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Guias e Dicas
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Aspectos da Personalidade do Autor e do Fantástico: H.P. Lovecraft e Todorov, Notas de aula de Literatura

Este documento aborda as definições do gênero fantástico por h.p. Lovecraft e tzvetan todorov, além de sua relação com a psicanálise e o sonho. O texto explora as influências constantes da psicanálise na literatura fantástica, as características marcantes das obras fantásticas, os perigos que devem ser evitados e a relação entre o real e o fantástico.

O que você vai aprender

  • Que perigos devem ser evitados no mundo fantástico?
  • Como o real se relaciona com o fantástico?
  • Quais definições de gênero fantástico foram propostas por H.P. Lovecraft e Tzvetan Todorov?
  • Como as influências psicanalíticas afetaram a literatura fantástica?
  • Quais são as características marcantes das obras fantásticas?

Tipologia: Notas de aula

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Copacabana
Copacabana 🇧🇷

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS
DEPARTAMENTO DE TEORIA LITERÁRIA LITERATURA
COMPARADA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM TEORIA LITERÁRIA E
LITERATURA COMPARADA
Da Literatura fantástica (teorias e contos)
Marcio Cícero de Sá
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em
Teoria Literária e Literatura Comparada, do Departamento de
Teoria Literária e Literatura Comparada da Faculdade de
Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São
Paulo, para obtenção do título de Mestre em Letras.
Orientador: Profa. Dra. Sandra Margarida Nitrini
São Paulo
2003
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Baixe Aspectos da Personalidade do Autor e do Fantástico: H.P. Lovecraft e Todorov e outras Notas de aula em PDF para Literatura, somente na Docsity!

UNIVERSIDADE DE S√O PAULO

FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CI NCIAS HUMANAS

DEPARTAMENTO DE TEORIA LITER¡RIA LITERATURA

COMPARADA

PROGRAMA DE P”S-GRADUA«√O EM TEORIA LITER¡RIA E

LITERATURA COMPARADA

Da Literatura fant·stica (teorias e contos)

Marcio CÌcero de S·

DissertaÁ„o apresentada ao Programa de PÛs-GraduaÁ„o em

Teoria Liter·ria e Literatura Comparada, do Departamento de

Teoria Liter·ria e Literatura Comparada da Faculdade de

Filosofia, Letras e CiÍncias Humanas da Universidade de S„o

Paulo, para obtenÁ„o do tÌtulo de Mestre em Letras.

Orientador: Profa. Dra. Sandra Margarida Nitrini

S„o Paulo

UNIVERSIDADE DE S√O PAULO

FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CI NCIAS HUMANAS

DEPARTAMENTO DE TEORIA LITER¡RIA LITERATURA

COMPARADA

PROGRAMA DE P”S-GRADUA«√O EM TEORIA LITER¡RIA E

LITERATURA COMPARADA

Da Literatura fant·stica (teorias e contos)

Marcio CÌcero de S·

S„o Paulo

AGRADECIMENTOS

A minha orientadora, n„o somente pelo trabalho de orientaÁ„o, mas tambÈm pela amabilidade e seguranÁa com que o conduziu;

A minha esposa, pelo auxÌlio na busca de livros tÈcnicos, pesquisas na internet, incentivo e paciÍncia com meus hor·rios;

A todo o departamento de Teoria Liter·ria e Literatura Comparada;

E aos meus pais que, em primeira inst‚ncia, proporcionaram e incentivaram meu aprendizado durante toda minha vida.

RESUMO

A presente dissertaÁ„o pretende realizar um levantamento das principais teorias relacionadas com a literatura fant·stica produzidas durante os sÈculos XIX e XX, buscando suas caracterÌsticas, diferenÁas e concord‚ncias. Para tanto, inicia com uma leitura das tentativas de definiÁ„o desta literatura atravÈs do estudo de H. P. Lovecraft e Peter Penzoldt. Parte, ent„o, para uma leitura de trÍs teorias mais consistentes sobre o fant·stico, quais sejam: o fant·stico tradicional, de Todorov, o fant·stico contempor‚neo, de Sartre e o estranhamento, de Freud. A partir da leitura destas teorias, realizamos a ilustraÁ„o das mesmas atravÈs de trÍs contos tambÈm produzidos durante os sÈculos XIX e XX: ìBereniceî e ìA ilha da fadaî, de E. A. Poe, e ìA cidadeî, de Murilo Rubi„o. Por fim, sintetizamos e realizamos algumas consideraÁıes sobre o fant·stico.

SUM¡RIO

  • RESUMO...............................................................................................................................
  • ABSTRACT...........................................................................................................................
  • SUM¡RIO .............................................................................................................................
  • ÕNDICE..................................................................................................................................
    1. O tema e os contos..............................................................................................................
    1. DefiniÁıes e IndefiniÁıes..................................................................................................
    • Primeiras definiÁıes .........................................................................................................
    • A definiÁ„o tem·tica .........................................................................................................
    • A an·lise do autor.............................................................................................................
    1. ContribuiÁıes importantes ................................................................................................
    • Todorov e o fant·stico tradicional.....................................................................................
    • Sartre e o fant·stico contempor‚neo..................................................................................
    • O trabalho de Freud - os sonhos e o estranhamento...........................................................
    1. IlustraÁıes ........................................................................................................................
    • O Fant·stico tradicional ñ ìBereniceî, de Edgar Allan Poe ...............................................
    • O Fant·stico contempor‚neo e o absurdo ñ ìA cidadeî, de Murilo Rubi„o........................
    • O mundo onÌrico e o estranhamento ñ ìA ilha da fadaî, de Edgar Allan Poe.....................
    1. SÌntese e algumas consideraÁıes .......................................................................................
    1. Anexos ...........................................................................................................................
    • ìBereniceî de Edgar Allan Poe - traduÁ„o......................................................................
    • ìBereniceî de Edgar Allan Poe.......................................................................................
    • ìA Cidadeî de Murilo Rubi„o.........................................................................................
    • ìA ilha da Fadaî de Edgar Allan Poe - traduÁ„o.............................................................
    • ìThe Island of the Fayî de Edgar Allan Poe....................................................................
  • ReferÍncias Bibliogr·ficas ..................................................................................................
    1. O tema e os contos.............................................................................................................. ÕNDICE
    1. DefiniÁıes e IndefiniÁıes..................................................................................................
    • Primeiras definiÁıes .........................................................................................................
    • A definiÁ„o tem·tica .........................................................................................................
    • A an·lise do autor.............................................................................................................
    1. ContribuiÁıes importantes ................................................................................................
    • Todorov e o fant·stico tradicional.....................................................................................
    • Sartre e o fant·stico contempor‚neo..................................................................................
    • O trabalho de Freud - os sonhos e o estranhamento...........................................................
    1. IlustraÁıes ........................................................................................................................
    • O Fant·stico tradicional ñ ìBereniceî, de Edgar Allan Poe ...............................................
    • O Fant·stico contempor‚neo e o absurdo ñ ìA cidadeî, de Murilo Rubi„o........................
    • O mundo onÌrico e o estranhamento ñ ìA ilha da fadaî, de Edgar Allan Poe.....................
    1. SÌntese e algumas consideraÁıes .......................................................................................
    1. Anexos ...........................................................................................................................
    • ìBereniceî de Edgar Allan Poe - traduÁ„o......................................................................
    • ìBereniceî de Edgar Allan Poe.......................................................................................
    • ìA Cidadeî de Murilo Rubi„o.........................................................................................
    • ìA ilha da Fadaî de Edgar Allan Poe - traduÁ„o.............................................................
    • ìThe Island of the Fayî de Edgar Allan Poe....................................................................
  • ReferÍncias Bibliogr·ficas ..................................................................................................

O presente trabalho propıe-se a analisar o percurso da literatura fant·stica desde sua formaÁ„o, no sÈculo XIX, atÈ seu amadurecimento, no sÈculo XX. Devido ‡ extensa quantidade de obras relacionadas a essa literatura no perÌodo acima proposto, tornou-se necess·rio selecionar alguns autores cujas reflexıes trouxeram contribuiÁıes teÛricas que abriram caminhos para a compreens„o deste tema e gÍnero t„o complexo, ainda que n„o nos dÍem respostas definitivas. Assim, nosso trabalho objetivou verificar como se constituiu estruturalmente o conjunto de idÈias a esse respeito no ‚mbito de alguns pensadores, escritores e estudiosos da literatura, como se relacionaram umas com as outras, em maior ou menor grau, bem como compreender as semelhanÁas e diferenÁas entre as mesmas. Tivemos sempre presente a noÁ„o de que as idÈias analisadas possuÌam Ìntima ligaÁ„o com a cultura de seu espaÁo-tempo. Procuramos, desta forma, buscar a interpretaÁ„o do conceito de fant·stico sem a intenÁ„o de gerar a unificaÁ„o das idÈias dos autores selecionados, respeitando os vieses ou ìflavoursî que se configuraram atravÈs dos sÈculos XIX e XX. Nossa abordagem, conseq¸entemente, n„o ir· buscar o que definiria o fant·stico como um gÍnero autÙnomo 1 , mas t„o somente estud·-lo ou interpret·-lo, sem a necessidade de um rÛtulo que o posicione como um gÍnero liter·rio^2 distinto. Uma vez apresentado o percurso das idÈias sobre o fant·stico ao longo dos sÈculos XIX e XX, ser„o feitas trÍs leituras de contos, a tÌtulo de ilustraÁ„o, do que chamaremos de fant·stico tradicional, fant·stico contempor‚neo e estranhamento.

(^1) Para Bellemin-Noel, o fant·stico poderia ser considerado uma tÈcnica narrativa ou maneira de contar

(BELLEMIN-NOEL, Jean. ìNotes sur le Fantastique î in LittÈrature n. 8 , Librarie Larrousse, Paris, 1972, p. 3 e 4). (^2) Para uma an·lise da Teoria do gÍnero podemos indicar FRYE, Northrop. Anatomy of Criticism ñ

Four essays , Princiton University, Princiton, 1957, p.243.

Em outros termos, os contos selecionados n„o constituem objeto de uma leitura crÌtica, mas s„o utilizados como uma espÈcie de material de controle para mostrar os limites conceituais que nunca d„o conta da obra liter·ria concreta. Apesar disso, nosso objetivo È adentrar o que poderÌamos chamar de ìuniverso fant·sticoî. Esclarecendo ainda: nossa entrada nesse tema È motivada por uma indagaÁ„o de ordem teÛrica, o que justifica o corpus liter·rio apresentado como ilustraÁ„o. Feitas essas consideraÁıes, iniciamos nosso trabalho constatando que o termo fant·stico foi associado, principalmente a partir do final do sÈculo XIX, ‡s obras que possuÌam uma tem·tica ligada aos fantasmas e ao seu campo sem‚ntico. Segundo o dicion·rio Petit Larousse^3 , o fant·stico È definido como: ìonde est„o seres sobrenaturais: contos fant·sticosî. Utilizando-se do critÈrio de um tema comum, escritores e teÛricos da literatura de ent„o colocavam as ìhistÛrias de fantasmasî, as ìnarrativas maravilhosasî, as ìnarrativas misteriosasî e mesmo as ìnarrativas sobrenaturaisî sob uma mesma denominaÁ„o como se seus aspectos e estruturas formais fossem constantes. Um conhecido autor inglÍs de narrativas fant·sticas, M. R. James, assim comentava sobre este tipo de literatura:

Tem-me sido freq¸entemente pedido que formule as minhas opiniıes sobre as histÛrias de fantasmas e as narrativas maravilhosas, misteriosas ou sobrenaturais. Nunca cheguei a descobrir se tinha algumas opiniıes a formular. Suspeito, na verdade, que o gÍnero È demasiado exÌguo e especial para aceitar a imposiÁ„o de princÌpios de grande alcance...^4

(^3) Petit Larousse (^4) JAMES, M.R., ìIntroduction î , in V.H. Collins (ed.), Ghosts and Marvels , Oxford University Press,

London, 1924, p. 6.

... os que acreditam em forÁas ocultas s„o provavelmente menos eficazes do que os cÈpticos no delineamento do espectral e do fant·stico porque para eles o mundo dos espÌritos È uma realidade t„o familiar que tendem a referi-lo com menos temor, distanciamento e emotividade do que quem vÍ nele uma absoluta e assombrosa violaÁ„o da ordem natural 8.

Desta feita, os problemas resultantes das tentativas de definiÁ„o de uma literatura fant·stica se multiplicavam nas primeiras dÈcadas do sÈculo XX. Como pudemos observar nas definiÁıes transcritas, o termo fant·stico, maravilhoso, sobrenatural, misterioso e mesmo o horror e o terror se mesclavam sem a menor timidez.

(^8) Idem , p. 82.

2. DefiniÁıes e IndefiniÁıes

suas obras. Este mesmo tipo de abordagem foi adotado por muitos psicanalistas, cuja preocupaÁ„o era a de analisar o autor atravÈs de seus trabalhos liter·rios.^11 Com Tzvetan Todorov em sua obra IntroduÁ„o a Literatura fant·stica^12 , publicada em 1970, pudemos ter acesso a um estudo mais detalhado e consistente das caracterÌsticas formais que nos permitiriam dar a devida import‚ncia ‡ literatura fant·stica. Como veremos posteriormente, Todorov dialogaria com Sartre ao final de sua obra concordando com a vis„o segundo a qual o sÈculo XX assistiria a uma redefiniÁ„o do fant·stico. Mas Todorov prefere centrar seus estudos no que podemos chamar de fant·stico tradicional. A Literatura fant·stica, conseq¸entemente, fora definida e redefinida durante quase 70 anos por meio dos estudos liter·rios. Mas em 1900, anteriormente aos estudos citados atÈ o momento, atravÈs da publicaÁ„o de Die Traumdeutung^13 , Freud lanÁava junto a outros trabalhos de sua autoria uma luz sobre a psiquiatria. Ao colocar em pauta conceitos b·sicos e inÈditos que foram e est„o sendo utilizados atÈ o presente momento, esse autor permitiria que v·rios mecanismos psÌquicos, dentre eles os mecanismos do inconsciente e do sonho, fossem estudados com profundidade. Os conceitos psicanalÌticos teriam v·rios prolongamentos em todas as ·reas da vida humana, absorvendo-lhes e ao mesmo tempo acrescentando-lhes material. A literatura n„o poderia deixar de beber desta maravilhosa fonte que se lhe apresentava. Em 1919, tambÈm anteriormente aos trabalhos liter·rios sobre o fant·stico aqui expostos, Freud completaria sua contribuiÁ„o ao estudo liter·rio atravÈs de seu trabalho Umheilich^14 ; tratando especificamente do tema do estranhamento. Pelo apresentado atÈ o momento, duas principais vertentes haviam tratado do fant·stico e do estranhamento: a vertente liter·ria, iniciada de forma prec·ria e confusa por Lovecraft e James e a vertente psicanalÌtica, conduzida por Freud. A

(^11) BONAPARTE, Marie. E.P., Sa Vie, son Oeuvre , Denoel & Steele, P.U.F, Paris, 1933. (^12) TODOROV, Tzvetan. IntroduÁ„o ‡ Literatura Fant·stica , Ed. Perspectiva, S„o Paulo, 1970. (^13) FREUD , Sigmund. A interpretaÁ„o dos Sonhos. Ed. Imago, R.J., 1999. (^14) FREUD, Sigmund. "O estranho ". In: Uma crianÁa È espancada / Sobre o ensino da psican·lise nas

Universidades e outros trabalhos. Ed. Imago, R.J., 1976.

vertente liter·ria do fant·stico, alvo de nossos estudos, receberia influÍncias constantes da psican·lise, como ocorrera em Penzoldt, mas tambÈm em Sartre e Todorov. Outra vertente, a do surrealismo, utilizar-se-ia dos conceitos de Freud para, em 1924, estruturar o conceito de mundos paralelos. Este conceito possibilitaria uma comparaÁ„o entre o mundo surreal e o mundo fant·stico, mas diferiria do mesmo em relaÁ„o a um ponto polÍmico e crucial, qual seja, a indefiniÁ„o entre dois mundos. Vejamos, portanto, como as noÁıes de fant·stico se alteraram e foram definidas durante o sÈculo XX e como a literatura, alvo maior de nossos estudos e fonte constitutiva das noÁıes teÛricas ora descritas, permitiria que esses trabalhos teÛricos fossem conduzidos. Para tanto, iremos estabelecer uma ordem por vezes n„o cronolÛgica para a apresentaÁ„o das diferentes interpretaÁıes para o fant·stico. Iniciaremos pelo estudo dos trabalhos liter·rios de Lovecraft e Penzoldt. Verificaremos o conceito de fant·stico tradicional elaborado por Todorov e como Sartre estabeleceu a diferenciaÁ„o entre o tipo contempor‚neo e o tradicional. Passaremos aos estudos de Freud que anteriormente a estes literatos e embasado nas ciÍncias biolÛgicas permitiu a incorporaÁ„o de seus conceitos ‡ teoria liter·ria.

O sentimento produzido no leitor, desta forma, fora invocado por Lovecraft, mas permearia v·rias outras obras posteriores sobre o fant·stico. Este sentimento, segundo ele, estaria vinculado a algo coletivo, v·lido para toda a humanidade. Outros autores contempor‚neos iriam graduar este sentimento ao diferenci·-lo de um leitor para outro, como fizera Vax. Mas a quest„o da sensibilizaÁ„o do leitor continuaria em voga. A estÈtica da recepÁ„o, surgida em 1967, viria ao nosso auxÌlio ao colocar em quest„o a figura do leitor como determinante na geraÁ„o do sentido do texto. Os enunciados dos textos, n„o sÛ os ficcionais, exigiriam que o leitor realizasse a complementaÁ„o de vazios como uma projeÁ„o de sua individualidade.^17 Este aspecto incluiria a noÁ„o de sentimento despertado no leitor por meio do texto visto que, ao preenchÍ-lo, suas emoÁıes estariam sendo utilizadas para a eliminaÁ„o dos vazios. As reaÁıes provocadas no leitor implÌcito atravÈs desta recepÁ„o variariam desde a simples compreens„o de seu sentido atÈ uma extensa gama de atos conseq¸entes. 18 Assim, esta caracterÌstica de sensibilizaÁ„o do leitor citada por Lovecraft tambÈm seria utilizada, como veremos posteriormente, por autores como Todorov, assumindo neste ˙ltimo caso, entretanto, a marcante caracterÌstica do sentimento de d˙vida. Lovecraft dedica todo um capÌtulo de sua obra a Poe nos indicando como esse autor soube atingir a sensibilidade do leitor estabelecendo o que chamou de ìguia explÌcitoî para os contos e principalmente para as histÛrias fant·sticas. Segundo Lovecraft, Poe n„o seguia as convenÁıes prÈ-estabelecidas do ìfinal felizî, ìvirtudes recompensadasî ou da ìdid·tica moralî como conclusıes para os ìvalores ou padrıes popularesî, mas expressava e interpretava os eventos e sensaÁıes, fossem elas boas ou m·s, atrativas ou repulsivas, estimulantes ou depressivas, sem que tentasse se portar como um professor, simpatizante ou vendedor de opiniıes. 19

(^17) LIMA, Luiz Costa. A Literatura e o leitor ñ textos de estÈtica da recepÁ„o , Paz e Terra, R.J., 1979,

p.50. (^18) STIERLE, Karlheinz. ìQue significa a recepÁ„o dos textos ficcionaisî in A Literatura e o Leitor ,

traduÁ„o de Luiz Costa Lima, R.J., 1979, p.121. (^19) LOVECRAFT, H. P., op. cit. , p. 52.

Ao tratar da intenÁ„o por parte do autor de sensibilizar o leitor implÌcito, Lovecraft se direciona para uma interpretaÁ„o da recepÁ„o do texto. Outra caracterÌstica apontada por Lovecraft para o fant·stico foi assim descrita:

A verdadeira estÛria sobrenatural possui algo mais que um assassinato secreto, ossos sangrando ou formas em lenÁÛis balanÁando correntes conforme as regras. Uma certa atmosfera de terror sufocante e inexplic·vel composta por forÁas exteriores e n„o conhecidas deve estar presente, e deve ser sugerida, expressa com seriedade e forÁa tornando-se assunto da mais terrÌvel concepÁ„o do cÈrebro humano ñ a suspens„o maligna e particular ou a derrota das leis fixadas pela natureza na qual reside nossa ˙nica salvaÁ„o contra os assaltos do caos e dos demÙnios do espaÁo desestabilizado.^20

Como conseq¸Íncia, para que o medo se instalasse, a atmosfera criada pelo escritor teria import‚ncia absoluta. Este seria um dos fatores que permitiria que gradualmente o mundo fant·stico fosse definido e que se sustentasse, mesmo que por alguns instantes.^21 A ambientaÁ„o que pouco a pouco envolveria o narrador e conseq¸entemente o leitor permitiria que o mundo organizado e natural fosse afetado de uma maneira t„o intensa que se aproximasse do caos. Assim, o mundo real, conduzido pelas leis da natureza e explicado por leis cientÌficas, sofreria um abalo ao ter alguma de suas leis suspensas ou derrotadas. No caso da derrota, podemos entrever que o mundo real continuar· existindo, com sua lÛgica e cientificidade, mas com parte de suas determinaÁıes sendo contrariada. N„o se constituiria outro mundo, maravilhoso, com regras prÛprias, mas t„o somente uma mudanÁa ou adequaÁ„o a alguma antiga certeza natural. O momento anterior ‡ mudanÁa ou adequaÁ„o constituir-se-ia como a etapa do espanto diante de algo novo, inexplorado. J· a suspens„o de uma lei marcaria uma linha mais tÍnue ainda

(^20) LOVECRAFT, H. P., op. cit., p. 15. (^21) Idem , p. 16.