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respeito da lógica, que é uma condição necessária para a argumentação jurídica em geral, para qualquer manejo do Direito, ...
Tipologia: Notas de estudo
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Não perca as partes importantes!
Tese apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de Doutor em Direito. Orientador: Prof. Dr. José Adércio Leite Sampaio.
Belo Horizonte 2010
FICHA CATALOGRÁFICA Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
Cunha, Ricarlos Almagro Vitoriano C972h Hermenêutica e argumentação: um possível encontro à luz do paradigma ontológico / Ricarlos Almagro Vitoriano Cunha. Belo Horizonte, 2010. 323f. : Il. Orientador: José Adércio Leite Sampaio Tese (Doutorado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em Direito .
Ao Mário Conceição e ao Dalvo Rocha, pela acolhida fraterna em Belo Horizonte. A amizade de ambos é o mais valoroso presente que levo de Minas Gerais.
Aos Professores José Adércio e Álvaro Ricardo pela atenção e lições memoráveis.
Ao Professor Márcio Paiva, por despertar em mim o gosto pela filosofia e tornar mais urbano o solo heideggeriano. Uma referência acadêmica a ser seguida.
Novamente ao Góes, irmão que a vida me reservou, uma eterna amizade que poucos têm a sorte de experimentar. Uma referência de vida que me permitiu este momento acadêmico.
Ao Doido, de um lado cada vez mais desorientado e fiel em sua amizade; de outro, um registro de admiração por sua companhia e torcida eternas.
Ao meu pai Ruyter Carlos, que à beira dos oitenta anos de idade, notoriamente ainda se projeta em meus passos na vida, experimentando efusivamente cada um dos meus momentos. Sem ele nada disso seria possível.
À lindinha, pela cumplicidade no estímulo e na tolerância por tantos momentos distantes, somente explicáveis no profundo sentido que o amor e a família podem ter em nossas vidas.
O presente trabalho é dividido em três partes. Na primeira é estudado o panorama de crise do Direito, associando-o à incorporação do pensamento filosófico e científico moderno, o qual, contaminado por uma pretensão de universalidade e certeza racional, acabou por desumanizar-se. Ademais, o referencial de certeza que fez das ciências da natureza o paradigma científico moderno e também inspirador do Direito sucumbiu, com ele arrastando as estruturas jurídicas que o refletiam. Instalada essa situação de crise, manifestada na baixa efetividade dos direitos consagrados no plano constitucional, elegeu-se o caminho hermenêutico para a sua superação. Entretanto, não poderia obviamente ser ela tomada no matiz clássico, que está envolvido no paradigma sucumbente, mas aquele de índole filosófica, pelo qual são assinalados os caracteres históricos e linguísticos de toda compreensão. Mas mesmo esse modelo que se anuncia com Gadamer, necessita ele de modulações, que ora se apresentam no viés do resgate de uma maior dimensão do outro no processo compreensivo do Direito. Assim, a exemplo do que fez o próprio Gadamer, voltando-se à analítica existencial do homem, desenvolvida na ontologia fundamental de Heidegger, a transcendência e o modo de ser-com (Mitsein) serão resgatados para postular à hermenêutica um encontro com a argumentação, ao que aqui se denominará hermenêutica argumentativa. Como consequência dessa aproximação, pode-se experimentar um ganho compreensivo pelo realinhamento da abordagem do fenômeno e evidenciação de ideologias que permeiam o modo impessoal com que o homem se põe no mundo.
Palavras-chave: Crise das ciências. Pós-modernidade. Matematização do Direito. Heidegger. Fenomenologia. Verdade. Dasein. Fundamento. Hermenêutica filosófica. Argumentação.
Este trabajo es dividido en tres partes. En la primera es estudiado el panorama de crisis del Derecho, ligando él a la incorporación del pensamiento filosófico y científico moderno, el cual, contaminado por una pretensión de universalidad y certidumbre racional, se quedó deshumanizado. Además, el referencial de certeza que hizo de las ciencias de la naturaleza el paradigma científico moderno y también inspirador del Derecho, sucumbió, con ele arrastrando las estructuras jurídicas las cuales le reflejaban. Instalada esa situación de crisis, manifestada en la baja efectividad de los derechos consagrados en el plano constitucional, se eligió el camino hermenéutico para superarla. Sin embargo, no se podría tomarla en el matiz clásico, lo cual está envuelto en el paradigma sucumbiente, sino lo de índole filosófica, por el cual, son señalados los caracteres históricos y lingüísticos de toda la comprensión. Pero incluso este modelo que se anuncia con Gadamer, necesita de modulaciones, las cuales ahora se presentan en el modo del rescate de una mayor dimensión del otro en el proceso comprensivo del Derecho. Así, a ejemplo de lo que hizo incluso Gadamer cuando volvió a la analítica existencial del hombre, desarrollada en la ontología fundamental de Heidegger, la transcendencia y el modo de ser-con (Mitsein) serán rescatados para la postulación del encuentro entre la hermenéutica y la argumentación, al que aquí se denominará hermenéutica argumentativa. En consecuencia de esa aproximación, se puede experimentar un gaño comprensivo en virtud de la reorganización del abordaje del fenómeno y del poner en claro las ideologías que permean el modo impersonal con el cual el hombre se pone en el mundo.
Palabras-clave: Crisis de las ciencias. Postmodernidad. Matematización del Derecho. Heidegger. Fenomenología. Verdad. Dasein. Fundamento. Hermenéutica filosófica. Argumentación.
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Aqui, pretendemos, muito rapidamente, transitar por alguns problemas que ainda penetram na prática jurídica, tais como a subsunção, como herança lógico- formal, e a matematização dos conceitos, como instrumento da segurança jurídica. Por trás de toda crise está o fundamento metafísico da crença na verdade absoluta de uma realidade independente do sujeito. Daí que, em última análise, toda relação do conhecimento seria travada em um sistema complexo, extremado, de um lado, pelo objeto conhecido e, de outro, pelo sujeito cognoscente. Uma diferença indiscutível, mas que não se presta necessariamente a justificar uma cisão. Portanto, implicitamente, procuramos deixar evidente que é essa relação sujeito-objeto que se encontra na base das práticas jurídicas voltadas à busca de um Direito objetivamente válido e, portanto, passível de aplicação sem a intromissão de deformações subjetivas. Ainda que implicitamente, estamos fazendo uma ligação entre Direito e verdade, posto que, sem essa, não há como ele ser desvelado. A analítica existencial do Dasein, aqui explorada parcialmente, servirá para mostrar a insuficiência daquele modelo cognoscitivo que, vendo a verdade como adequação (adequatio intellectus ad rem^1 ), acaba por desconsiderar a subjetividade do sujeito. Mostraremos também que a verdade, vista como verdade da proposição, repousa sobre uma ambiguidade estrutural, já que, antes de a enunciação ser verdadeira, é preciso que já me encontre na verdade do objeto. É só com base nela que poderei fazer enunciações verdadeiras ou falsas. É preciso, pois, que originariamente eu esteja junto ao objeto para que possa, em minha abertura, aí sim conhecê-lo. Esse mostrar-se próprio do fenômeno se dá no desvelamento, designação heideggeriana para a própria verdade. O modelo dicotômico pautado na relação sujeito-objeto desconsidera esse peculiar modo de ser do homem, a par da sua natural condição de estar-no-mundo, expressão complexa que demandará análise para a sua perfeita compreensão. É
(^1) Vide item 4.1.
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também com base nela que veremos a importância do todo referencial em que se inserem os objetos e com o qual já está familiarizado desde sempre o sujeito, tudo isso a permitir uma contundente crítica ao modelo em questão. Portanto, superada essa parcial análise dos existenciais do Dasein, resta-nos concluir pela impropriedade da utilização da relação sujeito-objeto, extremada por polos cindidos, porquanto desconsidera o modo de ser próprio do sujeito ou, mais simplesmente, a subjetividade mesma. Se abalada essa estrutura que, em última análise, serve de base ao modo de “operar” o Direito, então, abrem-se as portas para um repensar o seu próprio ser. Com essas considerações introdutórias, temos um esboço do caminho a ser desenvolvido na primeira parte da obra. Aqui já se deixa insinuar a densidade filosófica do texto, a qual exige imediata justificação. Essa forma de abordar nosso tema não se desvia do foco da Ciência do Direito e mesmo do seu objeto de estudo. Na verdade, pretendemos demonstrar que há uma essência esquecida que se presta a fundamentá-los e essa busca impõe um caminho crítico que possa superar as aporias e contradições em que eles se depararam. Um modo de pensar crítico que possa deixar transparecer a ideologia da técnica, como bem ressalta Ernildo Stein no excerto abaixo (HEIDEGGER, 1996d, p. 43):
Num momento de crise da sociedade brasileira, em que uma falsa segurança é buscada com o sacrifício da liberdade; em que se elabora um projeto nacional comprimido dentro de uma visão tecnocrática, nada melhor que a serena meditação da filosofia. Ela nos ensina a paciência diante da história e a coragem para apostar nas possibilidades que se escondem no risco da liberdade. Ela nos mostrará principalmente o verdadeiro lugar da ciência e da técnica na construção da história humana. Todo o determinismo que se quer imprimir à sociedade brasileira e à consciência nacional, mediante a absolutização da tecnologia, deve ser desmascarado pela consciência crítica instaurada pela filosofia. Ela é um instrumento de libertação das amarras deste novo positivismo tecnocrático com que o sectarismo e o interesse nos querem prender.
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Heidegger assevera (1997, p. 21, tradução nossa^4 ):
A pergunta pelo ser aponta, por conseguinte, para a determinação das condições a priori da possibilidade não só das ciências que investigam o ente enquanto tal, e que por fim se movem já sempre em uma compreensão do ser, mas que ela aponta também para a determinação da condição de possibilidade das ontologias mesmas que antecedem às ciências ônticas e as fundam.
Por isso mesmo, quando Heidegger afirma que “o verdadeiro movimento das ciências se produz pela revisão mais ou menos radical (embora não transparente para si mesma) dos conceitos fundamentais”, complementando que “o nível de uma ciência se determina por sua maior ou menor capacidade de experimentar uma crise em seus conceitos fundamentais” (HEIDEGGER, 1997, p. 20, tradução nossa^5 ), é que já se podem aí ver antecipadas as bases para a formulação de Thomas Khun (2006), no sentido de que a evolução científica verdadeiramente se dá por meio de revoluções e não da progressividade linear de resultados alcançados no âmbito do que denominou ciência normal, embora ele não tenha vislumbrado o fundamento ontológico dessa revolução, como o fez nosso filósofo^6.
(^4) “La pregunta por el ser apunta, por consiguiente, a determinar las condiciones a priori de la posibilidad no sólo de las ciencias que investigan el ente en cuanto tal o cual, y que por ende se mueven ya siempre en una comprensión del ser, sino que ella apunta también a determinar la condición de posibilidad de las ontologías mismas que anteceden a las ciencias ónticas y las fundan.” Para conferência, o texto em alemão: “Die Seinsfrage zielt auf eine apriorische Bedingung der Möglichkeit nicht nur der Wissenschaften, die Seiendes als so und so Seiendes durchforschen und sich dabei je schon in einem Seinsvërstandnis bewegen, sondern auf die Bedingung der Möglichkeit der vor den ontischen Wissenschaften liegenden und sie fundierenden Ontologien selbst.“ (HEIDEGGER, 1977, p. 15). 5 “El verdadero ‘movimiento’ de las ciencias se produce por la revisión más o menos radical (aunque no transparente para sí misma) de los conceptos fundamentales. El nivel de una ciencia se determina por su mayor o menor capacidad de experimentar una crisis en sus conceptos fundamentales.”. Eis o texto em alemão para conferência: “Die eigentlichte Bewegung der Wissenschaften spielt sich ab in der mehr oder minder radikalen und ihr selbst nicht durchsichtigen Revision der Grundbegriffe” (1977, p. 13). 6 A antecipação é confirmada em outra oportunidade (HEIDEGGER, 2009, p. 40): É da essência da existência do homem que a filosofia seja jogada de volta sempre de novo para o começo. E quanto mais radicalmente isso for compreendido, isto é, quanto mais originariamente a investigação (se) deixa evocar para trás, tanto mais seguramente move-se para frente. O avanço nas ciências positivas, seguramente, não consiste no fato de recolher
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Em resumo, as ciências têm no ente o objeto do seu estudo, sendo ele tematizado em face de diversas possibilidades que são abertas pelo próprio ser, daí a necessidade de recuar um passo para, antes de partir de conceitos fundamentais que lhe são dados, a ciência possa repensar esses próprios fundamentos, momento em que se pode dizer que “nenhuma ciência é possível, sem vir acompanhada pela questão que pergunta pelo ser” (HEIDEGGER, 2009, p. 35). A esse ponto retornaremos ao longo da segunda parte do trabalho, momento em que se insinua um caminho na busca de uma possível superação do ponto de vista ancilosado com que o Direito é tomado, o caminho hermenêutico. Mas a hermenêutica que aqui se anuncia está longe daquela tradicional, entendida como “teoria científica da arte de interpretar” (MAXIMILIANO, 1984, p. 1) ou simplesmente, como ciência da interpretação. Não se trata de uma normatização de um processo interpretativo^7 , mas de um acontecer que se experimenta no modo de ser do próprio homem. Hermenêutica é a própria compreensão, a qual, como existencial humano, está aí mais originariamente que qualquer metodologia que lhe pretenda determinar. Por isso mesmo, precederão a exposição da hermenêutica filosófica, algumas notas acerca do método fenomenológico e um avanço sobre a analítica existencial do Dasein, com o estudo dos existenciais da compreensão e da interpretação. Segue-se então uma abordagem dessa hermenêutica, tal como apresentada por Gadamer, onde as suas marcas fundamentais serão expostas. Aqui iremos destacar a relevância da tradição que nos marca em nossa estrutura prévia da compreensão, a qual não nos permite mais assumir um modelo interpretativo asséptico, em que o sentido seja algo no texto, que possa ser resgatado por um procedimento científico
resultados e empilhá-los como sacos num depósito de mercadorias; antes o avanço é sempre e cada vez uma reforma filosófica dos conceitos fundamentais, uma compreensão radicalizada do ente ele mesmo. (^7) Como se depreende em Limongi França: “A interpretação, portanto, consiste em aplicar as regras, que a hermenêutica perquire e ordena, para o bom entendimento dos textos legais” (2008, p. 19).
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Associado a esta ideia, apresenta-se o segundo ponto da tese, que diz respeito à assunção de que sendo um postulado de essência do humano o fato de que é-com os outros, não se pode negligenciar o papel relevante que na compreensão ele assume, exatamente porque “ser-com” é compartilhar a verdade de um mesmo que se apresenta para nós. Assim, é sob a base da mesmidade que o papel realinhador da hermenêutica filosófica (e argumentativa) eclodirá, permitindo a adução de um importante argumento contra as críticas da relatividade que a ela são imputadas. Se o problema inicialmente levantado é a crise do Direito, a hipótese que ora pretendemos ver confirmada é a de que a hermenêutica é um possível caminho para a sua superação, mas não naquela acepção clássica; e sim como hermenêutica filosófica, porém modulada por uma inserção do elemento argumentativo no processo compreensivo.
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1.ª PARTE A CRISE DA MODERNIDADE E O DIREITO EM CRISE
2.1 Da Modernidade
O que é a modernidade? Quando ela começou? Ela já terminou? O foco de nossas reflexões, como já adiantado na introdução, não está voltado à modernidade propriamente dita e ao seu colapso. Sobretudo não temos a pretensão de posicioná-la em termos precisos (se é que tal empreitada é possível), no viés de um relato historiográfico. Daí que as perguntas que iniciam o subitem nos servem apenas de balizas para introduzirmos o tema. Comecemos por situá-la no tempo e no espaço (GIDDENS, 1991, p. 11):
"modernidade" refere-se a estilo, costume de vida ou organização social que emergiram na Europa a partir do século XVII e que ulteriormente se tornaram mais ou menos mundiais em sua influência. Isto associa a modernidade a um período de tempo e a uma localização geográfica inicial, mas por enquanto deixa suas características principais guardadas em segurança numa caixa preta.
Em uma tentativa de definir o moderno, pode-se afirmar ser ele um período marcado pela descontinuidade, ruptura, distanciamento com o que é antigo. Como