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Ética e Política: Reflexões sobre o Papel da Ética na Política no Contexto Brasileiro, Trabalhos de Filosofia Política

Uma reflexão crítica e reflexiva sobre a importância da ética na política, baseada em contribuições filosóficas de platão, aristóteles e habermas. O texto discute a relação entre ética e poder, a ética e a política no estado brasileiro, e a necessidade de uma ética na política para promover o bem-estar humano e a justiça social. O documento também aborda a importância da comunicação e da participação dos cidadãos na democracia.

Tipologia: Trabalhos

2012

Compartilhado em 17/11/2022

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Pro Homine - Ciências Humanas
Pro Homine - Ciências Humanas - ano 2 - nº 4 - Julho a Dezembro de 2012Centro Universitário de Lavras - UNILAVRAS
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RESUMO
O presente trabalho visa discorrer sobre a configuração da
ética no campo da política de maneira crítica e reflexiva.
Para tal, fez-se necessário uma revisão teórico-filosófica
sobre o tema, a fim de alcançarmos maior entendimen-
to de como o conhecimento a respeito da relação entre
ética e política tem sido produzido. Nesse âmbito, foram
selecionadas algumas contribuições de Platão, Aristóteles
e Habermas, as quais foram tomadas como base para dis-
corrermos a respeito de “Ética e poder” e “Ética e política
no Estado brasileiro”. Constatou-se que, embora a política
devesse ser uma disciplina necessariamente pautada pela
ética, as práticas políticas realizadas no Brasil carecem de
um embasamento moral. O principal motivo atribuído a
tal fato deve-se ao legado de corrupção atrelado à história
do País e às práticas de manutenção e legitimação das ide-
ologias dominantes realizadas por algumas pessoas que
exercem o poder.
ABSTRACT
This paper aims to discuss the configuration of ethics in po-
litics in a critical and reflective way. To this end, it was ne-
cessary to review a theoretical-philosophical on the subject
in order to achieve greater understanding of how knowle-
dge about the relationship between ethics and politics has
been produced. In this context, we selected some contribu-
tions of Plato, Aristotle and Habermas, which were taken
as a basis to discuss on “Ethics and Power”, and “Ethics
and Politics in Brazilian State”. It was found that, although
Politics should necessarily be a subject based on ethics, lack
a moral foundation to political practices carried out in Bra-
zil. The main reason attributed to this fact is due to legacy
of corruption linked to country’s history and maintenance
and legitimating practices of dominant ideologies held by
some people who are in power.
1 Júlia de Moura Martins
Guimarães 2 Natalia Mene-
zes Ferri 3 Alessandro
Vinicius de Paula
1 Especialista em Psicolo-
gia Clínica: Existencial e
Gestáltica pela FEAD-MI-
NAS.
2 Pós-Graduanda em
Intervenção Psicossocial
no Contexto das Políticas
Públicas pelo Centro Uni-
versitário UNA.
3 Mestre em Psicologia
pela UFMG, doutorando
em Administração pela
UFLA e professor do UNI-
LAVRAS.
PALAVRAS-CHAVE
Ética; Política; Poder;
Estado brasileiro.
KEYWORDS
SEthics; Politics; Power;
Brazilian State.
ÉTICA E POLÍTICA:
UMA ARTICULAÇÃO INDISPENSÁVEL
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Centro Universitário de Lavras - UNILAVRAS Pro Homine - Ciências Humanas - ano 2 - nº 4 - Julho a Dezembro de 2012

RESUMO

O presente trabalho visa discorrer sobre a configuração da ética no campo da política de maneira crítica e reflexiva. Para tal, fez-se necessário uma revisão teórico-filosófica sobre o tema, a fim de alcançarmos maior entendimen- to de como o conhecimento a respeito da relação entre ética e política tem sido produzido. Nesse âmbito, foram selecionadas algumas contribuições de Platão, Aristóteles e Habermas, as quais foram tomadas como base para dis- corrermos a respeito de “Ética e poder” e “Ética e política no Estado brasileiro”. Constatou-se que, embora a política devesse ser uma disciplina necessariamente pautada pela ética, as práticas políticas realizadas no Brasil carecem de um embasamento moral. O principal motivo atribuído a tal fato deve-se ao legado de corrupção atrelado à história do País e às práticas de manutenção e legitimação das ide- ologias dominantes realizadas por algumas pessoas que exercem o poder.

ABSTRACT This paper aims to discuss the configuration of ethics in po- litics in a critical and reflective way. To this end, it was ne- cessary to review a theoretical-philosophical on the subject in order to achieve greater understanding of how knowle- dge about the relationship between ethics and politics has been produced. In this context, we selected some contribu- tions of Plato, Aristotle and Habermas, which were taken as a basis to discuss on “Ethics and Power”, and “Ethics and Politics in Brazilian State”. It was found that, although Politics should necessarily be a subject based on ethics, lack a moral foundation to political practices carried out in Bra- zil. The main reason attributed to this fact is due to legacy of corruption linked to country’s history and maintenance and legitimating practices of dominant ideologies held by some people who are in power.

(^1) Júlia de Moura Martins

Guimarães 2 Natalia Mene- zes Ferri 3 Alessandro Vinicius de Paula

(^1) Especialista em Psicolo-

gia Clínica: Existencial e Gestáltica pela FEAD-MI- NAS.

(^2) Pós-Graduanda em

Intervenção Psicossocial no Contexto das Políticas Públicas pelo Centro Uni- versitário UNA.

(^3) Mestre em Psicologia pela UFMG, doutorando em Administração pela UFLA e professor do UNI- LAVRAS.

PALAVRAS-CHAVE

Ética; Política; Poder; Estado brasileiro.

KEYWORDS

SEthics; Politics; Power; Brazilian State.

ÉTICA E POLÍTICA:

UMA ARTICULAÇÃO INDISPENSÁVEL

Pro Homine - Ciências Humanas - ano 2 - nº 4 - Julho a Dezembro de 2012 Centro Universitário de Lavras - UNILAVRAS

Introdução

Para percorrer o território em que se situam a ética e a política, é necessário, primeiramente, evidenciar a compreensão que possuímos a respeito desse tema. En- tendendo Ética como o conjunto de valores que norteia fatos e ações humanas e Política como a orientação ou a atitude de um go- verno em relação a certos assuntos e pro- blemas de interesse público, fica evidente a necessidade de que esses dois domínios sejam relacionados. Pois, se a política deve ser praticada em prol dos interesses pú- blicos, ou seja, colocada a serviço do que é melhor para a população em geral; e a ética, por sua vez, dedica-se à prática do bem comum, pode-se dizer que a política e a ética possuem interesses convergentes. É por isso que, para alguns pensadores, a po- lítica pode ser compreendida como a “ci- ência moral normativa do governo da so- ciedade civíl” (LIMA, 1932, p. 136). Assim, corroborando com a visão de que a política e a ética possuem uma relação intrínseca, é conveniente citar o pensamento de Bunson (1997):

Se a política é concebida como a parcela da ação humana que visa o gerenciamento de recursos com vistas à promoção do bem-estar humano, à realização da justiça social e à de- fesa dos direitos dos cidadãos, então ela não é sequer pensável como dissociável da ética. E, sendo esta uma reflexão sobre o agir hu- mano, orientada por valores tais como justiça, respeito aos direitos fundamentais da pessoa humana, respeito à natureza, respeito às gera- ções futuras, então a ação que promana de um caráter ético ou que é praticada de acordo com os imperativos éticos não têm como deixar de ter impacto sobre a vida política (BUNSON, 1997, p. 81, apud MUSETTI, 1998).

Dada a inesgotabilidade de possibilidades de tratar do tema, no decorrer deste traba- lho apenas alguns aspectos serão tratados, os quais consideramos importantes para discutir a questão da ética em relação à política. Assim, os assuntos aqui propostos serão abordados no presente texto em tó- picos que permitam apresentar uma “Re- visão teórico-filosófica no campo da ética e da política”, bem como reflexões sobre “Po-

lítica e poder” e “Ética e política no Estado brasileiro”. É extremamente atual e relevante re- fletir sobre o tema que aqui se apresenta, uma vez que trata de um assunto de suma importância para a sociedade em geral, pois estamos todos inseridos num contex- to em que a política é preexistente e, por isso, necessita ser pautada pela ética para perpassar nossas vidas de forma benéfica. Além disso, alguns tópicos relacionados ao tema aqui proposto vão ao encontro de uma realidade bastante contemporânea, a qual revela a crítica situação em que se en- contra o Brasil, emerso em uma crise que é tão política quanto moral.

Revisão Teórico-filosófica no campo da ética e da política

A república idealista de Platão

Platão possuía a pretensão de realizar uma filosofia essencialmente racionalis- ta, propondo a divisão do mundo em um mundo sensível (simulacro, cópia) e um mundo das ideias (razão). Enquanto o mundo sensível seria preenchido por im- perfeições, o mundo das ideias seria povo- ado por aqueles fenômenos que são “úni- cos”, dentre os quais se encontrariam as virtudes. Nesse mundo ideal, se alicerçaria a vida política. O filósofo trouxe contribuições signi- ficativas a respeito da filosofia política. De acordo com suas considerações, o governo ideal teria a forma de República, que de- veria ser governada por nobres de espírito, ricos em virtudes. Tais nobres seriam os grandes filósofos e sábios gregos, os quais deveriam ser capazes de gerir uma socieda- de ideal, democrática e regida pelos desejos do povo. Nesta sociedade imaginada por Platão, que seria perfeita por encontrar-se assentada nos princípios da razão, o gover- nante máximo (equivalente ao presidente no sistema presidencialista) seria o rei-filó- sofo, pessoa cuja conduta encontrar-se-ia a

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de na honra e a buscam, sobretudo aqueles que se dedicam ativamente à vida política (HEALE, 1994). Sendo assim, o bem su- premo que é a eudaimonia, a felicidade, pode ser alcançado através da vida política ativa. Este fato pode ser percebido através da peculiaridade da sociedade grega anti- ga de que um cidadão só se sentia como tal a partir da sua intensa participação no governo político. Sendo assim, para Aris- tóteles, a justiça estaria configurada como a mais importante das virtudes éticas, vis- to que esta é considerada como o respeito pela lei do Estado e, já que a lei do Esta- do (no caso o Estado grego) abarca toda a vida moral, a justiça compreenderia todas as virtudes (idem). O pensador propõe que o homem é, por natureza, um cidadão, ou ser da polis. Assim, o filósofo atribui à polis um sentido muito profundo e como que transcenden- te (CUNHA, 2007). O homem é, pois, um animal político, ou social, feito para viver em sociedade com outros onde a lingua- gem é o sinal dessa sociabilidade. Dessa forma, quem não é impelido a estar com os outros homens, ou é uma divindade ou um bruto, um ser inferior (HEALE, 1994). O estado poderia ser governado por três diferentes formas principais de poder: a monarquia, a aristocracia e a politia, as quais se referem, respectivamente, à tira- nia, à oligarquia e à democracia. A politia é uma transição entre a oligarquia e a demo- cracia, onde quem governa é uma multidão e não uma minoria, mas se trata de uma multidão que possa, de forma alternada, governar e ser governada segundo as leis. Além disso, para Aristóteles, o estado deve ser aquele que tenha como fim os bens es- pirituais, sendo somente estes passíveis da verdadeira felicidade (HEALE, 1994). Sendo assim, o estado ideal aristotéli- co seria aquele que: 1) não tivesse muitos cidadãos, já que um estado com cidadãos em demasia seria dificilmente governável;

  1. possuísse um território suficientemente grande para fornecer a todos os seus cida- dãos os bens necessários, sem produzir o supérfluo; 3) possuísse as qualidades ideais do cidadão grego (inteligente e de espírito

vivo, vivendo em liberdade); 4) possuísse cidadãos que exercessem as funções es- senciais (agricultores, artesãos, guerreiros, comerciantes, governantes e sacerdotes), sendo que os verdadeiros cidadãos se ocu- pariam da guerra, do governo e do culto. Ou seja, alguns cidadãos desempenhariam papeis que os qualificariam como homens perfeitos e inteiros, enquanto outros deve- riam se conformar em realizar atividades secundárias, sendo qualificados como ho- mens apenas pela metade (idem).

A teoria habermasiana: a comunicação como meio de controle político e social

Jürgen Habermas (1984) produziu em sua “Teoria da Ação Comunicativa” con- tribuições bastante importantes ao âmbito da política e, especialmente, à democracia. A teoria habermasiana consiste numa obra que pode ser entendida tanto como filoso- fia ou mesmo como teoria social. Sua ên- fase como obra filosófica abarca questões tais como os fundamentos pragmáticos da comunicação e as características das éticas formais. Já em sua obra tida como teoria social, as principais temáticas estão rela- cionadas à ação comunicativa e ao terreno na qual ela própria se desenvolve. A teoria social envolve um diagnóstico da política moderna que consiste na análise: do empo- brecimento das práticas políticas contem- porâneas; do surgimento de novos atores e movimentos sociais e da possibilidade de aprimorar as democracias contemporâne- as. (AVRITZER, 1996). Segundo Habermas, existem certos pro- blemas advindos da tentativa de se abordar questões sobre a racionalidade partindo de uma perspectiva filosófica, considerando que, para ele “[...] todas as tentativas de descobrir fundamentos últimos, nos quais as intenções de uma primeira filosofia se assentariam, se mostraram vãs” (HABER- MAS, 1984, I : 2). Além disso, ele revela um problema adi- cional apresentado quando se considera a filosofia para as ciências sociais, por haver uma tendência, tanto da economia, quanto

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da ciência política em seu processo de legi- timidade empírica, de ocorrer a limitação da racionalidade em cada uma dessas áre- as. Assim, como é comentado por Avritzer (1996), especificamente na política, este processo levou à desconsideração de ques- tões prático-morais. De acordo com a teoria habermasiana, a democracia é constituída por um fluxo de comunicações que tem seu início nas redes de comunicação da esfera pública. Dessa forma, a democracia é concebida como estruturalmente dependente das redes de comunicação existentes na esfera pública, considerando que tais redes estabelecem a direção do processo de produção de poder nas sociedades democráticas (HABER- MAS, 1984). A perspectiva habermasiana concebe que as redes de comunicação da esfera pú- blica são essenciais para o exercício da de- mocracia numa sociedade. Não é difícil en- tender esse fato já que não é incomum que, em governos ditatoriais, haja um enorme controle em relação à mídia e, muitas ve- zes, grande repressão e censura desta. Nes- tas situações, percebe-se que é o próprio Estado que mais se utiliza das redes de co- municação, através da propaganda política, por exemplo, a fim de cultuar e valorizar o líder ou o país e manter o apoio da opinião pública em relação ao governo. Com a identificação de Habermas a respeito da relação entre racionalidade comunicativa atrelada a um processo livre de constrangimentos, ele traz uma solução para o problema entre ética e democracia, ou seja, uma solução de acordo com a qual o princípio ético envolvido na prática de- mocrática estaria relacionado à qualidade dos processos de comunicação ligados à democracia. A partir daí, a teoria haber- masiana permite o estabelecimento de uma relação entre democracia, ética e bem comum, na qual o bem comum estaria vin- culado a regras utilizadas pelos próprios participantes na prática da democracia. A partir disso, desenvolve-se um entendi- mento da democracia enquanto questão moral, isto é, enquanto procura intersub- jetiva das regras mais adequadas ao desen-

volvimento de uma sociabilidade coletiva (AVRITZER, 1996). Habermas, em a “Reconstrução do Ma- terialismo Histórico” (1976), propõe uma revolução no pensamento de Marx ao des- locar o processo de autoconstrução do in- divíduo como produtor das condições da sua vida material (concepção marxista) para conceber o indivíduo como produtor do processo de organização política da co- munidade em que vive. Para Habermas, o esclarecimento político, sendo desconecta- do do processo social de controle da natu- reza, remete ao processo prático-moral de reconhecimento dos indivíduos enquanto iguais, na sua capacidade de atores políticos. Tal concepção possui duas dimensões importantes da política a serem conside- radas: primeiramente, o reconhecimento do outro enquanto igual, demonstrando o aspecto democrático dos atores sociais quanto à participação política. Em se- gundo lugar, a utilização da linguagem e, portanto, da dimensão comunicativa e interativa desses atores sociais no deba- te crítico-racional acerca da organização normativa e política da sociedade em que vivem (idem). A concepção de Habermas traz, assim, um caráter bastante democrá- tico quanto à participação dos cidadãos no âmbito político de uma sociedade.

POLÍTICA E PODER

A política existe desde as primeiras con- cepções de cultura, na medida em que ela é primordialmente necessária na organização dos grupos sociais. Não há como negar tam- bém que, desde então, ela está vinculada ao poder e/ou aos processos de manifestação ou imposição deste, a exemplo dos muitos relatos encontrados ao longo da história como as formas de governo monárquica, oligárquica, totalitária, dentre outras. Nicolau Maquiavel (1996), em “O Prín- cipe”, define a política como a arte de con- quistar, manter e exercer o poder, o gover- no. Com Maquiavel, cai por terra a ideia da política enquanto busca da justiça e do bem comum. Em síntese, a finalidade es- sencial da política seria conquistar e man-

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SILEIRO

Uma política autêntica sempre está comprometida com a ética (MUSETTI, 1998). Assim, nenhuma profissão deveria ser mais nobre do que a política porque quem a exerce assume responsabilidades somente compatíveis com grandes quali- dades morais e de competência. E nenhu- ma profissão é mais importante porque o político, na sua capacidade de definir ins- tituições e tomar decisões estratégicas na vida das nações, tem uma influência direta sobre a vida das pessoas (BRESSER-PE- REIRA, 2006). Porém, no atual momento em que es- tamos vivendo, essas considerações não se fazem presentes. A política que tem sido feita no Brasil não tem nada de digna e os políticos que nos governam não entendem a nobreza e a importância de sua profissão, pois sequer respeitam os cidadãos, uma vez que carecem de qualquer compromisso com a verdade e a moralidade. Nesse senti- do, a crise política sem fim pela qual passa o Estado brasileiro sugere algumas refle- xões sobre o problema da (falta de) ética na política. Há que se considerar, primeiramente, que existe um problema de cunho estru- tural em nossa sociedade, uma vez que, desde que foi designado como Estado, o Brasil é dirigido por vários representantes desonestos e de duvidosa competência. De acordo com Streck (1995), o Brasil cons- truiu ao longo de sua história de quinhen- tos anos uma espécie de “razão cínica”, na medida em que dispõe de um sistema po- lítico que gerou um déficit de representa- tividade; um sistema econômico com uma insuficiência total; um sistema social de- sintegrado e, finalmente, um sistema cultu- ral que serve para motivar/sustentar tudo isso. Consequentemente, todo o sistema do país ergueu-se sobre bases frágeis, as quais refletem, ainda hoje, uma deficiência ética em diversas esferas, como, por exemplo, na do Poder Legislativo, tal como mostra a afirmação de que “nosso código penal protege muito mais a propriedade do que a vida. Assim, um furto de relógio recebe

uma pena de 1 a 4 anos, enquanto o aban- dono de um idoso, que, em consequência, morre de inanição, recebe um apenamento de seis meses a dois anos” (STRECK, 1995, p. 8-9). Assim, não é de se admirar que os habi- tantes deste País tenham atitudes desprovi- das de valores morais, uma vez que fomos criados e educados no contexto acima ex- plicitado. Não é de se espantar que, como revela Streck (1995), seja “normal” profis- sionais liberais não fornecerem recibo, seja “normal” o comerciante sonegar impostos, o cidadão comprar equipamento de infor- mática de origem suspeita, a mulher do che- fe da repartição utilizar o veículo oficial para fazer compras, como é “normal” o servidor receber “presentes” pelos serviços prestados no exercício de sua função pública. E é esta mesma sociedade que acaba se esquecendo dos que têm capacidade de roubar e saírem ilesos, elegendo corruptos (OLIVEIRA, 1995). Além disso, geralmen- te o problema da desonestidade política no Brasil vem à tona por ocasião de algum escândalo momentaneamente original - e, portanto, de repercussão mais dramáti- ca nos meios de comunicação - mas que acaba se tornando normal pela reiterada inexistência prática de responsáveis direta- mente incrimináveis, para cair finalmente no esquecimento de uma imprensa eter- namente em busca de escândalos “frescos” (ALMEIDA, 2004). Como já foi colocado, o problema da falta de ética na política deste País localiza- -se no cerne da formação do Estado brasi- leiro. Mas não é por isso que devemos con- tinuar passivos diante da imoralidade que nos cerca. Precisamos prestar mais atenção nos passos dos nossos políticos, pois, so- mente a partir de tal atitude, teremos me- nos

[...] casos de anões, dança do mensalão, sangues- sugas, vampiros, cuecão ou outros episódios do gênero. Que esses personagens não sejam lem- brados apenas como temas que inspiram as cha- cotas do carnaval, mas que fiquem bem vivos na lembrança de todos os brasileiros, principal- mente na hora de votarem (PAULA, 2008, p. 5).

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Considerações finais

Fazer uma reflexão acerca do tema “éti- ca e política” não é uma tarefa fácil, prin- cipalmente porque tal assunto encontra-se imerso na realidade cotidiana de todos nós, ou seja, gera um impacto direto sobre nossas vidas, uma vez que a falta de ética na política implica em danosas consequên- cias para a população como um todo. Po- líticos corruptos, por exemplo, são respon- sáveis pelo desvio de verbas de importantes áreas como a saúde e a educação, gerando prejuízo para a sociedade, em especial para os grupos mais pobres, os quais dependem em maior grau da “boa vontade” dos go- vernantes para terem acesso a melhores condições de sobrevivência. Nesse sentido, é importante ressaltar que o homem, embora inserido na nature- za, transcende-a; conhece o seu universo e transforma-o (OLIVEIRA, 1995). Por isso, apesar de presenciarmos e nos subme- termos cotidianamente a relações de do- minação, as quais são naturalizadas pelas ideologias dominantes, é preciso entender que tudo isso faz parte de uma construção histórica, ou seja, não se dá naturalmente.

Por isso, é necessário conscientizar as pes- soas de que há possibilidades de transfor- mação dessa realidade, advertindo-as so- bre a importância de fiscalizarmos o poder constituído, questionarmos suas raízes e métodos de permanência, para assim tra- balharmos como agentes de mudanças. Estudos como este, que nos levam a re- fletir sobre o mundo e, consequentemente, sobre nós mesmos, fazem parte desse mo- vimento em direção à transformação. Ao produzirmos um “saber do mundo” que contenha um conhecimento sobre as con- sequências que este saber traz, chegaremos sempre à necessidade de um “saber de si”, de conhecer sobre nossa condição humana. Sentiremos cada vez mais a necessidade de adentrar no terreno pantanoso da filosofia, sem nos esquecermos do mundo real. Como já afirmava Aristóteles (1997), o homem é um animal político, portanto é impossível pensá-lo dissociado da política. Por isso, devemos tentar fazer da política dos homens uma prática mais humana, que seja essencialmente calcada em valores éticos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALMEIDA, P. R. A ética na (e da) política: Existe alguma diferença entre a esquerda e a direita? Rev. Espaço Acadêmico, ano IV, nº 43, 2004. Disponível em: <http:// www.espacoacademico.com.br/043/43pra. htm>. Acesso em: 18 jun. 2007. ARISTÓTELES. Política. 3ª edição, tradu- ção de Mário da Gama Kury. Brasília: UnB.

AVRITZER, L. A Moralidade da Democra- cia: Ensaios Sobre Teoria Habermasiana e Teoria Democrática. 1. ed. Perspectiva/ UFMG, 1996.

BRESSER-PEREIRA, L. C. Ética e política. Jornal Folha de S. Paulo, 10/04/2006. Dis-

ponível em: <http://www.bresserpereira. org.br/ver_file.asp?id=1762>. Acesso em: 10 jan. 2010.

BUNSON, M. E. A Sabedoria do Papa. 1a ed. Rio de Janeiro: Rocco, 1997. CUNHA, P. F. Aristóteles – Filosofia do Homem: Ética e Política. Disponível em: <http://www.hottopos.com/rih8/pfc. htm#_ftn1>. Acesso em: 28 jun. 2007.

HABERMAS, J. Para a Reconstrução do Materialismo Histórico. São Paulo, Brasi- liense, 1976.

HABERMAS, J. Teoria da Ação Comuni- cativa. Traduzido por Thomas McCarthy.