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Este artigo apresenta a interconexão entre o existencialismo e a fenomenologia na obra do filósofo brasileiro farias brito, a partir da perspectiva do filósofo americano f. G. Sturm. O texto destaca os pontos de convergência entre as duas escolas filosóficas e o pensamento de farias brito, enfatizando a importância de lançar novos olhares sobre a obra do pensador brasileiro.
Tipologia: Notas de estudo
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Elton Moreira Quadros*
Resumo: O presente artigo pretende apresentar o Existencialismo e a Fenomenologia que aparecem na obra do filósofo Farias Brito a partir da perspectiva do filósofo americano F. G. Sturm cuja leitura sustenta que as obras do filósofo brasileiro devem ser lidas levando em consideração a proximidade, mesmo inconsciente, com o método utilizado pela Fenomenologia e as inquietações apresentadas pelo Existencialismo. Para isso, destacamos alguns pontos de confluência entre as duas escolas citadas e o pensamento de Farias Brito, enfatizando, a importância de lançar novos olhares sobre a obra do pensador brasileiro. Palavras-chave: método, psicologia, fenomenologia, existencialismo, essencialismo. Abstract: This paper aims to present the Existentialism and the Phenomenology appearing on the work of philosopher Farias Brito from the perspective of the American philosopher F. G. Sturm whose readings implies that the work of the Brazilian philosopher should be read taking into consideration the proximity, even unconsciously, with the method used for Phenomenology and the concerns presented by Existentialism. We highlight some points of confluence between the two schools mentioned and the thoughts of Farias Brito, emphasizing the importance of launching new perspectives on the work of the Brazilian thinker. Key words: methods, psychology, phenomenology, existentialism, essentialism.
Introdução
Em comunicação apresentada no IV Congresso Nacional de Filosofia realizado no Ceará quando do centenário de nascimento de Farias Brito, Fred Gillette Sturm expôs uma inédita tese sobre a atualidade do pensamento britiano.
Ao considerar o cenário filosófico da segunda metade do século XX caracterizado pelo modo de perguntar do existencialismo e pelo modo de analisar da fenomenologia, Sturm acredita que o pensamento do filósofo brasileiro terá novo significado, isso porque, no pensamento de Farias Brito
existe “nos seus motivos, e na sua interpretação da situação humana – social e individual – um paralelo, do ponto de vista básico, com o existencialismo atual; e que há na metodologia proposta por ele, e no programa filosófico anunciado por ele, um paralelo com a fenomenologia atual” (STURM, 1962, 91). Sendo assim, considera o comentador americano, ser de importância fundamental a leitura das obras do filósofo brasileiro à luz dos problemas e perspectivas colocadas por essas correntes do pensamento filosófico ocidental.
O Filósofo
Nascido em São Benedito no Ceará em 24 de julho de 1862, Raimundo de Farias Brito é uma controvertida presença na filosofia brasileira. Tido pelos (entre eles, Vitorino Félix Sanson e Sylvio Rabelo) como o único gênio filosófico brasileiro. É tido por outros como inconsistente e incapaz de um pensamento original.
Sua família para fugir da seca de 1877 muda-se para Fortaleza onde Farias Brito conclui os estudos secundários e segue para o Recife onde cursará Direito na famosa Faculdade de Direito do Recife, no tempo em que Tobias Barreto era professor e exercia uma grande influência.
Farias Brito teve uma vida bem movimentada, morou em vários estados brasileiros, exerceu diversos cargos públicos, mas, será como professor que viverá a maior parte de sua existência.
Inclusive, um acontecimento inusitado se dá quando do concurso para professor de lógica no conceituado Colégio Pedro II no Rio de Janeiro em
Em janeiro de 1917 Farias Brito falece deixando uma extensa obra e um ideal (BRITO, 1957, 29):
Tudo passa, tudo se aniquila. Pois bem: eu quero saber se do que passa e se aniquila, alguma coisa fica e em virtude da qual se possa ter amor ao que já não existe ou deixará de existir; se do que passa e se aniquila alguma coisa fica que não há de passar, nem aniquilar-se: quero estudar esta ciência incomparável de que falava Sócrates: quero ensinar aos que padecem como é que se pode
esperar com serenidade o desenlace da morte: quero dirigir aos pequenos e humildes palavras de conforto: quero levantar contra os tiranos a espada da justiça: quero, em uma palavra, mostrar para todos que antes de tudo e acima de tudo existe a lei moral, e que somente para quem se põe fora desta mesma lei que a vida termina. O existencialismo no pensamento de Farias Brito O existencialismo consiste num movimento filosófico que inicia com Søren Kierkegaard em meados do século XIX e terá uma diversidade de correntes e autores bem conhecidos, como: Gabriel Marcel, Albert Camus e Jean-Paul Sartre. Este movimento filosófico caracteriza- se por um pensar o mundo a partir da reflexão sobre a existência real. O homem não possui uma essência abstrata e determinada a priori, por tanto, ele realiza no seu cotidiano o sentido de sua existência. Sartre em O Existencialismo é um Humanismo (1973) chama a nossa atenção para uma questão fundamental quando tentamos entender o que é o existencialismo (SARTRE, 1973, 11): O que torna o caso complicado é que há duas espécies de existencialistas: de um lado há os que são cristãos, e entre eles incluirei Jaspers e Gabriel Marcel, de confissão católica; e de outro lado, os existencialistas ateus, entre os quais há que incluir Heidegger, os existencialistas franceses e a mim próprio. O que têm de comum é simplesmente o fato de admitirem que a existência precede a essência, ou, se se quiser, que temos de partir da subjetividade. No que diz respeito ao existencialismo no pensamento de Farias Brito, Sturm faz uma interessante citação de Cruz
terrores, com todas as suas incertezas e mistérios; a realidade em toda a sua dureza e em toda a sua inexorabilidade, a realidade nua e crua, como seria preciso dizer, a realidade na sua inclemência e no seu determinismo fatal: a vida com sua ligação necessária ao sofrimento e à dor e com seu desenlace fatal na dor suprema da morte.
Para Farias Brito o sofrimento é uma característica marcante da condição humana. Estando a vida numa resistência constante a dissolução e ao desespero, sendo a primeira uma força externa e o segundo uma força interna. No caso das descrições das lutas travadas na existência contra a dissolução e seu momento culminante na morte, Sturm, encontra grande similaridade entre o filósofo brasileiro e os existencialistas.
Aqui, para que possamos comparar, lembro as palavras de Sartre sobre a natureza humana: “Assim o existencialismo apega-se à idéia duma natureza humana, mas desta vez não é uma natureza orgulhosa de si mesma, mas uma condição tímida, incerta e desamparada”. (SARTRE, 1973, 32)^1
Neste sentido, toda a obra de Farias Brito, apresenta um fio continuo nos “motivos existenciais e interpretação da situação precária do ser humano, que o impulsiona para uma descrição ontológica adequada, a fim de que os homens pudessem lançar bases firmes para a ordem social e o homem pudesse ter a coragem de resistir a forças de dissolução, mesmo à própria morte” (STURM, 1962, 97).
(^1) Talvez seja importante lembrar também que
Farias Brito morreu em 1917 e Sartre tem sua vida intelectual quase que inteiramente ligada a segunda metade do século XX.
Psicologia e Espírito Fred G. Sturm, acredita que o problema básico para Farias Brito está na “compreensão completa da natureza humana e do lugar do espírito humano na realidade histórica e universal. É por isso a importância que ele atribuiu à ciência da psicologia”. Essa ciência esteve presente entre as inquietações do pensador cearense desde os seus primeiros escritos. As preocupações com a psicologia pretendem responder, para Farias Brito, qual o valor ontológico da experiência espiritual, pois, é a psicologia que deverá solucionar o problema do espírito. No entanto, é preciso fazer um duplo esclarecimento acerca do que se compreende aqui por espírito e psicologia. Por “espírito” podemos entender toda a experiência subjetiva. A “psicologia”, por sua vez, é a ciência que irá estudar o espírito, ou dito de outro modo, irá examinar todos os dados da consciência (BRITO, 1914, 22-23). Entretanto si a psicologia é a ciência do espírito, si é a ciência nascida dessa exigência universal que veio a encontrar sua expressão mais precisa, na formula socrática: - conhece-te a ti mesmo, - compreende-se que esta ciência existe desde que se apresentou em face da natureza um ser pensante, e por conseguinte, desde que existe o homem. Pode dizer-se que é a mais velha das ciências. (…) A psicologia é uma ciência intuitiva e concreta, uma espécie de visão interior consubstancial com o sujeito, e deste modo não é somente conhecimento, mas energia e vida. (…) A psicologia estuda a realidade em si mesma, o ser em seu mistério interior, em sua
significação mais intima e profunda, numa palavra, o ser consciente de si mesmo.
No que diz respeito ao termo psicologia, ainda é necessário fazer alguns esclarecimentos. Farias Brito faz três usos diferentes deste termo:
(^2) Aqui, julgamos importante fazer uma breve citação de Husserl: “(…) a Psicologia experimental é um método para se registrarem porventura factos preciosos e regulações psicofísicas, mas que carecem de toda a possibilidade da compreensão mais profunda e da definitiva valorização científica, sem a ciência da consciência imanentemente investigadora do psíquico”. HUSSERL, Edmund. A filosofia como ciência de rigor. Atlântica, Coimbra, 1965.
sujeito, levando em consideração somente o aspecto subjetivo, psicológico. Correspondendo a “psicologia fenomenológica” de Husserl.
(^3) Uma das possíveis explicações para tal similitude pode estar na mutua influência sofrida por Faria Brito e Husserl do livro Os princípios de psicologia de William James
A segunda razão estaria associada ao fato do pensador brasileiro estar invariavelmente insatisfeito e isto se revela em suas próprias palavras, citadas por Sturm: “O infinito me fascina e me penetra… Se uma voz me falasse do alto, dando-me a chave de toda a verdade, tudo estaria resolvido… Mas essa voz não me fala. E a treva continua impenetrável, não somente fora, como ainda dentro de mim mesmo”.(STURM, 1962, 105)
Conclusão
O estado de mito em que Farias Brito foi alçado durante longos anos, bem como, o desprezo que logo se seguiu, não fazem jus ao esforço intelectual realizado por este filósofo brasileiro para o desenvolvimento de suas idéias filosóficas.
Farias Brito já foi considerado panteísta e pessimista. Muitos acreditam que este panteísmo seja fruto da influência espinosista e o pessimismo da influência de Schopenhauer e Hartmann.
Por isso, a importância da nova perspectiva interpretativa apresentada por Fred G. Sturm sobre Farias Brito quando o americano expõe que a filosofia do brasileiro capta a problemática da existência humana na sua precária e constante busca da essência, com isso, é possível aproximar o filósofo brasileiro dos principais movimentos filosóficos do século XX.
Cabe, portanto, uma maior reflexão sobre esta possibilidade interpretativa, uma vez que o pensamento de Farias Brito em muitos momentos parece antecipar conclusões ou perspectivas semelhantes ao Existencialismo e à Fenomenologia. O que não pode
filosofia”. FRAGATA, Júlio. A filosofia de Edmund Husserl. Edições da Revista “Filosofia”, Lisboa:
continuar acontecendo é esse quase que completo desprezo pelo pensamento de Farias Brito em detrimento de tanta mediocridade estudada na academia brasileira em que, muitas vezes, só são levados em consideração os modismos efêmeros e pueris. Farias Brito nos deixou um itinerário de suas preocupações e, a partir dele, podemos ter uma melhor idéia do destino do seu pensamento (BRITO, 1957, 34-35): É certo que nada é mais eloqüente e nada se impõe de modo esmagador e terrível do que o contraste que existe entre o nada de todas as grandezas humanas e a majestade infinita da natureza. Mas tudo vem de longe, e nada do que é grande, começou grande. Por isto devemos acreditar na elevação de nosso destino, nem outra coisa se pode supor, quando tudo demonstra e se sente que há perfeita conformidade dos nossos destinos para com o destino universal, pelo que a miséria, o sofrimento, a morte, em uma palavra, todas as formas de dor, devem ser consideradas não como o fim, mas como meios tendentes à realização do fim a que é destinada a natureza humana. E como estamos acostumados a ver que as cousas valem tanto mais, quando maiores são os esforços e sacrifícios com que são obtidos, a conseqüência é que o destino da humanidade é tanto mais elevado quando mais profundos e mais dolorosos são os sofrimentos humanos, encontrando- se por esta forma a legítima explicação da verdadeira significação do sofrimento e da dor, e a única interpretação possível da verdadeira significação da morte.
Referências:
BRITO, R. de Farias. A base física do espírito. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1912.
______. O mundo interior. Rio de Janeiro: Revista dos Tribunais, 1914.
______. Finalidade do mundo. Rio de Janeiro: Instituto Nacional do Livro, 1957.
FRAGATA, Júlio. A filosofia de Edmund Husserl. Lisboa: Edições da Revista “Filosofia”, 1961.
HUSSERL, Edmund. A filosofia como ciência de rigor. Coimbra: Atlântica, 1965.
RABELO, Sylvio. Farias Brito ou a aventura do espírito. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1967.
SANSON, Vitorino Félix. A metafísica de Farias Brito. Caxias do Sul: Educs, 1984. SARTRE, Jean-Paul. O existencialismo é um humanismo. In: Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1973. STURM, Fred Gillette. O Significado atual do pensamento britiano. Revista Brasileira de Filosofia. São Paulo-Fortaleza: IBF, 1962. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA: CERQUEIRA, Luiz Alberto. Filosofia Brasileira: Ontogênese da consciência de si. Petrópolis: Vozes, 2002. JAIME. Jorge. História da filosofia no Brasil. Vol. 1. Petrópolis: Vozes, 1997.
Instituto de Filosofia Nossa Senhora das Vitórias.