


















Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity
Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium
Prepare-se para as provas
Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity
Prepare-se para as provas com trabalhos de outros alunos como você, aqui na Docsity
Os melhores documentos à venda: Trabalhos de alunos formados
Prepare-se com as videoaulas e exercícios resolvidos criados a partir da grade da sua Universidade
Responda perguntas de provas passadas e avalie sua preparação.
Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium
Comunidade
Peça ajuda à comunidade e tire suas dúvidas relacionadas ao estudo
Descubra as melhores universidades em seu país de acordo com os usuários da Docsity
Guias grátis
Baixe gratuitamente nossos guias de estudo, métodos para diminuir a ansiedade, dicas de TCC preparadas pelos professores da Docsity
Este documento aborda as fontes formais e não formais do direito internacional público, com foco nos princípios gerais e no estatuto da corte internacional de justiça. Discutem-se ainda a jurisprudência, a doutrina, o jus cogens e o soft law como fontes importantes no desenvolvimento do direito internacional.
Tipologia: Esquemas
1 / 26
Esta página não é visível na pré-visualização
Não perca as partes importantes!
SUMÁRIO • 1. Conceito; 1.1 Fontes materiais e fontes formais; 2. Fontes formais do Direito Internacional; 2.1 Fontes estatutárias do Direito Internacional: o artigo 38 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça.; 2.1.1 O problema da hierarquia das fontes do Direito Internacional; 2.2 Fontes extra-estatutárias: as outras fontes do Direito Internacional; 2.3 Classificação; 3. Tratado; 4. Costume internacional; 5. Decisões judiciárias: a jurisprudência internacional; 6. Doutrina; 7. Princípios gerais do Direito; 8. Princípios gerais do Direito Internacional Público; 9. Analogia; 10. Equi- dade; 11. Atos unilaterais dos Estados; 12. Decisões de organizações internacionais;
O conceito de fonte do Direito é objeto de controvérsia no âmbito da Ciência Jurídica em geral. Entretanto, parte dessa discussão refere-se apenas à distinção entre fontes materiais e fontes formais, que examinaremos neste capítulo.
A doutrina internacionalista também procura definir as fontes do Direito, que são, para Salem Hikmat Nasser, os “instrumentos ou processos pelos quais surgem ou se permitem identificar as normas jurídicas”^1. Soares afirma que as fontes são “as razões que determinam a produção das normas jurídicas, bem como a maneira como elas são reveladas” 2. De nossa parte, conceituamos as fontes do Direito como os motivos que levam ao aparecimento da norma jurídica e os modos pelos quais ela se manifesta 3.
As fontes materiais são os elementos que provocam o aparecimento das normas jurídicas, influenciando sua criação e conteúdo. Nas palavras de Mazzuoli, “são ma- teriais as fontes que determinam a elaboração de certa norma jurídica”^4.
As fontes materiais são os fatos que demonstram a necessidade e a importân- cia da formulação de preceitos jurídicos, que regulem certas situações. Exemplo de fonte material foi a II Guerra Mundial, cujas atrocidades evidenciaram a relevância de proteger a dignidade humana, impulsionando a negociação e a consagração de algumas das principais normas internacionais de direitos humanos.
As fontes materiais são também “os fundamentos sociológicos das normas in- ternacionais, a sua base política, moral ou econômica” 5. São, portanto, as bases teó- ricas que influenciam a construção das normas, de cunho filosófico, sociológico, político, econômico etc., ou os valores, aspirações e ideais que inspiram a concepção dos preceitos jurídicos, como o desejo de manutenção da paz e de realização da jus- tiça, a proteção da dignidade humana e a mera necessidade de sobrevivência.
As fontes formais são o modo de revelação e exteriorização da norma jurídica e dos valores que esta pretende tutelar, representadas pelas normas de Direito positivo.
Ao conceituar as fontes formais, Soares enfatiza o elemento axiológico de que estas devem se revestir, asseverando que se tratam de “expressão clara dos valores ju- rídicos” e que a “fonte formal informa-nos sobre as formas externas e claras com que um valor deverá revestir-se” 6. Dinh, Dailler e Pellet enfatizam seu modo de prepa- ração, ao defini-las como “os processos de elaboração do direito, as diversas técnicas que autorizam a considerar que uma regra pertence ao direito positivo” 7.
O aparecimento das fontes formais é normalmente relacionado às fontes ma- teriais, as quais, como afirmamos, inspiram a criação de novas normas e orientam a sua elaboração, levando a que os preceitos de Direito positivo consagrem determi- nados valores, voltados a atender às demandas da sociedade.
Dentro desta obra, analisaremos apenas as fontes formais, porque o exame de- tido das fontes materiais requer o estudo de um vasto rol de elementos, muitos dos quais pertencem a outros campos do conhecimento, cujo estudo não cabe no escopo deste livro. Doravante, portanto, a palavra “fontes” aludirá apenas às fontes formais do Direito das Gentes, exceto quando indiquemos expressamente o contrário.
Neste capítulo, examinaremos aquelas fontes formais listadas no Estatuto da Corte Internacional de Justiça (CIJ), que se encontram consolidadas como fontes do Direito das Gentes no entendimento convencional e da doutrina há muito tempo. Entretanto, inclusive em vista do caráter não exaustivo do rol de fontes constantes do Estatuto da CIJ, estudaremos também novas formas de manifestação da norma de Direito Internacional, bem como institutos cujo caráter de fontes da disciplina ainda é objeto de polêmica na doutrina.
Direito Internacional Público Paulo Henrique Gonçalves Portela
atenÇÃo: o Estatuto da Corte Internacional de Justiça emprega o termo “convenção” para referir-se ao tratado. Como verificaremos posteriormente, a convenção é apenas um tipo de tratado. Em todo caso, na prática internacional, o termo “convenção” é frequen- temente empregado como sinônimo de tratado.
O Estatuto da Corte elenca como fontes do Direito Internacional os tratados, o costume, os princípios gerais do Direito, a jurisprudência e a doutrina.
Por meio da expressão ex aequo et bono , o Estatuto da CIJ refere-se também à equidade como meio que pode determinar juridicamente a solução de conflitos envolvendo a interpretação e a aplicação do Direito Internacional^10.
A importância do Estatuto para a definição das fontes de Direito das Gentes fundamenta-se no fato de que quase todos os Estados se comprometeram em obser- var as suas disposições, pelo que, com isso, acabam reconhecendo a relevância dos elementos indicados em seu artigo 38 para a disciplina das relações internacionais.
O Estatuto da Corte Internacional de Justiça não determina a hierarquia das fontes de Direito Internacional, e a mera ordem em que essas fontes aparecem no texto do artigo 38 não define a primazia entre elas.
Com isso, a definição da hierarquia das fontes de Direito das Gentes é tarefa à qual a doutrina vem se dedicando, em debates marcados pela falta de consenso.
Parte da doutrina confere preferência aos tratados, por ser uma fonte escrita, cujas normas podem, por isso, se revestir de maior clareza e precisão 11.
Entretanto, esse entendimento não é unânime, como revela Guido Soares, que defende que não pode haver hierarquia entre as fontes de Direito Internacional, por conta da estreita relação que estas mantêm entre si, mormente no momento da aplicação de uma norma, quando a regra de um tratado pode ser interpretada à luz do costume e da doutrina, por exemplo^12. É nesse sentido que Celso de Albuquerque Mello, em entendimento muito difundido, afirma que não há hierarquia entre trata- do e costume, não prevalecendo nenhum deles sobre o outro. Com isso, um tratado mais recente pode derrogar ou modificar um costume, e vice-versa 13.
Direito Internacional Público Paulo Henrique Gonçalves Portela
O entendimento de que não há hierarquia de fontes é majoritário na doutrina. De nossa parte, porém, entendemos que, no atual estágio da Ciência Jurídica, as normas só podem ser aplicadas à luz dos princípios que norteiam o ordenamen- to a que pertencem. Por isso, defendemos que os princípios gerais do Direito e os princípios gerais do Direito Internacional deveriam ter precedência sobre as demais fontes do Direito das Gentes, por conterem os preceitos que consagram os princi- pais valores que a ordem jurídica internacional pretende resguardar e que, destarte, orientam a construção, interpretação e aplicação de todo o arcabouço normativo do Direito das Gentes.
Em todo caso, é inegável a importância prática dos tratados dentro do rol das fontes de Direito Internacional, evidenciada pela grande quantidade de instrumen- tos do tipo nas relações internacionais, por sua maior notoriedade e por seu papel na regulamentação da maior parte das matérias mais importantes do Direito das Gentes.
Dentre os fatores que levam a que os tratados sejam a fonte mais empregada no Direito Internacional na atualidade indicamos: seu caráter mais democrático, decorrente do fato de que os Estados participam diretamente em sua elaboração, por meio de um processo de elaboração que conta, em muitos casos, com o envol- vimento dos parlamentos nacionais, e; a forma escrita, que confere maior precisão aos compromissos assumidos, credenciando os tratados como uma fonte que pode melhor contribuir para a regulamentação do complexo e sensível âmbito das relações internacionais 14.
atenÇÃo: em todo caso, enfatizamos que a importância dos tratados é prática e não necessariamente confere a estes o caráter de fonte de hierarquia superior no Direito das Gentes.
Por fim, advertimos que não se deve confundir “hierarquia de fontes” com “hierarquia de normas”. Com efeito, as fontes referem-se às formas de manifestação das disposições do Direito, ao passo que as normas consagram os próprios modelos de conduta esperados dentro de uma sociedade.
O Estatuto da CIJ não exclui a existência de outras fontes, algumas das quais comuns ao Direito interno e outras decorrentes unicamente da dinâmica das rela- ções internacionais. Essas fontes adicionais são os princípios gerais do Direito Inter- nacional, os atos unilaterais dos Estados, as decisões das organizações internacionais
Fontes do Direito Internacional Público: Introdução Direito Internacional Público.
Quadro 2: Fontes Formais do direito internacional Fontes do artiGo 38 do estatuto da ciJ (Fontes estatutÁrias)
outras Fontes (Fontes eXtra-estatutÁrias)
QUaDRO 3. F OnteS PRIncIPaIS e FOnteS aceSSóRIaS FOnteS PRIncIPaIS FOnteS aceSSóRIaS OU aUXILIaReS
QUaDRO 4. F OnteS cOnvencIOnaIS e FOnteS nãO-cOnvencIOnaIS Fontes conVencionais Fontes nÃo conVencionais
Os tratados são acordos escritos, concluídos por Estados e organizações inter- nacionais com vistas a regular o tratamento de temas de interesse comum. Apesar de existirem desde a Antiguidade, começaram a firmar-se como fonte por excelência do Direito Internacional apenas a partir da Paz de Vestfália, substituindo paulatina- mente o costume como fonte mais empregada no Direito das Gentes. Dada, portan- to, a importância dos tratados, examinaremos seus diversos aspectos relevantes em capítulo específico deste livro (Parte I – Capítulo III).
O artigo 38, par. 1º, “b”, do Estatuto da CIJ define o costume internacional como “uma prática geral aceita como sendo o direito”.
Poderíamos conceituar com maior precisão o costume internacional como a prática geral, uniforme e reiterada dos sujeitos de Direito Internacional, reconhecida como juridicamente exigível.
Fontes do Direito Internacional Público: Introdução Direito Internacional Público.
A formação de uma norma costumeira internacional requer dois elementos es- senciais: um, de caráter material e objetivo; o outro, psicológico e subjetivo. O pri- meiro é a prática generalizada, reiterada, uniforme e constante de um ato na esfera das relações internacionais ou no âmbito interno , com reflexos externos. É a inver- terata consuetudo, que constitui o conteúdo da norma costumeira. O segundo ele- mento é a convicção de que essa prática é juridicamente obrigatória ( opinio juris )^16.
Em regra, o processo de consolidação de uma prática costumeira antecede à opinio juris. Por outro lado, a mera reiteração de atos configura apenas uso, visto que o elemento subjetivo é também necessário para dar forma ao costume.
A generalização não se confunde com a unanimidade. De fato, o costume não precisa ser objeto da aceitação unânime de um grupo de Estados, bastando que, no espaço em que a regra é entendida como costumeira, um grupo amplo e representa- tivo reconheça sua obrigatoriedade 17.
atenÇÃo: recordamos também que a generalização não significa que o costume deva ser global ou universal, podendo se tratar de um costume regional ou empregado ape- nas nas relações bilaterais.
Entretanto, o tema é polêmico na doutrina, que discute também a possibilidade de que a norma costumeira vincule entes que não concordam com sua juridicidade.
Partindo da premissa voluntarista de que o fundamento do Direito Internacio- nal repousa apenas na vontade dos atores internacionais, o costume seria fruto de um acordo tácito entre sujeitos de Direito Internacional, diferenciando-se do tra- tado no sentido de que este existe a partir de uma manifestação expressa de acordo entre certas partes 18. Nesse sentido, o costume valeria apenas entre aqueles entes que implicitamente concordassem com certa prática e aceitassem seu caráter jurídico.
Caso partamos da premissa de que o costume requer aceitação, a norma costu- meira pode ser aceita de maneira expressa ou tácita^19.
Por outro lado, o entendimento objetivista vê o costume como uma manifesta- ção sociológica, que obrigaria erga omnes quanto mais difundido fosse, vinculando inclusive os Estados que com ele não concordaram.
Direito Internacional Público Paulo Henrique Gonçalves Portela
A jurisprudência internacional é o conjunto de decisões judiciais reiteradas no mesmo sentido, em questões semelhantes, proferidas por órgãos internacionais ju- risdicionais de solução de controvérsias relativas a matéria de Direito Internacional.
A jurisprudência internacional origina-se especialmente de cortes internacio- nais, que começam a se difundir no cenário internacional, como a Corte Internacio- nal de Justiça (CIJ), o Tribunal Penal Internacional (TPI) e a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).
Entretanto, um entendimento que efetivamente considere o papel exercido pelos mecanismos de aplicação do Direito das Gentes na elucidação do teor das normas internacionais deveria incluir também, como capazes de criar jurisprudência internacional, entidades que não sejam cortes ou tribunais, como os foros arbitrais e as comissões e comitês encarregados de monitorar a execução de determinados tratados. É o caso, por exemplo, da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, órgão não jurisdicional vinculado à Organização dos Estados Americanos (OEA), cujas decisões são, porém, fundamentadas em norma jurídica e que acabam orien- tando outras decisões.
Há polêmica no tocante ao papel das decisões judiciais dentro do Direito In- ternacional.
Com efeito, a teor do artigo 38 do Estatuto da CIJ, as decisões judiciais são consideradas apenas como fontes auxiliares do Direito das Gentes, meramente con- tribuindo para a aplicação das normas jurídicas ou, nos termos precisos do Estatuto da CIJ, como “meio auxiliar para a determinação das regras de direito”.
Na doutrina, Mazzuoli afirma que a jurisprudência não é fonte do Direito por- que “não cria o direito, mas sim o interpreta mediante a reiteração de decisões no mesmo sentido. Sendo ela uma sequência de julgamentos no mesmo sentido, nada mais é do que a afirmação de um direito preexistente, ou seja, sua expressão. Além do mais, as decisões de tribunais não criam normas propriamente jurídicas, o que demanda abstração e generalidade, requisitos sem os quais não se pode falar na exis- tência de uma regra de direito stricto sensu ” 21.
Em qualquer caso, as decisões judiciais também criam direito, ainda que apenas entre as partes em litígio. Nesse sentido, enfatizamos que o artigo 59 do Estatuto da CIJ determina que “A decisão da Corte só será obrigatória para as partes litigantes e a respeito do caso em questão”. Outrossim, com o aumento das atividades das cortes e
Direito Internacional Público Paulo Henrique Gonçalves Portela
tribunais internacionais, vem ficando cada vez mais claro que os julgados anteriores servem como referência para julgamentos posteriores.
Em todo caso, entendemos que no mundo atual, com toda a complexidade evidente das relações sociais e com a dificuldade dos elaboradores das normas em acompanhar a evolução das sociedades, não é possível olvidar o papel das decisões judiciais como parâmetro para efetivamente orientar a vida dos povos.
Por fim, é importante recordar que o Direito Internacional também prescreve condutas a serem observadas no âmbito interno dos Estados. Com isso, as normas internacionais podem fundamentar pretensões examinadas pelos Judiciários nacio- nais, que criarão jurisprudência interna sobre preceitos do Direito das Gentes. No Brasil, por exemplo, é comum encontrar pronunciamentos dos tribunais superiores fundamentados em normas de tratados.
O artigo 38 do Estatuto da CIJ inclui a “doutrina dos juristas mais qualificados das diferentes nações” como fonte, ainda que auxiliar, do Direito Internacional.
A doutrina é o conjunto dos estudos, ensinamentos, entendimentos, teses e pareceres dos estudiosos do Direito Internacional, normalmente constantes de obras acadêmicas e de trabalhos de instituições especializadas, como a Comissão de Direi- to Internacional das Nações Unidas.
No passado, a doutrina exerceu papel relevante para a própria criação do Di- reito Internacional, como demonstram os trabalhos de especialistas como Francisco de Vitória e Hugo Grócio. Atualmente, a principal função da doutrina é contribuir para a interpretação e aplicação da norma internacional, bem como para a formula- ção de novos princípios e regras jurídicas, indicando as demandas da sociedade in- ternacional, os valores que esta pretende ver resguardados, a opinio juris dos sujeitos de Direito Internacional etc. Enfatizamos, porém, que não cabe à doutrina regular diretamente condutas, visto que os enunciados doutrinários não são vinculantes por si sós.
Em síntese, o objeto da doutrina, segundo Yepes Pereira, é: “esmiuçar a matéria em seus mais profundos e reservados recônditos, a fim de delinear seus institutos e conceitos, fixando os limites de sua aplicação e a maneira mais eficaz de fazê-lo”^22.
Como o Direito Internacional interage com o Direito interno, incluímos tam- bém , na doutrina internacionalista , os estudos dos juristas de outras áreas que te- nham relação com o Direito das Gentes.
Fontes do Direito Internacional Público: Introdução Direito Internacional Público.
concreto^24. A analogia refere-se, portanto, à forma de regular relações sociais que não sejam objeto de norma jurídica expressa por meio do emprego de regras aplicáveis a casos semelhantes.
Parte da doutrina entende que a analogia é fonte de Direito Internacional. En- tretanto, para parte da doutrina de Direito em geral, a analogia é apenas meio de integração do ordenamento jurídico.
A equidade é a aplicação de considerações de justiça a uma relação jurídica , quando não exista norma que a regule ou quando o preceito cabível não é eficaz para solucionar, coerentemente e de maneira equânime, um conflito. É, como afirma Mazzuoli, “a aplicação dos princípios de justiça a um caso concreto sub judice ” 25.
O artigo 38, par. 2º, do Estatuto da CIJ consagra a equidade como ferramenta que pode levar à solução de conflitos internacionais, ao determinar que o rol de fontes de Direito Internacional existentes “não prejudicará a faculdade da Corte de decidir uma questão ex aequo et bono , se as partes com isto concordarem”.
Portanto, o Estatuto da CIJ autoriza a Corte, ao examinar um litígio, a afastar a aplicação de uma norma que incida sobre um caso concreto, decidindo o conflito com base apenas em considerações de justiça 26.
atenÇÃo: enfatizamos, em todo caso, que a equidade só poderá ser empregada a partir da anuência expressa das partes envolvidas em um litígio.
Parte da doutrina não reconhece a equidade como fonte formal de Direito In- ternacional, a exemplo de Celso de Albuquerque Mello, que a qualifica como “fonte material do Direito Internacional”^27. Parte importante da doutrina jurídica em geral percebe a equidade como mero elemento de integração 28. Em todo caso, a equidade é também princípio geral do Direito, visto que as normas jurídicas devem ser sempre aplicadas à luz da necessidade de se fazer justiça.
Fontes do Direito Internacional Público: Introdução Direito Internacional Público.
Partindo-se da premissa voluntarista de que as normas de Direito Internacional se fundamentam no consentimento dos Estados e das organizações internacionais, os atos unilaterais de entes estatais não poderiam ser fontes de Direito das Gentes.
Entretanto, a dinâmica das relações internacionais revela que atos cuja existên- cia tenha dependido exclusivamente da manifestação de um Estado terminam por influenciar as relações internacionais, gerando consequências jurídicas independen- temente da aceitação ou envolvimento de outros entes estatais.
Os atos unilaterais classificam-se em expressos e tácitos. Os atos expressos aper- feiçoam-se por meio de declaração que adote a forma escrita ou a oral. Os tácitos configuram-se quando os Estados implicitamente aceitam determinada situação, normalmente pelo silêncio ou pela prática de ações compatíveis com seu objeto.
Apresentamos a seguir alguns exemplos de atos unilaterais dos Estados, em lista que não exclui outras possibilidades que possam ocorrer nas relações internacionais.
- protesto: manifestação expressa de discordância quanto a uma determinada situação, destinada ao transgressor de norma internacional e voltada a evitar que a conduta objeto do protesto se transforme em norma. Visa a resguardar os direitos do Estado em face de pretensões de outro Estado. Exemplo: protestos por ocasião de golpes de Estado, que violam normas internacionais que deter- minam o respeito à democracia; - notificação: ato pelo qual um Estado leva oficialmente ao conhecimento de outro ente estatal fato ou situação que pode produzir efeitos jurídicos, dando- lhe “a necessária certeza da informação”^29. É entendido como “ato condição”^30 , ao qual a validade de ações posteriores está vinculada. Exemplos são as notifica- ções de estado de guerra; - renúncia: é a desistência de um direito, que é extinto. A bem da segurança jurídica e da estabilidade das relações internacionais, a renúncia deve ser sem- pre expressa, nunca tácita ou presumida a partir do mero não-exercício de um direito; - denúncia: ato pelo qual o Estado se desvincula de um tratado; - reconhecimento: ato expresso ou tácito de constatação e admissão da existên- cia de certa situação que acarrete consequências jurídicas. Exemplo: reconheci- mento de Estado e de governo; - promessa: compromisso jurídico de adoção de certa conduta; - ruptura das relações diplomáticas: ato que suspende o diálogo oficial com um Estado nas relações internacionais.
Direito Internacional Público Paulo Henrique Gonçalves Portela
Em alguns casos, o caráter vinculante ou não do ato estará previamente deter- minado em norma internacional. Entretanto, há hipóteses em que somente o exame do caso concreto permitirá apurar se a decisão do organismo é ou não obrigatória.
Exemplo de resolução vinculante é a Resolução nº 1.874, de 12 de junho de 2009, que determina medidas voltadas a impedir a proliferação de armas nuclea- res, biológicas e químicas na República Popular Democrática da Coreia (Coreia do Norte). A propósito, tal Resolução foi objeto, no Brasil, do Decreto nº 6.935, de 12/08/2009, voltado a conferir-lhe a devida execução em território nacional, proibindo o comércio de armas e materiais relacionados entre o Brasil e a Coreia do Norte, autorizando a realização de inspeções em embarcações destinadas àquele país ou dele provenientes e restringindo as atividades financeiras da República Popular Democrática da Coreia e exigindo a cessação de todas as atividades nucleares e ba- lísticas daquele país 31.
Aliás, as resoluções deverão ser executadas no Brasil por meio de Decreto pre- sidencial, do que é exemplo também a Resolução 1373/2001, do Conselho de Se- gurança das Nações Unidas, que visa a estabelecer medidas para o combate ao ter- rorismo e que foi objeto do Decreto 3.976, de 18/10/2001, o qual determinava textualmente, em seu artigo 1º, que “Ficam as autoridades brasileiras obrigadas, no âmbito de suas respectivas atribuições, ao cumprimento do disposto na Resolução 1373 (2001), adotada pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas em 28 de setembro de 2001, anexa ao presente Decreto” 32.
De nossa parte, defendemos que os atos das organizações internacionais, quan- do vinculantes, são fontes de Direito Internacional, o que não exclui, em todo caso, a importância de resoluções não vinculantes como parâmetros interpretativos, como elementos de relevância política e moral e como orientações para a futura elaboração de normas jurídicas.
A noção de jus cogens é definida pelo artigo 53 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, que estabelece que “É nulo um tratado que, no momento de sua conclusão, conflite com uma norma imperativa de Direito Internacional geral. Para os fins da presente Convenção, uma norma imperativa de Direito Internacional geral é uma norma aceita e reconhecida pela comunidade internacional dos Estados como um todo como norma da qual nenhuma derrogação é permitida e que só
Direito Internacional Público Paulo Henrique Gonçalves Portela
pode ser modificada por norma ulterior de Direito Internacional geral da mesma natureza”.
A norma de jus cogens é um preceito ao qual a sociedade internacional atribui importância maior e que, por isso, adquire primazia dentro da ordem jurídica in- ternacional, conferindo maior proteção a certos valores entendidos como essenciais para a convivência coletiva.
A principal característica do jus cogens é a imperatividade de seus preceitos, ou seja, a impossibilidade de que suas normas sejam confrontadas ou derrogadas por qualquer outra norma internacional, inclusive aquelas que tenham emergido de acordos de vontades entre sujeitos de Direito das Gentes. O jus cogens configura, portanto, restrição direta da soberania em nome da defesa de certos valores vitais.
O artigo 53 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados de 1969 reza que é nulo o tratado que, no momento de sua conclusão, conflite com uma norma imperativa de Direito Internacional geral.
De nossa parte, entendemos que essa determinação da Convenção de Viena é desproporcional e desprovida de razoabilidade, por abrir a possibilidade de que um tratado inteiro perca a validade quando apenas um de seus preceitos está em con- fronto com normas de jus cogens. Dessa forma, entendemos que seria mais razoável que apenas a norma que violasse o jus cogens tivesse sua aplicação afastada, evitando a extinção de todo o tratado^33.
O rol das normas de jus cogens não é expressamente definido por nenhum trata- do. Aliás, nem mesmo a Convenção de Viena de 1969 fixa essas normas, limitando- se a proclamar a sua existência e seu caráter de princípios e regras que restringem a capacidade de celebrar tratados dos Estados e das organizações internacionais.
Com isso, a definição do conteúdo do jus cogens é fruto de um processo histó- rico, político e social, dentro do qual a sociedade internacional reconhece em certos valores maior importância para a coexistência entre seus membros.
Dentre as normas de jus cogens encontram-se aquelas voltadas a tratar de temas como direitos humanos, proteção do meio ambiente e promoção do desenvolvimen- to sustentável, paz e segurança internacionais, Direito de Guerra e Direito Humani- tário, proscrição de armas de destruição em massa e direitos e deveres fundamentais dos Estados.
Fontes do Direito Internacional Público: Introdução Direito Internacional Público.
Entendemos que ainda não se pode atestar a existência de uma “ordem consti- tucional internacional” pelo fato de que o fenômeno constitucional é, por enquan- to, vinculado apenas ao Estado, comportando o conjunto de normas consideradas fundamentais para o funcionamento do ente estatal. Cabe, aliás, ressaltar que ainda não existe a figura do “Estado mundial”. Outrossim, entendemos que a ideia de uma ordem constitucional internacional deveria comportar a existência de um “poder constituinte internacional”, que ainda não existe.
Em qualquer caso, a circunstância de as normas de jus cogens não conformarem uma “constituição internacional” não as desqualifica enquanto normas de maior importância, inclusive à luz da lógica elementar de que nem tudo o que é mais rele- vante é constitucional.
De nossa parte, defendemos que o jus cogens não é fonte de Direito Internacio- nal. Com efeito, as normas de jus cogens são as normas mais importantes de Direito Internacional, não formas de expressão da norma, e aparecem nas fontes de Direito das Gentes, como os tratados, os princípios gerais do Direito e os princípios gerais do Direito Internacional.
O desenvolvimento das relações internacionais vem levando ao aparecimento de uma nova modalidade normativa, de caráter mais flexível, chamada soft law , ex- pressão em língua inglesa, cuja tradução aproximada seria “direito mole, maleável”.
O exame do soft law requer a prudência necessária à análise de um institu- to novo e de contornos ainda imprecisos. Entretanto, não podemos nos furtar ao estudo dessa forma alternativa de orientar a conduta dos membros da sociedade internacional 36 , que emerge dentro de um contexto em que o dinamismo dos fluxos de bens, de serviços, de informações e de pessoas no mundo e o aumento da inter- dependência entre os Estados exigem modos mais ágeis e maleáveis de estabelecer regras de convivência.
O soft law é uma das atuais modalidades de manifestação do fenômeno jurí- dico que não necessariamente incorporam as características clássicas do Direito. É, portanto, parte de um quadro em que se fortalecem noções como autonomia da vontade e arbitragem, todas tendo em comum maior flexibilidade e capacidade de oferecer soluções mais rápidas para os problemas das relações sociais.
Fontes do Direito Internacional Público: Introdução Direito Internacional Público.
O conceito foi desenvolvido pela doutrina norte-americana, em oposição à no- ção de hard law , que se refere ao Direito tradicional. No Brasil, Nasser define soft law como um conjunto de “regras cujo valor normativo seria limitado, seja porque os instrumentos que as contêm não seriam juridicamente obrigatórios, seja porque as disposições em causa, ainda que figurando em um instrumento constringente, não criariam obrigações de direito positivo ou não criariam senão obrigações pouco constringentes” 37. O autor aponta ainda as seguintes modalidades de soft law^38 :
A formação do soft law ocorre por meio de negociações entre os sujeitos de Direito Internacional ou dentro de órgãos técnicos das organizações internacionais. A elaboração de suas regras caracteriza-se por ser mais rápida, sem as dificuldades inerentes a esforços de articulação prolongados e perpassados por inúmeras questões políticas. Além disso, os preceitos de soft law , em regra, incorporam melhor as pe- culiaridades técnicas referentes às questões reguladas, o que nem sempre é possível nos tratados, pelas dificuldades normais encontradas nas negociações internacionais.
Em suma, o soft law inclui preceitos que ainda não se transformaram em nor- mas jurídicas ou cujo caráter vinculante é muito débil, ou seja, “com graus de nor- matividade menores que os tradicionais” 39 , como afirma Soares. Com isso, é comum que as regras de soft law tenham caráter de meras recomendações.
Na prática, o soft law normalmente não se reveste das formas clássicas adota- das pelas normas internacionais, como os tratados, embora possa identificar-se com as resoluções ou recomendações não-vinculantes de organizações internacionais.
Direito Internacional Público Paulo Henrique Gonçalves Portela