Docsity
Docsity

Prepare-se para as provas
Prepare-se para as provas

Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity


Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos para baixar

Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium


Guias e Dicas
Guias e Dicas

Direito Economico e Financeiro, Manuais, Projetos, Pesquisas de Direito Econômico

Publicação sobre Direito Economico e Financeiro

Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas

2010

Compartilhado em 16/08/2010

roger-antonio-malvestio-lunz-4
roger-antonio-malvestio-lunz-4 🇧🇷

4.5

(2)

3 documentos

1 / 50

Toggle sidebar

Esta página não é visível na pré-visualização

Não perca as partes importantes!

bg1
MÓDULO I
DIREITO ECONÔMICO E FINANCEIRO
Direito Financeiro Orçamento
Prof. José Marcelo Martins Proença
1. DIREITO FINANCEIRO – BREVE DEFINIÇÃO
O direito financeiro é ramo do direito público encarregado de tutelar, em conjunto
com o direito tributário e direito econômico, a atividade financeira do Estado, composta
pela obtenção e gasto de seus recursos. Assim, é de se afirmar que o direito financeiro tem
por objeto a tutela do orçamento público, que, de maneira sucinta, pode ser definida como
o conjunto formado pela realização de despesas e arrecadação de receitas públicas.
1.1. Normas Gerais de Direito Financeiro
Normas gerais são aquelas expedidas pelo Congresso Nacional, aplicáveis a todas as
pessoas políticas (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) e destinam-se a atuar,
assim como os princípios, orientando e operando a integração do ordenamento jurídico.
Com relação ao Direito Financeiro, verifica-se na redação do artigo 24 da
Constituição Federal, que é concorrente a competência legislativa, cabendo à União,
Estados e, também, ao Distrito Federal.
Finalmente, é de se salientar que os dispositivos da Lei Complementar n. 4.320, de
17.3.1964 estatuem normas gerais de Direito Financeiro para elaboração e controle dos
orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, exceto
em relação àqueles que contrariem normas constitucionais, por isso, revogadas.
2. ORÇAMENTO
Este instituto tem relação direta com “planejamento”, previsão. Assim, trata-se de
uma “antecipação hipotética” dos créditos e débitos a cargo da pessoa política em
determinado espaço de tempo. Além da previsão, contém também um caráter autorizador.
2.1. Conceito
O orçamento é considerado o ato pelo qual o Poder Legislativo prevê e autoriza ao
Poder Executivo, por certo período e em pormenor, as despesas destinadas ao
funcionamento dos serviços públicos e outros fins, adotados pela política econômica ou
geral do país, assim como a arrecadação das receitas já criadas em leis. Assim, trata-se de
“documento” em que se localiza a previsão de despesas e de receitas para um período
determinado.
Essa expressão “arrecadação das receitas criadas em lei”, todavia, não veda a
arrecadação do tributo legalmente criado, sem prévia inclusão orçamentária. Em outras
palavras, expressa o instrumento que documenta a atividade financeira do Estado, contendo
a receita e o cálculo das despesas autorizadas para o funcionamento dos serviços públicos e
outros fins projetados pelos governos. Na realidade, há obrigação de previsão das despesas,
funcionando o orçamento como condição para sua realização, o que não ocorre com as
pf3
pf4
pf5
pf8
pf9
pfa
pfd
pfe
pff
pf12
pf13
pf14
pf15
pf16
pf17
pf18
pf19
pf1a
pf1b
pf1c
pf1d
pf1e
pf1f
pf20
pf21
pf22
pf23
pf24
pf25
pf26
pf27
pf28
pf29
pf2a
pf2b
pf2c
pf2d
pf2e
pf2f
pf30
pf31
pf32

Pré-visualização parcial do texto

Baixe Direito Economico e Financeiro e outras Manuais, Projetos, Pesquisas em PDF para Direito Econômico, somente na Docsity!

MÓDULO I

DIREITO ECONÔMICO E FINANCEIRO

Direito Financeiro Orçamento

Prof. José Marcelo Martins Proença

1. DIREITO FINANCEIRO – BREVE DEFINIÇÃO

O direito financeiro é ramo do direito público encarregado de tutelar, em conjunto com o direito tributário e direito econômico, a atividade financeira do Estado, composta pela obtenção e gasto de seus recursos. Assim, é de se afirmar que o direito financeiro tem por objeto a tutela do orçamento público, que, de maneira sucinta, pode ser definida como o conjunto formado pela realização de despesas e arrecadação de receitas públicas.

1.1. Normas Gerais de Direito Financeiro

Normas gerais são aquelas expedidas pelo Congresso Nacional, aplicáveis a todas as pessoas políticas (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) e destinam-se a atuar, assim como os princípios, orientando e operando a integração do ordenamento jurídico. Com relação ao Direito Financeiro, verifica-se na redação do artigo 24 da Constituição Federal, que é concorrente a competência legislativa, cabendo à União, Estados e, também, ao Distrito Federal. Finalmente, é de se salientar que os dispositivos da Lei Complementar n. 4.320, de 17.3.1964 estatuem normas gerais de Direito Financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, exceto em relação àqueles que contrariem normas constitucionais, por isso, revogadas.

2. ORÇAMENTO

Este instituto tem relação direta com “planejamento”, previsão. Assim, trata-se de uma “antecipação hipotética” dos créditos e débitos a cargo da pessoa política em determinado espaço de tempo. Além da previsão, contém também um caráter autorizador.

2.1. Conceito

O orçamento é considerado o ato pelo qual o Poder Legislativo prevê e autoriza ao Poder Executivo, por certo período e em pormenor, as despesas destinadas ao funcionamento dos serviços públicos e outros fins, adotados pela política econômica ou geral do país, assim como a arrecadação das receitas já criadas em leis. Assim, trata-se de “documento” em que se localiza a previsão de despesas e de receitas para um período determinado. Essa expressão “arrecadação das receitas já criadas em lei”, todavia, não veda a arrecadação do tributo legalmente criado, sem prévia inclusão orçamentária. Em outras palavras, expressa o instrumento que documenta a atividade financeira do Estado, contendo a receita e o cálculo das despesas autorizadas para o funcionamento dos serviços públicos e outros fins projetados pelos governos. Na realidade, há obrigação de previsão das despesas, funcionando o orçamento como condição para sua realização, o que não ocorre com as

receitas, que poderão ficar aquém ou além do previsto, sem que disso resulte qualquer implicação. Lamentavelmente, o orçamento está longe de espelhar, entre nós, um plano de ação governamental referendado pela sociedade, tendendo mais, na verdade, para o campo da ficção. O desvio na realização de gastos públicos costuma ocorrer por meio dos seguintes expedientes:

  • superestimação de receitas;
  • contingenciamento de despesas;
  • anulação de valores empenhados;
  • instituição de fundos.

2.2. Natureza Jurídica

Apesar de não haver unanimidade acerca da natureza jurídica do orçamento, entre nós, essa discussão não tem relevância, visto que, desde a reforma constitucional de 1926, nossas Constituições sempre consideraram o orçamento uma lei. O artigo 166 e parágrafos da Constituição Federal estabelecem um regime peculiar de tramitação do projeto de lei orçamentária, de iniciativa do Executivo, sem, contudo, exigir quorum qualificado para sua aprovação; daí sua natureza de lei ordinária. A lei orçamentária, entretanto, difere das demais leis; estas caracterizadas por serem genéricas, abstratas e constantes ou permanentes. A lei orçamentária é, na verdade, uma lei de efeito concreto, para vigorar por um prazo determinado de um ano, fato que, do ponto de vista material, retira-lhe o caráter de lei. Essa peculiaridade levou parte dos estudiosos a sustentar a tese do orçamento como ato-condição. Sob o enfoque formal, no entanto, não há como negar a qualificação de lei. Concluindo, dizemos que o orçamento é uma lei ânua, de efeito concreto, estimando as receitas e fixando as despesas necessárias à execução da política governamental.

2.3. Espécies

As ditas “espécies orçamentárias”, na realidade, são as modalidades diversas de leis orçamentárias, previstas na Constituição Federal. Encontram-se previstas em número de três e, abaixo, seguem algumas especificações: a) Lei que institui o plano plurianual (artigo 165, § 1º, da Constituição Federal) : estabelecendo de forma regionalizada as diretrizes, objetivos e metas da administração pública federal para as despesas de capital e outras delas decorrentes, e para as relativas aos programas de duração continuada; b) Lei de diretrizes orçamentárias (artigo 165, § 2º, da Constituição Federal) : compreendendo as metas e prioridades da Administração Pública Federal, incluindo as despesas de capital para o exercício financeiro subseqüente, orientando a elaboração da lei orçamentária anual, dispondo sobre as alterações na legislação tributária e estabelecendo a política de aplicação das agências financeiras oficiais de fomento. Esta lei não se estabelece antes de ser submetida à apreciação do Congresso Nacional. Deve esta lei, ainda, preceder à elaboração do orçamento, uma vez que fornece as metas e as prioridades que devem constar no orçamento. c) Lei que aprova o orçamento anual (artigo 165, § 5º, da Constituição Federal) : abarca o orçamento fiscal referente aos três Poderes da União, seus fundos, órgãos e

econômica e a ação governamental do Estado, fomentando o crescimento das entidades político-administrativas de direito público interno”. 1 c) Princípio do equilíbrio orçamentário Esse princípio, no passado, era considerado como regra de ouro das finanças públicas. Com a crise econômica de 1929, porém, a tese do equilíbrio orçamentário passou a ser vigorosamente combatida. Hoje prevalece o pensamento de que não cabe à economia equilibrar o orçamento, mas ao orçamento equilibrar a economia, isto é, o equilíbrio orçamentário não pode ser entendido como um fim em si mesmo, mas como um instrumento a serviço do desenvolvimento da nação. Assim, fez bem o legislador constituinte em abolir a expressão desse princípio, limitando-se a recomendá-lo em alguns de seus dispositivos, como naqueles em que se limita o endividamento, fixam as despesas, estabelece o mecanismo de controle das despesas, proíbe a abertura de créditos suplementares ou especiais sem a indicação de recursos correspondentes etc, que impulsionam a ação dos legisladores no sentido do equilíbrio orçamentário. d) Princípio da anualidade (artigo 48, inciso II, artigo 165, inciso III e § 5.º, e artigo 166 da Constituição Federal) “O vetor da anualidade orçamentária, também conhecido por antonomásia, princípio da lei ânua, nasceu do expediente político de se obrigar os monarcas a convocarem o parlamento, pelo menos, uma vez por ano. Vigora entre nós desde a Constituição Imperial de 1824”.^2 A característica fundamental do orçamento é a sua periodicidade. É da tradição brasileira, como também da maioria dos países, que esse período, o do exercício financeiro, seja de um ano. Daí o princípio da anualidade, que decorre de vários dispositivos expressos na Constituição Federal. De acordo com a Constituição Federal (artigo 165, § 9.º, inciso I), cabe à lei complementar “dispor sobre o exercício financeiro, a vigência, os prazos, a elaboração e organização do plano plurianual, da lei de diretrizes orçamentárias e da lei orçamentária anual”. A Lei que rege o assunto é a de n. 4.320, de 17.3.1964, e, por ela, o exercício financeiro vai de 1.º de janeiro a 31 de dezembro. e)Princípio da unidade (artigo 165, § 5.º, da Constituição Federal) Atualmente existe uma multiplicidade de documentos orçamentários. O princípio da unidade, porém, ao contrário do que se estabelecia antigamente, não se preocupa com a unidade documental, mas com a unidade de orientação política, de sorte que os orçamentos se estruturem uniformemente, ajustando-se a um método único, vale dizer, articulando-se com o princípio da programação. f) Princípio da Universalidade (artigo 165, § 5.º , da Constituição Federal) Esse princípio significa que as parcelas da receita e da despesa devem figurar em bruto no orçamento, isto é, sem quaisquer deduções. Hoje esse princípio tem sentido de globalização orçamentária, significando a inclusão de todas as rendas e despesas dos Poderes, fundos, órgãos, entidades da Administração direta e indireta etc, no orçamento anual geral; fato esse que contribui para a obtenção do equilíbrio financeiro. (^1) BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal Anotada. 3.ª ed. Saraiva. 2001. p. 1109. (^2) BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal Anotada. 3.ª ed. Saraiva. 2001. p. 1109.

De acordo com esse princípio expresso no § 5.º, do referido artigo, a lei orçamentária deve compreender o orçamento fiscal, o orçamento de investimento das empresas, o orçamento da seguridade social e os que se ligam ao plano plurianual (este se inter-relaciona com os planos e programas nacionais, regionais e setoriais). g) Princípio da Legalidade Orçamentária (artigo 165, § 1.º, da Constituição Federal) Segue o sentido geral do princípio da legalidade, pelo qual ninguém é obrigado a fazer, ou não fazer algo senão em virtude de lei. Assim, em matéria orçamentária, esse princípio significa que a Administração Pública subordina-se às prescrições legais. h) Princípio da Transparência Orçamentária (artigo 165, § 6.º, da Constituição Federal) É um desdobramento do princípio da transparência tributária. Por esse princípio, o projeto de lei orçamentária será acompanhado de demonstrativos regionalizados do efeito sobre as receitas e despesas, decorrentes de isenções, anistias, remissões, subsídios e benefícios de natureza financeira, tributária e creditícia, possibilitando, mais tarde, a fiscalização e o controle interno e externo da execução orçamentária. i) Princípio da Publicidade Orçamentária (artigos 37, 165, § 3.º e 166, § 7.º, da Constituição Federal) A Administração Pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer um dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá a esse princípio. Devido à sua grande importância, além de estar previsto em caráter geral, a Constituição Federal determinou, ainda, sua observância relativamente aos projetos de leis orçamentárias e ordenou a publicação, pelo Poder Executivo, do relatório resumido da execução orçamentária.

2.5. Fiscalização e Controle Interno e Externo dos Orçamentos

O orçamento pode ser entendido como o instrumento fiscalizador da atividade financeira do Estado, com o escopo de coibir os abusos dos governantes. Com o intuito de assegurar o controle orçamentário, a Constituição Federal adota mecanismos de rigorosa fiscalização que, inclusive, extravasam o campo de atuação do princípio da legalidade para adentrar nos limites da legitimidade, da economicidade etc. Para tanto, há possibilidade de controle interno e externo. “É importante observar que a Constituição de 1988 não consagrou os controles interno e externo como realidades estanques. Ao invés disso, devem atuar em harmonia, de modo integrado e sistêmico, em nome da gestão democrática da coisa pública (art. 74, IV, da Constituição Federal)”.^3

2.5.1. Controle Interno ou Autocontrole (parte final do artigo 70 da

Constituição Federal)

O que caracteriza esse tipo de controle é o princípio da hierarquia, que impõe às autoridades superiores o dever de exercer controle sobre seus subalternos, concordando ou revendo os atos por eles praticados, notadamente em matéria de execução orçamentária. (^3) BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal Anotada. 3.ª ed. Saraiva. 2001. p. 806.

constituindo, na maioria das vezes, a rotina dos serviços públicos; ou extraordinárias, as quais não se renovam todos os anos por se tratarem de serviços de caráter esporádico;

  • relacionando-se com o critério produtividade , temos as despesas produtivas, que criam utilidades por intermédio da atuação estatal; as reprodutivas, as quais representam o aumento da capacidade produtora do país e as despesas públicas improdutivas, que correspondem às despesas inúteis;
  • decorrente da competência constitucional de cada entidade política , temos as despesas federais, que se destinam à realização dos fins e dos serviços públicos que competem exclusivamente à União; as estaduais, as quais encontram-se relacionadas com as atribuições conferidas aos estados-membros e despesas públicas municipais, referentes ao exercício da competência municipal). De se esclarecer que esta classificação é muito criticada, pois existem outras matérias além das de competência comum entre as três esferas políticas;
  • com relação à atividade econômica estabelecida, isto é, quanto à economia , poderá a despesa ser denominada despesa-compra, a qual é realizada para compra de serviços e produtos, e despesa-transferência, que se limita a criar rendimentos para os indivíduos sem qualquer contraprestação destes;
  • em decorrência de previsão expressa na Lei n. 4.324/64 temos a denominada classificação quanto à legalidade , que se divide em despesas concorrentes, as quais abrangem as despesas de custeio e as transferências concorrentes e despesas de capital, abrangendo os investimentos, as inversões financeiras e a transferência de capital.

3. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

A despesa pública, para que possa ser realizada, exige inclusão em lei orçamentária. Logo, devido a tal exigência, necessário o respeito ao princípio da legalidade, Assim, o princípio da legalidade preside as realizações de despesas. Portanto, a inobservância de normas legais poderá resultar ao agente público crime de responsabilidade. Ainda, no caso de o agente ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento, constituir-se-á ato de improbidade administrativa.

4. TÉCNICA DE REALIZAÇÃO DA DESPESA PÚBLICA

Para que se realize a despesa pública, via de regra, faz-se necessário percorrer quatro etapas que, se desviadas, implicam em sua ilegalidade. São as etapas: a) empenho; b) liquidação; c) ordem de pagamento; e d) pagamento. A etapa inicial para a realização de uma despesa é seu prévio empenho , o qual representa reserva de recursos na respectiva dotação inicial ou no saldo existente, ou seja, é um ato advindo de autoridade competente que cria para o Estado obrigação de pagamento pendente ou não de implemento de condição, visando, desta forma, garantir os diferentes credores do Estado, a teor do disposto no artigo 58 da Lei n. 4.320/64. De se salientar que, de acordo com lição de Celso Ribeiro Bastos, “o empenho não cria uma obrigação jurídica de pagar, como acontece em outros sistemas jurídico- financeiros. Ele consiste numa medida destinada a destacar, nos fundos orçamentários destinados à satisfação daquela despesa, a quantia necessária ao resgate do débito”.

Em uma segunda etapa, procede-se na liquidação da despesa pública , fase na qual, segundo Alberto Deodato, é observado o direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito. Entretanto, também citado por Celso Ribeiro Bastos, José Afonso da Silva entende que não é criado direito algum por meio da liquidação, sendo apenas a confirmação do direito criado pelo contrato estabelecido entre as partes. A terceira fase de constituição de uma despesa pública, determinada pelo artigo 64 da Lei 4.320/64, é a ordem de pagamento , a qual se caracteriza pelo despacho da autoridade competente que determina o pagamento da despesa. Finalmente, concluindo a execução das despesas públicas, existe a última fase desse procedimento, que consiste no próprio pagamento , ato pelo qual tem-se por extinta a obrigação de pagar e realizada, finalmente, a despesa pública.

5. A DISCIPLINA CONSTITUCIONAL E LEGAL DOS PRECATÓRIOS

No que tange aos débitos originários de condenação judicial, as etapas supramencionadas também devem ser respeitadas. Além das etapas, certos requisitos expressos no artigo 100 da Constituição Federal, alterado pela Emenda Constitucional n.30/2000, deverão ser observados. Assim, esses débitos são requisitados pelo Presidente do Tribunal que proferiu a decisão a ser executada, por meio de precatório, sendo este inserido pela autoridade política devedora na ordem cronológica de apresentação. Exceção se faz aos créditos de natureza alimentícia, os quais não entrarão nesta ordem. Créditos dessa natureza são os expressamente previstos no parágrafo 1º-A do artigo 100 da Constituição Federal. O Executivo não ficará obrigado a requerer abertura de crédito especial para atendimento dos precatórios no caso de estarem esgotados os recursos orçamentários. Neste caso, deverá ser demonstrada ao órgão judicial competente a impossibilidade de cumprir a decisão judicial.

MÓDULO III

DIREITO ECONÔMICO E FINANCEIRO

Receita Pública

Prof. José Marcelo Martins Proença

1. CONCEITO

Receita é recurso obtido para fazer frente às despesas, salientando-se uma vez mais que, em conjunto com estas últimas, formam o orçamento. A qualidade de ser pública, de acordo com a doutrina de Celso Ribeiro Bastos, advém de ser o ente arrecadante pessoa jurídica de direito público. Assim, se arrecadada por pessoa jurídica de direito privado, deixaria a receita de ser pública. O conceito mais preciso é dado por Aliomar Baleeiro, segundo o qual, “receita pública é a entrada que, integrando-se no patrimônio público sem quaisquer reservas, condições ou correspondência no passivo, vem acrescer o seu vulto, como elemento novo e positivo”.

  • Derivadas : decorrentes das parcelas de riquezas que o Estado, face ao seu poder de autoridade, pode retirar de seus subordinados para a realização de seus fins, visando sempre o bem-estar geral. Decorrem da exploração do patrimônio ou de rendas de seus subordinados. A título de exemplo, podemos citar a receita advinda da cobrança de tributos. Existe corrente doutrinária que traz uma terceira classificação baseada na origem da receita. Tal corrente denomina a receita de receita pública transferida , que também deriva do patrimônio do particular; entretanto não é cobrada pelo ente que utilizará tal receita, isto é, é cobrada por pessoa política diversa do destinatário da arrecadação.

3.2. Classificação Legal

Leva em consideração o que determina o artigo 11 da Lei n. 4.320/64, a qual institui normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, Estados, Municípios e Distrito Federal. Segundo o diploma legal, as receitas são divididas em receitas correntes e receitas de capital. Trata-se de classificação decorrente da destinação a que se dá à receita pública.

  • Receitas correntes : segundo dispõe o § 1.º do artigo 11 da citada lei, são as receitas destinadas a atender às despesas correntes (despesas de custeio). Tratam-se das receitas resultantes da atuação do Estado, utilizando-se de prerrogativas provenientes do regime jurídico da Administração, isto é, atuando, fazendo-se valer de seu poder de império. Assim, são receitas provenientes da cobrança de tributos, de contribuições e outros.
  • Receitas de capital : a teor do disposto no § 2.º do artigo 11 da lei, de capital são as receitas destinadas a atender às despesas classificadas como despesas de capital (decorrentes de investimentos) e ao superávit do orçamento (saldo positivo, quando da confrontação entre receita e despesa). Referem-se às receitas obtidas em decorrência de negociações entre o Estado e uma pessoa física ou jurídica, de direito público ou de direito privado. A título de exemplo, podemos citar as receitas decorrentes de alienação de bens, operações de crédito e amortização de empréstimos, dentre outros.

4. PREÇO PÚBLICO E A SUA DISTINÇÃO COM A TAXA

Em que pese à existência de constante confusão entre preço público e taxa, e embora o produto de ambos venha a fazer parte da receita pública, os institutos não se confundem. Assim, temos que taxa é uma das espécies tributárias. Trata-se de tributo vinculado a uma atuação estatal, tendo, por conseqüência, sua cobrança submetida ao regime de direito público. É considerada uma obrigação ex lege (decorrente da lei, e não de disposição de vontade das partes), ou seja, só pode ser exigida dos particulares “em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição”, de acordo com o disposto no artigo 145, inciso II, da Constituição Federal. Preço público, de modo diverso, é simplesmente uma tarifa, significando a contraprestação paga pelos serviços solicitados ao Estado ou pelos bens por ele vendidos. Assim, trata-se de uma obrigação ex voluntate (decorrente da vontade das partes, sendo que uma das partes presentes é o Estado), sendo necessário um contrato, expresso ou tácito, entre as partes, logo, seu regime jurídico é de direito privado.

Já fora mencionado, em outra oportunidade, a diferença entre estes institutos (módulo 3 – Direito Tributário). Naquela oportunidade, fora dito que tal diferença é determinada pela sua obrigatoriedade (compulsoriedade). A teor do disposto na Súmula n. 545 do Supremo Tribunal Federal: “Preços de serviços públicos e taxas não se confundem, porque estas, diferentemente daqueles, são compulsórias e têm sua cobrança condicionada à prévia autorização orçamentária, em relação à lei que as instituiu”. Cabe a cobrança de preço público quando se está diante de coisa em comércio, enquanto que a taxa será cobrada quando houver determinação legal. A comparação que segue entre taxa e preço público foi retirada do Código Tributário Nacional Comentado, coordenado por Vladimir Passos de Freitas, Revista dos Tribunais, artigo 77: Taxa:

  • exercício do poder de polícia;
  • utilização efetiva ou potencial do serviço público;
  • remuneração por serviços públicos essenciais ou cuja atividade econômica não compete originariamente à iniciativa privada. Preço Público:
  • remunera serviços que não têm natureza de públicos;
  • atividade monopolizada;
  • pressupõe contratação;
  • serviços não essenciais, que admitem concessão.

MÓDULO IV

DIREITO ECONÔMICO E FINANCEIRO

Dívida Ativa da União de Natureza Tributária e

Não-Tributária, Inscrição, Cobrança

1. CONCEITO

Dívida ativa é o crédito do Estado a ser cobrado executivamente. Esgotado o prazo de pagamento fixado pela lei ou por decisão administrativa, de que não caiba mais recurso, o crédito tributário é inscrito no Livro de Inscrição da Dívida Ativa pela Procuradoria da Fazenda. A Lei n. 6.830, de 22.9.1980, todavia, amplia o conceito do que seja dívida ativa, abrangendo “aquela definida como tributária ou não-tributária na Lei n. 4.320, de 17.3.1964”, dispondo, assim, que qualquer valor, cuja cobrança seja atribuída por lei às entidades políticas e respectivas autarquias, será considerado dívida ativa da Fazenda Pública.

2. REQUISITOS PARA INSCRIÇÃO

O art. 202 do CTN enumera os requisitos que deve conter o termo de inscrição da dívida ativa, autenticada pela autoridade administrativa competente. Além dos requisitos previstos no referido artigo, a certidão que constitui título executivo deverá conter a indicação do número do livro e da folha em que foi inscrita a dívida.

2.1.2. Quanto à natureza ou competência (dependerá da pessoa

jurídica que os autoriza)

  • Federal
  • Estadual
  • Municipal

2.1.3. Quanto à forma (são os títulos da dívida pública)

  • Voluntários : aqueles obtidos junto ao mercado de capitais ou mediante a emissão de títulos.
  • Patrióticos ou semi-obrigatórios : aqueles adquiridos sob coação indireta, como apelos, propaganda e pressão social.
  • Obrigatórios ou coativos : empréstimos forçados, de subscrição obrigatória, podendo também ocorrer mediante autorização de emissão de moeda por via do Banco Central.

2.1.4. Quanto ao prazo

  • A longo prazo : são resgatáveis em exercício diferente daquele do contrato, podendo ser também nominados de perpétuos, quando não houver data de resgate. Tais empréstimos podem ser remíveis, reservando-se ao Estado um dia resgatá-los, ou irremíveis, não havendo essa previsão.
  • A curto prazo ou temporários : aqueles em que o resgate ocorrerá dentro do exercício financeiro.

2.1.5. Quanto à classificação constitucional

  • Operações de crédito por antecipação de receita : objetiva suprir déficit de caixa, mediante empréstimos de curto prazo.
  • Operações de crédito em geral : são aquelas que, por exclusão, não se acham compreendidas na hipótese acima, correspondendo aos empréstimos de longo prazo que objetivam atender, em geral, às despesas de capital.

2.2. Fases

2.2.1. Emissão

É a fase inicial vinculada ao princípio da legalidade. Trata-se do momento do lançamento dos títulos diretamente pelo Estado ou por intermédio de corretores, banco ou bolsa de valores, sob as condições que ele próprio, o Estado, estipular; e será feito indiretamente, quando se operar a emissão mediante intermediários.

2.2.2. Condições oferecidas

São as vantagens estipuladas para o resgate do empréstimo, que deverão ser suficientes para atrair o interesse dos possíveis subscritores, como:

  • abaixo do par;
  • ao par;
  • sorteios;
  • concessão de direitos;
  • títulos com privilégios fiscais;
  • títulos com vantagens jurídicas.

2.2.3. Extinção do empréstimo

A extinção do empréstimo corresponde às várias formas que viabilizam seu pagamento, mediante a sua liquidação total no vencimento ou em amortizações de parcelas até o resgate total:

  • anuidades termináveis : juros e amortizações são pagos ao longo de um período, em prestações iguais, até completa liquidação da dívida, de sorte que, com o passar do tempo, a parcela do capital restituído é cada vez maior, segundo a tabela Price ;
  • liquidação : pagamento total do empréstimo, diretamente ou por compra em Bolsa (amortização simultânea no vencimento);
  • amortização : pagamentos sucessivos de parcelas do empréstimo, até o resgate total;
  • saldos orçamentários (Constituição Federal artigo 164 § 2.º) : ocorre quando o Estado, na medida dos seus saldos orçamentários, resgata os títulos colocados em Bolsa, aproveitando as cotações inferiores ao valor nominal;
  • rendas vitalícias (empréstimos perpétuos) : forma européia antiga em que o Tesouro se obrigava a pagar uma prestação até o fim da vida do subscritor, extinguindo-se a dívida com a morte deste ou do seu beneficiário;
  • em série de sorteios : o Tesouro Público, mediante sucessivos sorteios, vai amortizando a obrigação até a extinção do crédito de todos os mutuantes;
  • repúdio : é a forma esdrúxula de extinguir o empréstimo, independentemente da vontade de seu subscritor, podendo, inclusive, causar sérios prejuízos ao crédito público em caso de necessidade de novos empréstimos;
  • compensação (Código Tributário Nacional artigo 170) : possibilidade de um encontro de contas em relação a débitos tributáveis do mutuante.

2.3. Garantias

São a característica substancial que leva confiança ao subscritor ou lhe convence da opção pelo investimento; podem ser:

  • garantias reais : aquelas vinculadas a bens do seu patrimônio, anualmente autorizadas pelo Senado Federal, mediante resolução dispondo sobre operações de crédito interno e externo e concessão de garantias, seus limites e condições de autorização;
  • garantias de terceiros : aquelas oferecidas por terceira pessoa pública ou privada, nos termos da regulamentação anualmente editada pelo Senado Federal, exigindo-se a comprovada adimplência prévia da entidade tomadora e garantidora;
  • garantias vinculadas : quando se compromete determinada renda tributável do Estado, vinculando-a ao pagamento do empréstimo;
  • empréstimos indexados : quando o valor para o resgate é vinculado ao preço de determinados produtos ou serviços, à determinada moeda estrangeira forte, ao câmbio da data do resgate. É garantido pelo valor internacional do ouro, também ao tempo do pagamento do empréstimo.
  • artigo 75 : aplicabilidade das normas supra na organização, composição e fiscalização dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, bem como dos Tribunais e Conselhos de Contas dos Municípios;
  • artigos 157, 158 e 159 : dispositivos acerca da repartição das receitas tributárias;
  • artigo 160 : vedação da retenção ou restrição à entrega e ao emprego dos recursos atribuídos aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios;
  • artigo 161 : competência da lei complementar em matéria de repartição das receitas tributárias;
  • artigo 162 : divulgação da União quanto aos montantes de cada um dos tributos arrecadados, recursos recebidos, valores de origem tributária entregues e a entregar, e a expressão numérica dos critérios de rateio;
  • artigo 163 : competência da lei complementar, em matéria de finanças públicas;
  • artigo 164 : exercício exclusivo do Banco Central na emissão de moeda;
  • artigo 165 : leis de iniciativa do Poder Executivo – plano plurianual, diretrizes orçamentárias e orçamentos anuais;
  • artigo 166 : normas sobre apreciação dos projetos de lei relativos ao plano plurianual, às diretrizes orçamentárias, ao orçamento anual e aos créditos adicionais;
  • artigo 167 : vedações no tocante ao orçamento, regras quanto aos créditos especiais extraordinários;
  • artigo 168 : prazo para entrega dos recursos correspondentes às dotações orçamentárias, compreendidos os créditos suplementares e especiais, destinados aos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário e do Ministério Público;
  • artigo 169 : limitação da despesa com o pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

2. ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS

  • artigo 33 : pagamento do valor dos precatórios judiciais, pendentes na data da promulgação da Constituição;
  • artigo 35 : forma de cumprimento do artigo 165, § 7.º;
  • artigo 36 : ratificação pelo Congresso Nacional dos fundos existentes na data da promulgação da Constituição;
  • artigo 38 : limitação pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios de despesas com pessoal;
  • artigo 71 : instituição do Fundo Social de Emergência;
  • artigo 72 : rol dos valores que integram o Fundo Social de Emergência;
  • artigos 74 e 75 : dispõem sobre a contribuição provisória sobre movimentação financeira (CPMF);
  • artigo 76 : desvinculação de 20% de algumas receitas da União;
  • artigo 77 : recursos mínimos a serem aplicados nas ações e serviços públicos de saúde;
  • artigo 78 : normas sobre liquidação de precatórios;
  • art igo 79: instituição do Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza;
  • artigo 80: discrimina as receitas integrantes ao Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza;
  • artigo 81: regras sobre o Fundo constituído pelos recursos recebidos pela União em decorrência da desestatização de sociedades de economia mista ou empresas públicas por ela controladas;
  • artigo 82: regras referentes à criação de Fundos de Combate à Pobreza pelos Estados, Distritos Federal e Municípios;
  • artigo 84: prorrogação da cobrança da CPMF até 31 de dezembro de 2004 e disciplina a destinação do produto arrecadado;
  • artigo 85: elenca hipóteses de não incidência da CPMF;
  • artigos 86, 87 e 88: regras relativas a precatório.

MÓDULO VII

DIREITO ECONÔMICO E FINANCEIRO

1. ORDEM CONSTITUCIONAL ECONÔMICA

A idéia de ordem econômica pressupõe a possibilidade lógica de se distinguirem as normas jurídicas de conteúdo econômico de todas as demais normas jurídicas, o que, segundo os ensinamentos do Prof. FÁBIO KONDER COMPARATO^6 , talvez não seja possível, dado que, até hoje, ninguém conseguiu definir precisamente no que consiste a ordem econômica, já que há concordância geral em que a economia tem a ver com a produção e a distribuição da riqueza, a formação de preços, a determinação da renda nacional e o nível de emprego. Não há unanimidade, porém, quando se pensa que o próprio conceito de riqueza tem evoluído e compreende, além dos bens materiais, certos bens culturais e condições sociais de vida, tais como a saúde e a educação, que são geralmente consideradas como resultantes de políticas sociais e não propriamente de decisões econômicas stricto sensu. O Direito Constitucional brasileiro, entretanto, caminhou em sentido contrário à evolução do conceito de riqueza, uma vez que, enquanto as Constituições de 1934, 1946 e 1967 combinaram em um único capítulo a ordem econômica e a social, a atual Constituição separou essas duas séries de normas, reservando o seu título VII à “ordem econômica e financeira” e o título VIII à “ordem social”. Bem ou mal caracterizada a ordem econômica, além dos preceitos constantes no título VII da Constituição Federal, são transportados ao seu bojo – pelos ensinamentos do Prof. EROS ROBERTO GRAU^7 –, fundamentalmente, os preceitos inscritos nos arts. 1.º, 3.º, 7.º a 11, 201, 202, 218 e 219, bem como, entre outros, os preceitos do art. 5.º, inc. LXXI, do art. 24, inc. I, do art. 37, incs. XIX e XX, do § 2.º do art. 103, do art. 149 e do art. 225, ou seja:

  • a dignidade da pessoa humana como fundamento da República Federativa do Brasil (art. 1.º, inc. III) e como fim da ordem econômica (art. 170, caput );
  • os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa como fundamentos da República Federativa do Brasil (art. 1.º, inc. IV) e a valorização do trabalho humano e da livre iniciativa como fundamentos da ordem econômica (art. 170, caput );
  • a construção de uma sociedade livre, justa e solidária como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil (art. 3.º, inc. I);
  • a garantia do desenvolvimento nacional como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil (art. 3.º, inc. II); (^6) COMPARATO, Fábio Konder. Ordem Econômica na Constituição Brasileira de 1988. RDP 93/263. Cadernos de Direito Econômico e Empresarial. (^7) GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 4.ª ed. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 215.

de qualquer profissão, arte ou ofício que lhe aprouvesse, sendo, contudo, ela obrigada a se munir previamente de uma “patente” (imposto direto), a pagar as taxas exigíveis e a se sujeitar aos regulamentos de polícia aplicáveis. Logo após, na chamada Lei de Chapelier (Decreto de 14-17 de junho de 1791), na qual restaram proibidas todas as espécies de corporações, o princípio foi reiterado. É possível perceber, assim, como salienta o Prof. EROS ROBERTO GRAU 10 , que no princípio da livre iniciativa, mesmo quando da sua origem, não se consagrava a liberdade absoluta de iniciativa econômica, ou seja, a visão de um Estado inteiramente omisso, no liberalismo, em relação à iniciativa econômica privada. Trata-se de uma expressão pura e exclusiva de um tipo ideal, dado que, nesse estágio, medidas de polícia já eram impostas. Não se pode perder de vista que a Constituição declara assentar a ordem econômica, conjuntamente, na livre iniciativa e na valorização do trabalho humano, assinalando que o objetivo global e último dessa ordenação consiste em “assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social” (art. 170, caput ). O texto constitucional, portanto, permite a imposição de restrições de natureza pública ao exercício da liberdade empresarial, as quais visaem à realização dos valores ou finalidades superiores, igualmente expressos como mandamentos constitucionais. A Ordem Econômica e Financeira da Constituição Brasileira estabelece, assim, as finalidades e os princípios gerais dessa “ordem econômica”, bem como o tipo de organização econômica, a delimitação entre o domínio da iniciativa privada e o da intervenção direta do Estado na economia e, ainda, as bases jurídicas dos fatores de produção, ou seja, o “núcleo duro da constituição econômica brasileira”. Estando a livre iniciativa ligada ao seu valor social e devendo ser exercida em conformidade com os objetivos da “ordem econômica” – é o que se encontra estabelecido na Constituição Federal, repita-se –, apesar do papel primordial que lhe foi atribuído, o seu valor é relativizado pela própria Constituição. A livre iniciativa – que pode ser entendida, em duplo aspecto, como a liberdade de criar e explorar uma atividade econômica e, sobretudo, a rejeição da atividade econômica estatal – não é admitida de maneira absoluta, mas unicamente em razão do seu valor social (conforme art. 1.º, inc. IV, da própria Constituição Federal) e deve ser entendida no contexto de uma ordem econômica, idealmente concebida pela Constituição, que “tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social” e que deve respeitar toda uma série de princípios. Assim é que, uma vez consagrada a livre concorrência como um princípio da ordem econômica (inc. IV do art. 170), princípio que a livre iniciativa deve respeitar, a Constituição estabelece uma distinção entre livre iniciativa e livre concorrência. Desse modo, a Constituição não considera a livre concorrência uma conseqüência natural ou necessária da livre iniciativa, mas, sim, o que é consagrado, como atividade econômica legítima no contexto da ordem econômica constitucional, é a livre iniciativa concorrencial. Declarando-se, portanto, que a livre concorrência é um princípio ao qual a livre iniciativa deve se submeter, a Constituição Brasileira rejeitou a concepção dos liberais clássicos do século XIX, segundo a qual a livre concorrência é uma conseqüência natural da livre iniciativa. Ao mesmo tempo, a Constituição, adotando uma nova ordem econômica, (^10) Idem , ibidem p. 225

consagra o dogma segundo o qual se presume que a livre iniciativa concorrencial é útil à coletividade. Verifica-se, via de conseqüência, que o princípio da livre concorrência tem um significado próprio que o distingue do princípio da livre iniciativa. Aquele se apresenta como um elemento desejável ou mesmo necessário para possibilitar a presunção de que a livre iniciativa promove a realização do bem comum, o que é, a seu turno, um elemento favorável para que a livre iniciativa reencontre o seu valor social. A livre concorrência, assim, desempenha um papel fundamental para que a livre iniciativa possa gozar da presunção de beneficiar a coletividade. Trata-se de um elemento importante para a valorização social da livre iniciativa. A livre ação dos agentes econômicos, o livre acesso ao mercado e a livre escolha dos consumidores e utilizadores são as três liberdades que caracterizam um mercado concorrencial, ou seja, um mercado em que a concorrência joga livremente, configurando essas liberdades o objetivo a que visa o princípio da livre concorrência, distinguindo-o, portanto, do conceito da livre iniciativa, mas não os incompatibilizando, entretanto. Assim, buscando a existência digna, conforme os ditames da justiça social, é que devem ser compreendidos e harmonizados os demais princípios expressos no artigo 170 da Constituição, ou seja, a função social da propriedade, a defesa do consumidor, a busca do pleno emprego e, entre outros, a livre concorrência. Aliando-se a possibilidade de se imporem restrições ao exercício da liberdade empresarial e harmonizando-se o princípio da livre concorrência com a busca da existência digna, conforme os ditames da justiça social, é que se pode afirmar que a tutela da livre concorrência pode aparecer como um limite negativo ao fundamento da livre iniciativa, uma vez que essa última interessa a todo o conjunto social, dado que existem fins constitucionalmente propostos à livre iniciativa. O texto da Constituição de 1988 não deixa dúvidas quanto ao fato de a concorrência ser, entre nós, um meio, um instrumento para o alcance de outro bem maior, qual seja, “assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social”. O caráter instrumental da proteção da concorrência é evidente quando determina reprimir o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados e à eliminação da concorrência, em atenção ao princípio da livre concorrência, e quando determina reprimir o aumento arbitrário de lucros, em atenção ao princípio da defesa do consumidor. Essa proteção, entretanto, vai inserta no fim geral e maior, qual seja, “assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social”, demonstrando que a tutela da concorrência não é um fim em si mesma e poderá ser afastada quando o escopo maior perseguido pelo sistema assim o exigir. Aconselha-se, assim, nesse momento, a leitura atenta, na íntegra, do art. 170 da Constituição Federal de 1988.

1.2. Política Agrícola e Fundiária e a Reforma Agrária

A propriedade rural, com sua natureza de bem de produção, tem como utilidade natural a produção de bens necessários à sobrevivência humana, daí por que a Constituição Federal de 1988 traz normas que servem de base à sua peculiar disciplina jurídica (arts. 184 ao 191). A Constituição Federal, assim, traz normas especiais sobre a propriedade rural que caracterizam seu regime jurídico especial, quer porque especificam o conteúdo de sua