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Este texto discute sobre o conector lógico que interliga proposições normativas primárias e secundárias, enfatizando a importância da interdefinição lógica no contexto de direito positivo. O documento aborda as qualificações sintáticas e semânticas de proposições normativas, incluindo proposições deonticas e jurídicas, e explica como as proposições podem ser ligadas mediante conectivos como 'e', 'ou' e 'se... Então'. Além disso, o texto discute a importância da interdefinição lógica em relação à determinação do conector adequado para relacionar proposições componentes de uma regra de direito positivo.
O que você vai aprender
Tipologia: Resumos
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SUMÁRIO: 1. Interdefinibilidade dos conectivos — 2. A via para escolha do conectivo — 3. A situação objetiva deôntica — 4. Uso do ou -includente — 5. Tese de F. Kaufmann — 6. A disjuntividade proposicional em Cossio — 7. Juízo disjuntivo e juízo hipotético — 8. Funções do dever-ser.
A questão posta em foco, acerca do conector que interliga a proposição normativa primária à proposição normativa secun- dária, relativiza-se sob o ponto-de-vista lógico-formal quando pensamos que os conectivos interdefinem-se. Sem maiores aná- lises, anotemos que com a negação - functor irredutível e primiti- vo - mais a disjunção temos o equivalente da conjunção, ou seja, p /\ q = ~(~p v ~q), que se lê: afirmar que p e q são ambos verda- deiros é equivalente a negar que pelo menos um dos argumentos é falso; por sua parte, com a negação mais a conjunção temos o equivalente da disjunção, ou seja, p v q = ~(p Ù ~q), que signifi- ca: afirmar que um dos argumentos pelo menos é verdadeiro equivale a negar que ambos sejam falsos; por fim, a implicação se define com a negação e a conjunção, ou seja, p ® q = ~(p Ù ~q), que se lê assim: afirmar que o argumento p implica o argu- mento q equivale a negar que p seja verdadeiro e q seja falso. Onde se diz verdadeiro e falso, na interpretação deôntica se ponha válido/não-válido, que são as qualificações sintática e se- mântica das proposições normativas, uma de cujas subclasses representa as proposições em que se exprimem as normas jurí-
dicas. Do contexto, vê-se que, onde se fala de proposições nor- mativas, proposições deônticas, proposições prescritivas, alude- se às proposições cujas significações são normas-de-Direito. Den- tro do universo das proposições deônticas, está o subuniverso das proposições jurídicas que exprimem normas. Estas não se confundem, por sua vez, com as proposições que são jurídicas, porque falam sobre proposições de Direito positivo. Assim sendo, poderíamos tomar a proposição normativa pri- mária e a proposição normativa secundária ligando-as mediante um e, um ou , um “se..., então”, procedendo à alteração na estrutu- ra interna das referidas proposições, de conformidade com as relações formais adequadas. Teríamos as duas proposições uni- das conjuntivamente, ou disjuntivamente, ou implicacionalmente, modificando-se, também, os conectivos formais operando den- tro de cada proposição. Assim sendo, do ponto de vista lógico, as equivalências denominadas interdefinicionais (analíticas) relati- vizam o problema de saber qual o conector adequado para rela- cionar as referidas proposições componentes de uma regra de Direito positivo. Não obstante o fato de que, aparte o operador “~” ( não , tido por absolutamente primitivo) os demais, representados pe- las constantes lógicas, serem redutíveis por definição formal (a negação mais uma constante é suficiente para definir outra cons- tante), os conectivos são subsistentes como modalidades opera- tórias no domínio das proposições. Recolhendo as proposições como elas se dão na experiência da linguagem natural e procuran- do reduzí-las aos esquemas formais-lógicos, constatamos que, ao lado de modos operatórios meramente gramaticais, expressivos de contextos não-formais (contextos fácticos, circunstanciais - da minha circunstância ou da circunstância compartilhada por to- dos de um grupo social), há modalidades operatórias puramente analíticas, que não se reduzem a uma única, tornando as demais supérfluas ou insubsistentes, justamente porque analiticamente redutíveis a uma só operação. Há, sim, equivalências que mos- tram a potência operatória da negação, sem destruir as demais constantes do universo formal.
como lícitos, ilícitos, proibidos, permitidos, obrigatórios, nulos, anuláveis, etc. Nenhum fato natural entra no universo social sem a experiência (científica, religiosa, estética) de uma valoração. O fato natural, já qualificado por outros critérios de valoração não- jurídicos, passa a importar ou ganhar relevância jurídica se me- diata ou imediatamente mantiver relação com a conduta huma- na. O universo social é antropocêntrico. Sempre o homem em inter-relação (a Zwischenmenschenlichkeit de L. W. Wiese) com o outro, para alcançar a relação com o mundo físico circundante. O correlato de referência da norma, em sua integridade, seu vetor semântico, está na conduta humana e nos fatos naturais que têm alguma relação, valorativamente relevante, para a con- duta. E a conduta humana é constitutivamente um poder-ser, uma possibilidade de ser isto ou aquilo, por maior que seja o cer- co restritivo no campo das possibilidades (na Filosofia contem- porânea do Direito, Cossio, firmado na Ontologia existencial, acentua essa concepção). E se a norma funciona prescritivamente, como diretiva para a conduta humana, há de ter em conta esse dado ontológico. Se uma norma foi posta, para ser norma jurídica, constituir- se-á de duas proposições: a primeira fixa as relações jurídicas ou situações jurídicas decorrentes da verificação ou não-verificação (fato não-ocorrente, omissivo) de fatos que são fatos jurídicos jus- tamente porque provocam tais “efeitos jurídicos”; a segunda, fixa as conseqüências para os sujeitos no caso de não seguirem o que está preceituado na norma antecedente. A conduta dos sujeitos se alojará numa ou noutra norma, não em ambas. Mesclar-se-iam o lícito e o ilícito, o devido e o não-devido se a conduta se inserisse simultaneamente na primeira e na segunda norma-parte da nor- ma total. Se se descumpre a norma primária, ingressa-se na órbita de incidência da norma secundária sancionadora. Se há observân- cia da norma primária, carece de sentido prescritivo subsumir a conduta na norma secundária. Do âmbito de possibilidades de con- duta para os sujeitos, são selecionadas duas, colocadas em sucessividade temporal. Cumprir/descumprir, ou observar/ inobservar, ou adimplir/inadimplir, é a dualidade que o ordenamento jurídico deixa aos sujeitos ante as normas positivas. São possibili-
dades mutuamente excludentes, contraditórias ou contrárias, con- forme logicamente sejam ou não exaustivas (ontologicamente, as possibilidades de fazer ou não-fazer são inesgotáveis). Quer se apresentem como contrárias ou como contraditó- rias ou simplesmente diversas, as condutas prescritas, ontologi- camente, não se verificam a um só tempo, satisfazendo (ou veri- ficando) a norma primária e a norma secundária. Se o preten- desse, o ordenamento jurídico perderia a sua função sociológica como técnica social de evitar condutas socialmente desvaliosas, sancionando-as na norma secundária. Não canalizaria o proces- so social no caminho axiologicamente positivo, contraditoriamen- te punindo o exercício do direito e o cumprimento do dever. No final, seria estatuir o obrigatório e o permitido e, ao mesmo tem- po, proibí-lo, ou indistinguir o juridicamente lícito e o juridica- mente ilícito. Se as proposições deônticas primária e secundária são váli- das, como observamos, podem ser unidas pelas constantes lógi- cas e, ou, “se ..., então”. Logicamente, indiferente nesse caso de validade positiva simultânea. A opção por um destes conectivos decorrerá do substrato factual — do fato-conduta e do fato-natu- ral — onde a natureza é valorada em função da conduta. Pode- mos, então, dizer: provém da conduta que é sempre inter-rela- cional, de sujeito para sujeito de atos e que sempre aparece reves- tida deonticamente, pelas normas do uso, dos costumes, ou pelas normas morais, ou religiosas, ou técnicas e pelas normas jurídi- cas, representando estas fração do campo deôntico. A tradução, em linguagem formalizada, da estrutura bimem- bre da proposição jurídica, isto é, a estrutura formal que corres- ponde à estrutura morfologicamente variada (usando linguagem ordinária e linguagem técnica — linguagem natural, portanto) do Direito formulado será: “( p ® q ) v ( ~ q ® r )”. Quer dizer: p implica q ou não- q implica r. Explicitando: se se dá um fato F (fato jurídi- co), então um sujeito S’ coloca-se em relação deôntica com outro sujeito S” , devendo fazer ou omitir ato cujo cumprimento pode ser exigido pelo outro. Se não se cumpre o estatuído, nova relação deôntica se estabelece, de caráter compensatório ou sancionador, ante a inobservância do devido. A ponte entre uma e outra propo-
tivado não coincidir com o dever-ser posto nas normas válidas do sistema jurídico. Há um sentido subjetivo de dever-ser na conduta que pode coincidir ou se desviar do sentido objetivo de dever-ser estabelecido como critério obrigatório de validade objetiva (pro- cedente do foco de irradiação normativa ou centro de decisão que, na evolução histórica, veio a ser o Estado). Um grupo organizado de revolucionários age de acordo com normas, que informam como deve-ser sua conduta. Esse o sentido subjetivo de dever-ser váli- do. Mas, do ponto de referência da ordem jurídica constituída, objetivamente válido é o dever-ser por ela instituído. A conduta dos membros do grupo penetra, assim, em dois estatutos, isto é, em dois sistemas normativos, que se excluem. A validade objetiva do dever-ser é dada pelo sistema normativo estatal.
Sociologicamente, impõe validade objetiva quem dispõe do “poder de decisão” em grau mais alto na ordem dos fatos. Deon- tologicamente, requer-se princípio superior de legitimação (a exigência de certos valores) para que a mera juridicidade das normas positivas adquiram sentido de Direito justo. Aqui tem sua oportunidade a distinção stammleriana entre conceito de Direito e idéia de Direito, mas não passando por alto que a sim- ples juridicidade de todo sistema implanta, na realidade social, um conteúdo axiológico, e uma certa concepção de justiça que bem pode não ser a concepção certa da justiça.
Procurando alcançar a formalogische Satzkonstruktion da proposição jurídica ( Rechtssatz ), Kaufmann rechaça a tese de que o conectivo ou represente a justa tradução formal da partícula que interliga norma primária e norma secundária. A proposição jurídica constitui-se como norma dupla, “ als Doppelnorm ”, se- gundo Kaufmann, e é do seguinte teor: Um sujeito A deve cum- prir uma conduta V 1 ; se não o faz, então deve realizar-se ( platz- greifen ) contra o mesmo a conduta V 2 (F. Kaufmann, Logik und Rechtswissenschaft, pág. 91). E, em nota abaixo, observa que a proposição jurídica não apresenta nenhuma disjunção, pois esta é simétrica, enquanto a relação entre norma primária e norma
secundária é irreversível. No texto: “Der Rechtssatz stellt keine Disjunktion dar, denn diese ist symmetrisch, waerend das Verhaeltniss zwischen primaerer und sekundaerer Norm, als ein subsidiaeres, unumkehrbar ist” (ob. cit., pág. 91, nota n. 3). Já observamos - ponto pacífico em lógica clássica e simbóli- ca - que tanto a conjunção como a disjunção de duas proposições não se alteram se permutarmos as posições ocupadas pelas pro- posições constituintes da conjunção e da disjunção. Duas propo- sições quaisquer, p , q dão as equivalências: “( p e q ) = ( q e p )”; “( p ou q ) = ( q ou p )”. É a lei comutativa aplicada à conjunção e à disjunção (Alfred Tarski, Introduction to Logic, pág. 43). A sime- tria, na teoria formal das relações, dá-se quando a relação R , na classe K , entre os elementos x e y vale de tal modo que “( x R y ) implica ( y R x )”. O que Kaufmann diz da propriedade relacional simétrica (sua reversibilidade ou convertibilidade) é, propriamen- te, a comutabilidade das proposições constituintes de uma con- junção ou de uma disjunção lógicas. Quer o conector e, quer o conector ou , que permitem a per- mutação das proposições componentes da operação lógica, sem alterar a matriz de valores, sua verdade ou sua validade, (numa matriz de validade jurídica ), articulam possibilidades lógico-for- mais irrecusáveis. Logicamente , proposição jurídica primária e proposição jurídica secundária são reversíveis, quer no caso do conjuntivo, quer no caso do disjuntivo. Formalmente, a lei de co- mutação aplica-se-lhes. Inexiste direção ou vetor interproposicio- nal cuja reversão alterasse o valor da proposição originária em sua integridade constitutiva. Tanto faz dizer “o papel é branco e a tinta é preta” como afirmar “a tinta é preta e o papel é branco”. É possível interpolar-se “ e/ou ” em proposições descritivas sem alteração da verdade, como intercalar-se nas proposições pres- critivas, sem alteração de validade. Muito embora a permutação seja logicamente possível, em virtude da lei de comutação, na proposição jurídica de conteúdo significativo especificado tal não pode ocorrer. E não é possível por determinação extralógica. Ontologicamente, não é indiferen- te pôr a conduta lícita — obrigatória ou permitida — antes ou depois da conduta ilícita, que serve de pressuposto à sanção. Da
ou somente com perinorma, apreendemos a conduta parcialmen- te, como possibilidade valiosa (licitude) ou como possibilidade desvaliosa (ilicitude). Dada a estrutura disjuntiva, por outro lado, a norma não é violada pela conduta: ou ingressa no âmbito endonormativo ou no âmbito perinormativo. Agora, ainda que formalmente a disjunção seja estranha à temporalidade, na norma jurídica, que é menção da conduta como existência temporal, a disjunção ex- prime sucessividade, o que é um dado extralógico. Não se pode colocar antes a perinorma, e depois a endonorma. A realização das possibilidades de conduta dá-se temporalmente numa rela- ção de ordem irreversível. Poder-se-ia pensar que a disjunção proposicional exprime uma alternativa, com um ou -excludente, cada um dos membros excluindo a verificação simultânea do outro membro. Se a con- duta verifica a endonorma, se o sujeito da prestação satisfaz o comportamento devido, não entra em jogo a perinorma, que prevê o comportamento contrário como pressuposto da sanção. Todavia, para a teoria egológica, tem-se partes de um todo normativo: há uma norma só que, em sua dualidade constitutiva, representa o dado da conduta em sua integridade: como condu- ta lícita e como conduta ilícita. Podemos dizer: licitude (en-do- normativa) e ilicitude (perinormativa) mutuamente se relacio- nam como significações de um mesmo universo-de-discurso e reciprocamente se exigem como possibilidades ontológicas do objeto-conduta.
A teoria egológica opõe-se à teoria pura do Direito no que concerne à estrutura da norma do Direito. Para Kelsen, a forma lógica desta é a de um “juízo hipotético”; para Cossio, a de um “juízo disjuntivo”. Mas, considerando-se bem a teoria egológica, ela não recusa a estrutura hipotética, pois na fórmula “dado A deve- ser B , ou dado não- B deve-ser S ” encontra-se a relação de antece- dente para conseqüente, característica da conexão hipótese/tese (ou prótase e apódose). Os símbolos literais nela contidos não são
variáveis nominais, mas variáveis proposicionais. Tanto que po- deremos formular assim: “se p então q ou se não- q então r ”. Des- formalizando: i ) dada uma situação coexistencial como o fato ini- cial de uma totalidade sucessiva, ii ) então deve-ser a prestação de alguém como obrigado ante alguém titular (isto é, se p , então q : p é a proposição com função de descritor, q é a proposição em que a conduta em recíproca interferência está posta deonticamente), iii ) ou dado o descumprimento do devido ( entuerto ) , iv ) então deve- ser a sanção do responsável (omitimos o resto do esquema, sem prejuízo para o ponto em foco de comentário, Cossio, ob. cit., pág. 662, nota), ou seja, em fórmula, “se não- q , então r ”. O conectivo “se/então” está contido na palavra “dado”. As proposições p e q , como “não- q ” e r podem ser relaciona- das conjuntivamente, disjuntivamente (com o ou -includente ou o ou -excludente) implicacionalmente ou co-implicacionalmente. Não há outro modo combinatório. Quanto à teoria pura do Direito, caracteriza logicamente a norma como juízo hipotético (dado A, deve-ser B ) (dado não- B , deve-ser C ); logo, elimina a primeira norma, que denomina nor- ma secundária (a endonorma). Depois, acentuando que o caráter propriamente jurídico reside na segunda norma, a norma primá- ria, que estatui o pressuposto da sanção (a perinorma), tem em conta somente esta. Com o que resta apenas uma norma, a norma sancionadora da conduta contrária àquela que evita a sanção. A teoria egológica restabelece a norma jurídica em sua integrida- de, que consta de endonorma e perinorma. Então surge o pro- blema: qual o seu tipo de conexão? A teoria vê, acertadamente, que a disjunção proposicional, função sintática do ou , é este conectivo. Kelsen, reduzindo a norma a uma só, tem apenas em mãos duas proposições em uma só relação hipotética, proposições constituintes da norma primária, que ele denomina o pressupos- to e a conseqüência. Já dissemos que as variáveis A e B não são variáveis nominais, mas variaveis proposicionais, só substituíveis por proposições Já observamos, ainda, que a norma primária kelseniana (como a norma secundária) é proposição inferiormen- te composta: é uma implicação que exige, pelo menos, dois argu- mentos (mesmo na tautologia “ p implica p ”, a relação implicacio- nal é biargumental: p desempenha dois papéis sintáticos).
me dá na experiência, posso relacionar na forma “se A é, então B é”, ou “se A é, então B deve-ser”. Ser e dever-ser são formas cate- goriais, métodos de síntese dos dados empíricos para elaborar os juízos sintéticos, com os quais ponho gnosiologicamente ordem no mundo. Temos o dever-ser como “imputação”, ou seja, o modo de relacionamento normativo. A imputação é irredutível à forma causal de relacionamento. Tão radical é a distinção que Kelsen não admite absolutamente essa síntese que o conceito de cultura implica em Rickert: valor/realidade, ser/dever-ser, causalidade/ normatividade (Alf Ross, Theorie der Rechtsquellen, pág. 257), pois, como Ross, interpretando, diz: “Sie bedeuten gleichgeordnete for- mule Kategorien, und keine Bruecke kann von der einem zu anderen fuehren”. Assim, imputabilidade e causalidade são duas categorias transcendentais no sentido kantiano, que tanto influiu em Kelsen, através do neokantiano Hermann Cohen. Como categoria ou modo fundamental do conhecimento, o dever-ser é axiologicamente neutro. Nem valioso nem desvalioso é o nexo que estabelece entre os dados-da-experiência. Além desse uso como categoria transcendental de relacio- namento dos dados-da-experiência, coordenada mas irredutível à categoria da causalidade, o dever-ser em Kelsen é tomado como functor ou operador deôntico, interligando não só pressuposto e conseqüência, mas os sujeitos da relação jurídica, qualificando as condutas em proibidas, em obrigatórias e em permitidas. En- tão, o dever-ser toma o papel sintático de um operador relacional, que se triparte para dar conta das possibilidades de conduta ju- ridicamente relevantes. Como toda variável relacional R , tem sua conversa: se S’ tem o dever de fazer ou omitir a conduta C face a S” , este tem face a S’ o direito de exigir o cumprimento da pres- tação estatuída. Os valores de R são valores relacionais, V , O e P ( P toma as variedades da permissão unilateral, da permissão bi- lateral, da permissão positiva e da permissão negativa). A formalização do functor deôntico importa na exclusão de seu conteúdo axiológico. Donde a distinção cossiana de “dever- ser lógico” e “dever-ser axiológico”. Há, ainda, o uso descritivo do dever-ser. O dever-ser na nor- ma jurídica tem função prescritiva. Na proposição jurídica sua
função é descritiva, teorética. A norma jurídica, digamos, ocupa o nível de linguagem-objeto, enquanto a proposição jurídica está no plano da linguagem que fala acerca da linguagem-objeto. A cláusula que indica esse plano de sobrelinguagem é de acordo com o sistema jurídico S... Em rigor, é uma proposição sobre ou- tra proposição, não a mesma proposição, o que seria (como viu acertadamente Cossio) uma duplicação supérflua do que a nor- ma jurídica já diz. Por isso, porque é uma proposição tendo por objeto a norma jurídica, a proposição é verdadeira ou falsa e per- tence ao sistema que é a Ciência-do-Direito. De passagem, ob- servemos, a terminologia kelseniana não é exata: tanto a norma jurídica quanto o enunciado com que a ciência dogmática des- creve a norma, logicamente, são proposições. Convencionalmen- te, é certo, podemos reservar o termo proposição para os enuncia- dos da metalinguagem, suscetíveis de valores veritativos. Para a exposição da teoria normativa, v. Gofredo Telles Jú- nior ( A Criação do Direito, págs. 209-236, vol. I; como posição face à estrutura hipotética e disjuntiva da norma, o estudo de Paulo de Barros Carvalho ( A Estrutura Lógica da Norma Tribu- tária, págs. 22-29); Wílson de Souza Campos Batalha ( Introdução ao Direito, págs. 210-239, vol. I; Evaristo de Morais Filho (O Pro- blema de Uma Sociologia do Direito, págs. 172-177); Orlando Go- mes ( Marx e Kelsen, págs. 9-44); Paulo Dourado de Gusmão ( In- trodução à Ciência do Direito, págs. 457-461).