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Este texto apresenta a história do parnasianismo no brasil, uma corrente literária que se desenvolveu no final do século xix, em oposição à escola romântica. O autor traza as raízes do parnasianismo na poesia socialista e na idéia nova, e destaca a influência de autores franceses, como baudelaire. Além disso, o texto menciona os primeiros poetas brasileiros que se identificaram com esta corrente, como alberto de oliveira, raimundo correia, vicente de carvalho e outros. O texto também discute as características literárias do parnasianismo, como o uso de sonetos, tercetos e metros desiguais.
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Tipologia: Notas de aula
Compartilhado em 07/11/2022
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Prefac»ando om 1885 o livro Noites de msórna, de Antônio Joaquim Viana, "estudante de Medicina, nalural de Sergipe", advertia o poeta Joâo Ribeiro que esse trabalho vinha à luz pública em meio à condenação quase geral da escola romântica. Realmente, anos antes se havia proclamado, pela voz de Sílvio Romero, que o Romantismo era "um cadáver, e pouco respeitado" (1878, prefácio dos Cantos do fim do sécuto). o Machado de Assis, num ensao famoso, "A nova geração” , corroborava em 1879: a escola subjetiva era um dia que verdadeiramente acabara. Românticos e anti-românticos. aliás, já haviam andado às tur ras na “Batalha do parnaso", travada em versos pelo Diáno do Rio do Janeiro, em 1878; e om 1882 os últimos românticos, como Rosendo Mumz Barreto e Melo Morais Filho, foram atacados, e o prtneiro até ridicularizado, pelas colunas de A Gazetmha. O Romantismo, porianto, náo mais existia em 1885. O que imperava eram o Socialismo, o Realismo, a Poesia Científica e algo novo, que |á se formava e náo possuía ainda nome certo, mas herdaria em boa parte os despojos da luta das cor rentes antenores contra o Romantismo. Ou melhor, esse algo novo, a partir de certa altura, talvez 1882, passou a ser encarado às vezes como Parnasianismo. Alguns pareciam tomar esses visos parnasianos, de início, como tendência fraca e despre zível. tal se dava, por exemplo, com Sílvio Romero. desde 1882. Mal imaginava ole o vigor que a corrente adquiriria, pouco depois, em nossas letras. Mas, voltando às ongens do Socialismo, assinalava Joâo Ribeiro, no citado prefácio: "... hoje náo cantamos o Mondego, nem a estrada do Bom Jesus de Braga, em compensação, porém, restam-nos a marselhosa. as barncadas, Danton e o petróleo... e todo esse valhacouto de baca martes demagógicos que transportamos de Pans revolucionária e febril". E do Realismo, sob seus vár»os nomes, acentuava que a apologia das neuroses e do êxtase havia chegado ao cúmulo. No setor formal, frisava o poeta de Avena c efiara que o decassílabo parecia cair "diante do alexan drino retumbante e ruidoso", mas em tudo já se ia "notando uma sensata reação", a reaçáo que logo. esclarecemos nôs, relegana às trevas as outras correntes, sob o rótulo avassalador de Par nasianismo, aquela mesma designação avulsa, combatida e precária, do mício.
A Poesia Cientifica
Assim, pois, é certo que o combate ao Romantismo foi encetado por várias correntes, son do o Parnasianismo antes o herdeiro do que o imciador da peleja. E quem teria dado o sinal da batalha contra a escola subjetiva9 A crermos em Silvio Romero, foi ele próprio - e podemos ter is so como certo, ao menos no que se refere à poesia filosófico-científica: em 1870, no poriódico Crença, do Recife, publicava o artigo "A poesia dos harpejos poéticos", no qual “apresentava pela primeira vez (no Brasil) a idéia da poesia fundada no criticismo contemporâneo, e combatia, con seqüência lógica, o romantismo choroso e o mdianismo brasileiro", diria mais tarde. Sílvio doseia- va uma poesia imbuída do pensamento filosófico e cientifico da época, em suas generalidades, o náo versos meramente didáticos. Suas idéias, ole as tentou aplicar nos Cantos do fim do século ,
PÉRICLES EUGÊNIO DA SILVA RAMOS 6 prolessor do língun Portuguesa na Faculdade do Comuncaçáo Social “Cásper Libero”, poeta membro da Acadonrua Paulista de Loiras, o IracJutof.
Solombro. Outubro o Nove mbr<V 1989 Rovisla USP - 155
mas sem muita lolicidade: se o intento do livro era anti-romântico, a expressão permaneceu vaga, nebulosa e tingida de hugoamsmo - continuando, pois, com aparência romântica. Machado de Assis assinalou esse contraste entre a concepção e a forma - e Sflvio, por isso, iamais o perdoou (como bem adverte Lúcia Miguel Pereira). Entre os adeptos da Poesia Científica o mais característico foi José Isidoro Martins Júnior (1860-1901). que publicou vários livros e opúsculos. Também ele era contrário ao Romantismo:
Vêm-me até tentações diabólicas, fatais, Que fazem-me lembrar o morto Romantismo' Mas ai' eu antes quero o tédio e seus punhais Do que a face sem cor do Lamartimanismo
O volume em que definidamente se entregou às diretrizes da Poesia Científica chama-se Visões de hoie (1881; 2* ed., 1886). Esse livro traz linhas explicativas na 1• ediçáo, e estas e no vas fcnhas na ?•'. em defesa e confirmação de idéias. Compreende, em verso, uma introdução e quatro sínteses: científica, política, religiosa e artística, nas quais o mot dordre é o Posibvismô e se laia abertamente em lei de seleção, luta pela existência, monismo, e pululam, nas compara ções. termos ideais extraídos da ciência. Veja-se, por exemplo, como entram nos seguintes ver sos a luz elétnca o a pilha de Volta:
... Eu sou a nova Musa, Oue anda como uma luz elétrica, difusa...
Enquanto à tua Pátria, o que é preciso agora é pores-lhe diante uma espiendente aurora Quo a doure, que a desperte e seja como a priha De Volta, que a eletnze...
Martins Júnior queria substituir a verdade cientílica à imaginação romântica, mas suas aspi rações nem sempre se concretizaram em poesia peremptória ou pelo menos equilibrada. Telapo- iteroma, o seu livro seguinte (1893), é uma espécie de colcha de retalhos: há nele composições científicas, mas também líricas e até parnasianas.
Realismo
Mais importante, como corrente, foi o Realismo, que se caractenzou, em nossa poesia, pe los seguintes pontos: 1) A mulher perdeu o hak> que a revestia no Romantismo, para se transfor mar, materialmente, na fêmea cotxçada. sadta e bela. A três por dois, evocam-se congressos se- xuais e a sugestão da carne. Esse aspecto já era decadente, mas, na época, náo se tinha cons ciência disso. 2) O espírito de observação substitui a idealização romântica, havendo muitas ve zes nas composições, como ass^alava Machado de Assis, antes uma estética de inventário (pe los pormenores acumulados) do que relações ne^.ssárias ou acessónas. 3) Amiúde se conde nam vícios sociais ou humanos, embora a situação nâo seja diretamente verberada; conta-se uma história, esboça-se um quadro - e a conclusão, de ordem moral, o leitor que a tire. Por isso mes mo dizia um tratadista da época, Paulo Antônio do Vale, que, no Realismo, a poesia era substituída pela moral. Entre os que se inspiravam diretamente em Baudelaire (este, em nosso meio, àquela época, era tomado como realista, segundo o expresso testemunho de Machado de Assis), isto é, entre os apologistas da “ neurose e do êxtase", no dizer de Joâo Ribeiro, figuram poetas que já não eram românticos, pela expressão, mas ainda nâo eram parnasianos (hoje pode-se tomá-los como de- cadistas). Estão entre eles Carvalho Júnior e Teófik) Dias, que influem em muitos poetas, por exemplo, na comparação de desejos a animais ferozes, presente em Ramundo Correia, Vences- lau de Queirós o outros, ou na lorte descrição da mulher e das relações entro os sexos. Esses dois poetas. Francisco Antônio de Carvalho Júnior (1855-1879) e Teófilo Odonco Dias de Mes quita (1854-1889). ostentam um novo tipo de dicção, flmdo, cheio de adjetivos proparoxítonos e aliteraçôes, atingindo a expressão, por vezes, elevado nível artístico. Carvalho Júnior morreu sem deixar livro publicado. Artur Barreiros foi quem, em benefício da viúva, editou seus Escntos pós- tumos (1879). dos quais uma parte, Hespéndes. inclui 22 poesias líricas. De Teófilo Dias o livro mais significativo são as Fanfarras (1882), cuja pnmeira parte é reabsta (ou melhor, decadente), nâo só pela violência carnal, como pela dupla influência revelada, de Baudelaire e Carvalho Júnior. Esses precedentes explicarão, em nosso Parnasianismo, certas notas cruas, como as de Bilac
156 - Revisia USP Solembro, Outubro e Novembro/19A
em "Satârva". “ De volta do baile" ou “ Beijo eterno", ou certas situações e imagens, como as de Ra>mundo Corroía em "Après le combat" ou MNa penumbra**. Quanto ao espírito de observação, estética de inventário e condenação social ou humana, po< meio de quadros ou htstonetas, sáo de otar Cdso Magalhães (1849-1879), com parte de seus Versos (1870), B. Lopes, com seus Cromos (realismo agreste) ou Ptzzicalos (em que espelha a assoluçAo dos círculos mundanos), Afonso Celso (Tetas sonantes. 1879), Adeirx) Fontoura (em parte) e poucos mais.
Poesia Socialista
Embora presos à corrente geral do Reaksmo, como Insava um critico, Aníbal Falcão, no prefácio ás Opalas de Fontoura Xavier, havia também os que pensavam fazer da poesia um meio de traduzir "as aspirações, as ânsias, as blasfêmias e a vaga esperança do moderno viver so* a a f. Oc modo geral, atacavam os poetas socialistas o Trono e a Igreja, pregavam o sufrágio uni versal, a República, a Paz. a Jusbça, a Igualdade, o Amor Universal (tudo com maiúsculas, fnsava Valentim Magalhães seguindo observação de Sílvio Romcro). Em última análise, a poesia socia lista tem suas raízes no Romantismo francês, que gerou, em nosso meo, o condoremsmo (ro mântico) e a "Musa cívica", dos adeptos da Idéia Nova, isto é, dos que se recusavam a cantar a mulher, e, por mlluôncia dos portugueses como Antero de Quental, Guerra Junqueiro, Gomes Leal, Guilherme de Azevedo e outros defensores da bandeira desfraldada na Ouestáo Coimbrá, desprezaram o "arrabil dos amores" e entraram na poesia de combate. À primeira vista, a poesia social é uma só. praticada quer pelos românticos como Castro Alves ou Tobias Barreto, quer pe los partidários da Idéia Nova; mas embora as «déias sejam em parte as mesmas, de modo geral a expressão mudou. Entre os condore*ros era empolada, grandiosa, hiperbólica, misturando os poetas, como observava nâo sem humour Vaientm Magalhães, “a filosofia, os condores, as dúvi das, os astros, as tfiterrogações, os Andes, as confidências das coisas, a pólvora, as lágrmas, o Himalaia, o sangue, as espadas, as nuvens", ao passo que os socialistas possuíam expressão nâo só mais pedestre como mais precisa, à exceção inicial de alguns, como Lúcio do Mendonça (Névoas matutinas, 1872). Os adeptos principais da poesia socialista, como altor ogo do Realis mo. ou soía, os cultores da Idéia Nova foram om nosso meio Fontoura Xavier (O rógio saltimbanco e Opalas, esto do 1884), Valentim Magalhães (Cantos o lutas, 1879), Teófilo Dias ( Fanfarras, 29 parte), Raimundo Correia (transitoriamente, em parte das Sinfonias, 1883, e já antenormente, no soneto "A idôia nova" de Pnmeiros sonhos, 1879), Afonso Celso, em várias composições das Telas sonantes, já citadas, Augusto de Lima, em poesias de Contemporâneas, o outros. Para quo se tenha idéia do que fo< a poesia socialista, basta ver um soneto de Valentim Magalhães, "A idéia nova", de Cantos e lutas (com os retoques de fíimàno):
Atxsma o teu olhar no azul do firmamento; Devassa o velho Okmpo e o ve»>o céu cnstâo: À serena altivez do seu deslumbramento A indagadora vista elevarás em vâo'
Está deserto o céu' No grande isolamento Palpita, ensangüentado, o sol - um coração. Mas os deuses de Homero, o Jeová sangrento. Alá e Jesus Cnsto, os deuses onde ostáo Morreram. Era tempo. Agora encara a terra: Ressoa alegre a forja e sai da escola um hino. O Génio enterra o Mal em uma negra cova. Deus hatxta a consciência. O coração doscerra Aos ósculos do Bem o cákx purpurino. Vem perto a liberdade, é isto a idéia Nova.
Ou, so so quiser compossçáo mais diretamente interossada em potòica, "O tiro do canhão", de Raimundo Correia:
O tiro do canhão demarca a propnedade E o domínio quo tem no mar cada naçáo. Desenvolva-se o ardor, cresça a velocidade, Multipbque-se o rnpulso ao tiro do canhão’
E de um mar a outro mar, varando os ares, una As nações, e rebente a bafcza fatal’ Seu ostrondo será o estrondo da Comuna, Será a aclamação do Império Universal'
158 - Rovmta USP Sotomtxo, Outubro e Novçmtxo' 1989
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0 Parnasianismo
Esse tipo de poesia v»nha*se generalizando, recomendado que era por uns poetas a outros poetas. Fontoura Xavier, por exemplo, dava o seguinte conselho a Teófilo Dias (que o seguiu em Fanlarras, 2? parle):
Bardo! o cantar somente o coto nu da amante Não diz com a evolução do século gigante!
Enquanto tu sorris De uns olhos sensuais, Nos lôbregos covis, Nas (urnas imperiais,
Capa da revfcta A Bruxa, fundada em 1896 por Biiac em parceria com o caricaturista JuH&o Machado
Setembro, Outubro e Novembro/1989 Revista USP - 159
deixou-se estar efetivamente no castelo, nâo com a filha, mas com as filhas do castelão, o que é ainda mais do que eu lhe pedia naquele tempo." Noutros termos: Mendionais são um livro delmidamente parnasiano (embora no Brasil o vo cábulo ainda fosse usado com escassez, naquele tempo), e para isso contribuiu Machado de As sis, não só forçando Alberto a delinir-se, como ainda por meio dos vános pontos de sua doutnna lormal (espalhados por seus artigos: exigências de unidade e economia do poema, sobriedade de imagens, correção métrica e gramatical, precisão vocabular, etc.) que foram adotados pela ala mais representativa dos parnasianos, quando alinal, muito mais tarde. formularam suas teonas formais: assim Bdac ( Últimas conferências e discursos ). Vicente de Carvalho (Nota à 1- edição dos Poemas e canções ), Alberto de Oliveira (trabalhos esparsos).
Machado de Assis é ainda precursor do Parnasianismo, e agora diretamente, pela data em que publicou nas revistas das mais expressivas composições de Ocidentais: 1879 e 1880.
Outros fatores
Entre outros fatores que contribuíram para o advento do Parnasianismo deve-se contar a in fluência de Artur de Oliveira, Gonçalves Crespo e Lufs Guimarães. Artur de Oliveira (1851-1882) exerceu larga sugestão sobre os poetas "novos" do Brasil a partir de 1877. Tendo vivido em França, onde conheceu vultos eminentes das letras (entre os quais Théophile Gautier, que o tena chamado “le père de Ia loudre") de volta disseminou, por meio de sua brilhante conversação, o culto não só de Victor Hugo ou Baudelaire como de Théophile Gautier, Leconte de Lisle. Banville, Sully-Prudhomme e outros poetas. A crermos em Alberto de Oliveira, “o chamado parnasianismo saiu das largas algibeiras das calças inglesas de Artur de Oliveira". E de que sua ação foi extensa podemos certificar-nos por expressões da época (por exemplo “foi quem melhor Artur de Oliveira fez", Artur de Oliveira af significando tipo de composição divergente do usual), como pelas dedi catórias de livros, partes de livros e poesias, das quais quase nenhum poeta novo se eximiu. O papel de Artur de Oliveira foi expor novidades e onentar o gosto, talvez, mas sua pregação náo era definidamente parnasiana. Nessas condições, sena exagerado atnbuír-lhe à simples intluéncia a implantação do Parnasianismo no Brasil. Para esse resultado, Artur de Oliveira contribuiu, mas não Io» a causa única. Já falamos no papel exercido pela crítica de Machado de Assis; mas outras vozes poderiam ser lembradas para mostrar como não faltava quem se preocupasse com teoria literária, quando não havia ainda surgido claramente o Parnasianismo. Em 1879 advertia Silva Jardim ( A gente do mosteiro) que "nâo pode existir verdadeira arte onde não há junção severa de forma e de fundo", ou, repetindo Silva Pinto ( Controvérsias e estudos literários): “As grandes perversões estéticas derivam da anarquia da forma", para condenar a seguir a infidelidade nas descrições, o adjetivo mal-empregado, confuso ou ambíguo, o excesso de palavras. Ao lado de tudo isso, a influência de Gonçalves Crespo também pode ser assinalada, desde a publicação das Miniaturas (1871): seus versos, se ainda refletem por vezes algo do Romantis mo brasileiro, já se faziam parnasianos pelo tipo da expressão. O mesmo se dá com referência aos Sonetos e nmas de Lufs Guimarães (1880), inteiramente diversos de seu livro antenor, Co- nmbos. Sua poesia se faz plástica, objetiva, colorida, formalmente trabalhada, por influência da poesia contemporânea européia, donde vir Fialho de Almeida a dizê-la parnasiana, no prefácio à 2* edição (1886). Nesse mesmo ano. começa a generalizar-se a aplicação do vocábulo aos nossos poetas, segundo Manuel Bandeira; este. que rastreou os termos parnasiano e Parnasianismo pe los nossos (ornais e revistas, encontrou-os somente a partir de 1886o1, donde talvez seia lícito vincular a Fialho de Almeida a responsabilidade pela difusão do nome em nosso meio. Os indícios, pelo menos, autorizam tal suposição. A essa altura, |á dois dos nossos grandes parnasianos, Alberto de Oliveira e Raimundo Cor reia. tinham livros publicados e definidamente parnasianos ( Meridionais. 1884, e Sonetos e poe mas, 1885, de Alberto; muitas composições de Sintomas, 1883, de Raimundo). Mas para exprimir a novidade de suas composições, lalava-se, por exemplo, como Aluísio de Azevedo a propósito de Raimundo Correia, à falia de designação melhor, em “congraçamento sutil do lirismo e do Rea lismo". Era essa - a do Parnasianismo ainda meio inominado - a "sensata reação" a que João Ri beiro se refena, em 1885, como v»nos no início desta Introdução.
Princípios parnasianos
Já se ia firmando o nosso Parnasianismo quando esse nome começou a lhe ser mais insis tentemente aplicado. O movimento Irancês nascera, como nome, da publicação de Le Pamasse
1 Na roaUdado. jâ Arafipo Júnior. em 22 do julho de 1882. concordava com Fieiho de Atmetdâ, om que Luta Gul- marAes ora parnasiano (Cl. Obt» cthi* ca óv Araripo Júntor, Rio. Casa do Rui Harbosa, 1* vo»., 1958. p. 261). A opi* niAo do Fialho |A era conhecida polo nosso ttfttoo. portanto, quatro anoi anios da ?• od. do» Sonetos c nm at. Os dados do Manuel Bando!ra devom pois ser recuados - pa'a passarmos a aceitar a data do 1880 timplosnenta como a do potafvot inicio da general»- «•ttÇAo do uso do vocábulo. om soa aplicação oos nossos poetas.
Setombfo, Outubro e Novembro/1989 Revista USP - 161
contemporam. recuetl õe vers nouveaux, em três séries: 1866, 1871 e 1876. A última séne já nâo reflete o espírito do grupo, para o qual se procuraram vános rótulos, como fomvstes. irrpassibtes, (antaisistes, mas que ficaram mesmo conhecidos como pamasiens, do título da publicação em que colaboraram. Segundo Charles Bruneau, o Parnasianismo Irancês constituiu uma verdadeira escola, com um chefe e expositor de idéias, Leconte de Usle, e vários poetas agrupados em torno de pnncípos comuns, a saber madame Ackermann, Louis Bouillet, Paul Bourget, François Cop- pée, Léon Dierx, André de Guem, José-Maria de Heredia, Jean Lahor, Victor de Laprade, Louis Ménard, Catulle Mendês, Albert Mérat e Léon Valade, sendo insegura a inclusão de Sully-Pru- dhomme na escola. Bruneau resume a teona de Leconte numa observação deste a Heredia, sobro 'versos firmes e li/ninosos, sóIkJos e sonoros".
O Parnasianismo, segundo em geral se admite, praticou “ a arte pela arte" e a precisão vo cabular (mot juste), numa poesia plástica, pmturesca e sonora, que buscava a perleiçâo técnica o evitava a um tempo as confissões sentimentais e o palavreado oco.
No Brasil, “grosso modo" podem ser tomados como gerais, para os parnasianos, os se* gumtes princípios: exclusão da sentimentalidade romântica, embora não do sentimento; a arte pela arte; o mot juste. Quanto ao senso de colorido e de sonoridade, há poetas que com ele so embria gam, como B. Lopes ou Luís Delfino, mas falha noutros, como Alberto de Oliveira, Vicente de Car valho ou Olavo Bilac. Certos tipos de verso desaparecem (como o alexandrino arcaico); o sistema de contagem de sílabas passa por mudança, vmdo a ser adotada a reforma de Castilho, já prati cada por Machado de Assis, por exemplo; o uso uniforme do decassllado sáfico se eclipsa; com- bate-se a "frouxidão" do verso romântico, isto é, há tendência quase invencível em poetas como Alberto de Oliveira, à prática da smalefa e da smérese, quase desaparecendo a diêrese e o hiato, isso pelo "horror ao hiato", adquirido náo nos clássicos da língua, mas em manuais franceses. Começa a existir a preocupação da “ nma nca", isto é, rara, ou então e de preferência resultante da combinação de categonas gramaticais diferentes (um substantivo náo devia rimar com outro substantivo, mas com um adjetivo, verbo, advérbio, etc.); condena-se a homofoniadas nmas, isto é, o fato de as ordens de rimas possuírem a mesma vogal tônica, como nos tercetos de Bilac:
Direis agora: “Tresloucado amigo! Oue conversas com elas7 Que sentido Tem o que dizem, quando estão contigo?"
E eu vos direi: "Amai para entendê-las! Pois só quem ama pode ter ouvido Capaz de ouvir e de entender estrelas".
O verso branco quase nâo é usado; prevalecem as "formas fixas", indo-se buscar além-mar o tnolé, o rondó, o rondei, o pantum e outros tipos, e cultuando-se absorventemente o soneto. Este é usado em quase todas as modaídades possíveis, exceto algumas do cultismo, entre as quais o labinnto; excluem-se também o soneto de três quadras e um dístico, nas variedades maroti * que, inglesa ou baudelairiana. Assim, usam-se sonetos de tercetos à frente, como em "Gelo po lar", de Venceslau de Queirós; de tercetos intercalados, ou de metros desiguais (vide "Suave mari magno", de Machado de Assis), coisa que era de uso geral, praticada ainda que foi, com maior ou menor freqüência, por Luís Delfino, Raimundo Correia, Filinto de Almeida, Arlhur Azevedo e ou tros. Claro está que essa invenção de formas não-canômcas de soneto não foi originariamente brasileira, mas atrtaui-se a Baudelaire. Deu ele nmas no todo ou em partes independentes às qua dras de muitos de seus sonetos, segundo os modelos abba/cddc ou abab/cdcd ou ainda abba/ac- ca ou abab/cbcb ("Le tonneau de la haine"); chegou a emparelhar as rimas nas quadras ou mes mo por todo o soneto ("Sur le tasse en pnson"); compôs sonetos com tercetos abnndo-os ("Bien loin d'icO ou com metros desiguais ("Le chat", de 10 e 8 sílabas; “ La musique", de 12 e 15 síla bas). Em nosso meo, "A derradeira injúna", de Machado de Assis, com pendia essas variedades de soneto, das quais é uma espécie de epftome.
Os parnasianos e seus epígonos
Advindo o Parnasianismo, eclipsam-se as correntes anteriores, como Realismo, Socialismo e poesia filosófico-cientffica, ficando os parnasianos praticamente soznhos, excluída, natural
162 - Revista USP Seiomòro. Oututxo e NoveontxcV 1989
Mais le matm olles quittent les branches: Comme un colher qui s’égrêne, on les voil S'éparpiller dans l‘air bleu, toutes blanches, Et se poser plus loin sur quelque toU.
Mon áme est Tarbre ou tous les soirs, comme eUes, Oes blancs essaims de folies visions Tombent des cieux, en palpitant des ailes Pour s’envoler dès les premiers rayons.
Outro trecho de Gautier foi trazido á baila por lufs Mural, que tachou Raimundo de plagiário, em diversas poesias. Citou ele, como argumento final, as linhas de Madomoisolle deMaupin: "Si tu viens trop tard, ô mon idéal' je n’aurai plus Ia force de taimer; mon âme est comrre un colombier tout piem de colombes. À toute heure du jour il s’envole quelque désir. Les colombes reviennent au colombieí, mais les désirs ne reviennent pomt au coeur". Armouse a propósito dessas increpações uma celeuma, da qual resultou como saldo a oonvicção de que Raimundo Correia, como verdadeiro artista, superara o texto francês, no caso de haver-se utilizado dele. O própno poeta jamais respondeu diretamente à acusação, noas em carta a Gaspar da Silva endossou a opinião expendida a respeito por Valentim Magalhães: "Pare- ce-me que o Valentim com toda a singeleza de àrwmo o sem esses assomos de falsa e vaporosa erudição, quo somente aos inexpertos iludem, tornou mais uma vez claro e patente que as obras do arte dos mestres insignes têm um fim mais elevado do que deliciar-nos o espírito e é educá-lo. que não constitui plágio fazer que floresçam, sem que desbotem, à luz de outro sol e sob a in fluência de outros cimas, belezas de estranhas línguas, porventura mais opulentas do que a nos sa, nem o constitui tampouco ir beber nas grandes fontes da arte as inspirações’. Mais tarde, em nota à 1* odição das Poesias, declara que nos versos do Sinfonias ó bem sens/vel à influência dos poetas estrangeiros mais em voga, quando da redação do volume, entre os estudantes de São Paulo; e cita Victor Hugo, Gautier e os parnasianos franceses, "de que era o autor um sincero e fervente entusiasta". Mais adiante, confidencia que a idéia de "O vinho de Hebe“ lhe foi mais di- rotamente sugerida por uns belos alexandrinos de madame de Ackermann em suas Poósies phh losophiques. Posteriormente o nome do livro surgiria emendado: Premières poósies.
O v e r s o s de madame de Ackermann são os seguintes, segundo os cita Múcio Leão:
Les yeux baissés, rougissanto et candide, Vers leur banquet, quand Hêbé s‘avança«l, Les dieux charmés tendaient leur coupe vide. Et de néctar Tenlant Ia rempfcssait. Nous aussi, quand passe la Jeunesse, Nous lui tendons notre coupe à Tenvi. Quel est le vm qu'y verse la dóesse Nous 1'ignorons; il emvre et ravit. Ayant soun dans sa grâce immorteWe, Hébé s’ék»gne. on la rappele en vam. Loogtemps encor, sur la route êtemelte, Notre oeil en pleurs suit féchanson divm.
Este é o soneto de Raimundo, na versão final:
Quando do Olimpo nos festins surgia E o vinho do prazer, em nossa taça Hebe risonha, os deuses majestosos Verte-nos ela, verte-nos e passa... Os copos estendiam-lhe, ruidosos, Passa, e não toma atrás o seu caminho. E ela, passando, o copo lhes enchia... Nós chamamo-la em vão; em nossos lábios A Mocidade, assim, na rubra orgia Restam apenas tímidos ressábios, Da vida, alegre e pródiga de gozos, Como recordações daquele vinho. Passa por nós, e nós também, sequiosos, Nossa taça estendemos-lhe, vazia...
Se a poesia de madame Ackermann inspirou a do Raimundo, náo resta dúvida de que o pnncfpto árcade da imitação superadora o absolvena tranqüilamente. Outras poesias de Raimundo
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foram também increpadas de plágio, mas o vocábulo não parece bem aplicado. Concedido mesmo que sem o ponto de partida de Gautier náo houvesse "As pombas", como queria Said Ah, ainda assm a idéia de comparar sonhos (ou dusóes. desejos, etc.) com pombos nada oferece de sin gular; poderíamos citar exemplos antenores em nossa poesia, para mostrar que a comparação, ao tempo de Raimundo, tendia ao topos. Assim: Machado de Assis. “Versos a Conna“, III, 1-2 ( Crisá lidas. 1864):
Ouando voarem minhas esperanças Corro um bando de ponrtias fugitivas,
ou Alberto de Oliveira ("Tenebrosa", em Canções românticas, 1878):
Eu que espalhei por todo o céu meus sonhos, Que soltei pelo azul das alvoradas Esse bando de pássaros risonhos. Essas pombas sagradas.
A idéia de as pombas irem e voltarem, de mera observação, não é tão extraordinána que exija, também, filiação a Gautier. Não há pois que cuidar de plágio, mas, no máximo, de sugestão. Para alguns, como João Ribeiro, “em Raimundo Correia, como em todos os máximos poetas e escritores, a questão da originatdade é insignificante. Estes e aquele estão sempre acima dos ori ginais em que se inspiram". Eis aí reproduzida, em tempos mais recentes, o pnncípio da imitação superadora dos árcades, como já dissemos. Ou, noutros termos, o plágio náo consiste no fato de um escritor inspirar-se em toma alheio, mas sim em apropriar-se de expressão alheia. "Georges Rodenbach" - recorda-o Júlio Dantas - distingue “entre aqueles profissionajs que, em literatura, roubam a moeda já cunhada, e aqueles - criadores apesar de tudo - que cunham de novo o ouro alheio". E tal linha de pensamento já era, como se vê no mesmo trabalho de Dantas, de Zola e D‘Annunzio. Raimundo Correia usou seu próprio cunho, como o demonstra o fato de “As pombas” terem sido parafraseadas ou evocadas por toda forma, das simples alusões a mais amplas e dis farçadas referências. Quanto a uma simples alusão, veja-se por exemplo esta quadra de "Folha solta", de Vicente de Carvalho (Relicáno):
Que sonhos - línos abertos Em nossas almas, então! Que formosas esperanças Como soltas pombas mansas Pelo céu do coração!
E, quanto às referências encapuzadas. "Ilusões", de Medeiros e Albuquerque:
Velas fugindo pelo mar em tora... Velas... pontos - depois... depois, vazia, a curva azul do mar, onde, sonora, canta do vento a triste salmodia...
Parlem, pandas e brancas... Vem a aurora e vai a noite após, muda e sombna... E, se em porto distante a frota ancora, é pra partir de novo em outro dia...
Assim as Ilusões. Chegam, garbosas. Palpitam sonhos, desabrochsrr rosas na esteira azul das peregrinas frotas...
Chegam... Ancoram na alma um só momento... Logo. as velas abrindo, amplas, ao vento, fogem pra tonges solidóes remotas...
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Também um soneto de Antônio Nobre (datado de Leça, 1885) evoca diretamente "As pom bas” , trata-se de "Menino e moço’*, de Só (como acentuou Humberto de Campos):
Tombou da haste a flor da minha infância alada, Murchou na jarra de oiro o pudico jasmim: Voou aos altos céus a pomta enamorada Que dantes estendia as asas sobre mim.
Julguei que fosse eterna a luz dessa alvorada, E que era sempre dia, e nunca tinha fim Essa visâo de luar que vivia encantada, Num castelo de prata embutido a marfim»
Mas, hoje, as pombas de oiro, aves de minha infância, Que me enchiam de Lua o coração, outrora, Partiram e no Céu evotam-se a distância!
Debaide clamo e choro, erguendo aos Céus meus ais: Voltam na asa do Vento os ais que a alma chora, Elas, porém, Senhor! elas não voltam mais...
Há de resto em Primeiros versos uma poesia con* posta em agosto de 1883, "Dezesseis anos", que começa com o verso “ Raia sanguínea e clara a madrugada fresca" - adverte Manuel Bandeira - e isso reforça a vmculaçáo acima. Como se vê, não é tão simples o caso de "As pombas", nem sua propalada falta de ongina- lidade impediu que o soneto se celebnzasse e por seu turno influísse noutros poetas - o que trai a existência de expressão nova e sugestiva. E aqui é que bate o ponto, como já vmos. Outros parnasianos não se eximiram da pecha de ter-se valido de poetas estrange*os, como se deu, bem ou mal, com Albertc de Oliveira, sobre quem também Luís Murat apontou vánas influências, ou corr Vicente de Carvalho, cuja “ Última confidência" afirmam ter parentesco com Maeterlmck. De Bilac murta coisa se asseverou injustifi- cadamente, mas parece-nos fora de dúvida que "A morte do tapir" aprimora apenas "A morte do Tupi", do Barão de Paranapiacaba. O "Ouvir estrelas" não se radica, como imagina Agnpino Grie- co, em Arsène Houssaye, mas preferivelmente em Álvares de Azevedo, cujo Conde Lopo, publi cado em 1886, náo pode ter sido ignorado por Bilac, ou talvez em Heme. Os versos do Houssaye, segundo suponho, uma vez que Agripino não os reproduz, devem ser os que constam do livro Les onze mille vierges, "Apollon et Daphné": "... comme on voit au travers des érables/Les étoiles du soir se parlant dans les cieux". Isso é muito menos que o trecho de Álvares de Azevedo, |á citado por Fausto Cunha em 1954, "... por que assim imóvel
Do teu olhar o azul nos céus parado Com as estrelas conversar parece9"
ou esse e outro que eu própno apontei em 1957, a linguagem tema
Das aves da solidão é-te uma língua Que tu entendes só - e cada estrela Que te fita do céu fala-te, e n'alma Decifras-lhe o falar" (Canto 39, IV),
junto com vánas reminiscências do autor da Ura dos vinte anos em Bilac. É ver a introdução que escrevi para as poesias de Azevedo (São Paulo, Saraiva, 1957, p. 25, hoje em Do Barroco ao Modernismo, 2* ed., Rio de Janeiro, Livros Técnicos e Científicos, 1979, pp. 139 s.). Mas não vale a pena insistir no assunto. Ninguém se exime de influências, e os poemas in fluenciados. em todos os casos que citamos, nâo desdouram quem sofreu a influência. O que, convenhamos, já não é pouco.
Avaliação do Parnasianismo
Asseverava a crítica do tempo - e isso se tornou um lugar-comum, repetido até por Máno de Andrade - que os nossos parnasianos se tomaram dignos de nota quando se afastaram dos
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pnncfpws da escola, como a impassibilidade ou a objetividade. Quando, em suma, foram eles mesmos, e nâo repetidores de figurinos alheios. Não tem cabimento, pois, querer ignorar no conjunto de nossa literatura, como às vezes fa zem alguns inocentes fantasiados de críticos, a parte mais pessoal da poesia de figuras como Machado de Assis, Raimundo Correia, Olavo Bilac, Vicente de Carvalho, Alberto de Oliveira. Esses entojos modernosos não resistem a uma análise mais séria, para quem conhece o conjunto de nossa poesia* Se o Parnasianismo passou, como passam todas as correntes, se en sejou o aparecimento de uma chusma de poetas medíocres, desse mal não se eximiram nem se eximem as escolas em geral, sequer o Modernismo. Já Mário de Andrade rogava que nâo imitas sem nem a ele nem aos outros modernistas da pnmeira hora, para nâo barateá-los, nâo cobri-los de vulgaridade. Assim, o Parnasianismo merece exame e estudo ao mesmo título que o Barroco, o Arca- dismo, o Romantismo, o Simbolismo. Nâo foi a corrente suprema que muitos imaginaram no sé culo passado e começos deste, mas também nâo foi a página em branco que outros supõem, ver dade que movidos jx)r simples preconceito ou mera ignorância. Está bem que Thibaudet assevere dos parnasianos franceses (mas excluídos Gautier, Leconte, BanviHe, Ménard. Bouilel e ... Bau delaire) que, se não houvessem existido, isso tena sido lamentável, mas a poesia francesa nada de substancial teria perdido. Argumentos desse gênero podem repetir-se indefinidamente. O Cé sar de Bernard Shaw, por exemplo, não reputava de importância o incêndio da Biblioteca de Ale xandria, mesmo ao preço de com ela se perder a memóna da humanidade, para ele indigna de conservação. Já muitos disseram, inclusive Moréas e Gide, que a França náo apresenta, como a Inglaterra, uma sucessão de grandes poetas, mas grandes poetas isolados; assim, o argumento de Thibaudet, mesmo na literatura francesa, não deveria atingir apenas os parnasianos menores, mas numeroso rol de poetas. De mais a mais, no Brasd, quando a influência parnasiana já desapareceu, nâo há por que combater as sombras passadas. Em nome do Modernismo? Este já nâo precisa disso. Mas te nha-se presente um argumento capital: embora os modernistas de 22 e 30 não soubessem das origens do verso livre em nosso meio, já hoje demonstramos que o introdutor do verso livre no Brasil foi Alberto Ramos, em 1894, sob o pseudõnmo de Marcos de Castro, na tradução dos Poemas do Mar do Norte , de Heme. E Alberto Ramos, embora ligado aos poetas simbolistas, foi também companheiro de Bilac e poeta parnasiano. Assim, a forma de que os modernistas se utili zaram avassaladoramente, o verso livre, inclusive para se afirmar contra o Parnasianismo, foi primeiro usada por um parnasiano, Alberto Ramos, seguido por Guerra-Duval e só depois por Ma nuel Bandeira, ainda na faixa do Simbolismo. O desconhecimento histórico dos fatos literários, em nossa terra, ó de estarrecer. Mas se ultimamente só é ouvido quem trombeteia mais alto, não é para todos que esse sound and fury significa alguma coisa: afinal, o som das trombetas passa mais depressa do que se imagina.
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