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Trabalho acadêmico concernente a uma das formas especiais de pagamento, a saber, a imputação do pagamento.
Tipologia: Trabalhos
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Não perca as partes importantes!
Este trabalho acadêmico, elaborado por membros do terceiro período da turma de Direito da faculdade de Direito de Pedro Leopoldo, tem como objetivo essencial, por mais humilde que seja, desenvolver da forma mais detalhada possível um tema de não muita relevância na doutrina, mas que ainda assim constitui um instituto normativo de grande importância e aplicação prática na seara da Jurisprudência – num sentido mais amplo – o que nos impele, diante disto, a prosseguir firmemente nesse mister. Primeiramente, será abordado o gênero no qual o tema principal desta pesquisa se encontra subsumido, visto que o desconhecimento de suas origens, ao menos mais próximas, constituiria óbice a uma visão o mais didática e ampla possível do que se pretende aqui perscrutar. Passando pelo gênero, chegaríamos finalmente à espécie, a qual se enquadraria na trilha principal que devemos nos embrenhar, e após um relativamente breve percurso e encontrando muitas pequenas ramificações no caminho – também pertinentes e constituintes da grande trilha – poderemos, enfim, chegar ao nosso destino final, que nada mais poderia ser do que o objeto de desejo menos cobiçado e ainda assim, o mais difícil de se conseguir: o conhecimento pretendido. Pretendendo não desvelar, ainda nesta página, o mistério de qual seja o nome real desta trilha confabulada, deixamos assim que o leitor por si mesmo descubra, ao folhear página por página, do que realmente se trata essa longa estrada e seus postos ramificados, tal como os veios de um vivo corpo o são para suas principais moradas. Prossigamos corajosamente então, sempre avante e adiante, não temendo o porvir.
Conforme o anteriormente dito, antes de se passar ao tema principal deste trabalho – da imputação do pagamento (a espécie), cumpre fazer uma rápida incursão na questão do pagamento (o gênero), a fim de se extrair ao menos uma noção geral do que este seja. Comecemos então com a abertura do novo Código Civil, no título III, que trata “do adimplemento e extinção das obrigações”, e poderemos ver, logo abaixo, o capítulo I, que trata “do pagamento”. Como não se trata da parte geral do código, percebemos de pronto uma não definição do que este seja, mas sim, o que vemos, são disposições sobre quem deve pagar e a quem se deve pagar e demais regulamentações. Exemplo destas disposições, mais especificamente sobre quem deva pagar, encontramos no art. 304: “ Qualquer interessado na extinção da dívida pode pagá-la, usando, se o credor se opuser, dos meios conducentes à exoneração do devedor ”. Outro exemplo deste tipo de disposição ou mera regulamentação seria a do art. 308, que trata daqueles a quem se deva efetuar o pagamento: “ O pagamento deve ser feito ao credor ou a quem de direito o represente, sob pena de só valer depois de por ele ratificado, ou tanto quanto reverter em seu proveito ”. Todavia, como se pode ver, nenhum desses artigos se ocupam especificamente “do que seja” o pagamento, não existindo ali uma definição ou conceituação geral. Esta, somente encontraremos, por óbvia ilação, na doutrina. Como é sabido de todos, o direito das obrigações 1 disciplina as relações jurídicas de conteúdo patrimonial que se formam entre as pessoas, através de um complexo normativo e vínculo que confere ao credor o poder de exigir do devedor uma prestação ou pagamento. Este, por sua vez, pode ser manifesto ou cumprido através das modalidades de dar, fazer e não fazer. Ocorrida a manifestação de uma destas modalidades e estando de acordo com o preceituado na lei, temos então a extinção da obrigação ou do vínculo de conteúdo patrimonial que unia o devedor e o credor. À essa extinção da dívida ou obrigação é o que denominamos de pagamento ou adimplemento.
(^1) “Obrigação é o vínculo jurídico, de caráter transitório, estabelecido entre credor e devedor, cujo objeto é a prestação pessoal, lícita, determinada ou determinável, de cunho econômico, positiva ou negativa”. (CRETELLA JÚNIOR, 2007, p. 27)
abrangente ou abarcadora do tema principal deste trabalho: a imputação do pagamento 3.
(^3) “Todavia, existem outras formas especiais de extinção das obrigações, as quais a doutrina costuma denominar pagamentos especiais ou indiretos. Metaforicamente, podemos dizer que se o pagamento é a “morte natural” de uma obrigação, não podemos deixar de reconhecer que, juridicamente, há outras formas de “morte” de uma obrigação, sem que se siga a via ordinária concebida genericamente para todas as formas de vida... Consoante veremos (...), ocorrida uma dessas modalidades de extinção obrigacional, o devedor se eximirá de responsabilidade, embora nem sempre o crédito haja sido plenamente satisfeito. É o ocorre, por exemplo, quando o credor “perdoa” a dívida. Nesse caso, a obrigação será extinta por meio da remissão , não obstante não tenha havido pagamento propriamente dito. Conclui-se, portanto, que a extinção da obrigação não necessariamente significará satisfação do credor. Advertimos, outrossim, quanto à importância da matéria, uma vez que cada forma especial de pagamento apresenta peculiaridades, exigindo do estudioso redobrada atenção para que não confunda institutos jurídicos semelhantes, embora desiguais em essência”. (GAGLIANO, 2004, p.
Neste capítulo iremos tratar de uma das formas indiretas de extinção das obrigações, denominada por “imputação do pagamento”, constante nos arts. 352 a 355 do Código civil brasileiro de 2002. A respeito do tema, já nos relata Pablo Stolze: “Ninguém está impedido de contrair mais de uma dívida com a mesma pessoa. Supondo serem todas líquidas e vencidas, e oferecendo o devedor capital insuficiente para a quitação de todas, tem ele o direito de escolher qual das dívidas pretende extinguir em primeiro lugar. É o caso de o sujeito dever R$ 5,00, R$ 10,00 e R$ 15,00 ao mesmo credor, sendo todas as dívidas líquidas e vencidas. Não discordando o credor em receber parcialmente o pagamento, cabe ao devedor (em regar a escolha é dele) imputar o valor pago em qualquer das dívidas. Da mesma forma, tendo todas as dívidas o mesmo valor, urge especificar qual dos débitos deverá ser solvido em primeiro lugar. Isso se dá através do instituto da imputação do pagamento , que analisaremos no presente capítulo”. (GAGLIANO, 2004, p. 187)
2.1 – Conceito
Antes de mais nada, vejamos o nos diz o art. 352 do Código Civil de 2002: “A pessoa por dois ou mais débitos da mesma natureza, a um só credor, tem o direito de indicar (ou imputar) a qual deles oferece pagamento, se todos forem líquidos e vencidos (grifos nossos)”. Tendo em mente tal artigo, esmiucemos a seguir o significado da própria palavra imputação, de forma que facilite, através de rápida incursão etimológica, a compreensão de nosso objeto de estudo. A palavra imputação deriva do latim imputare , significando levar em conta algo, atribuindo responsabilidade a alguém que realiza alguma coisa através da acusação. Em sentido amplo, ainda fora das aplicações específicas do termo ao direito contemporâneo, imputar seria “atribuir a alguém a responsabilidade de algo censurável” 4. Mas já no âmbito do direito civil, alcança a significação específica de
(^4) Cf. HOUAISS, Antônio; VILLAR, M de S; FRANCO, FM de. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva; 2001.
extinguirá, por ser este insuficiente para solver a todos” 9. Podemos perceber assim uma certa univocidade quanto a esta conceituação geral por parte dos muitos doutrinadores do Direito. Um exemplo, a título ilustrativo, de aplicação prática das conceituações supramencionadas poderia ser o de um “caso em que uma pessoa deve à outra várias promissórias, sendo duas no valor de $200, uma no valor de $140 etc. Se todas estiverem vencidas e o devedor entrar em acordo com o credor para pagar parceladamente, deverá ser especificado em cada pagamento qual das promissórias está sendo paga” 10. A jurisprudência também contém boas exemplificações, exemplo é um acórdão que trata dos juros vencidos, conforme o especificado no art. 354, no qual “ havendo capital e juros, o pagamento imputar-se-á primeiro nos juros vencidos, e depois no capital, salvo estipulação em contrário, ou se o credor passar a quitação por conta do capital ”. As peculiaridades inerentes a tal questão serão discutidas mais à frente. Contudo, objetivando uma melhor compreensão do acórdão que será, aqui, utilizado como exemplo, se fez mister de tal breve digressão. Então, sem mais demora, segue o acórdão: “ EMENTA: APELAÇÃO. AÇÃO MONITÓRIA. NOTA PROMISSÓRIA. PAGAMENTO PARCIAL DO DÉBITO. IMPUTAÇÃO DO PAGAMENTO. Conforme dispõe o art. 534 do CC, o pagamento imputar-se-á primeiro sobre os juros vencidos, depois, sobre o capital. RECURSO PROVIDO. (Apelação Cível Nº 70029190808, Vigésima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Niwton Carpes da Silva, Julgado em 06/05/2009).” 11
Percebe-se nesse acórdão, a necessidade do devedor imputar o seu pagamento primeiramente aos juros vencidos e, só depois, após quitados estes, recair o mesmo no capital da dívida. Isso é um exemplo de imputação que pode ser compreendido mesmo sem uma análise mais meticulosa a respeito dos requisitos e espécies do nosso tema em voga, que serão destrinchados nas seções correspondentes deste presente trabalho.
(^9) Cf. DINIZ, loc. cit. (^10) Cf. FIUZA, 2003, p. 270. (^11) PORTO ALEGRE. Tribunal de Justiça do RS. A parte demandante interpõe recurso de apelação propugnando pela aplicação do artigo 354 do Código Civil. Apelação Cível n. 70029190808. Rudimar Simões vargas versus Vera Lucia Custodio. Relator: DR. Niwton Carpes da Silva. Rio Grande do Sul, Acórdão de 27 de maio 2009. Disponível em: http://tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/ementa.php. Acesso em: 12. set. 2009.
Maria Helena Diniz trata sobre este mesmo assunto ao expor a preferência que o Código Civil de 2002 confere ao devedor para que este “[...] use, em primeiro lugar, do direito de indicar a dívida imputável; se ele não o fizer, esse direito se transferirá ao credor, e se nem um nem outro lançar mão desse instituto, a lei mencionará o critério que deverá ser seguido, prevalecendo, então, imputação legal. Martin de la Moutte nos ensina que, provenha a imputação do devedor, do credor ou de lei, é ela sempre convencional, pois o credor tem o dever de aceitar, resultante da relação obrigacional, sob pena de incorrer em mora accipiendi, autorizando o devedor a requerer consignação para que o pagamento oferecido se impute no débito indicado ” (grifos nossos). (DINIZ, 2003, p. 264) Como remate desta primeira seção do trabalho, podemos aduzir o conceito mais utilizado nos concursos públicos e exames da ordem, in verbis : “ Imputação do pagamento é o destino ou a aplicação dada à importância em dinheiro, entregue pelo devedor a um único credor, relativamente a dois ou mais débitos líquidos, vencidos e de mesma natureza ou a parte deles, quando esta importância não for suficiente para quitar a totalidade das dívidas, declarando o devedor, na ocasião, qual dos débitos pretende extinguir. Se o devedor não fizer a indicação e a quitação for omissa quanto à imputação, esta se fará nas dívidas líquidas e vencidas em primeiro lugar; se todas as dívidas forem líquidas e vencidas ao mesmo tempo, a imputação far-se-á na de valor mais elevado”. (CRETELLA JÚNIOR, 2007, p. 33)
2.2 – Requisitos
Conforme os arts. 352 e 353 do Código Civil de 2002, a imputação do pagamento pressupõe alguns requisitos. Vejamos primeiramente o disposto nos respectivos artigos: Art. 352. A pessoa obrigada por dois ou mais débitos da mesma natureza, a um só credor, tem o direito de indicar a qual deles oferece pagamento, se todos forem líquidos e vencidos. Art. 353. Não tendo o devedor declarado em qual das dívidas líquidas e vencidas quer imputar o pagamento, se aceitar a quitação de uma delas, não terá direito a reclamar contra a imputação feita pelo credor, salvo provando haver ele cometido violência ou dolo.
2.2.1 – Pluralidade de dívidas
Passemos agora a uma análise dos dispositivos acima. Do artigo 352 podemos inferir o primeiro dos requisitos no trecho “(...) pessoa obrigada por dois ou mais débitos (...)”, no qual se constata a necessidade de que haja uma pluralidade de dívidas , pois sem esta multiplicidade ou ao menos dualidade não teria, o devedor
uma única dívida, quando ela se desdobra, destacando-se os juros, que são acessórios do débito principal. Neste caso, segundo dispõe o art. 354, o pagamento imputar-se-á primeiro nos juros vencidos”^14.
2.2.2 – Identidade de partes
Passando agora para o segundo requisito, temos a necessidade de uma identidade das partes figurantes tanto no pólo ativo ou passivo da obrigação, devendo haver, desta forma, um só credor vinculado a um só devedor na relação, independendo se seja de forma solidária ou não - para ambos os casos 15. Nas palavras de Maria helena Diniz, deve haver uma identidade de credor e de devedor , “uma vez que as diversas relações negociais devem vincular o mesmo devedor a um só credor. Se se tratar de obrigação solidária ativa ou passiva, para efeito de imputação do pagamento e extinção da obrigação, o credor será tido como um só, o mesmo ocorrendo com o devedor, sob pena de não se configurar materialmente a imputação” 16.
2.2.3 – Igual natureza dos débitos
Precisaremos agora o terceiro requisito, conforme se observa no trecho do art. 352 que diz que a pessoa obrigada o é assim por “dois ou mais débitos da mesma natureza”. O que se quer dizer com isso é que para que se configure o pagamento por imputação é necessário que os débitos que um devedor tenha para com o credor sejam, além de fungíveis (ou seja, que possam ser “gastos”, consumidos ou passíveis de serem reciprocamente substituídos uns pelos outros), também iguais. Essa igualdade se verificaria na hipótese de um devedor A ter dois débitos com relação ao vendedor B de R$ 2.000,00 (débito X) e R$ 3.500,00 (débito
(^14) Cf. GONÇALVES, loc. cit. (^15) “ Identidade de partes – As diversas relações obrigacionais devem vincular o mesmo devedor a um mesmo credor, uma vez que o art. 352 do Código Civil cuida da hipótese de pessoa obrigada , por dois ou mais débitos da mesma natureza, a um só credor. Pode haver, todavia, pluralidade de pessoas, no pólo ativo ou passivo, como nos casos de solidariedade ativa ou passiva, sem que tal circunstância afaste a existência de duas partes, pois o devedor ou credor serão sempre um só.” (GONÇALVES, 2004, p. 302.) 16 Cf. DINIZ, loc. cit.
Y), todos, portanto, na forma da moeda brasileira. Caso o devedor A tivesse, ao invés de R$ 3.500,00 no débito Y, um débito de prestar uma obrigação de fazer (pintar as paredes da casa de B), então não existiria mais essa igualdade ou homogeneidade das dívidas, o que por conseqüência, tornaria a razão de ser da imputação inexistente 17. O autor Carlos Roberto Gonçalves também traz uma boa explicação, ao explicitar a exigência do art. 352 com relação aos débitos serem da mesma natureza, ou seja, que devam “ter por objeto coisas fungíveis de idêntica espécie e qualidade. Se uma das dívidas for de dinheiro, e a outra consistir na entrega de algum bem, havendo o pagamento de certa quantia não haverá necessidade de imputação do pagamento. Não poderá o devedor pretender imputar o valor pago no débito referente ao bem a ser entregue”. Ainda na mesma linha de raciocínio, aduz que a “fungibilidade dos débitos é necessária, para que se torne indiferente ao credor receber uma prestação ou outra. Não basta que ambas consistam em coisas fungíveis (dinheiro, café, milho etc.), fazendo-se mister que sejam homogêneas, isto é, fungíveis entre si. Assim, só poderá haver imputação do pagamento se ambas consistirem em dívida em dinheiro, por exemplo. Ela não poderá se dar se uma das dívidas for de dinheiro e outra de entregar sacas de café^18 ”. Ainda dentro deste mesmo requisito, teríamos que as dívidas deveriam ser ainda líquidas 19 e vencidas para configurar a licitude na indicação, por parte do
(^17) Preconiza Maria Helena Diniz sobre a igual natureza dos débitos , dizendo que “as dívidas devem apresentar fungibilidade recíproca, de tal modo que ao credor seja indiferente receber uma ou outra. P. ex.: se “A” deve a “B” R$ 5.000,00 e uma jóia, e oferece soma em dinheiro, claro está que o débito extinto foi aquele consistente nos R$ 5.000,00, não havendo necessidade de imputação do pagamento. Ante o fato de as dívidas serem de natureza diversa, o devedor, ao oferecer a prestação em dinheiro, não poderá pleitear que ela seja imputada na primeira ou na segunda dívida. o que se exige é que as prestações devidas consistam em coisas fungíveis de igual espécie e qualidade, sem o que não haverá imputação”. (DINIZ, 18 loc. cit. ) Cf. GONÇALVES, loc. cit. (^19) Washington de Barros Monteiro tem uma boa descrição das obrigações líquidas e ilíquidas: “(...) Eis outra classificação bem rica de interesse prático. Realmente, considera-se líquida a obrigação certa quanto à sua existência e determinada quanto ao seu objeto. Nela, acham-se especificadas, de modo preciso, qualidade, quantidade e natureza do objeto devido. Obrigação que não pode ser expressa por um algarismo, que não traduza uma cifra, que necessita, enfim, de prévia apuração, não merece tal qualificativo. Mas não lhe prejudica esse caráter qualquer dúvida de natureza jurídica. Por outro lado, ilíquida é a obrigação que dependa de prévia apuração, visto ser incerto o montante da prestação. Esse cálculo realiza-se, processualmente, através da liquidação, que lhe fixa o respectivo valor, em moeda corrente, a ser pago ao credor, se o devedor não puder cumprir a prestação na espécie ajustada (art. 947 do Cód. Civil de 2002).
haja financiamento ao consumo, adiantar quantas prestações lhe aprouver, tendo descontados os juros”. (FIUZA, 2003, p. 270) Nos relata também, o autor Carlos Roberto Gonçalves, que seria mais esclarecedora “sem dúvida, a redação do art. 783º, n. 2, do Código Civil português: ‘O devedor, porém, não pode designar contra a vontade do credor uma dívida que ainda não esteja vencida, se o prazo tiver sido estabelecido em benefício do credor´.”^24 Cotejado com o art. 991 do código civil brasileiro de 1916, que dispõe que “sem consentimento do credor, não se fará imputação do pagamento na dívida ilíquida, ou não vencida”, vemos a semelhança dos dispositivos português e brasileiro e também a concisão do código civil brasileiro de 2002, que omite tal disposição, por considerá-la já manifesta de modo implícito em seu texto 25.
2.2.4 – Suficiência do pagamento para resgatar qualquer dos débitos
Temos neste último requisito a imprescindibilidade de que, o valor pecuniário ou econômico prestado pelo devedor, seja suficiente para a quitação de ao menos um dos débitos da relação obrigacional 26. Deve-se levar em conta
(^24) Cf. GONÇALVES, 2004, p. 303 (^25) “O art. 991, segunda parte, do Código de 1916 dizia que, `sem consentimento do credor, não se fará imputação do pagamento na dívida ilíquida, ou não vencida´. Tal dispositivo não foi repetido, por supérfluo, pelo Código de 2002, segundo SILVIO RODRIGUES, posto que, de resto, a lei permite que a imputação se faça não só no débito vincendo, como no ilíquido, quando com isso concordar o credor”. (GONÇALVES, loc. cit. ) (^26) “ EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS. PROTESTO INDEVIDO. DÍVIDA PAGA. IMPUTAÇÃO AO PAGAMENTO. 1. Ilícito o protesto de título representativo de dívida quitada. Discute-se, no caso, imputação do pagamento. A tese da requerida é de que o cheque emitido pela autora não serviu para o pagamento da DM 1126, protestada por falta de pagamento, mas sim da DM 1131, no mesmo valor, com vencimento em data posterior. Não é verossímil a defesa apresentada. Quando emitido o cheque, apenas a DM 1126 estava vencida, além de constar, no verso do título, referência expressa a tal duplicata. Não há como concluir, diante de tais elementos, que o pagamento, ocorrido em 09.09.2004, diga com a DM 1131, que só venceria dias depois. Mesmo sob o enfoque das regras de imputação ao pagamento , não assiste razão à demandada. Art. 352 CC2002. 2. Presentes os pressupostos do dever de indenizar. Evidente a ocorrência dos danos morais decorrentes de protesto indevido. Abalo de crédito. Caso de dano moral in re ipsa, que dispensa a comprovação ou a demonstração da extensão dos danos, evidenciados pelas circunstâncias do fato. 3. Matéria relacionada ao valor da indenização não devolvida ao exame desta Corte. APELO DESPROVIDO. UNÂNIME”. (Apelação Cível Nº 70024636763, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Iris Helena Medeiros Nogueira, Julgado em 09/07/2008). (PORTO ALEGRE. Tribunal de Justiça do RS. Ilícito o protesto de título representativo de dívida quitada. Apelação Cível n. 70024636763. EQUIPE - COOPERATIVA DE SERVIÇOS LTDA. versus AVIS CONSTRUÇÕES E INCORPORAÇÕES. Relator: Iris Helena Medeiros Nogueira. Rio Grande do Sul, Acórdão de 9 de jun. 2009. Disponível em: http://tj.rs.gov.br/site_php/jprud2/ementa.php. Acesso em: 12. set. 2009).
também que, para a configuração da imputação do pagamento, o devedor não poderia oferecer pagamento suficiente para saldar todas as dívidas de uma só vez, visto que ao proceder assim desfiguraria a própria ratio essendi da imputação. Outro motivo de descaracterização consistiria no caso do solvens oferecer quantia inferior à necessária para a extinção de, na pior das hipóteses, a menor das dívidas. Ou ainda no caso do oferecimento de prestação que supra somente o valor desta última, o que enquadraria ambas as hipóteses em discussão na situação descrita no artigo 314 do CC/2002, no qual “ainda que a obrigação tenha por objeto prestação divisível, não pode o credor ser obrigado a receber, nem o devedor a pagar, por partes, se assim não se ajustou”. Em outras palavras, não pode o devedor forçar o accipiens a aceitar uma forma de pagamento parcelada, já que isto iria contra o seu direito 27. Utilizando-se das palavras de outros autores, temos que este é o “[...] último requisito exigido [...] (para que) o pagamento se mostre suficiente para extinguir pelo menos uma dívida ou outra, na qual pretenda o devedor imputá-lo. Se o pagamento não basta para extinguir ao menos uma das dívidas, descabe a imputação, porquanto, do contrário, se constrangeria o credor a receber pagamento parcial, ao que evidentemente se não acha obrigado (art. 314 do Cód. Civil de 2002). Amortização, ou pagamento parcelado do débito, só se permite quando convencionada entre as partes (grifos nossos)”. (MONTEIRO, 2003, p. 284)
2.3 – Espécies
Neste capítulo serão abordadas as espécies de imputação do pagamento, as quais são reguladas através dos arts. 352, 353 e 355 do novo código civil. Relembremos, por conseguinte, o que nos diz cada um desses dispositivos: “Art. 352. A pessoa obrigada por dois ou mais débitos da mesma natureza, a um só credor, tem o direito de indicar a qual deles oferece pagamento , se todos forem líquidos e vencidos (grifos nossos)”. Vemos aqui a prerrogativa que tem o devedor em especificar qual ou quais das dívidas deverão ser as solvidas através da prestação. Neste caso o
(^27) “É necessário, para que se possa falar em imputação do pagamento, que a importância entregue ao credor seja suficiente para regatar mais de um débito, e não todos. Se este oferece numerário capaz de quitar apenas a dívida menor, não lhe é dado imputá-la em outra, pois do contrário estar-se- ia constrangendo o credor a receber pagamento parcial, a despeito da proibição constante do art. 314 do estatuto civil. E, neste caso, não há que se cogitar da questão da imputação do pagamento”. (GONÇALVES, loc. cit. )
será tratada mais detalhadamente, junto com ao outras duas formas, nas respectivas seções subseqüentes deste capítulo.
2.3.1 – Imputação do pagamento por indicação do devedor
Como foi visto, as espécies da modalidade especial de pagamento ora em análise, se subdividem em três, a saber, imputação do pagamento por indicação do devedor , após a qual, consoante o art. 353, teríamos a imputação do pagamento feita pelo credor e, por fim, a imputação legal do pagamento. Este sub-capítulo pretende tratar especificamente da primeira destas modalidades, conforme o disposto no art. 352 do Código civil de 2002. Nessa espécie de imputação, o devedor tem a possibilidade de escolha com relação a qual dos débitos, dentre os vários que possa ter, deva saldar. É possível também a terceiro, nos casos nos quais lhe seja permitido por lei, realizar a imputação do pagamento no lugar do devedor. Comparando o código civil de 2002 com o anterior, temos na segunda parte do art. 991 deste a seguinte disposição: “ Sem consentimento do credor, não se fará imputação do pagamento na dívida ilíquida, ou não vencida ”. Entretanto, excluída esta segunda parte do dispositivo, em nada difere, destarte, do seu correlato no CC/2002. Confira o conteúdo deste artigo na íntegra e perceba por si mesmo a semelhança: Art. 991. “A pessoa obrigada, por dois ou mais débitos da mesma natureza, a um só credor, tem o direito de indicar a qual deles oferece o pagamento, se todos forem líquidos e vencidos. (no art 352 do CC/2002 : ` A pessoa obrigada por dois ou mais débitos da mesma natureza, a um só credor, tem o direito de indicar a qual deles oferece pagamento, se todos forem líquidos e vencidos ´. Esta primeira parte do dispositivo é, portanto, quase uma cópia literal, palavra por palavra, da nova redação do texto legal de 2002). Sem consentimento do credor, não se fará imputação do pagamento na dívida ilíquida, ou não vencida” (esta já é a parte dissonante). (grifos nossos). Assim, vimos que o devedor tem o direito de indicar a qual dos múltiplos
supletivamente far-se-á a imputação legal, na ordem preconizada pela norma residual do art. 355 do mesmo Estatuto Civil. Neste diapasão, primeiro eliminam-se as dívidas líquidas e vencidas com antecedência. Inexistindo precedência de vencimentos, recairá a imputação sobre as mais onerosas. Entende-se como mais onerosos os débitos que revelam encargos elevados sobre o devedor, tais como juros mais elevados, ônus hipotecário, débitos trabalhistas e fiscais e obrigações em fase de execução judicial, garantidas por penhora”. (FARIA, loc. cit. )
débitos de mesma natureza deva imputar o pagamento ao sujeito ativo da relação obrigacional. Nada obstante isso, existem certos requisitos ou condições que devam ser observadas na imputação levada a efeito pelo solvens. A primeira condição se refere à necessidade, conforme preceituado no dispositivo legal, dos débitos já estarem vencidos e também terem o status de liquidez, ou seja, estarem bem definidos ou certos quanto a sua existência e possuírem objetos já especificamente determinados. Esta é, portanto, a regra geral (digo regra geral num sentido mais amplo, transcendendo a terminologia jurídica). No entanto, seria possível ao devedor, por conta da inexistência de um dado específico, poder ainda assim efetuar o pagamento em dívidas líquidas e não vencidas. Vejamos como isso poderia ocorrer e que dado específico seria este, que, pelo fato de por si só de inexistir, ensejaria ao devedor a possibilidade de além de escolher o pagamento a ser imputado nas dívidas líquidas e vencidas, imputá-lo igualmente às ainda por alcançarem o seu vencimento. Pois bem. É sabido que, nos contratos, os mesmos são regulados por um preceito que admite a presunção de que deva ser respeitada, preferencialmente, a atuação do devedor - em primeiro lugar - quanto à imputação dos débitos, podendo este, assim sendo, renunciar ao prazo feito em seu próprio benefício. Para melhores esclarecimentos, o art. 133 do CC/2002 dispõe que “(...) nos contratos (o prazo é presumido) em proveito do devedor, salvo, quanto a esses (neste caso o devedor) , se do teor do instrumento, ou das circunstâncias, resultar que se estabeleceu a benefício do credor, ou de ambos os contratantes” (grifos nossos). Tendo em mente o artigo citado, fica fácil agora esclarecer que elemento ou dado seria esse, que, pela única razão de inexistir, já facultaria ao devedor a possibilidade de excluir o prazo e, por conseguinte, extinguir um vínculo obrigacional ainda por vencer. Tal dado seria, como patente se nos revela agora, o fato do contrato ter sido estabelecido em favor do credor, o que de per s e configuraria uma situação excepcional. Avançando um pouco mais, chegamos ao segundo requisito para que a imputação do pagamento realizada pelo devedor possa se desenvolver validamente. Segundo este requisito ou condição, o devedor, no momento de atribuir o pagamento a um dos débitos, deve se dobrar ante a imposição peremptória de oferecer uma quantia pecuniária que seja superior ou igual, pelo menos, ao menor dos múltiplos débitos existentes e devidos àquele a quem devam os mesmos ser
única dívida, considerando que a despeito do dispositivo legal que requer vários débitos para que possa ocorrer a imputação, “(...) excepcionalmente, a lei a admite (imputação do pagamento) havendo um único débito se este vencer em juros. Assim sendo, havendo capital e juros (compensatórios ou moratórios), o pagamento imputar-se-á primeiro nos juros vencidos e, depois, no capital, salvo convenção em sentido contrário ou se o credor vier a passar a quitação por conta do capital, permanecendo subsistentes os juros” (grifos nossos). (DINIZ, 2005, p. 355) Com essa breve exposição, se encerra a descrição do que sejam os três requisitos ou balizas para que possa a indicação por parte do devedor - de qual dos múltiplos débitos deva receber a quitação -, dentro do quadro principal da temática da imputação do pagamento, se desenvolver validamente. Cumpre também salientar que, no caso de terem sido observados corretamente todos os requisitos super- mencionados por parte do devedor ao adimplir a obrigação ou imputação do(s) débito(s), não poderá o credor recusar a prestação oferecida por aquele, visto que tal recusa implicaria em mora por parte do credor, a qual por sua vez, ensejaria ao solvens a possibilidade de requerer em juízo que o pagamento fosse efetuado por consignação, outra modalidade de pagamento especial ou indireto. Como fecho deste sub-capítulo, oportuno é mencionar as palavras do insigne Washington de Barros Monteiro sobre a imputação do devedor : “A imputação realizar-se-á por indicação do devedor, ou do credor, e ainda em virtude de lei. Existem, assim, três espécies de imputação: do devedor, do credor e legal. Na primeira (imputação do devedor) , a regra fundamental é a de que o devedor que paga tem direito de declarar qual o débito que almeja resgatar. Mas não é livre a imputação, e naturalmente comporta exceções: a) havendo capital e juros, o pagamento imputar-se-á primeiro nos juros vencidos, e depois no capital, salvo estipulação em contrário, ou se o credor passar a quitação por conta do capital (art. 354 do Cód. Civil de 2002). Nessas condições, não pode o devedor, pagando certa quantia ao credor, pretender que ela seja imputada no capital, quando se acha a dever juros deste. Ressalva-se, todavia, pacto em contrário, ou se o credor concorda com a aplicação no capital; b) não pode o devedor, invito creditori , imputar aquilo que paga numa dívida cujo montante seja maior. Do contrário, o credor seria obrigado a receber a receber por partes, quando assim não se ajustara, com violação do art. 314 do Código Civil de 2002. Muda o caso de figura, porém, se o accipiens aceita o pagamento parcelado; c) o devedor não pode imputar pagamento numa dívida ainda não vencida, se convencionado o prazo respectivo em proveito do credor. Nas obrigações, geralmente, o prazo é estabelecido em favor do devedor, caso em que pode este renunciá-lo, tendo-se, assim, por vencida a dívida. Nessa hipótese, admissível se torna a imputação no débito, cujo prazo se renuncia. Não lhe será lícito fazê-lo, porém, se esse prazo se convenciona em proveito exclusivo do credor. A imputação do devedor não pode ser prejudicial ao credor” (grifos nossos). (MONTEIRO, 2003, p. 285)
2.3.2 – Imputação do pagamento feita pelo credor
Esta seção tratará agora da hipótese na qual o devedor deixa de indicar qual dos débitos deveriam receber a quitação por ocasião do pagamento. Nestes casos, somos remetidos ao conteúdo normativo do art. 353 do Código Civil de 2002, que preceitua: “Art. 353. Não tendo o devedor declarado em qual das dívidas líquidas e vencidas quer imputar o pagamento, se aceitar a quitação de uma delas, não terá direito a reclamar contra a imputação feita pelo credor, salvo provando haver ele cometido violência ou dolo”. Cabe então ao credor, pela omissão do devedor, o direito de escolha de qual dos títulos de crédito que possui devam ser os escolhidos, arbitrariamente, para a sua quitação, haja vista o fato do devedor que pagou não ter exercido a quitação regular que lhe era devida, declinando assim de uma prerrogativa que permitiria, inclusive, o direito à retenção do pagamento no caso extremo do accipiens recusar a outorga da quitação da dívida intencionalmente por ele selecionada, fato que encontra seu embasamento legal no artigo 319 do CC/2002, o qual assevera que “ o devedor que paga tem direito a quitação regular, e pode reter o pagamento, enquanto não lhe seja dada ”. Desta forma, ficou claro que na situação na qual o solvens aceite a quitação por parte do credor, por decorrência do pagamento feito por aquele, somente se caracterizará uma ilicitude do ato – e por conseguinte invalidade e anulabilidade – nos casos em que o credor tenha agido de forma que atente contra a incolumidade física ou moral do pólo oposto da relação ou aja de forma coativa. Com efeito, a doutrinadora Maria Helena Diniz nos relata que, nessa espécie de imputação do pagamento, sua existência pressupõe o fato do solvens “[...] não usar de seu direito de indicar a dívida que será resgatada pelo pagamento. Deveras, o Código Civil, art. 353, estatui que `não tendo o devedor declarado em qual das dívidas líquidas e vencidas quer imputar o pagamento, se aceitar a quitação de uma delas, não terá direito a reclamar contra a imputação feita pelo credor, salvo provando haver ele cometido violência ou dolo´. Infere-se desse dispositivo legal que, para a configuração da imputação do pagamento pelo credor: a) será preciso aceitação de quitação de uma delas, feita no momento do pagamento; b) não tenha havido coação ou dolo por parte do credor”. (DINIZ, 2003, p. 267)