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a força normativa da constituição
Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas
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Resumo: O presente artigo jurídico aborda a força normativa da Constituição^2. O texto procura sintetizar o pensamento de Konrad Hesse ao demonstrar a relevância da abertura da Constituição ao tempo e à realidade para a preservação de sua estabilidade político-jurídica e respectiva força normativa. Palavra-chave: Constituição. Democracia. Força normativa. Abstract: This article discusses the legal normative force of the Constitution [1]. The text seeks to synthesize the thought of Konrad Hesse to demonstrate the relevance of the opening of the Constitution time and reality for the preservation of its political stability and its legal-normative force. Keywords: Constitution. Democracie. Normative force. Sumário: 1. Introdução. 2. A unidade política e a ordem jurídica. 3. O conteúdo da constituição aberto ao tempo. 4. A sociedade e a consciência de constituição democrática. 5. Constituição e realidade. 6. Conclusão. 7. Referências.
(^1) Mestre em Direito, na área de concentração Sistema Constitucional de Garantias de Direito, pelo Centro de Pós Graduação da ITE; Defensor Público no Estado de Mato Grosso do Sul; Titular da Defensoria Pública de Direitos Difusos e Coletivos em Campo Grande/MS; Atualmente exerce a função de Assessor para Assuntos Institucionais da Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso do Sul; causiri@uol.com.br (^2) Em famoso texto denominado “A força normativa da Constituição”, o jurista alemão Konrad Hesse reafirma o caráter normativo da Constituição e procura conciliá-lo com a realidade. Destaca ser tarefa delegada ao Direito Constitucional contribuir para a conservação da força normativa da Constituição.
“Formação da unidade política” não significa a produção de um harmônico estado de coincidência geral e em nenhuma hipótese a eliminação das diferenças sociais, políticas ou de tipo institucional e organizativo, através da nivelação total. (^3) Para Hesse, “tais decisões são, segundo a Lei Fundamental, a inviolabilidade da dignidade humana como princípio supremo do ordenamento constitucional, a república, a democracia, o postulado do Estado social de Direito, e a organização territorial em termos de Estado federal”. (HESSE, 2009, p. 7)
Não devem restar indeterminados os fundamentos da ordem da Comunidade. Ao estabelecer-se, com caráter vinculante, tanto os princípios que regem a formação da unidade política e a fixação das tarefas estatais, quanto as bases do conjunto do ordenamento jurídico, tais fundamentos devem ficar subtraídos à luta constante dos grupos e tendências, criando-se um núcleo estável do que já não se discute, que não é discutível e, por isso mesmo, não precisa de novo acordo e nova decisão. A Constituição pretende criar um núcleo estável daquilo que deve considerar-se decidido, estabilizado e distendido. Porém tampouco devem restar indeterminados a estrutura estatal e o procedimento através do qual hão de se resolver as questões deixadas em aberto. (HESSE, 2009, p. 89).
(^5) Hesse (1998, p. 29) observa que: “Essa fusão da pluralidade nunca está definitivamente concluída, de modo que ela pudesse, sem mais, ser pressuposta como dada, senão é um processo permanente e, por causa disso, sempre também dado. É uma tarefa que, enquanto não está sujeita a nenhuma discrição, como convivência humana, somente no Estado e pelo Estado é possível”. (^6) Cita-se, por exemplo, a hipótese da Constituição deixar em aberto certa matéria para ensejar discussão, decisão e sua consolidação. Há segmentos que, por sua natureza, não se pode elaborar uma regulação jurídica detalhada, como no caso da política econômica externa.
O Direto Constitucional cria regras de ação e de decisão políticas; proporciona diretrizes e pontos de orientação para a política, mas sem poder substituí-la. Por isso, a Constituição deixa espaço para a atuação das forças políticas. Quando ela não regula numerosas questões da vida política, ou o faz apenas em linhas gerais, isso não deve ser visto apenas como uma renúncia a essa regulação ou tampouco como um remeter dessa tarefa ao processo de atualização e concretização, mas também, para além disso, como uma atitude constitucional em prol da livre discussão e da livre decisão dessas questões. Que essa liberdade não possa converter-se num sistema fechado, que impeça a atuação de diferentes forças, é algo que a Constituição procura assegurar mediante distintos tipos de prescrições materiais, organizativas e processuais, cuja função não consiste apenas nessa garantia. Por meio das suas prescrições materiais, das relativas à estrutura estatal e à regulação constitucional do processo de formação de unidade política e de atuação do Estado, a Constituição cria unidade estatal, dá forma à vida da Comunidade, assegura continuidade supra-pessoal, com o consequente efeito estabilizador. Ao mesmo tempo, permite entender e compreender a formação de unidade política e a atuação estatal, torna possível a participação consciente, protege de recaída no informe e indiferenciado, com a conseguinte eficácia estabilizadora. Através da ordenação do processo de formação de unidade política; da instituição, sempre limitada, de atribuições de poderes estatais; da regulação processual do exercício dessas atribuições; e do controle dos poderes estatais, a Constituição intenta limitar o poder estatal e prevenir o abuso desse poder. Nessa função de possibilitar e garantir um processo político livre, de constituir, de estabilizar, de racionalizar, de restringir o poder e, nisso tudo, de assegurar a liberdade individual reside a peculiaridade da Constituição. (HESSE, 2009, p. 90-91).
Se se dificultam as reformas constitucionais numa Constituição que deixa pouco espaço para a mutação, então resulta efetivamente correto falar-se de uma Constituição “rígida”; embora o conteúdo das disposições constitucionais, neste caso, esteja determinado com relativa precisão, dificilmente a Constituição estará em condição de cumprir seu desiderato na realidade histórica da vida da Comunidade. A situação não é muito melhor quando uma Constituição que deixa pouco espaço para a mutação se torna “móvel”, possibilitando sua reforma a qualquer momento e sem obstáculos. É certo que esta solução compatibiliza uma mais rápida adaptação, com maior precisão do texto, mas tampouco nesse caso pode a Constituição cumprir a sua missão como ordem jurídica fundamental da Comunidade, porque fica privada de um aspecto essencial, da sua virtude estabilizadora. Diversamente, atende-se à ideia e ao conteúdo da Constituição quando se deixa espaço para a mutação constitucional nos limites traçados no texto, ao mesmo tempo em que se criam obstáculos para a reforma constitucional. Tal solução opera simultaneamente essa (^8) Canotilho denomina transição constitucional “a revisão informal do compromisso político formalmente plasmado na constituição sem alteração do texto constitucional. Em termos incisivos: muda o sentido sem mudar o texto”. Para o jurista lusitano, alteração constitucional “consiste na revisão formal do compromisso político, acompanhada da alteração do próprio texto constitucional”. (CANOTILHO, 2006, p. 1228). (^9) Para Hesse: “Ver uma mutação constitucional na ‘contradição entre a situação constitucional e a lei constitucional’ ou, na terminologia atual, entre Constituição e realidade constitucional, simplesmente não é admissível pelo fato de que se está argumentando em diferentes níveis; o que muda não é o conteúdo da norma constitucional, para cuja determinação colabora o seu texto, mas outra coisa. Portanto, o conceito deveria ficar limitado a modificação do conteúdo de normas constitucionais cujo texto não é modificado”. (HESSE, 2009, p.153-154). (^10) Certamente não cabe a esse trabalho estabelecer qualquer discussão sobre o fenômeno da mutação constitucional, tampouco seus limites e aplicação. O trabalho limita-se tão-somente apresentar brevíssima introdução ao preceito, porquanto mantém relação com a força normativa da Constituição.
relativa elasticidade e essa relativa estabilidade, necessárias ao adequado cumprimento de seu desiderato por parte da Constituição (HESSE, 2009, p. 95).
Não é a vontade dos diferentes legisladores que consegue que as normas da Constituição sejam acatadas, que se afirme o Estado como unidade política de ação estabelecida por ela, e seja assumido responsavelmente, mas, sim, que, ademais, o acordo dos progenitores da Constituição tem que se perpetuar, por princípio, entre aqueles que posteriormente hão de viver sob ela. Isso depende de que a ordem positivada nela, e por ela se considere moralmente reta , ordem legítima, e exiba à sua volta efeitos integradores (HESSE, 2009, p. 12-13).
Se a Constituição, como se pôde ver, não contém um sistema fechado e unitário (quer seja este lógico-axiológico ou de valores hierarquizados) e se a interpretação de suas normas não pode ser simples execução de algo preexistente, far-se-á necessário um procedimento de concretização que responda a essa situação. Pois bem, através de uma atuação “tópica” orientada e limitada pela norma (o que significa dizer vinculada pela norma), haverão de encontrar- se e provar-se pontos de vista que, buscados pela via da inventio , sejam submetidos ao jogo das opiniões favoráveis e contrárias e fundamentem a decisão de maneira mais esclarecedora e convincente possível ( topoi ). Sempre que estes pontos de vista contenham premissas objetivamente adequadas e fecundas terão consequências que levem à solução do problema ou, ao menos, colaborem para isso. Neste sentido, não ficam entregues à discrição os topoi que devam ser trazidos à colação na multiplicidade dos pontos de vista. De um lado, o intérprete só pode utilizar na tarefa de concretização aqueles pontos de vista que tenham relação com o problema; a vinculação ao problema exclui topoi estranhos à questão. De outro lado, está obrigado a incluir no seu “programa normativo” e no seu “âmbito normativo” (cfr. Supra n.46) os elementos de concretização que lhe ministra a própria norma constitucional, assim como as diretrizes contidas na Constituição, em ordem à aplicação, coordenação e valoração desses elementos no curso da solução do problema (HABERLE, 2002, p. 111).
Dessa forma, num Estado de Direito, os direitos fundamentais operam como limite da ação estatal, como garantia dos fundamentos do ordenamento jurídico, em particular dos institutos essenciais do ordenamento jurídico privado; obrigam a proteger os conteúdos que garantem mediante
procedimentos adequados. De igual maneira, o ordenamento democrático da Lei Fundamental busca sua configuração jurídica nos direitos fundamentais, nos princípios de um sufrágio geral, livre, igual e secreto, o da igualdade de oportunidades dos partidos políticos, da liberdade religiosa e ideológica, das liberdades de expressão, reunião e associação. Esses direitos fundamentais regulam e asseguram a livre e igual participação dos cidadãos na formação da vontade política e, ainda mais, protegem a atividade e a igual oportunidade das minorias políticas e a formação da opinião pública: em conjunto, a liberdade e abertura do processo político como o traço decisivo da democracia que regula a Lei Fundamental. (HESSE, 2009, p. 37).
(^13) Para Hesse, “se os pressupostos da força normativa encontrarem correspondência na Constituição, se as forças em condições de violá-la ou de alterá-la mostrarem-se dispostas a render-lhe homenagem, se, também em tempos difíceis, a Constituição lograr preservar a sua força normativa, então ela configura verdadeira força viva capaz de proteger a vida do Estado contra as desmedidas investidas do arbítrio. Não é, portanto, em tempos tranquilos e felizes que a Constituição normativa vê-se submetida à sua prova de força. Em verdade, esta prova dá-se nas situações de emergência, nos tempos de necessidade. [...] Importante, todavia, não é verificar, exatamente durante o estado de necessidade, a superioridade dos fatos sobre o significado secundário do elemento normativo, mas, sim, constatar, nesse momento, a superioridade da norma sobre as circunstâncias fáticas”. (HESSE, 1991, p. 25). (^14) Segundo Mendes, “a Constituição, ensina Hesse, transforma-se em força ativa se existir a disposição de orientar a própria conduta segundo a ordem nela estabelecida, se fizerem-se presentes, na consciência geral – particularmente, na consciência dos principais responsáveis pela ordem constitucional -, não só a vontade de poder (Wille zur Macht), mas também a vontade de Constituição (Wille zur Verfassung)”. (MENDES, ano, 1991, p. 5).
Eventual ênfase numa ou noutra direção leva quase inevitavelmente aos extremos de uma norma despida de qualquer elemento da realidade ou de uma realidade esvaziada de qualquer elemento normativo. Faz-se mister encontrar, portanto, um caminho entre o abandono da normatividade em favor do domínio das relações fáticas, de um lado, e a normatividade despida de qualquer elemento da realidade, de outro [...]. A norma constitucional não tem existência autônoma em face da realidade. A sua essência reside na sua vigência , ou seja, a situação por ela regulada pretende ser concretizada na realidade. Essa pretensão de eficácia ( Geltungsanspruch ) não pode ser separada das condições históricas de sua realização, que estão, de diferentes formas, numa relação de interdependência, criando regras próprias que não podem ser desconsideradas. Devem ser contempladas aqui as condições naturais, técnicas, econômicas, e sociais. A pretensão de eficácia da norma jurídica somente será realizada se levar em conta essas condições. Há de ser, igualmente, contemplado o substrato espiritual que se consubstancia num determinado povo, isto é, as concepções sociais concretas e o baldrame axiológico que influenciam decisivamente a conformação, o entendimento e a autoridade das proposições normativas. (HESSE, 1991, p. 14-15).
A Constituição não configura, portanto, apenas expressão de um ser, mas também de um dever ser; ela significa mais do que o simples reflexo das condições fáticas de sua vigência, particularmente as forças sociais e políticas. Graças à pretensão de eficácia, a Constituição procura imprimir ordem (^16) Segundo Hesse, “abstraídas as disposições de índole técnico-organizatória, ela deve limitar-se, se possível, ao estabelecimento de alguns poucos princípios fundamentais, cujo conteúdo específico, ainda que apresente características novas em virtude das céleres mudanças na realidade sócio-política, mostre-se em condições de ser desenvolvido. A “constitucionalização” de interesses momentâneos ou particulares exige, em contrapartida, uma constante revisão constitucional, com a inevitável desvalorização da força normativa da Constituição” (HESSE, 1991, p. 21).
e conformação à realidade política e social. Determinada pela realidade social e, ao mesmo tempo, determinante em relação a ela, não se pode definir como fundamental nem a pura normatividade, nem a simples eficácia das condições sócio- políticas e econômicas. A força condicionante da realidade e a normatividade da Constituição podem ser diferençadas; elas não podem, todavia, ser definitivamente separadas ou confundidas. (HESSE, 1991, p. 15).
Onde inexiste força a ser desperta – força esta que decorre da natureza das coisas – não pode a Constituição emprestar- lhe direção; se as leis culturais, sociais, políticas e econômicas imperantes são ignoradas pela Constituição, carece ela do imprescindível germe de usa força vital. A disciplina normativa contrária a essas leis não logra concretizar-se. [...] A norma constitucional somente logra atuar se procura construir o futuro com base na natureza singular do presente. [...] a força vital e a eficácia da Constituição assentam-se na sua vinculação às forças espontâneas e às tendências dominantes do seu tempo, o que possibilita o seu desenvolvimento e a sua ordenação objetiva. A Constituição converte-se, assim, na ordem geral objetiva do complexo de relação da vida. (HESSE, 1991, p. 18).
(^17) A teoria ontológica das Constituições foi desenvolvida na década de 50 do século XX pelo jurista Karl Löewenstein e visa estudar a realidade vivenciada subjacente ao texto constitucional.