Docsity
Docsity

Prepare-se para as provas
Prepare-se para as provas

Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity


Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos para baixar

Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium


Guias e Dicas
Guias e Dicas

Abordagem Multidisciplinar na Incontinência Fecal: Pressões Anorretais e Funcionalidade An, Notas de aula de Anatomia

Este documento discute a importância de abordar a incontinência fecal de forma estruturada e abrangente, considerando as diferentes subtipos e causas. Ele descreve a função do sistema anal, incluindo a importância do reflexo reto-anal inibitório e do esfíncter anal externo (eae). Além disso, o texto aborda a importância de avaliar a sensibilidade do canal anal e a possibilidade de utilizar exames complementares, como manometria anorretal e ecografia endoanal. O documento também menciona a importância de avaliar a história clínica do paciente e utilizar questionários para avaliar a qualidade de vida do paciente.

O que você vai aprender

  • Quais são os três subtipos de incontinência fecal?
  • Qual é a função principal do reflexo reto-anal inibitório?
  • Quais exames complementares podem ser utilizados para avaliar a incontinência fecal?
  • Qual é a importância de abordar a incontinência fecal de forma estruturada e abrangente?
  • Qual é a importância de avaliar a sensibilidade do canal anal?

Tipologia: Notas de aula

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Reginaldo85
Reginaldo85 🇧🇷

4.5

(72)

219 documentos

1 / 44

Toggle sidebar

Esta página não é visível na pré-visualização

Não perca as partes importantes!

bg1
INCONTINÊNCIA FECAL: ABORDAGEM
PASSO A PASSO
FANI SUSANA LEITE RIBEIRO
Dissertação de Mestrado Integrado em Medicina
Artigo de Revisão Bibliográfica
Ano Letivo 2012/2013
ORIENTADORA: DRA. ANA MARGARIDA PINHEIRO POVO
CO-ORIENTADOR: PROF. DR. FERNANDO MANUEL DE CASTRO POÇAS
Porto, junho de 2013
pf3
pf4
pf5
pf8
pf9
pfa
pfd
pfe
pff
pf12
pf13
pf14
pf15
pf16
pf17
pf18
pf19
pf1a
pf1b
pf1c
pf1d
pf1e
pf1f
pf20
pf21
pf22
pf23
pf24
pf25
pf26
pf27
pf28
pf29
pf2a
pf2b
pf2c

Pré-visualização parcial do texto

Baixe Abordagem Multidisciplinar na Incontinência Fecal: Pressões Anorretais e Funcionalidade An e outras Notas de aula em PDF para Anatomia, somente na Docsity!

INCONTINÊNCIA FECAL: ABORDAGEM

PASSO A PASSO

FANI SUSANA LEITE RIBEIRO

Dissertação de Mestrado Integrado em Medicina Artigo de Revisão Bibliográfica Ano Letivo 2012/

ORIENTADORA: DRA. ANA MARGARIDA PINHEIRO POVO

CO-ORIENTADOR: PROF. DR. FERNANDO MANUEL DE CASTRO POÇAS

Porto, junho de 2013

FANI SUSANA LEITE RIBEIRO

INCONTINÊNCIA FECAL: ABORDAGEM PASSO A PASSO

Dissertação de Mestrado Integrado em Medicina submetida no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar. Artigo de Revisão Bibliográfica Ano Letivo: 2012/

Orientadora: Doutora Ana Margarida Pinheiro Povo Título profissional: Assistente Hospitalar de Cirurgia Geral do Centro Integrado de Cirurgia de Ambulatório do Centro Hospitalar do Porto Assistente convidada de Anatomia Clínica da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto

Co-orientador: Professor Doutor Fernando Manuel de Castro Poças Título profissional: Assistente Hospitalar Graduado de Gastrenterologia do Centro Hospitalar do Porto. Professor Auxiliar Convidado do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, Universidade do Porto

Porto, junho de 2013

Índice

  • Lista de Acrónimos……………………………………………….………………………..………
  • Resumo…………………………………………………………………………………..……..….
  • Abstract ..……………………………………………………………………………….......………
  • Introdução………………………………………………………………………..………………...
  • Fisiologia anorretal………...………………………………………………………………..…...
  • Abordagem clínica da incontinência fecal…………………………………………..………...
      1. Diagnóstico ……………………………….…..………………………………..……
      • 1.1. História clínica………….…………………………..…………………...
      • 1.2. Exame físico……………….………………………………………....…
      • 1.3. Exames complementares de diagnóstico ………………………..….
        • 1.3.1. Teste de infusão salina……………………………………..…
        • 1.3.2. Manometria anorretal e testes de sensibilidade……………
        • 1.3.3. Imagiologia do canal anal…………………………………..…
        • 1.3.4. Técnicas de electroestimulação……………………………...
      1. Tratamento…………………………….………………………………………….….
      • 2.1. Modificação de hábitos……………….………………………………..
      • 2.2. Terapia farmacológica…………………………………...……….……
      • 2.3. Fisioterapia do pavimento pélvico…………………………………....
      • 2.4. Biofeedback ………………………………………………………….….
      • 2.5. Neuromodulação…………………….………………………………....
        • 2.5.1. Estimulação do nervo sagrado…………………………….…
        • 2.5.2. Estimulação percutânea do nervo tibial…………………..…
      • 2.6. Tratamento cirúrgico…………………………………….…………..…
        • 2.6.1. Reparação de esfíncter…………………………………...…..
        • 2.6.2. Neo-esfíncteres……………………………………………..….
        • 2.6.3. Colostomia………………………………………………….…..
  • Conclusão………………………………………………………………………………………...
  • Bibliografia……………….………………………………………………………………………..
  • Tabela 1- Etiologia da incontinência fecal…………………………………..………………….. Índice de tabelas
  • fecal…………………………………………………………………………………..…………… Tabela 2- Informação importante a obter na história clínica do doente com incontinência
  • manometria…………………………………………………………..………….……………….. Tabela 3- Valores de referência da pressão anal e da sensibilidade retal obtidos por
  • Tabela 4- Avaliação da estrutura e função anorretal……………………………..…….……
  • Tabela 5- Fármacos que podem exacerbar a incontinência fecal………………...……..…
  • Tabela 6- Modalidades de tratamento por Biofeedback …………………………..…………
  • Figura 1- Anatomia anorretal: corte coronal………………………………………………….. Índice de figuras
  • Figura 2- Configuração anorretal em repouso e durante a defecação…………………..…
  • saudável e num doente com incontinência fecal…………………………………….………. Figura 3- Pressões anorretais obtidas por manometria de alta resolução num indivíduo
  • Figura 4- Teste do balão retal………………………………………………………………..…
  • Figura 5- Ecografia endoanal……………………………………………………………...……
  • Figura 6- Fases de uma defecografia normal…………………………………………………
  • Figura 7- PTNML………………………………………………………………..………………..
  • Figura 8- Estimulação do nervo sagrado………………………………………………………
  • Figura 9- Estimulação percutânea do nervo tibial…………………………………………….
  • Figura 10- Reparação de esfíncter…………………………………………………..…………
  • Figura 11- Graciloplastia dinâmica…………………………………………………………..…
  • Figura 12- Esfíncter artificial…………………………………………………….………………3
  • Figura13- Algoritmo de abordagem da incontinência fecal………………………………….

Resumo

A incontinência fecal é definida como passagem involuntária ou incapacidade de controlar a perda de matéria fecal, incluindo gases, através do ânus. Apesar de não ser uma doença fatal, está associada a uma elevada morbilidade e envolve os doentes numa grande ansiedade e vergonha. Esta dissertação surge com o propósito de, através da revisão da literatura científica publicada entre 2002 e 2012, criar um algoritmo de abordagem à incontinência fecal. Foram revistos artigos selecionados com recurso à Pubmed e à Ovid focados na incontinência fecal, sua etiologia, fisiopatologia, diagnóstico e tratamento. É fundamental uma abordagem adequada no estabelecimento da etiologia e no tratamento da incontinência fecal que passa por uma história clínica precisa e um exame físico completo e minucioso que, caso seja necessário, direcionam a escolha dos métodos complementares de diagnóstico adequados. Tal pode ser complementado com scores criados e validados para ajudar médicos e doentes a quantificar a severidade dos sintomas e o seu impacto na qualidade de vida, bem como para planear estratégias de tratamento. O seu tratamento pode ser médico, conservativo e não invasivo, cirúrgico ou por neuromodulação. Assim, a abordagem da incontinência fecal deve ser abrangente e estruturada para que se possa tratar individualmente o doente; o que é adequado para uns, pode ser completamente inaceitável para outros.

Palavras-chave: Incontinência fecal, biofeedback , estimulação nervosa, esfincteroplastia, neo-esfíncteres.

Abstract

Fecal incontinence is defined as either the involuntary passage or the inability to control the discharge of fecal matter, including intestinal gas, through the anus. Despite not being a fatal disease, it is associated to an increased morbidity and involves the patients in anxiety and shame. The purpose of this dissertation is to review the scientific literature published between 2002 and 2012 in order to create an algorithm for fecal incontinence’s approach. There were reviewed articles selected from Pubmed and Ovid focused on fecal incontinence, its etiology, physiopathology, diagnosis and treatment. An adequate approach is fundamental on the establishment of the etiology and on fecal incontinence’s treatment and that implies an accurate clinical history and a complete physical examination which directs to the choice of the necessary complementary exams. This can be complemented with scores created and validated with the purpose to help doctors and patients to quantify the severity of the symptoms, their impact on life’s quality and to plan treatment’s strategy. Treatment can be medical, conservative and non- invasive treatment, surgical or by neuromodulation. So, fecal incontinence’s approach must be extensive and well-structured to treat the patient individually; what is proper for one can be completely unacceptable to the others.

Key words: Fecal incontinence, biofeedback, nervous stimulation, sphincteroplasty, neosphincters

Tabela 1. Etiologia da incontinência fecal

Categoria Etiologia

Esfíncter Parto vaginal, cirurgia anorretal, cancro anal ou retal, malformações anorretais

Fezes Diarreia: DII, diarreia infeciosa, abuso de laxantes, enterite rádica, síndrome do intestino curto Obstipação: alimentação, medicamentos obstipantes, demência

Neurológico Neuropatia do pudendo, DM, lesões da medula espinhal, neuropatia do pudendo, esclerose múltipla, doenças congénitas (meningocelo, mielomenigocelo), distúrbios SNC (AVC, trauma, infeção, tumores)

Reto Prolapso retal, neoplasias retais, fístulas anais, proctite rádica, agenesia retal, malformações anorretais

A estratégia de tratamento da incontinência fecal depende essencialmente da sua causa específica, da extensão do problema e da idade do doente. Não obstante, a chave central assenta na qualidade de vida do doente e é para este fator que todos os esforços devem ser dirigidos (8). Neste sentido, o objetivo desta revisão é a criação de um algoritmo de abordagem da incontinência fecal. Com recurso à Pubmed e Ovid foram selecionados 61 artigos em inglês, alemão e francês. Procedeu-se ainda ao cruzamento bibliográfico de 11 artigos, obtendo-se um total de 72 citações, sobre incontinência fecal, sua etiologia, fisiopatologia, diagnóstico e tratamento.

Fisiologia anorretal

A continência fecal é mantida pela integridade estrutural e funcional da unidade neuromuscular anorretal e do pavimento pélvico mas, qualquer alteração na sua anatomia ou fisiologia leva a incontinência.

O reto é um tubo muscular de 12 a 15 cm, composto por um músculo longitudinal contínuo que se interlaça com o músculo circular subjacente. Este arranjo muscular permite que funcione como reservatório, conseguindo acomodar-se passivamente à distensão, e como propulsor de fezes (3) (8). Durante a sua distensão há uma diminuição da pressão de repouso anal num processo designado de reflexo reto-anal inibitório e mediado pelo plexo mioentérico, cuja amplitude e duração aumenta com o volume da distensão retal. Apesar deste reflexo facilitar a descarga de gases, a distensão do reto está também associada a uma resposta contrátil anal, ou seja, a um esforço subconsciente refléxico- reflexo reto-anal excitatório- que vai prevenir a libertação de conteúdo retal, bem como dos gases. Esta resposta contrátil envolve a contração do esfíncter anal externo (EAE) e é mediada pelos nervos pudendo e esplâncnicos pélvicos. Quando a compliance retal está comprometida, um pequeno volume de fezes consegue gerar uma pressão intra-retal elevada, que ao ultrapassar a resistência anal gera incontinência (9). Além disso, a diminuição da sua capacidade e do volume máximo tolerável está diretamente relacionada com o aumento da frequência das defecações e diminuição da continência, pelo aumento de pressão retal a volumes cada vez menores (8).

O ânus é um tubo muscular de 2 a 4 cm que em repouso forma um ângulo de cerca de 90º com o reto. Durante a contração voluntária este ângulo torna-se mais agudo, enquanto durante a defecação ele fica mais obtuso. O ânus mantém-se normalmente fechado pela atividade tónica do EAI, sendo esta barreira reforçada pelo EAE durante a contração voluntária (3). Assim, um componente preponderante para a manutenção da continência é o esfíncter anal, que é extremamente dinâmico,

Figura 1. Anatomia anorretal: corte coronal (39)

passam ao longo dos nervos esplâncnicos pélvicos e são independentes do nervo pudendo (9). Uma sensibilidade intacta permite perceber a iminência da defecação, bem como a capacidade de discriminar entre gases, fezes sólidas e líquidas. A perceção da distensão causada pelas fezes ainda não está completamente esclarecida, mas parece estar confinada ao reto, que com a sua inervação parassimpática de S1, S2 e S3, ajuda a manter a continência. Se esta estiver comprometida, pode haver acumulação excessiva de fezes, causando impactação fecal, mega-rectum ou overflow fecal (9).

Os músculos do pavimento pélvico também exercem uma função importante na manutenção da continência, nomeadamente o músculo elevador do ânus, constituído pelos músculos pubococcígeo e íleococcígeo. O levantador do ânus é um músculo crítico no suporte do conteúdo abdomino-pélvico e, por isso, na evicção de prolapsos, sendo um componente ativo contra a pressão intra-abdominal. A sua constante contração permite a manutenção da continência ao tracionar a junção anorretal para a frente, formando um ângulo anorretal a cerca de 90º (12). O músculo puborretal também exerce uma função essencial na anatomia e fisiologia anorretal. Este músculo origina-se na face posterior do púbis, passa à volta da junção anorretal e decussa com fibras do lado oposto, de forma a constituir uma espécie de corda à volta desta junção. Em repouso, a sua tração contrátil, bem como a dos restantes músculos do pavimento pélvico, mantém o ângulo anorretal de 90º, o que ajuda a manter a continência. Em caso de urgência defecatória, e se a defecação não for conveniente no momento, o EAE e estes músculos são contraídos voluntariamente, o ângulo anorretal torna-se mais agudo, o pavimento pélvico eleva-se e a zona de alta pressão do canal anal alonga-se (13) (11) (Figura 2). O músculo puborretal é inervado por ramos diretos das raízes anteriores de S3 e S4, pelo que não acompanham o nervo pudendo. Assim, este e o EAE têm inervações distintas, pelo que o bloqueio do nervo pudendo elimina a função do EAE mas não a contração voluntária do pavimento pélvico. A continência permanece desta forma preservada se houver dano dos esfíncteres, mas não do músculo puborretal, ou vice-versa (9).

Figura 2. Configuração anorretal em repouso e durante a defecação (27)

Abordagem clínica da incontinência fecal

1. Diagnóstico A incontinência fecal pode ser causada por fatores simples ou complexos que, por sua vez, podem ser reversíveis ou irreversíveis. Não se trata de um diagnóstico por si só, pelo que os médicos devem ser proactivos e sensíveis na abordagem do problema.

1.1 História clínica

A avaliação da incontinência fecal deve ser dirigida para a causa e para o estado funcional do doente (8), sendo importante que a história clínica seja detalhada, abordando as suas possíveis causas e a frequência, severidade e duração dos episódios, bem como o impacto na qualidade de vida do doente, incluindo a capacidade deste sair de casa para o trabalho ou para atividades sociais. Este deverá também ser questionado sobre a existência de outros sinais/sintomas abdominais, doenças sistémicas conhecidas, procedimentos anorretais locais como hemorroidectomia, partos vaginais, medicação e dieta. O médico deverá ter em conta que a incontinência pode ser secundária a outras condições, que podem ser graves, sobretudo se houver uma alteração inexplicada do trânsito intestinal, perda de peso, anemia, hemorragias retais, diarreia noturna ou severa e massas abdominais ou pélvicas (14) (tabela 2).

Depois da entrevista clínica, o médico deverá ser capaz de categorizar o tipo de incontinência e classificá-la como ligeira, moderada ou severa. No que concerne esta classificação, deve-se ter em conta que se a entrevista focar apenas nas questões fisiopatológicas do problema, pode ocorrer uma subvalorização da classificação, dado que vez que os doentes ficam particularmente ansiosos com a imprevisibilidade dos episódios, comprometendo severamente as suas atividades (5). Assim, existem diversas escalas e questionários validados que, para além de ajudarem a determinar o tipo e

Tabela 2. Informação importante a obter na história clínica do doente com incontinência fecal (3)

  • Data de início e fatores precipitantes
  • Duração e severidade
  • Consistência das fezes e urgência
  • Comorbilidades/cirurgias prévias/ incontinência urinária/ lesões vertebrais
  • História obstétrica: fórceps, ventosas, apresentação do feto
  • Fármacos, cafeína, dieta
  • História de impactação fecal

que a sua observação poderá alertar o clínico para uma possível fraqueza dos esfíncteres (16).

A pesquisa do reflexo anocutâneo permite determinar a integridade da conexão entre os nervos sensoriais e a pele, os neurónios intermediários dos segmentos S2, S3 e S4 da espinal medula e a inervação motora do esfíncter anal externo. Pode ser avaliado através da passagem de um cotonete ou uma espátula em cada um dos quadrantes perianais. A resposta normal consiste na contração do EAE. Se este reflexo não estiver presente ou se for diminuído significa que há um dano neuronal aferente ou eferente, como uma neuropatia do pudendo ou uma lesão da cauda equina (3) (8).

1.2.2 Exame digital do reto

Através do exame digital do reto é possível ter perceção do tónus dos esfíncteres interno e externo, quer em repouso quer em contração, respetivamente, do comprimento do canal anal, do ângulo anorretal, da força do músculo anal e da elevação do peritoneu durante a contração voluntária. No entanto, a sua fiabilidade enquanto teste objetivo para a avaliação da função dos esfíncteres tem sido discutida, uma vez que é influenciado por vários fatores, como a experiência do observador, o tamanho do seu dedo, a técnica utilizada e a cooperação do doente (3) (17).

1.3 Exames complementares de diagnóstico

Exames complementares de diagnóstico específicos ajudam a completar a avaliação clínica e permitem uma avaliação objetiva, ajudando a fazer um diagnóstico mais preciso da causa da incontinência. No entanto, apesar de serem úteis para determinar o melhor tratamento a instituir de acordo com a causa da incontinência, não há nenhum teste objetivo que possa ser considerado como o definitivo para a avaliação da função anorretal ou para o diagnóstico da sua etiologia.

Uma investigação adicional pode ser útil para:

  • determinar défices, através de medidas objetivas da função do esfíncter anal, em doentes cuja história e exames iniciais é desproporcional aos achados clínicos, e nos quais há um potencial ganho com a investigação;
  • determinar potenciais candidatos a reparação cirúrgica ou outros tratamentos, através de imagiologia e medidas da função neuromuscular, em doentes com suspeita de terem lesões do esfíncter anal (18).

O primeiro passo é identificar se a incontinência é secundária a diarreia. Se assim for, pode ser útil efetuar proctoscopia, colonoscopia, testes a fezes e mesmo testes respiratórios para despistar outras patologias (19).

1.3.1 Teste de infusão salina

É um método tradicional e simples em que 1500 mL de uma solução salina são infundidos no reto. A maioria dos indivíduos sem incontinência tolera este volume de líquido, mas a maioria dos doentes com incontinência apenas toleram cerca de 500 mL (17). Segundo Rao , é indicado sobretudo para avaliar a melhoria clínica após tratamento cirúrgico ou por feedback (3). No entanto, pelo menos 17% dos indivíduos saudáveis são incapazes de reter 500 mL, o que pode indicar a existência de defeitos subclínicos ou que este volume é excessivo, mesmo para um esfíncter normal, pelo que a relevância deste teste pode ser questionada (17).

1.3.2 Manometria anorretal e testes de sensibilidade

Figura 4. Teste do balão retal. O balão é ligado ao cateter da manometria e introduzido no reto. (18)

(16) (tabela 3).

Além disso, não permite determinar a etiologia da incontinência nem diferenciar entre defeitos dos esfíncteres ou outras causas para a diminuição de pressão, como a desenervação do pavimento pélvico ou dos músculos do esfíncter externo (7). Desta forma, a grande vantagem que a manometria anorretal pode oferecer é a quantificação da disfunção, auxiliando a direcionar o tratamento. Geralmente, doentes com grande disfunção do esfíncter anal externo são candidatos a cirurgia, enquanto que para doentes com moderada função esta se torna irrelevante (22). Além disso, é possível efetuar o exame em ambulatório, permitindo a avaliação da atividade motora sigmóide, retal e anal continuamente num período de 24 horas, o que oferece melhor correlação com a causa dos distúrbios funcionais anorretais.

A par da manometria, também pode ser efetuado o teste do balão retal , onde a insuflação de um balão no reto permite avaliar a sensibilidade retal e testar o reflexo anorretal, tendo por base a premissa de que a distensão retal causa relaxamento do canal anal (23) (Figura 4). Neste exame são obtidas três medidas: o limiar sensitivo retal, que corresponde ao volume mínimo sentido no reto; a sensação de enchimento, ou seja, o máximo de volume injetado no reto que despolete a vontade urgente de defecar; o volume máximo tolerável, referente volume que causa desconforto intolerável, permitindo uma determinação grosseira da compliance retal. Uma manometria normal ou com valores elevados associada a um limiar baixo ou sensibilidade aumentada à

Tabela 3. Valores de referência da pressão anal e da sensibilidade retal obtidos por manometria (17) Pressão anal Pressão de repouso máxima 60 - 120 cmH2O Pressão de contração máxima 120 - 300 cmH2O Sensibilidade retal Primeira sensação (limiar) 20 - 40 ml Volume máximo tolerado 110 - 480 ml

distensão retal sugere que a causa da incontinência está provavelmente no reto (17). Porquanto, os resultados deste teste devem ser interpretados com cuidado, uma vez que uma sensação anormal do reto pode apenas refletir propriedades viscoelásticas anormais em vez de distúrbio sensitivo. Além disso, podem ser variáveis consoante os laboratórios onde são efetuados (23).

A técnica da eletrossensibilidade da mucosa anal também permite testar a sensibilidade do canal anal. É inserido um elétrodo no canal anal (superior, médio e inferior) e a corrente vai sendo gradualmente aumentada até que o doente relate uma sensação de formigueiro (8). Neste caso, doentes com incontinência idiopática têm um limiar de sensibilidade aumentado ou não têm qualquer sensibilidade à electroestimulação (24). De igual forma, o teste de sensibilidade térmica permite inferir a sensibilidade do canal anal, sabendo que este é extremamente sensível a alterações de temperatura e que esta sensibilidade está diminuída em doentes com incontinência (25).

1.3.3 Imagiologia do canal anal

Ecografia endoanal É um exame simples, rápido e pouco dispendioso, que fornece imagens de alta resolução e que possibilita uma avaliação de 360º do canal anal. É passível de ser realizada no consultório, uma vez que não requer preparação ou sedação do doente, e é, em geral, bem tolerada. É obtida uma avaliação anatómica e morfométrica dos esfíncteres, do músculo puborretal e do septo retovaginal, além de permitir avaliar o pavimento pélvico e o ângulo anorretal. Trata-se da técnica de imagem diagnóstica de escolha para providenciar informação sobre os esfíncteres (7) (figura 5), tendo uma sensibilidade e especificidade de aproximadamente 100% para a deteção dos seus defeitos (23).