado na Alemanha). Eles e Edmund Husserl sofreram influência recíproca, que por sua vez foram estudados e divulgados na França por Maurice Merleau-Ponty: numa aproximação entre: Fenomenologia, Gestalt e Psicanálise. Outro autor de destaque foi o Psicólogo Kurt Lewin que estabeleceu uma Teoria dos Campos, aplicável à Psicologia Social.

Se observarmos diversas árvores e estudarmos seus elementos, relações entre as partes e funções desempenhadas = sistema, expandiremos o conceito de ‘árvore’. Tanto os aspectos sensoriais, como os afetivos e os cognitivos sintetizaremos no significante ‘árvore’. Embora haja quase total assentimento de que qualquer árvore em nossa frente será nominada de ‘árvore’, haverá diferenças apreciativo-semânticas: tanto quanto ao conteúdo afetivo (conotação) como ao conteúdo cognitivo (denotação). Bem, para alguém com grande variedade de contato com árvores poderá haver diferença também na denominação se o que vejo ou é ou não é uma árvore. Quanto maior o número de contato com as espécies, mais elementos teremos para distinguir, para atingir aquilo que há de comum a todas as árvores. Tanto as espécies dependem da classificação para serem reconhecidas e comparadas, como o gênero depende da variedade das espécies para ser conceituado de modo preciso. Filosoficamente, atingir o que tem de essencial num objeto é considerarmos aquilo que se repete, aquilo que há de comum em todas as variedades ou tipos de árvores (em contraposição ao que cada uma tem de acidental, variável).

(...) Todo o pensamento , toda a referência, foi sustentado, é uma adaptação de vida aos contextos psicológicos que interligam os elementos em contextos externos. Por mais “universal” ou mais “abstrato” que seja a nossa adaptação, a explicação geral do que está acontecendo é a mesma. Desta maneira, chegamos a um sentido claro e definido de “significado”. De acordo com isto, o significado de A é aquilo que o processo mental interpretando A esta adaptado. É este o mais importante sentido em que as palavras têm significado. (OGDEN-RICHARDS, 1972: 206).

Há noções que sofrem gradação como aspectos sensoriais e afetivos como: intensidade duma cor e afetos como: carinho, desejo, ternura, meiguice, paixão etc. Fiquemos por enquanto nas cores: laranja, rosa, vermelho, magenta e vinho diferem entre si por saturação. Como assim? Saturação é a quantidade que uma cor está misturada a outra. Amarelo com um pouco de vermelho resulta na cor denominada ‘laranja’. A diferença cromática entre intensidade do matiz laranja será apreciada com grau comparativo: laranja fraco, médio e forte, por exemplo. O mesmo ocorrerá com rosa: é uma mistura de branco com vermelho, e para ser

exato momento ouvirmos alguém proferir – duma determinada maneira – “Gosto da pessoa X”. Nessa comparação entre outras pessoas e a pessoa singular que nos fala, inferiremos uma certa qualidade, um certo modo de ser, um certo grau de intensidade para este ‘gostar’. Tanto o caso formativo (1º caso) como o caso modal (2º caso) denominá- lo-emos de pragmáticos (classificatórios e modais)! Pois o fenômeno complexo de apreendermos significados a um significante = significação primária = assimilação de gênero; e o segundo fenômeno complexo de inferirmos significados a um significante = significação secundária = aplicação do gênero ao caso singular e comparação de outros modos com o respectivo modo presente na pessoa que fala. No 2º caso temos o reconhecimento classificatório (gostar significa tal situação pela pessoa X) e, também, um inferimento ou predicação (gostar da maneira como esta pessoa fala comparado ao que outras pessoas falam representa uma qualidade tal de intensidade tal à pessoa X). Acabou? Não! Pois o processo de significar contém uma terceira etapa: visa aos comportamentos, às atitudes que as pessoas que dizem “gostar” têm com a pessoa X. Então,

Ao significante ‘gosto’ associaremos um conjunto de comportamentos para os casos em que as pessoas que dizem “Gosto da pessoa X”.

Ao significante ‘gosto’ associaremos – quando presenciamos – as ações da pessoa (como agiram) que nos disse “Gosto da pessoa X” com o fulano X.

No 3º caso temos condições genéticas (formativas) entre comportamentos e intenções: ao significado já classificável e modalizado na expressão (1º e 2º casos), associaremos as condições necessárias para classificarmos quais são os comportamentos que comportam a classificação de quem ‘gosta’, ou seja, um pareamento (relação) entre o comportamento de quem diz ‘gostar’ da pessoa X. No 4º caso teremos duas modalidades em jogo: o como as pessoas que dizem ‘gostar’ se comportam com aqueles que os correspondem para compararmos com a presente pessoa que diz “Gosto da pessoa X”. Assim, inferiremos uma certa qualidade e intensidade do ‘gostar’ da pessoa que diz “Gosto da pessoa X”, só que agora tal modalidade incide sobre a intensidade e

qualidade da intenção ou sentimento da pessoa em face do comportamento que ela tem em comparação com mais pessoas que afirmam o mesmo em casos similares.

Sintetizando:

1º e 3º casos são comuns quanto ao processo de formação que capacita-os a reconhecerem o significado ao significante quanto à classificação de ‘gostar’ em relação ao evento – situação externa de conjuntura – do (1º caso); e em relação ao comportamento – situação externa de ação do (3º caso). Formação = subsídios para o sujeito associar a classe, reconhecer o evento à fala (1º caso) e classificar, reconhecer o comportamento à intenção (3º caso).

2º e 4º casos são comuns quanto à comparação entre os modos de dizer (2º caso) e os modos de agir (4º caso). Aos modos de dizer inferiremos qualidade e intensidade: pela maneira como se expressa na fala (2º caso); aos modos de se comportar (atitudes para com a pessoa X) na relação entre ação e intenção (4º caso). Comparar = avaliar a qualidade e intensidade para apreciar a ação/comportamento em relação à pessoa X inferir o grau da intenção (ou afeto) em relação à pessoa X.

1º e 2º casos têm de incomum a classificação e a comparação. Têm em comum que ambas as operações (classificação e comparação) incidem sobre falas ‘Gosto da pessoa X’. Ambos são casos pragmáticos de constituição e comparação expressiva da fala.

3º e 4º casos têm de incomum a classificação e a comparação. Têm em comum que ambas as operações incidem sobre os comportamentos em relação às intenções. Ambos são casos pragmáticos de constituição e comparação expressiva da ação com a intenção.

Uma contradição pragmática ocorrerá quando afirmarmos “Gosto da pessoa X” sem o correspondente tratamento da pessoa que afirma à pessoa X. Teremos uma contradição performática no âmbito pragmático de ações que não correspondem com a fala. A intenção está do lado (equivalente) à ação, mas não à fala. O critério para reconhecermos tal fenômeno é o comportamento em relação – mas em detrimento – à fala.