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Direito das obrigações e uma inclinação perfeita, Resumos de Direito das Obrigações

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Tipologia: Resumos

2021

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DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
PROF. ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO
MAFALDA MALÓ
FACULDADE DE DIREITO DE LISBOA
Universidade de Lisboa
2016/2017
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DIREITO DAS OBRIGAÇÕES

PROF. ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO

MAFALDA MALÓ

FACULDADE DE DIREITO DE LISBOA

Universidade de Lisboa

2016/

4

7

  • NOÇÃO E COORDENADAS GERAIS DAS OBRIGAÇÕES TRATADO DO DIREITO CIVIL - TOMO VI
      1. NOÇÃO DE OBRIGAÇÃO
      1. PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
  • DOGMÁTICA GERAL DAS OBRIGAÇÕES
      1. CONCEITO E ESTRUTURA DAS OBRIGAÇÕES
      • 1.1. As Doutrinas Pessoalistas
        • 1.1.1. Teoria Pessoalista de Savigny
        • 1.1.2. As Análises Económicas Posteriores
        • 1.1.3. A Teoria Clássica
      • 1.2. As Doutrinas Realistas
      • 1.3. As Doutrinas Mistas (Débito e Respondência).........................................................
        • 1.3.1. A Essencialidade da Respondência...................................................................................................
      • 1.4. As (Re)construções do Pessoalismo
        • 1.4.1. O Interesse do Credor
      • 1.5. A Natureza Complexa da Obrigação
        • 1.5.1. Posição da Regência – Natureza Complexa e uma Posição de Vantagem
      1. CARACTERÍSTICAS DAS OBRIGAÇÕES
      • 2.1. A Patrimonialidade
      • 2.2. O Interesse do Credor e a Juridicidade
        • 2.2.1. O Problema das Relações de Obsequiosidade e de Cavalheirismo
        • 2.2.2. A Responsabilidade Por Deferência
      • 2.3. A Mediação e a Colaboração
        • 2.3.1. A Determinação das Partes................................................................................................................
      1. A RELATIVIDADE E A EFICÁCIA PERANTE TERCEIROS
      • 3.1. A Relatividade Estrutural
      • 3.2. A Relatividade na Produção de Efeitos
        • 3.2.1. A Oponibilidade Forte
        • 3.2.2. A Oponibilidade Média, os Contratos com Proteção de Terceiros e o Terceiro Cúmplice
        • 3.2.3. A Oponibilidade Fraca e o Dever Geral de Respeito.........................................................................
        • 3.2.4 A Relatividade na Responsabilidade Civil e na Responsabilidade Obrigacional.............................
      1. ESPECIALIDADE E ATIPICIDADE NO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
      1. CONTEÚDO GERAL DAS OBRIGAÇÕES
      • 5.1. Delimitação Positiva
      • 5.2. As Prestações Principais e Secundárias
      • 5.4. Os Deveres Acessórios
      1. OUTROS ELEMENTOS DECORRENTES DAS OBRIGAÇÕES
      1. DELIMITAÇÃO NEGATIVA
      • 6.1. Requisitos da Obrigação
  • OBRIGAÇÕES MODALIDADES DE PRESTAÇÕES E CLASSIFICAÇÕES, TIPOS E MODALIDADES DAS
      1. MODALIDADES DE PRESTAÇÕES
      1. CLASSIFICAÇÕES DE OBRIGAÇÕES
      • 2.1. Conteúdo
      • 2.2. Simples ou Complexas – Unilaterais ou Bilaterais
      • 2.3. Absolutas, Relativas ou mistas
      • 2.4. Puras ou Combinadas – Subordinadas ou Subordinantes
      • 2.5. Típicas ou Atípicas
    • 2.6. Determinadas e Indeterminadas
    1. TIPOS DE OBRIGAÇÕES
    • 3.1. Obrigações Duradouras
    • 3.2. Relações Obrigacionais Gerais..................................................................................
    • 3.3. Direitos Pessoais de Gozo
    1. OBRIGAÇÕES NATURAIS
    • 3.1. A Natureza Jurídica
    1. OBRIGAÇÕES GENÉRICAS
    • 2.1. A Escolha
    • 2.2. Quando de Transfere o Risco
    1. OBRIGAÇÕES ALTERNATIVAS
    1. OBRIGAÇÕES COM FACULDADE ALTERNATIVA
    1. OBRIGAÇÕES DE INFORMAÇÃO
    1. OBRIGAÇÕES DE APRESENTAÇÃO DE COISAS OU DOCUMENTOS
    1. OBRIGAÇÕES PECUNIÁRIAS
    • 7.1. Obrigações em Moeda Estrangeira...........................................................................
    • 7.1. A Particular Situação dos Juros
    • 7.2. Tipologia dos Juros
    • 7.3. O Anatocismo
    1. OBRIGAÇÕES PLURAIS
    • 8.1. As Teorias da Contitularidade
    1. OBRIGAÇÕES PARCIÁRIAS
    • 9.1. O Regime da Parciariedade
    • 9.2. Prestações Indivisíveis
    1. SOLIDARIEDADE PASSIVA
    • 10.1. Relações Externas
    • 10.2. Relações Internas
    1. SOLIDARIEDADE ATIVA
    • 11.1. Relações Externas
    • 11.2. Relações Internas
    1. PLURALIDADE HETEROGÉNEA
  • MODALIDADES DO CONTRATO TRATADO DO DIREITO CIVIL - TOMO VII
      1. CLASSIFICAÇÕES DOS CONTRATOS
      1. OS CONTRATOS MISTOS E ATÍPICOS: MODALIDADES E TEORIAS
      • 2.1. As Teorias Clássicas
      • 2.2. O Regime dos Contratos Mistos
      • 2.3. Contratos Indiretos
        • 2.3.1. O Caso Particular da Doação Mista
      • 2.4. Contratos Fiduciários
      • 2.5. União de Contratos
        • 2.5.1. O Regime Aplicável
  • O CONTRATO-PROMESSA
      1. NOÇÕES GERAIS.....................................................................................................................
      1. A PROMETIBILIDADE
      • 2.1. Casos em Que é Equacionada a Prometibilidade
      1. A FORMA DO CONTRATO-PROMESSA
      • 3.1. A Questão das Assinaturas
      1. REGRAS NÃO APLICÁVEIS
      1. MODUS CONTRAHENDO
      1. A QUESTÃO DO CUMPRIMENTO E DO INCUMPRIMENTO
      • 6.1. O Cumprimento e o Incumprimento do Contrato Promessa
      • 6.2. Extinção do Contrato Promessa
      1. O SINAL E O DIREITO DE RETENÇÃO..........................................................................................
      • 7.1. O Sinal e o Funcionamento........................................................................................
      • 7.2. O Direito de Retenção
      1. A EXECUÇÃO ESPECÍFICA
      • 8.1. O Funcionamento da Execução Específica
      • 8.2. Vicissitudes
      1. CONTRATOS-PROMESSAS COM EFICÁCIA REAL...........................................................................
      • 9.1. Requisitos e Forma
      • 9.3. Funcionamento da Eficácia Real
      1. O REGISTO DA AÇÃO DE EXECUÇÃO ESPECÍFICA
      1. NATUREZA DO CONTRATO PROMESSA.....................................................................................
  • O PACTO DE PREFERÊNCIA
      1. NOÇÕES GERAIS DA PREFERÊNCIA
      • 1.1. Modalidades do Pacto de Preferência
      1. O REGIME DA PREFERÊNCIA
      • 2.1. A Preferibilidade
      • 2.2. A Forma do Pacto de Preferência
      • 2.3. O Regime Substantivo
      • 2.4. O modus praelationis – o Terceiro
      1. OS PROCEDIMENTOS DA PREFERÊNCIA
      • 3.1. A Comunicação
      • 3.2. A Resposta do Preferente
      • 3.3. Venda de Coisa Conjuntamente com Outras
      • 3.4. Prestação Acessória e Uniões de Contratos e Contratos Mistos
      • 3.5. Pluralidade de Preferentes
      1. A PREFERÊNCIA COM EFICÁCIA REAL
      • 4.1. A Forma
      • 4.2. A Ação de Preferência
      • 4.3. A Simulação
      1. A NATUREZA DA PREFERÊNCIA
      • 5.1. Teorias
      • 5.2. Posição Adotada
  • O PACTO DE OPÇÃO
      1. NOÇÕES GERAIS.....................................................................................................................
      • 1.1. Como se Distingue de Figuras Afins
      • 1.2. Optabilidade e Preço da Opção
      • 1.3. Regime
      • 1.4. Direitos e Deveres Acessórios
      1. FUNÇÕES E NATUREZA
  • O CONTRATO A FAVOR DE TERCEIROS
      1. NOÇÕES GERAIS.....................................................................................................................
      • 1.1. A Atribuições e a Prometibilidade a terceiro
      1. O REGIME..............................................................................................................................
      • 2.1. A Posição do Promissário
      • 2.2. A Posição do Promitente
      • 2.3. A Posição do Terceiro
      • 2.4. Contratos a Favor de Terceiros e Especificidades
      • 2.5. O Papel dos Deveres Acessórios
  • O CONTRATO PARA PESSOA NOMEAR
      1. AS FUNÇÕES TÍPICAS
      1. REGIME E EFEITOS
      1. NATUREZA
  • A CAUSA
      1. NOÇÃO GERAL E A EXPERIÊNCIA PORTUGUESA
      • 1.1. A Causa do Contrato
      • 1.2. Posição da Regência
  • AS FONTES PARACONTRATUAIS
      1. NOÇÃO GERAL........................................................................................................................
      • 1.1. Relações Contratuais de Facto
        • 1.1.1. A Doutrina de Haupt
      • 1.2. Relações Paracontratuais Em Especial
        • 1.2.1. A Culpa in Contrahendo
        • 1.2.2. A Insubsistência do Contrato
        • 1.2.3. Proteção de Terceiros
        • 1.2.4. Culpa Post Factum Finitum
        • 1.2.5. Respondência Pela Confiança
      1. A DOGMATIZAÇÃO DA PARACONTRATUALIDADE...........................................................................
      1. A IMPORTÂNCIA DESTA PROBLEMÁTICA
  • OS NEGÓCIOS UNILATERAIS
      1. NOÇÃO GERAL........................................................................................................................
      1. A HISTÓRIA
    • 1.1. Natureza
    • 1.2. A Tipicidade Aberta
    1. DOGMÁTICA GERAL
    • 2.1. Função
    • 2.2. As Relações Complexas que se Constituem
    1. OS NEGÓCIOS UNILATERAIS EM ESPECIAL
    • 3.1. Promessa de Cumprimento e Reconhecimento de Dívida
    • 3.2. Promessa Pública
    • 3.3. Concurso Público
  • A GESTÃO DE NEGÓCIOS TRATADO DO DIREITO CIVIL - TOMO VIII
      1. NOÇÕES GERAIS.....................................................................................................................
      1. MODALIDADES DA GESTÃO DE NEGÓCIOS
      1. FUNÇÕES
      1. REQUISITOS:
      • 4.1. Direção de negócios:
      • 4.2. A alienidade:
      • 4.3. O exercício.
      • 4.4. Por conta do dono.
      • 4.5. No interesse do dono
      • 4.6. A falta de autorização.
      1. REGIME E EFEITOS DA GESTÃO
      • 5.1. A Situação do Gestor
        • 5.1.1. Deveres do Gestor (artigo 465º):
        • 5.1.2. A Responsabilidade do Gestor
      • 5.2. A Situação do Dono
        • 5.2.1. O Dever de Reembolso ou de Indemnização
        • 5.2.2. A Remuneração do Gestor
        • 5.2.3. Direitos do Dono
        • 5.2.4 Aprovação da Gestão e Ratificação
      • 5.3. A Situação do Terceiro
        • 5.3.1. Representação sem Poderes
        • 5.3.2. Mandato sem Representação............................................................................................................

8

Tratado do Direito Civil

Tomo VI

PROF. ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO

10

DIREITO DAS OBRIGAÇÕES

DOGMÁTICA GERAL DAS OBRIGAÇÕES

  1. CONCEITO E ESTRUTURA DAS OBRIGAÇÕES

1.1. AS DOUTRINAS PESSOALISTAS

1.1.1. TEORIA PESSOALISTA DE SAVIGNY

As doutrinas pessoalistas, protagonizadas por Savigny, pressupõe que na obrigação há

uma situação de desigualdade: há uma liberdade alargada com o domínio sobre a pessoa e uma

liberdade limitada pela adstrição e pela necessidade à prestação.

O direito subjetivo, entendido como um poder de vontade, recai sobre a natureza não-

livre ou sobre a pessoa estranha – no entanto, note-se que não recai sobre a pessoa em si; mas

sobre um ato que deve ser realizado por essa pessoa, que é a obrigação.

Face a estas suposições de Savigny, surgem críticas:

à Traduziria a escravidão, um poder do credor sobre o devedor e até um direito

real sobre o devedor – ao que Savigny contrapõe que o foco não é a pessoa, mas

um

ato do devedor;

à Não explica o poder de agressão que é reconhecido, ao credor, em relação ao

património do devedor e ignora a vontade do devedor – Savigny, aliás, reconhece

que o ato do devedor é

voluntário;

à A regência discorda do conceito de direito subjetivo aliado apenas a um poder

de vontade, havendo aliás direitos subjetivos sem vontade;

1.1.2. AS ANÁLISES ECONÓMICAS POSTERIORES

Posteriormente à proposta de Savigny, a obrigação passa a ser entendida – Dernburg e

Savatier – com um teor económico, que se traduz na ação patrimonial (que havia sido rejeitada

por Savigny, segundo críticas). Assim, a obrigação como atuação estaria destinada a satisfazer o

interesse do credor ou um resultado que com este interesse se relacionasse.

Apesar dos pressupostos em que assentavam estas posições, já se entende hoje que

nem todas as obrigações têm um conteúdo patrimonial e que as obrigações valem por si,

independentemente de qualquer satisfação de interesses que nela se inscrevam.

1.1.3. A TEORIA CLÁSSICA

A teoria clássica assenta na noção generalizadamente aceite: vinculo pelo qual uma

pessoa fica adstrita, em relação a outra, à realização de uma prestação (art. 397º). No entanto,

há que reconhecer que esta noção é insuficiente no que respeita ao conteúdo e estrutura da

obrigação.

1.2. AS DOUTRINAS REALISTAS

As doutrinas realistas surgem como resposta ao problema da transmissibilidade das

obrigações – como transferir, afinal, um vínculo pessoal? Afinal, as teorias pessoalistas não

poderiam explicar a transmissibilidade, na medida em que estariam intimamente ligadas à

pessoa do credor e do devedor.

A primeira tentativa é reportada a Albert Koeppen, que explica que, no crédito, não está

em causa um direito à prestação, mas ainda, o valor monetário que essa prestação tenha para

o credor.

11

Mais tarde, uma nova ideia de obrigação, vem reduzi-la a uma relação de patrimónios.

De acordo com o prof. Gomes da Silva, poderá ser extrema (quando a obrigação não vincula,

diretamente, do devedor e o credor, mas os patrimónios respetivos) ou moderada (o crédito

represente um direito a bens indeterminados do devedor). Na versão extrema, situa-se Bonelli,

afirmando que o verdadeiro sujeito, nas obrigações, é o património. Já a versão moderada,

indicaria que a obrigação apenas implicaria um direito sobre os bens indeterminados do devedor.

Puacchioni, já próximo das teorias mistas, vem apelar ao crédito como mera expectativa

à prestação, que teria também um direito real de garantia sobre o património do devedor.

As críticas realizadas às teorias realistas foram sintéticas:

à Desconformidade com o Direito positivo: as leis modernas prescreviam um dever

de prestar e os modos de concretização, não sendo, também, claro que as

normas jurídicas se dirigissem ao património do devedor, já que a pessoa que

não tem património mantém-se hábil a contrair obrigações.

à Perspetiva deficiente, em resultado de uma interpretação histórica menos

adequada, afirmando os críticos que não se havia passado de uma visão pessoal

para uma visão patrimonial, mas de uma visão pessoal para uma adstrição ética

(devedor como destinatário de um dever ser).

1.3. AS DOUTRINAS MISTAS (DÉBITO E RESPONDÊNCIA)

Nas doutrinas mistas residiria a lógica de haftung e schuld, afirmando estas que a

obrigação consiste num conjunto formado pelo débito e pela respondência – aquele que

incumpre o débito deve responder pelo incumprimento. O schuld corresponderia ao débito (um

dever de prestar) e o haftung corresponderia à garantir, através de pessoa ou coisa, em caso de

incumprimento. Note-se, no entanto, que entre os conceitos não é estabelecido um nexo de

causalidade; para além disso, não admitem um débito sem respondência, já que não teria

estrutura jurídica, nem a respondência sem um débito.

Distingue-se, assim, nestas conceções, dois vínculos: o débito, o devedor encontra-se

adstrito a uma prestação; a

responsabilidade , o credor pode-se ressarcir patrimonialmente em

caso de incumprimento. Estão, estes dois vínculos, intimamente interligados.

No entanto, sabe-se que pode ocorrer, no ordenamento jurídico português, dissociação

entre o

débito e a

respondência , podendo essa dissociação assumir várias dimensões:

à Objetiva: diferenças existenciais ou essenciais. Tenha-se como exemplo: débito

sem respondência (402º) e respondência sem débito (483º);

à Subjetiva: cada vínculo é encabeçado por sujeitos distintos. Tenha-se como

exemplo: respondência direta por débitos alheios (627º), respondência por

débitos alheios (667º).

à Teleológica: os vínculos prosseguem fins distintos. Tenha-se como exemplo: um

dever de prestar que serve um interesse do credor e uma execução que poderá

dar uma soma em dinheiro ao credor.

à De regimes: suscitam a aplicação de regimes e regras próprias.

1.3.1. A ESSENCIALIDADE DA RESPONDÊNCIA

Nas conceções dualistas, o elemento essencial é a respondência – nela reside a

tentativa de explicação (já que o débito é de fácil explicação). Destacam-se três conceções: a

teoria publicística, a teoria do direito real de garantia e a teoria das fases.

à

Teoria publicística: o credor usaria meios próprios para executar a

responsabilidade/garantia ( haftung) ; progressivamente, as sociedades têm

vindo a delegar esta função ao Estado, devendo o credor recorrer ao Estado de

acordo com as normas processuais – o Estado limita-se a executar direitos pré-

existentes.

13

1.5. A NATUREZA COMPLEXA DA OBRIGAÇÃO

As referências que se foram fazendo à obrigação enquanto vínculo complexo, ou seja,

enquanto organismo/estrutura, reportam-se à necessidade de, para o devedor executar

corretamente aquilo a que está adstrito, deverá sempre proceder a atuações diferencias que se

distinguem da prestação principal.

Note-se, assim, que estas atuações podem ter fontes intrínsecas, decorrendo da

natureza das coisas; podem ter fontes dispositivas, ou seja, que se predem com o contrato ou a

fonte em questão; podem ter fontes linguísticas, ou seja, no idioma considerado exige uma

perífrase para ser completamente comunicada.

Assim, a obrigação assume-se como um sistema que unifica, em torno de um ponto de

vista unitário, diversas prestações que o servem – aliás, essas prestações tornam-se essencais

para se definir o regime jurídico adequado, bem como para garantir o correto cumprimento da

prestação a que o devedor está adstrito. Distinguem-se, assim, a prestação principal das

prestações secundárias

  • que, em princípio, são predeterminadas ou predetermináveis.

Acresce-se, a este sistema, os deveres acessórios, que resultam da concretização dos

valores fundamentais do sistema, nomeadamente da boa fé. Assim, a boa fé deve ser respeitada

nas negociações (227º), na execução dos contratos (762º) e no exercício de posições jurídicas,

sob pena de abuso de direito (334º). Traduzem-se em:

deveres de lealdade, deveres de

segurança e deveres de informação. A função destes deveres é prevenir danos, seja no serviço,

seja nos elementos circundantes.

Note-se que, para além do

devedor , também o

credor tem deveres: poderá,

eventualmente, ter de colaborar para que prestação principal seja possível (aliás, caso não

faculte a execução, entra em mora – 813º e ss.). Está, ainda, adstrito a deveres acessórios, que

têm por base a prevenção do agravamento da posição do devedor e os danos colaterais na sua

pessoa.

Para terminar, não se deixe de notar que também existem obrigações sem dever de

presta, ou seja, seja prestação principal. É o caso dos direitos pessoais de gozo, onde a prestação

principal é substituída pelo direito de gozo da coisa.

1.5.1. POSIÇÃO DA REGÊNCIA – NATUREZA COMPLEXA E UMA POSIÇÃO DE VANTAGEM

A estrutura complexa

obrigação, proposta pela

regência, comporta três partes:

o núcleo, onde se situa a

prestação principal, a que

corresponde a oponibilidade

forte ; o

halo central , onde se

situam os deveres

secundários, a que

corresponde a oponibilidade média; o halo periférico, onde se situam os deveres acessórios

(decorrentes de valores do sistema), a que corresponde a oponibilidade média.

Assim, o direito de crédito é, em termos técnicos, a permissão normativa específica de

aproveitamento de uma prestação e o débito será o dever de efetuar essa prestação.

Quando se alude a vantagem, pretende-se transmitir uma realidade protegida pelo

direito, ampliada à esfera jurídica do credor – que dispõe, assim, de proteção jurídica. A

inobservância, pelo devedor, dá origem a dona (interesse técnico).

Halo Periférico: deveres acessórios.

Núcleo: prestação principal.

Halo Central: deveres secundários.

14

  1. CARACTERÍSTICAS DAS OBRIGAÇÕES

2.1. A PATRIMONIALIDADE

A questão da patrimonialidade é uma questão de fundo do direito das obrigações e

reside na dúvida de saber se a obrigação tem ou não sempre valor patrimonial – ou seja, se é

pecuniária.

De acordo com a tese clássica, a obrigação teria necessariamente natureza patrimonial,

em resultado de: as disposições legais assim o determinam; a responsabilidade patrimonial

assim o exige; os danos morais não são passiveis de ressarcimento. No entanto, há que ver que

a responsabilidade patrimonial não determina o caráter da obrigação; para além disso, o

moderno direito das obrigações já admite outros meios de sanção, como é o caso da execução

específica e das sanções compulsórias (829º).

Deste modo, admite-se a rejeição das teses clássicas quando aplicadas ao direito

vigente. Aliás, a própria lei determina que a prestação não tem necessariamente de ter valor

pecuniário (398º). E, em consequência da superação do patrimonialismo, dá-se também o

abandono das conceções realistas e mistas, já que pressupõe uma relação de património e uma

especial relevância do valor patrimonial da obrigação.

Importa, ainda, esclarecer o que entender por não necessita de ter valor pecuniário. Por

situação patrimonial, esclareça-se antes de mais, deve entender um conteúdo económico que

pode ser avaliado em dinheiro. Ainda, estabeleça-se conclusões: a natureza não-patrimonial é

compatível com o ressarcimento de danos morais e deve reger-se pelo Direito patrimonial;

Ora, apesar de as situações não patrimoniais serem aquelas cujas trocas por dinheiro

não sejam admitidas pelo Direito, sabe-se, hoje, também que as mesmas situações podem ser

avaliadas em dinheiro. Concretiza-se esta ideia com a noção de prestações sem valor pecuniário:

aquelas que penetram pela fresta, hoje apertada, das atuações que, não podendo ser trocadas

por dinheiro sejam, todavia, lícitas e compensáveis com dinheiro – resume-se na ideia de que a

dificuldade em fixar um valor patrimonial em algo não implica que esse algo não o tenha.

2.2. O INTERESSE DO CREDOR E A JURIDICIDADE

A necessidade de proteção legal atribuída ao interesse do credor resulta da querela em

torno do caráter patrimonial das obrigações. Por interesse, relembre-se, tem de tido como noção

uma realidade protegida por normas jurídicas, as quais, se violadas, dão origem a dano.

Levanta-se a questão, então, da juridicidade das obrigações, cuja solução consta da

sequência: 397º, definição de obrigação; 398/1, afirma a liberdade de fixação do conteúdo;

398/2, permite que não tenham conteúdo patrimonial; 398º/2 exige que sejam juridicamente

consideráveis. Assim, interesse digno de proteção legal implica a suscetibilidade de proteção

jurídica. No entanto, pergunta-se: se tudo o que não é proibido é permitido, no Direito civil, o que

fica fora da juridicidade?

Antunes Varela propõe: prestações que correspondam a um mero capricho do credor;

prestações consideradas por outros complexos normativos. A regência desconsidera a

precedência da primeira; no entanto, afirma a segunda, já que não faz sentido que uma

prestação que apenas releve para ordens jurídicas tenha proteção legal.

2.2.1. O PROBLEMA DAS RELAÇÕES DE OBSEQUIOSIDADE E DE CAVALHEIRISMO

Este problema coloca-se dentro das prestações que correspondam a um mero capricho

do credor.

As relações de obsequiosidade correspondem a adstrições que surgem no trato social,

em resultado da boa educação e da razoabilidade de contacto entre as pessoas. As relações de

puro cavalheirismo decorrem da palavra de honra no sentido de garantir um resultado ou de

16

  1. A RELATIVIDADE E A EFICÁCIA PERANTE TERCEIROS

A questão da relatividade coloca-se, em obrigações, em resultado de estas derivarem de

acordos livremente celebrados e que, portanto, em termos abstratos, apenas podem vincular as

pessoas que os tenham concluído, ou seja, as partes. A regra é retirável do artigo 406º do Código

Civil Português, posteriormente ao contraponto entre direitos de crédito e direitos reais, que

permitiam a transposição da regra dos contratos para as obrigações.

O tema da

relatividade em obrigações, como resultado de uma relação jurídica entre

duas pessoas determinadas, era já referenciado por Savigny. De um modo geral, significa que o

devedor está sujeito à prestação, perante o credor. Em oposição, os Direitos Reais podem valer-

se contra todos, logo são absolutos.

(1) Relatividade em termos estruturais: pressupõe a existência ou inexistência de uma

relação jurídica entre duas pessoas determinadas. Nos direitos de crédito, há uma relação entre

o credor e o devedor – tendencialmente, são relativos. Nos direitos reais, a relação reside no

aproveitamento da coisa – tendencialmente, são absolutos.

(2) Relatividade em termos de oponibilidade: pressupõe a possibilidade de pretensões

contra a outra parte da relação ( interpartes ) ou contra qualquer sujeito ( ergaomnes ). Nos direitos

de crédito, o Direito permite que o credor exija o cumprimento ao devedor e apenas ao devedor.

Nos

direitos reais, o titular pode exigir a restituição da coisa a qualquer terceiro (1311º/1), assim

como os terceiros podem pedir o respeito pela sua posição.

(3) Relatividade em termos de eficácia externa: pressupõe a possibilidade ou não de

incorrer em responsabilidade civil ou obrigacional aquele que incorreu em ilicitude. Nos direitos

de crédito, apenas o devedor pode faltar ao cumprimento, incorrendo em responsabilidade

obrigacional (798º e ss.). Nos direitos reais, qualquer pessoa pode atingir a coisa, incorrendo em

responsabilidade aquiliana (483º e ss.).

Relatividade Estrutural (1) Oponibilidade (2) Eficácia Externa (3)

Direitos Reais

Permissão normativa

específica de

aproveitamento de

uma coisa corpórea.

Tendencialmente,

são absolutos

Forte, média e fraca

ergaomnes (contra

todos)

Responsabilidade

delitual, civil ou

aquiliana (artigo.

483º, CC)

Direitos de Crédito

Permissão normativa

específica de

aproveitamento de

uma prestação.

Tendencialmente,

são relativos

Forte, média e fraca

interpartes (apenas

contra o devedor)

Responsabilidade

obrigacional (artigo

798º, CC)

17

3 .1. A RELATIVIDADE ESTRUTURAL

Quando se contrapõem direitos reais e direitos de crédito, é indubitável que a distinção

que salta à vista resida na relatividade: os direitos de crédito são tendencialmente relativos e os

direitos são tendencialmente absolutos.

Note-se, no entanto, que no conceito de obrigação – amplamente aceite pela doutrina,

nos dias de hoje – não se reconduz apenas a direitos relativos, mas também a direitos absolutos,

como é o caso dos direitos potestativos – o titular atua isoladamente. Assim, é possível afirmar

que a relatividade não é uma característica permanente das obrigações.

Os direitos potestativos diferem, deste modo, dos direitos de crédito, o que resulta em

regimes muito diferentes. Numa situação de sujeição, a pessoa sujeita nada pode fazer, daí que

seja uma posição distinta da do devedor – que se sujeita às normas respeitantes ao dever de

prestar, às suas vicissitudes e à execução.

Outro caso a considerar, para além dos direitos potestativos, é o caso dos direitos

pessoais de gozo

. O núcleo destes direitos é estruturalmente

absoluto , gozando o titular da coisa

em resultado da tua atividade e não de qualquer prestação – no entanto, num plano secundário

são compostos por deveres acessórios.

Entende-se, assim, que a relatividade não é um vetor obrigatório no direito das

obrigações.

3 .2. A RELATIVIDADE NA PRODUÇÃO DE EFEITOS

No que respeita à relatividade em termos de oponibilidade ou de produção de efeitos, a

regência distingue a graduação dessa mesma oponibilidade, através de três denominações:

oponibilidade forte, oponibilidade média e oponibilidade fraca. Note-se, ainda, que a

oponibilidade pode assumir-se como

interpartes – entre as partes da relação jurídica, típica dos

direitos de crédito – ou como ergaomnes – contra todos, em resultado de um direito isolado

(absoluto), típica dos direitos reais.

à Oponibilidade forte: possibilidade de o titular exigir o quid valioso que o Direito

lhe atribui, podendo ser interpartes ou ergaomnes.

à Oponibilidade média: possibilidade de o titular exigir o acatamento de obrigações

secundárias ou deveres acessórios, podendo ser interpartes ou ergaomnes.

à Oponibilidade fraca: possibilidade de exigir um dever geral de respeito, podendo

ser interpartes ou ergaomnes.

3 .2.1. A OPONIBILIDADE FORTE

Como bem se entende, os direitos de crédito são dotados de oponibilidade forte

interpartes , o que significa que o credor pode exigir o cumprimento da prestação ao devedor e

só este está obrigado a cumprir. Note-se, no entanto, que no que respeita às

obrigações pode

haver intromissão de terceiros, desde que seja dirigida à satisfação do credor (artigo 767º/1).

Em oposição, os direitos reais são dotados de oponibilidade forte ergaomnes , o que

significa que o proprietário pode exigir a coisa a qualquer pessoa que a possua ou a detenha.

Perante as regras gerais anunciadas, há que anunciar algumas exceções: há direitos

reais que perdem a sua oponibilidade ergaomnes (1) ; há direitos de crédito que adquirem

oponibilidade ergaomnes (2); há direitos de crédito que podem ser atuados contra terceiros (3).

(1) Pode ocorrer por via das regras do registo predial.

(2) São exemplos a promessa com eficácia real (artigo 413º/1) e a preferência com

eficácia real (artigo 421º/1). São figuras obrigacionais “realificadas”, ou seja, que se podem fazer

valer contra todos: na primeira pela reivindicação; na segunda pela ação de preferência.

19

violação), podendo exigir deveres de atuação que devem ser respeitados. Cabem, a estes

deveres, o controlo do perigo ou do dano (um dever de atuação).

Já no que respeita à tutela absoluta dos direitos relativos, a questão reside na tutela dos

direitos de crédito perante terceiros. O problema surge em resultado de a obrigação poder ser

atingida por terceiros, nomeadamente por poder exigir suportes materiais, condições ambientais

ou, até mesmo, agentes humanos. Assim, quando se prove que o terceiro agiu com intenção de

atingir a obrigação, prejudicando o credor, não há como evitar uma responsabilidade civil – é o

espírito do sistema, em especial, os ditames da boa fé, que exigem uma solução do problema.

Este problema da responsabilização de terceiros surge no âmbito da oponibilidade média

e de oponibilidade fraca. No que respeita à oponibilidade média, fala-se na técnica do terceiro

cúmplice, que comina em responsabilidade delitual (sistema anglo-saxónico e francês); ou no

contrato com eficácia e proteção para terceiros, que comina em responsabilidade obrigacional

(sistema alemão). No que respeita à oponibilidade fraca, a questão reside em saber se se dever

falar de um dever geral de respeito dos direitos de crédito (positiva a resposta do sistema anglo-

saxónico; negativa a resposta do sistema alemão).

Em Portugal, a doutrina tem convergido em soluções diversas: umas apontam para a

negação da responsabilidade civil de terceiros (A); outras, intermédias, apontam para a

possibilidade de responsabilidade civil de terceiros, mediante determinadas condições (B);

outras, apologistas, admitem sempre a responsabilidade civil de terceiros (C).

(A) defendida pelos professores Cunha Gonçalves, Manuel de Andrade e Vaz Serra.

Argumentos sociopolíticos: a eficácia externa das obrigações poria em causa a liberdade

dos sujeitos e criaria uma vasta variedade de situações de responsabilidade.

Argumento interpretativo da lei e sistemático: o artigo 483º/1 foi historicamente pensado

para os direitos absolutos, sendo por isso regra geral. No que respeita a matéria

obrigacional, é aplicável o artigo 798º, que é regra especial.

Argumento legal: o artigo 406º, relativo à relatividade dos contratos, prevê que estes só

devem ser cumpridos pelas partes, o que significa que as próprias obrigações só devem

ser cumpridas pelo devedor. Para além disso, responsabilizar terceiros seria contra a

própria liberdade contratual, prevista no artigo 405º.

(B) defendida pelos professores Pessoa Jorge, Menezes Cordeiro, Ferrer Correia.

Argumentos sociopolíticos: a vasta variedade passaria pelos pressupostos da

responsabilidade civil (pelo que seria legítima), passando nomeadamente pelo crivo da

ilicitude da conduta e pela culpa.

Argumento interpretativo da lei e sistemático: o artigo 483º/1 não permite, na letra ou

espírito, uma limitação aos direitos absolutos. Para além disso, uma vez que o artigo

798º, como regra especial, só se aplica ao devedor, e não responsabiliza terceiros que

devem ser responsabilizados, deve recorrer à regra geral, artigo 483º.

Argumento de Direito Comparado: várias ordens jurídicas mostram-se sensíveis ao tema;

nomeadamente os sistemas anglo-saxónico e o francês, que acolhem uma solução pela

responsabilidade aquiliana; e o sistema alemão, que acolhe uma solução pela

responsabilidade obrigacional.

Argumento de necessidade: entende-se que há necessidade de tutelar o problema, uma

vez que até as posições relativistas reconhecem que os terceiros podem atingir um

direito de crédito.

  1. podem atuar sobre o objeto da prestação;
  2. podem impedir o cumprimento, agindo física ou psiquicamente;
  3. podem tomar uma posição eficaz mas injusta, que contrarie a execução;

(C) defendida pelos professores Inocêncio Galvão Telles e Gomes da Silva.

Argumentação jurídica: os direitos de crédito são tidos como direitos subjetivos, pelo que

merecem a tutela do direito e são passíveis de ser judicialmente exigidos; para além

disso, o artigo 483º não faz qualquer referência a direitos absolutos.

20

PRECISÕES EM
QUESTÕES
CONCORRENCIAIS
RESPONSABILIDADE
CIVIL E SEUS
PRESSUPOSTOS

Argumentação: a todos assiste um dever geral de respeito, aplicável aos direitos de

crédito, que, por isso, postula a responsabilidade delitual por lesão de direitos alheios

(483º). Assim, qualquer violação de direito de crédito alheia é ilícita, desde que o terceiro

tenha conhecimento prévio do contrato (presumindo-se, assim, a culpa).

A. POSIÇÃO ADOTADA PELA REGÊNCIA

A regência entende que o sistema jurídico português comporta duas soluções diferentes

para o problema da responsabilidade de terceiros que impeçam o cumprimento de uma

obrigação. Para além disso, há que notar que a eficácia externa, a ter em conta, corresponde à

stricto sensu, que respeita à tutela aquiliana dos direitos de crédito.

  1. A Cláusula geral da boa-fé: permite impor deveres de conduta, quando o

espírito do sistema assim o exija (alemã).

  1. A Cláusula geral da responsabilidade civil: permitir a imposição da

responsabilidade aquiliana, por forma a prosseguir os valores básicos do

sistema. (inglesa)

A

regência entende que não há quaisquer impedimentos à aplicação do artigo 483º, do

CC, aos direitos de crédito; como tal, sempre que haja uma violação da titularidade de um direito

de crédito por parte de um terceiro, deve este terceiro incorrer em responsabilidade delitual. Não

se entende que seja um problema de abuso de direito, mas antes um problema de titularidade

que exige tutela aquiliana.

A questão transfigura-se quando se tem em consideração saber se o artigo 483º é

aplicável ao terceiro que, com o devedor, contrata de modos incompatíveis com o crédito

preexistente, forçando ou incentivando ao incumprimento. Esta é uma questão que tem animado

a doutrina e a jurisprudência e que tem conduzido a uma resposta negativa.

No que respeita à questão da concorrência, o legislador define – numa lex speciallis

  • , com alguma minúcia, as práticas concorrenciais que tem por inadmissíveis. A

contrario , as restantes condutas são lícitas, não fazendo sentido proibi-las com

recurso ao artigo 483º. Afinal, a possibilidade de contratar com terceiros é uma das

portas abertas pela concorrência, prevalecendo as regras desta.

Neste ponto, assim, intervém a questão do abuso do direito – quando respeite a matéria

concorrencial. O terceiro pode sempre contratar com o devedor, exercendo a sua liberdade

contratual (405º). No entanto, se ao contratar com o devedor, o terceiro agir ilicitamente,

incorrerá em abuso do direito (uso da posição jurídica contra o espírito do sistema). Ou seja, o

abuso de direito retira a licitude do exercício da liberdade contratual, permitindo-se a aplicação

do artigo 483º - da responsabilidade civil/aquiliana.

A ilicitude enquanto requisito fundamental para justificar o abuso de

direito, surge como requisito, igualmente, da responsabilidade civil.

Aliás, relembre-se os 5 requisitos da responsabilidade civil, que relevam

para a importância da ilicitude como chave para a aplicação do abuso

de direito: conduta, dano, culpa, nexo de causalidade entre o dano e a

culpa e ilicitude.

Deste modo, é possível afirmar que o abuso de direito é objetivo: não exige culpa, para

se concretizar, mas antes faz cessar uma permissão de agir, em nome do sistema. Tenha, como

exemplo, a situação em que C penetra no círculo de A e B, aí obtendo informações privilegiadas,

induzindo A a não cumprir o contrato; incorre, assim, em abuso de direito, por violar deveres

fundamentais de confiança e da tutela da materialidade subjacente (boa fé).

Em suma, distinga-se duas soluções possíveis:

A. Abuso de direito: quando haja uma contratação que seja incompatível com a

obrigação preexistente; considera-se ilícita a conduta do terceiro, que impede que se

aplique a liberdade contratual; dá lugar a responsabilidade delitual do terceiro.

B. Violação do princípio da boa fé: quando ocorra violação da titularidade, que

também dá lugar a responsabilidade delitual do terceiro.