Docsity
Docsity

Prepare-se para as provas
Prepare-se para as provas

Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity


Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos para baixar

Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium


Guias e Dicas
Guias e Dicas

Cultura, multiculturalismo e interculturalidade, Manuais, Projetos, Pesquisas de Antropologia Social

A sociabilidade e a socialização são dois temas clássicos da Sociologia, mas que são muito importantes para compreender como o ser humano se relaciona com a sociedade na qual está inserido e com a cultura dessa sociedade. Logo, também é uma preocupação da Antropologia compreender como o ser humano estabelece relações sociais. A sociabilidade é uma característica intrínseca ao ser humano, sendo quase uma necessidade para se viver em sociedade. É graças à sociabilidade que temos essa ânsia pela vida em grupo, já que o ser humano não é dado ao isolamento. No entanto, é a socialização que nos integra à cultura em que nascemos, inculcando-nos os valores e hábitos dela, que adotamos como nossos, por meio dos diversos agentes de socialização. São esses agentes de socialização que nos transmitem as normas que regem a nossa vida. Neste capítulo, você vai compreender a importância da cultura, do multiculturalismo e da interculturalidade. Para tanto, é imprescindível que você esteja familiarizado

Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas

2023

À venda por 21/04/2023

Duany1
Duany1 🇧🇷

11 documentos

1 / 15

Toggle sidebar

Esta página não é visível na pré-visualização

Não perca as partes importantes!

bg1
ANTROPOLOGIA
TEOLÓGICA E
DIREITOS HUMANOS
Adriane da Silva Machado Möbbs
pf3
pf4
pf5
pf8
pf9
pfa
pfd
pfe
pff

Pré-visualização parcial do texto

Baixe Cultura, multiculturalismo e interculturalidade e outras Manuais, Projetos, Pesquisas em PDF para Antropologia Social, somente na Docsity!

ANTROPOLOGIA

TEOLÓGICA E

DIREITOS HUMANOS

Adriane da Silva Machado Möbbs

Cultura, multiculturalismo

e interculturalidade

Objetivos de aprendizagem

Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Reconhecer a importância da cultura, do multiculturalismo e da inter- culturalidade para a construção de uma sociedade melhor.  Definir aldeia global como novo areópago para o diálogo e o respeito às diferentes culturas.  Explicar a importância da valorização das diferentes culturas com base no sacrário da consciência.

Introdução

A sociabilidade e a socialização são dois temas clássicos da Sociologia, mas que são muito importantes para compreender como o ser humano se relaciona com a sociedade na qual está inserido e com a cultura dessa sociedade. Logo, também é uma preocupação da Antropologia compre- ender como o ser humano estabelece relações sociais. A sociabilidade é uma característica intrínseca ao ser humano, sendo quase uma necessi- dade para se viver em sociedade. É graças à sociabilidade que temos essa ânsia pela vida em grupo, já que o ser humano não é dado ao isolamento. No entanto, é a socialização que nos integra à cultura em que nascemos, inculcando-nos os valores e hábitos dela, que adotamos como nossos, por meio dos diversos agentes de socialização. São esses agentes de socialização que nos transmitem as normas que regem a nossa vida. Neste capítulo, você vai compreender a importância da cultura, do multiculturalismo e da interculturalidade. Para tanto, é imprescindível que você esteja familiarizado com os conceitos de sociabilidade e socialização, uma vez que esses conceitos são fundamentais para a compreensão das sociedades, da influência da cultura, do multiculturalismo e da intercul- turalidade nas formas e nos estilos de vida dos sujeitos.

De acordo com Kottak (2013, p. 44): “ Enculturação é o processo pelo qual uma criança aprende sua cultura”. O processo de enculturação é possibilitado pela facilidade de aprendizagem das crianças. Acerca disso, Kottak (2013, p.

  1. afirma: “A facilidade com que as crianças absorvem qualquer tradição cultural reside na capacidade humana singularmente sofisticada de aprender” (Figura 1).

Figura 1. Crianças exercendo práticas culturais próprias do grupo social ao qual pertencem. Fonte: CRStudio/Shutterstock.com.

Outra definição de cultura bastante conhecida e referenciada é a do antro- pólogo Clifford Geertz. Para Geertz (1981), as culturas se caracterizam como um conjunto de mecanismos de controle — planos, receitas, regras, instruções, aquilo que os engenheiros de informática chamam de programas para comandar o comportamento. Logo, a cultura é por ele definida como ideias baseadas na aprendizagem e nos símbolos culturais. Essas ideias são passadas não apenas às crianças, embora elas assimilem e aprendam de forma mais fácil; mas nós, adultos, podemos também receber novos hábitos e costumes — isso se dá a partir dos fatos sociais.

De acordo com Durkheim (1918), o fato social consiste em maneiras de agir, de pensar e de sentir que exercem determinada força sobre os indivíduos, obrigando-os a se adaptar às regras da sociedade onde vivem. No entanto, nem tudo o que uma pessoa faz pode ser considerado um fato social, pois, para ser identificado como tal, tem de atender a três características.  Coercitividade: característica relacionada com o poder ou a força com a qual os padrões culturais de uma sociedade se impõem aos indivíduos que a integram, obrigando esses indivíduos a cumpri-los.  Exterioridade: quando o indivíduo nasce, a sociedade já está organizada com suas leis, seus padrões, seu sistema financeiro, etc.; cabe ao indivíduo aprender a viver nela, por intermédio da educação, por exemplo.  Generalidade: os fatos sociais são coletivos, ou seja, eles não existem para um único indivíduo, mas para todo um grupo ou sociedade.

A cultura também é aprendida por meio da observação, segundo Kottak. As crianças observam os adultos e acabam repetindo os seus hábitos. Isso não é nenhuma novidade para quem está familiarizado com a Filosofia, uma vez que Aristóteles, na Ética a Nicômaco , já havia nos alertado que a educação se dá por imitação, e que uma criança só aprenderá a agir virtuosamente obser- vando os hábitos virtuosos do phrónimos (homens virtuosos). Cabe ressaltar que essa aprendizagem nem sempre se dá de forma consciente.

Ser humano: produto e produtor de cultura

Como vimos anteriormente, a cultura pode ser definida como tudo aquilo que o ser humano produz ou que sofre a sua intervenção, de forma que, segundo Ribeiro (1999), até uma galinha pode ser considerada cultura. Portanto, tudo o que vemos ao olhar ao nosso redor é cultural e foi produzido pelo ser humano, pois a realidade, como afirmou Freire, é a realidade humana , produzida pelo ser humano. Você deve concordar que o trabalho é muito importante para o ser humano, pois lhe dignifica, o torna útil e capaz de modificar a realidade, desde que não seja um trabalho em que seja explorado. Logo, não há exagero nenhum em dizer que o ser humano é produtor de cultura. Além disso, somos seres sociais que vivem em grupo, dotados de sociabilidade, ou seja, uma necessi- dade intrínseca de viver em grupo e/ou comunidades, pois não somos dados ao isolamento. Ainda, nossa educação, ou seja, as nossas aprendizagens,

No Brasil, a aculturação permitiu às culturas indígenas e africanas ad- quirirem traços das outras culturas. Houve também a aculturação religiosa, por meio da qual as religiões de matriz indígena e africana adquiriram traços das outras religiões. Essa troca entre as culturas é conhecida também como interculturalidade , que nada mais é do que o intercâmbio cultural entre as sociedades — é quando sociedades com culturas diferentes interagem, e uma acaba assimilando os hábitos da outra, sem perder os seus hábitos culturais. Alguns autores trabalham o conceito de interculturalidade como sinônimo de multiculturalismo. Em uma sociedade globalizada como esta em que vivemos, é comum que exista o que os antropólogos chamam de assimilação , que nada mais é do que o processo de mudança que um grupo étnico pode experimentar quando se muda para um país no qual uma outra cultura é dominante. Porém, essa mudança não é inevitável e nem necessária, desde que o grupo não se sinta ameaçado ou constrangido por agir conforme a sua cultura. Em situações em que as pessoas são pressionadas ou questionadas acerca dos seus hábitos e culturas, é mais comum que exista a assimilação cultural, até como uma forma de autodefesa. Uma sociedade multicultural não só socializa os indivíduos na cultura dominante (nacional), mas também cria uma cultura étnica e permite, assim, a compreensão das semelhanças e diferenças entre as culturas, sem fazer qualquer julgamento. Contudo, em uma sociedade tão plural culturalmente, é necessário aumentar a vigilância contra os preconceitos e as intolerâncias. E, para isso, o diálogo e o respeito são imprescindíveis.

O diálogo e o respeito às diferentes culturas

Nos cenários atuais, temos várias culturas convivendo em um mesmo território, graças à globalização, e as pessoas interagem via redes sociais com pessoas de diferentes culturas, tanto do seu próprio país como dos demais. Alertar para a necessidade do diálogo e do respeito às diferentes culturas se torna ainda mais necessário. Segundo Kottak (2013, p. 62):

O termo globalização abarca uma série de processos que operam em nível transnacional para promover transformações, em um mundo no qual as na- ções e as pessoas são cada vez mais interligadas e mutuamente dependentes. Promovendo a globalização estão as forças econômicas e políticas, juntamente com modernos sistemas de transporte e comunicação.

Como já vislumbrava o Papa João Paulo II, em sua Encíclica Redemptoris Missio (JOÃO PAULO II, 1990, documento on-line):

Encontramo-nos hoje diante de uma situação religiosa bastante diversificada e mutável: os povos estão em movimento; certas realidades sociais e religio- sas, que, tempos atrás, eram claras e definidas, hoje evoluem em situações complexas. Basta pensar em fenômenos tais como o urbanismo, as migrações em massa, a movimentação de refugiados, a descristianização de países com antiga tradição cristã, a influência crescente do Evangelho e dos seus valores em países de elevada maioria não cristã, o pulular de messianismos e de seitas religiosas. É uma alteração tal de situações religiosas e sociais, que se torna difícil aplicar em concreto certas distinções e categorias eclesiais, a que estávamos habituados.

As redes sociais, ao mesmo tempo que aproximam as pessoas das diferentes culturas, familiarizando-as com as práticas culturais dos diferentes povos que estão presentes nessa grande aldeia global ou casa comum que é a Terra, acaba distanciando-as também, devido à incompreensão e à falta de diálogo e respeito. A cada dia, vemos as pessoas se sentindo autorizadas a escreverem e dizerem o que querem, como se as redes sociais fossem uma “terra de ninguém”. Talvez, aqui, o ponto nevrálgico seja que as pessoas escrevem e dizem o que pensam. Portanto, cabe questionar: como mudar esse pensamento? Como diminuir ou mesmo erradicar a intolerância, a falta de respeito, a falta de empatia e de alteridade com relação ao outro? Esse outro que é estranho a mim, mas que, ao mesmo tempo, é meu irmão e criado por Deus também. A atitude de julgar a cultura e os hábitos do outro a partir da minha própria cultura é o que os antropólogos chamam de etnocentrismo. O etnocentrismo pode ser compreendido como uma visão do mundo na qual a própria cultura é tomada como superior e se aplicam os próprios valores culturais no julgamento dos comportamentos e das crenças de pessoas de outras culturas. No plano intelectual, pode ser visto como a dificuldade de pensarmos a diferença; no plano afetivo, ocorre na forma de sentimentos de estranheza, medo, hostilidade, etc. Como alternativa aos comportamentos etnocêntricos, há quem defenda a perspectiva do relativismo cultural , que é a visão de que o comportamento de uma cultura não pode ser julgado pelos padrões culturais de outra, conforme aponta Kottak (2013). O problema com o relativismo cultural é que ele pode nos conduzir ao relativismo moral , fazendo com que tenhamos de abrir mão de alguns valores e princípios fundamentais porque não podemos julgar as práticas culturais e religiosas das outras sociedades. Nesse sentido, para evitar esse relativismo

Você sabia que é possível acessar a Encíclica Redemptoris Missio (1990)? Acesse o link a seguir ou o código ao lado para ser direcionado ao site do Vaticano.

https://goo.gl/FcBKv

Valorização das diferentes culturas com base no sacrário da consciência

Em vez de ver a cultura do outro como exótica, porque não é igual à nossa, é fundamental que possamos promover a valorização das diferentes culturas, sem abrir mão do respeito aos direitos humanos, pois isso nos garante um fundo comum, ou uma base segura, que é a consciência, a racionalidade. A proposta de respeito e diálogo com as demais culturas pode ser utilizada a partir da proposta metodológica própria da Antropologia. Os antropólogos utilizam o relativismo cultural como uma posição metodológica, em vez de uma postura moral, em suas pesquisas. Enquanto método, o relativismo cultural permite ao sujeito se distanciar da sua cultura, para adentrar a cultura do outro e compreendê-la melhor, tendo sempre como base a liberdade. Trata-se de uma forma racional de estudar e compreender as demais culturas e, principalmente, de valorizá-las a partir delas mesmas. As atividades missionárias propostas pela Igreja Católica também têm esse propósito e se caracterizam pela consciência de promover a liberdade. Veja o que disse o Papa João Paulo II (1990, documento on-line) acerca disso:

Todas as formas de atividade missionária se caracterizam pela consciência de promover a liberdade do homem, anunciando-lhe Jesus Cristo. A Igreja deve ser fiel a Cristo, já que é o Seu Corpo e continua a Sua missão. É necessário que ela “caminhe pela mesma via de Cristo, via de pobreza, obediência, serviço e imolação própria até à morte, da qual Ele saiu vitorioso pela sua ressurreição”. A Igreja, portanto, tem o dever de fazer todo o possível para cumprir a sua missão no mundo e alcançar todos os povos; e tem também o direito, que lhe foi dado por Deus, de levar a termo o seu plano. A liberdade religiosa, por vezes ainda limitada e cerceada, é a premissa e a garantia de todas as liberdades que asseguram o bem comum das pessoas e dos povos.

É de se auspiciar que a autêntica liberdade religiosa seja concedida a todos, em qualquer lugar, e para isso a Igreja se empenha a fim de que tal aconteça nos vários Países, especialmente nos de maioria católica, onde ela alcançou uma maior influência. Não se trata, porém, de um problema de maioria ou de minoria, mas de um direito inalienável de toda a pessoa humana.

Dessa forma, fica evidenciado que não há como separar as culturas, as religiões e suas práticas dos direitos humanos. Os direitos humanos são fun- damentais, inclusive, para a manutenção e a compreensão de tais práticas. De acordo com Kottak (2013, p. 66), “A difusão, a migração e o colonialismo levaram traços e padrões culturais a regiões diferentes do mundo. Os mecanismos de mudança cultural incluem difusão, aculturação e invenção independente”. A Antropologia reconhece sistemas culturais (níveis de cultura), que são maiores e menores do que os Estados-nação. Observe o Quadro 1.

Fonte: Adaptado de Kottak (2013).

Cultura nacional Cultura internacional Subculturas

Incorpora crenças, padrões de comportamento aprendidos, valores e instituições que são compartilhados pelos cidadãos do mesmo país.

Se estende além das fronteiras nacionais. Como a cultura é transmitida pela aprendizagem, e não pela genética, os traços culturais podem se espalhar por meio de empréstimos ou de difusão de um grupo para outro.

São as tradições e os padrões simbólicos diferentes associados a determinados grupos na mesma sociedade complexa.

Quadro 1. Níveis de cultura

Todavia, ainda que haja um sistema cultural e níveis culturais distintos, não há uma hierarquia entre as culturas. Não existe uma cultura superior a outra. O que há são culturas mais ou menos desenvolvidas, no sentido de mais ou menos elaboradas, e tradições e costumes específicos transmitidos pela aprendizagem e pela linguagem, conforme leciona Kottak (2013).

MÖBBS, A. S. M. Respeito e “casos difíceis” (hard cases) em Paul Ricoeur. Revista Guairacá, Guarapuava, PR, v. 29, nº. 1, 87–107, 2013. Disponível em: https://revistas.unicentro.br/ index.php/guaiaraca/article/view/2709/46. Acesso em: 25 mar. 2019.

RIBEIRO, D. Noções de coisas. São Paulo: FTD, 1999.

TYLOR, E. B. Primitive culture. New York: Harper Torchbooks, 2000.

Leituras recomendadas

CASTILHO, R. Educação e direitos humanos. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2016.

RACHELS, J.; RACHELS, S. Os elementos da filosofia da moral. 7. ed. Porto Alegre: AMGH, 2013.

ROCHA, E. G. O que é etnocentrismo. São Paulo: Brasiliense, 1988.