Baixe Introdução de Alimentos em Lactentes de Risco: Estudo no Município de Cuiabá e outras Notas de estudo em PDF para Enfermagem, somente na Docsity!
Introducing food to infants considered to be at risk at birth
Artigo
originAl Introdução de alimentos para lactentes considerados de
risco ao nascimento
Endereço para correspondência: Christine Baccarat de Godoy Martins – Rua Fortaleza, no^ 70, Jardim Paulista, Cuiabá-MT, Brasil. CEP: 78065- E-mail : leocris2001@terra.com.br
Christine Baccarat de Godoy Martins Departamento de Enfermagem, Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá-MT, Brasil Danuza da Silva Santos Faculdade de Enfermagem, Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá-MT, Brasil Fernanda Cristina Aguiar Lima Programa de Pós-graduação em Enfermagem, Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá-MT, Brasil Maria Aparecida Munhoz Gaíva Departamento de Enfermagem, Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá-MT, Brasil
doi: 10.5123/S1679-
Resumo
Objetivo : descrever o calendário de introdução de alimentos/líquidos nos seis primeiros meses de vida e investigar fa-
tores associados a essa introdução, entre lactentes considerados de risco ao nascer. Métodos : estudo transversal, mediante
inquérito domiciliar com lactentes considerados de risco ao nascer, realizado no município de Cuiabá-MT, Brasil, em 2011.
Resultados : foram avaliados 113 lactentes; todos receberam alimentos/líquidos antes dos seis meses de idade – água (86,7%),
chás (68,1%), leite de vaca integral (15,9%), leite em pó (59,3%), sucos (67,3%), papa salgada (69,0%), alimentação
da família (38,0%), bolacha/pão (45,1%), caldos (60,2%), iogurte (60,2%) –; observou-se associação entre introdução
precoce de alimentos/líquidos e uso de chupeta e mamadeira, menor tempo de aleitamento materno exclusivo, aleitamento
artificial nas primeiras 24 horas de vida e intercorrências na gravidez/parto. Conclusão : faz-se necessária a orientação das
gestantes e mães quanto à manutenção da amamentação exclusiva e ao calendário adequado para a introdução de alimentos.
Palavras-chave : Aleitamento Materno; Saúde Materno-Infantil; Desmame; Inquéritos Epidemiológicos; Estudos
Transversais.
Abstract
Objective : describe the timing of introducing food/liquid in the first six months of life and associated factors among
infants considered at risk at birth. Methods : cross-sectional study using household survey with infants considered
at risk at birth in the city of Cuiabá-MT, Brazil, 2011. Results : 113 infants were assessed. All received food/liquids
before six months of age: water (86.7%), tea (68.1%), whole cow's milk (15.9%), powdered milk (59.3%), fruit juice
(67.3%), savoury purée (69.0%), same food as the family (38.0%), biscuits/bread (45.1%), bouillon (60.2%), yogurt
(60.2%). Association was observed between early introduction of foods/liquids and: use of dummies/feeding bottles,
shorter duration of exclusive breastfeeding, bottle feeding with milk in the first 24 hours of life, and complications
during pregnancy/childbirth. Conclusion : pregnant women and mothers need to be guided regarding maintaining
exclusive breastfeeding and appropriate timing for introducing food.
Key words : Breast Feeding; Maternal and Child Health; Weaning; Health Surveys; Cross-Sectional Studies.
Epidemiol. Serv. Saúde , Brasília, 23(1):79-90, jan-mar 2014
Introdução
A introdução de alimentos e líquidos na dieta de
lactentes é de grande importância para um bom cres-
cimento e desenvolvimento, 1 embora seja essencial
atentar para a idade adequada em que os alimentos/
líquidos devem ser ofertados à criança, assim como
para a qualidade e a quantidade dos alimentos ofere-
cidos.^2 A Organização Mundial da Saúde recomenda
manter o aleitamento materno após os seis meses de
idade, além de introduzir outros alimentos em função
das maiores demandas energéticas do lactente e do
aleitamento materno exclusivo já não ser mais sufi-
ciente para satisfazer suas necessidades nutricionais. 3-
Essa etapa de adoção de alimentos na dieta
do lactente merece especial atenção. Os alimen-
tos devem ser introduzidos de forma segura e
nutricionalmente adequada, uma vez que graves
consequências podem surgir decorrentes de sua ini-
ciação incorreta, como a desnutrição e as doenças
diarreicas. 6-7^ Quando introduzido precocemente, o
alimento torna-se desvantajoso: diminui a duração
do aleitamento materno, interfere na absorção de
nutrientes importantes, aumenta o risco de conta-
minação e reações alérgicas. 8
A introdução precoce de alimentos em lactentes
considerados de risco ao nascimento é preocupante,
dada sua imaturidade fisiológica e neurológica, e
requer acompanhamento sistemático.8-
É considerado recém-nascido de risco quem, na
ocasião do nascimento, responde a um dos seguintes
critérios estabelecidos pelo Ministério da Saúde:
residir em área de risco; apresentar baixo peso ao
nascer (inferior a 2.500g); ser prematuro (abaixo de
37 semanas de idade gestacional); apresentar asfixia
grave (Apgar menor que 7 no quinto minuto de vida);
criança internada ou com intercorrências na materni-
dade ou em unidade de assistência ao recém-nascido;
criança que, por ocasião da alta da maternidade/
unidade de cuidados do recém-nascido, necessita de
orientações especiais (em uso de antibióticos e com
icterícia); recém-nascido de mãe adolescente (menos
de 18 anos); recém-nascido de mãe com baixa ins-
trução (com menos de oito anos de estudo); e com
histórico de morte de crianças com idade menor que
5 anos na família.^9
Muito se tem produzido sobre esse grupo consi-
derado de risco. 8-10^ Entretanto, pouco se sabe sobre
a introdução de alimentos e líquidos na dieta dessas
crianças consideradas sob risco ao nascer, principal-
mente no primeiro semestre de vida.
Nessas circunstâncias, torna-se essencial estudar a
introdução de alimentos e líquidos entre os lactentes
nascidos de risco, a fim de direcionar as estratégias
específicas de atenção capazes de contribuir para uma
alimentação adequada e, conseqüentemente, favorecer
o crescimento e desenvolvimento saudáveis e a redução
da morbimortalidade nessas crianças.
O presente estudo teve como objetivo descrever o
calendário de introdução de alimentos/líquidos nos
seis primeiros meses de vida e investigar fatores asso-
ciados a essa introdução, entre lactentes considerados
de risco ao nascer, no município de Cuiabá, capital do
estado de Mato Grosso, Brasil.
Métodos
Trata-se de estudo transversal, cuja população foi
composta por crianças nascidas em Cuiabá-MT, no mês
de janeiro de 2011, consideradas de risco na ocasião
do nascimento, cujas famílias residiam no município.
Para a seleção da população de estudo, utilizou-se a
Declaração de Nascido Vivo (DN), da qual se conside-
raram, como critérios de inclusão, crianças nascidas
em janeiro de 2011, em uma das três maternidades do
município, sua família ser residente em Cuiabá-MT e
responder a pelo menos um dos seguintes critérios de
classificação para recém-nascido de risco, definidos
pelo Ministério da Saúde:^9
a) recém-nascido com menos de 37 semanas de idade
gestacional;
b) peso ao nascer menor que 2.500 gramas;
c) asfixia grave – Apgar menor que 7 no 5º minuto de
vida –;
d) ser filho de mãe adolescente – menos de 18 anos
–; e
e) ser recém-nascido de mãe com baixa instrução –
menos de 8 anos de estudo.
A Organização Mundial da Saúde recomenda manter o aleitamento materno após os seis meses de idade, além de introduzir outros alimentos.
Alimentação para lactentes de risco ao nascimento em Cuiabá-MT
Epidemiol. Serv. Saúde , Brasília, 23(1):79-90, jan-mar 2014
Alimentação para lactentes de risco ao nascimento em Cuiabá-MT
Epidemiol. Serv. Saúde , Brasília, 23(1):79-90, jan-mar 2014
a 2.500 gramas; e 9,1% apresentaram asfixia grave
(Apgar menor que 7 no 5o^ minuto de vida).
Todas as crianças receberam alimentos/líquidos
antes dos seis meses de idade, como água, papa salgada
caseira, chás, sucos e outros (Tabela 1).
Destaca-se a introdução de água, chás, leite de
vaca integral e leite em pó antes dos 15 dias de vida,
e a maioria dos alimentos aos três meses de idade.
Alimentos como sucos, papas, alimentação da família,
refrigerantes, bolachas, cereais infantis, salgadinhos,
doces e outros foram predominantes em idades
maiores. Além desses, foram introduzidos, precoce-
mente, um lanche típico de Cuiabá-MT chamado de
“baguncinha” (pão com ovo, hambúrguer, salsicha,
bacon, presunto, queijo, tomate e alface), café, couro
de porco, fígado, galinha caipira, hortaliças, legumes/
verduras, macarrão, macarrão instantâneo, mingau,
salgado, sorvete, suco de couve e temperos. Todavia,
o macarrão instantâneo e as verduras apresentaram
frequências mais expressivas (Tabela 2).
O uso de chupeta (relatado por 66 mães – 58,4%)
esteve associado com a introdução precoce de alimen-
tos/líquidos. Entre as crianças que usaram a chupeta,
foi maior a introdução precoce de água, sucos, leite
em pó, chás, papa salgada caseira, caldos, frutas
raspadas/amassadas, bolachas/pães e leite de vaca
integral (Tabela 3).
O uso da mamadeira (identificado em 62 crian-
ças – 54,9%) também esteve associado à introdução
precoce de alimentos/líquidos. Entre as crianças que
usaram mamadeira, foi maior a introdução precoce
de água, sucos, papa salgada caseira, chá, leite
em pó, frutas raspadas/amassadas, caldo e iogurte
(Tabela 3).
Tabela 1 − Distribuição dos recém-nascidos de risco (n=113) segundo a introdução de alimentos e líquidos antes
dos seis meses de idade, no município de Cuiabá, Mato Grosso, 2011
Alimentos e líquidos Sim^ Não n % n % Água 98 86,7 9 8, Chás 77 68,1 30 26, Sucos (naturais e artificiais) 76 67,3 31 27, Frutas raspadas/amassadas 71 62,8 36 31, Frutas inteiras 11 9,7 96 85, Papa salgada caseira 78 69,0 29 25, Papa salgada industrializada 10 8,9 97 85, Caldos (feijão, frango) 68 60,2 39 34, Leite em pó 67 59,3 40 35, Leite de vaca integral 18 15,9 89 78, Leite de vaca desnatado 4 3,5 103 91, Fórmulas infantis 2 1,8 105 92, Iogurte 68 60,2 39 34, Gema de ovo 5 4,4 102 90, Ovo inteiro 1 0,9 106 93, Carne desfiada 43 38,1 64 56, Refrigerantes 22 19,5 85 75, Bolachas/pães 51 45,1 56 49, Cereais infantis 2 1,8 105 92, Salgadinho industrial 16 14,2 91 80, Doces (balas/chocolate) 13 11,5 94 83, Enlatados 2 1,8 105 92, Embutidos 4 3,5 103 91, Alimentação da família 43 38,1 64 56,
a) Em cada uma das linhas, acrescenta-se 5,3% de informações ignoradas, proporção correspondente às 6 mães (das 113 que responderam o inquérito) que não souberam responder sobre a introdução, antes dos seis meses de idade, dos alimentos/líquidos pesquisados.
Christine Baccarat de Godoy Martins e colaboradores
Epidemiol. Serv. Saúde , Brasília, 23(1):79-90, jan-mar 2014
A associação entre a introdução precoce de ali-
mentos/líquidos e o número de consultas de pré-natal
não foi estatisticamente significativa (p=0,725). Além
disso, as mães que introduziram alimentos e líquidos
precocemente na dieta de seus filhos haviam passado
por mais de 6 consultas no pré-natal (89,8%), 5 a 6
consultas (6,4%) e até 4 consultas (3,8%).
Não houve associação entre a introdução precoce
de alimentos/líquidos e a escolaridade materna. Con-
tudo, verificou-se maior proporção dessa prática entre
as mães com maior escolaridade: 54,0% da introdução
precoce de alimentos e líquidos ocorreu nas mães com
mais de 8 anos de estudo; 28,0% entre as mães com 4
a 7 anos; 9,6% entre aquelas com 1 a 3 anos; e 8,4%
entre as mães que não tinham estudo.
A Tabela 4 apresenta a introdução precoce de ali-
mento/líquido segundo o tempo de aleitamento materno
exclusivo. Observou-se que quanto menor foi o tempo
de amamentação, maior foi a proporção de alimentos/
líquidos introduzidos precocemente. Por exemplo, a
água, o chá, os sucos, o leite em pó e a papa salgada
foram introduzidos com maior frequência entre as mães
que não amamentaram (21,4%, 22,1%, 19,7%, 28,4%
e 20,5%, respectivamente). Fórmulas infantis, caldo
(de feijão ou frango), bolacha/pão, cereais infantis e
a alimentação da família foram oferecidos à criança
em maior proporção pelas mães que amamentaram
exclusivamente por menos de 15 dias (40,0%, 23,5%,
23,5%, 60,0% e 23,3%, respectivamente). O leite de
vaca integral foi introduzido em maior proporção pelas
mães que amamentaram até um mês de vida da criança
(33,3%). O refrigerante, por sua vez, foi oferecido em
maior proporção pelas mães que amamentaram até dois
meses de vida da criança (22,7%). Destaca-se o valor
Tabela 2 − Distribuição dos recém-nascidos de risco (n=113) segundo a idade em que os alimentos foram
introduzidos, no município de Cuiabá, Mato Grosso, 2011
Alimentos e líquidos
Idade em que foi introduzido o alimento/líquido <15 dias 15 a 29 dias 1 mês 2 meses 3 meses 4 meses 5 meses 6 meses Ignorado % % % % % % % % % Água 8,2 3,2 9,2 13,2 26,5 18,3 6,1 12,2 3, Chás 18,1 6,5 18,1 11,7 21,1 11,7 2,5 9,1 1, Sucos (naturais e artificiais) – 1,3 – 2,6 15,8 21,3 22,3 31,5 5, Frutas raspadas/amassadas – – – – 7,1 22,5 12,7 50,7 7, Frutas inteiras – – – – 9,1 18,2 18,2 54,5 – Papa salgada caseira – – – – 7,8 10,2 25,6 48,7 7, Papa salgada industrializada – – – – – 10,0 10,0 70,0 10, Caldos (feijão, frango) – – – – 4,4 13,3 20,5 55,9 5, Leite em pó 21,0 3,0 8,9 13,4 8,9 16,4 8,9 16,4 3, Leite de vaca integral 5,5 – 16,7 – 11,1 11,1 27,8 11,1 16, Leite de vaca desnatado – – – 25,0 – 25,0 25,0 – 25, Fórmulas infantis – – – – – – 40,0 60,0 – Iogurte – – – – 10,3 20,6 16,1 48,5 4, Gema de ovo – – – – 20,0 – 20,0 40,0 20, Ovo inteiro – – – – – – 100,0 – – Carne desfiada – – – – 2,3 7,0 16,3 60,5 13, Refrigerantes – – – – 4,5 9,2 4,5 40,9 40, Bolachas/pães – – – – 5,9 5,9 25,4 53,0 9, Cereais infantis – – – – – – 60,0 40,0 – Salgadinho industrial – – – – 6,2 – 12,5 56,2 25, Doces (bala/chocolate) – – – 7,7 7,7 – 23,0 46,1 15, Enlatados – – – – – – 100,0 – – Embutidos – – – – – – 25,0 50,0 25, Alimentação da família – – – – 4,6 16,2 18,6 46,5 14,
Christine Baccarat de Godoy Martins e colaboradores
Epidemiol. Serv. Saúde , Brasília, 23(1):79-90, jan-mar 2014
Tabela 4 − Distribuição dos recém-nascidos de risco (n=113) segundo a introdução de alimentos antes dos seis
meses e o limite de idade em que prevaleceu o aleitamento materno exclusivo, no município de
Cuiabá, Mato Grosso, 2011
Alimentos/ líquidos introduzidos
na a^ <15 dias 15 a 29 dias 1 mês 2 meses 3 meses 4 meses 5 meses 6 meses (^) Valor de p b % % % % % % % % % Água 21,4 18,4 3,0 13,3 12,2 15,3 11,2 3,1 2,1 0, Chás 22,1 19,5 2,6 13,0 9,1 16,9 10,4 3,9 2,5 0, Sucos (naturais e artificiais) 19,7 18,4 2,6 17,1 9,2 15,8 10,5 3,9 2,6 0, Frutas raspadas/amassadas 19,7 21,1 1,4 16,9 8,5 14,1 12,7 2,8 3,0 0, Frutas inteiras 27,3 36,5 – 9,1 9,1 9,1 9,1 – – 0, Papa salgada caseira 20,5 19,2 2,6 16,7 10,3 14,1 9,0 2,6 5,0 0, Papa industrializada – 20,0 – 10,0 10,0 10,0 20,0 10,0 20,0 0, Caldos (feijão, frango) 16,2 23,5 1,5 17,6 11,8 16,2 10,3 1,5 1,4 0, Leite em pó 28,4 22,4 3,0 10,4 9,0 11,9 10,4 3,0 1,5 0, Leite de vaca integral 11,1 5,6 – 33,3 16,7 22,2 5,6 5,6 – 0, Leite de vaca desnatado – 25,0 – – – 50,0 – 25,0 – 0, Fórmulas infantis – 40,0 – – – – 60,0 – – 0, Iogurte 16,2 20,6 1,5 17,6 11,8 17,6 8,8 5,9 – 0, Gema de ovo 20,0 20,0 – 20,0 – 40,0 – – – 0, Ovo inteiro – 100,0 – – – – – – – 0, Carne desfiada 25,6 11,6 2,3 18,6 9,3 20,9 7,0 – 4,7 0, Refrigerantes 9,1 18,2 4,5 4,5 22,7 18,2 13,6 9,2 – 0, Bolachas/pães 9,8 23,5 2,0 21,6 11,8 15,7 9,8 3,9 1,9 0, Cereais infantis – 60,0 – – – – 40,0 – – 0, Salgadinho industrial 12,5 18,8 – 18,8 6,3 31,3 – 12,3 – 0, Doces (balas/chocolate) 15,4 23,1 – 23,1 23,1 7,7 7,6 – – 0, Enlatados – 50,0 – – – 50,0 – – – 0, Embutidos – 50,0 – 25,0 25,0 – – – – 0, Alimentação da família 18,6 23,3 2,3 16,3 11,6 14,0 9,3 2,3 4,3 0,
a) na: não amamentou b) teste do qui-quadrado de Pearson
de risco ao nascer. Revelou-se a introdução precoce
de alimentos e líquidos na dieta das crianças, bem
como sua associação positiva com: uso de chupeta
e mamadeira; prevalência do aleitamento materno
exclusivo; tipo de aleitamento logo após o nascimento;
e intercorrências na gravidez/parto.
A introdução precoce de alimentos/líquidos no
calendário alimentar de lactentes também foi verificada
em outras pesquisas, as quais identificaram, entre
esses alimentos/líquidos, água, chás, sopas, sucos,
frutas, carnes, fórmulas infantis e comida salgada. 11-
Muitos desses alimentos foram oferecidos antes dos
dois meses de idade, com um aumento de 30% entre o
quarto e o quinto mês, sendo que mais da metade das
crianças menores de quatro meses já estavam a receber
água, chás, sucos, outros leites (fórmulas infantis) e/
ou alimentos complementares, 13 coincidentemente
com os resultados do presente estudo. Não foi possível
distinguir a oferta de suco natural do artificial, pois
as mães relataram que, ao introduzirem suco para as
crianças, ofereceram, simultaneamente, suco natural
e artificial.
Tais práticas podem levar à diminuição do aleita-
mento materno exclusivo (AME) ou sua interrupção.^9
Já o acompanhamento alimentar, com orientações
individuais no primeiro ano de vida da criança, pode
evitar que alimentos e líquidos sejam incluídos na
alimentação da criança precocemente – a exemplo
do macarrão instantâneo e do salgadinho industrial,
presentes na alimentação dos lactentes avaliados.
Alimentação para lactentes de risco ao nascimento em Cuiabá-MT
Epidemiol. Serv. Saúde , Brasília, 23(1):79-90, jan-mar 2014
Pesquisa 14 demostrou que alimentos ricos em
carboidratos e pobres em proteínas contêm produtos
químicos, como aditivos, corantes e conservantes, além
de quantidade excessiva de sal e gorduras saturadas,
gorduras trans e colesterol, o que pode predispor, no
futuro, a doenças como hipertensão arterial, doenças
cardiovasculares e obesidade. Acrescenta-se, ainda,
o custo mais elevado desses alimentos em relação
aos naturais, o que pode comprometer o orçamento
da família.
Nesse cenário, destaca-se a relevância da Primei-
ra Semana de Saúde Integral, uma das estratégias
a serem implementadas pelo Pacto Nacional pela
Redução da Mortalidade Materna e Neonatal, 15 que
tem como um de seus objetivos a promoção do alei-
tamento materno.^9 Aliada a essa estratégia, ressalta-se
a importância do seguimento dos recém-nascidos de
risco nos programas de puericultura, visto que os
alimentos/líquidos foram introduzidos precocemente
na dieta alimentar dessas crianças por iniciativa das
próprias mães e familiares.
Pesquisas demonstram que o uso de chupeta e ma-
madeira nos seis primeiros meses diminui o período
de aleitamento materno exclusivo. 16-17^ A mamadeira
interfere nas funções de mastigação, sucção e deglu-
tição. Ademais, quando introduzidas precocemente,
acredita-se que a mamadeira e a chupeta possam
gerar “confusão de bicos” devido às diferenças exis-
tentes entre a sucção na mama e no bico artificial.
Consequentemente, a redução ou interrupção da
Tabela 5 − Distribuição dos recém-nascidos de risco (n=113) segundo a introdução de alimentos antes dos seis
meses e o tipo de aleitamento logo após o nascimento (nas primeiras 24 horas), no município de
Cuiabá, Mato Grosso, 2011
Alimentos/ líquidos introduzidos
Tipo de aleitamento nas primeiras 24 horas após o nascimento Materno exclusivo Misto Artificial Banco de leite Ignorado Valor de p a % % % % % Água 92,5 100,0 100,0 77,8 12,5 0, Chás 72,5 66,7 100,0 66,7 12,5 0, Sucos (naturais e artificiais) 76,3 66,7 100,0 33,3 – 0, Frutas raspadas/amassadas 67,5 58,3 100,0 66,7 – 0, Frutas inteiras 10,0 8,3 25,0 11,1 – 0, Papa salgada caseira 75,0 66,7 100,0 66,7 – 0, Papa industrializada 11,3 8,3 27,8 – – 0, Caldos (feijão, frango) 68,8 21,7 100,0 44,4 – 0, Leite em pó 56,3 100,0 100,0 44,4 25,0 0, Leite de vaca integral 20,0 8,3 25,0 – – 0, Leite de vaca desnatado 5,0 – 19,0 – – 0, Fórmulas infantis 2,0 – 50,0 – – 0, Iogurte 68,8 50,0 50,0 55,6 – 0, Gema de ovo 5,0 – 25,0 – – 0, Ovo inteiro 1,3 – 28,9 – – 0, Carne desfiada 37,5 41,7 75,0 55,6 – 0, Refrigerantes 23,8 8,3 42,5 22,2 – 0, Bolachas/pães 25,0 25,0 56,3 22,2 – 0, Cereais infantis 0,5 – 2,5 – – 0, Salgadinho industrial 17,5 8,3 38,6 11,1 – 0, Doces (bala/chocolate) 13,8 – 25,0 11,1 – 0, Enlatados 2,5 – 4,7 – – 0, Embutidos 5,0 – 8,9 – – 0, Alimentação da família 25,0 33,3 43,8 33,3 – 0,
a) teste do qui-quadrado de Pearson
meses de idade do lactente, pode ter contribuído para
a caracterização de um viés de memória, particular-
mente sobre a época de introdução dos alimentos.
Não obstante, outros autores 28-30^ aplicaram a mesma
metodologia de recordatório para investigações sobre
o tema, encontrando o momento da introdução de
alimentos como marcante na memória das mães.
Por se tratar de um estudo transversal, é mister
destacar que as características aqui verificadas po-
dem se modificar ao longo do tempo, na medida das
intervenções e estratégias em implantação. Portanto,
os dados aqui apresentados e discutidos devem ser
analisados sob essa ótica.
A despeito das limitações ao estudo, os resultados
apresentados contribuem para a construção do perfil
de um segmento ainda pouco conhecido, princi-
palmente no município. A pesquisa foi desenhada
com o objetivo de fornecer dados pioneiros sobre
a introdução de alimentos e líquidos para lactentes
considerados de risco ao nascimento no município de
Cuiabá, estado de Mato Grosso, o que introduz uma
perspectiva inédita no estudo da alimentação em um
grupo considerado de risco.
Outra consideração deve-se à importância da licen-
ça maternidade de seis meses, pois o fato de a mãe
trabalhar fora de sua casa, muitas vezes informalmente,
pode contribuir para o desmame.
Destaca-se, portanto, a importância de estratégias
e programas de acompanhamento durante todo o
primeiro ano de vida, com vistas não apenas a orientar
o aleitamento materno e o calendário alimentar da
criança e sim atender as demais necessidades da mãe,
seu filho e família. O trabalho multidisciplinar com
profissionais de diferentes áreas do conhecimento
científico e de interesse direto para a Saúde Pública,
como Enfermagem, Nutrição, Medicina, Serviço Social
e afins, mostra-se essencial nesse sentido.
O cenário observado aponta para a necessidade de as
unidades de Saúde da Família priorizarem a formação
de equipes que acompanhem e orientem as famílias
sobre a alimentação de lactentes nascidos de risco,
cujo crescimento e desenvolvimento saudável constitui
prioridade para o Ministério da Saúde do Brasil e deve
ser efetivamente incorporado pelos serviços de saúde.
Contribuição dos autores
Todas as autoras participaram da concepção e
delineamento do estudo, análise e interpretação dos
dados, redação ou revisão crítica relevante do con-
teúdo intelectual do manuscrito e aprovação final da
versão a ser publicada. Todas são responsáveis por
todos os aspectos do trabalho, incluindo a garantia
de sua precisão e integridade.
1. Barbosa MB, Palma D, Bataglin T, Taddei JA. Custo
da alimentação no primeiro ano de vida. Rev Nutr
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