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Introdução à Odontogénese: Células da Crista neural e Genes Homeóticos, Notas de aula de Embriologia

Uma introdução à odontogénese, um processo complexo de formação dos dentes. O texto aborda as características básicas das células derivadas da crista neural e dos genes homeóticos, que desempenham papéis chaves no início e progressão deste processo. Além disso, são discutidas as etapas tradicionais de desenvolvimento dos órgãos dentários, como a fase de gomo, de capuz, de campânula, de coroa e de raiz.

O que você vai aprender

  • Quais são as interacções epitélio/mesênquima importantes durante o processo de odontogénese?
  • Quais são as etapas tradicionais de desenvolvimento dos órgãos dentários e o que as caracteriza cada uma?
  • Quais são as características intrínsecas das células derivadas da crista neural?
  • Quais genes homeóticos são expressos durante o processo de odontogénese?

Tipologia: Notas de aula

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Rafael86
Rafael86 🇧🇷

4.6

(197)

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______________________________________________
Odontogénese
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Sumário: Pág.
Agradecimentos ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 3
Parte A Introdução, planificação e objectivos do trabalho ---------------------------------------------- 4
Lista de abreviaturas ------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 5
Resumo ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 6
Abstract ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 10
Odontogénese ---------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 11
Introdução ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 11
Células da crista neural (breves considerações) -------------------------------------------------------- 12
Genes homeóticos (alguns aspectos) ---------------------------------------------------------------------------- 19
Parte B - Aspectos morfofuncionais e moleculares da odontogénese --------------------------- 24
Fase de iniciação ------------------------------------------------------------------------------------------------------------ 24
Determinação do eixo oral-aboral ----------------------------------------------------------------------------------- 26
Interacção sequencial, recíproca e temporária entre epitélio e mesênquima ---- 29
Código odontogénico ----------------------------------------------------------------------------------------------------------- 30
Banda epitelial primária/ lâmina dentária --------------------------------------------------------- 34
Fase de Gomo ou Broto ------------------------------------------------------------------------------------------------ 36
Fase de Capuz ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 39
Fase de Câmpanula -------------------------------------------------------------------------------------------------------- 42
Fase de Coroa ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 44
Fase de Raiz ---------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 46
Conclusões finais ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------ 48
Parte C Bibliografia ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 50
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Baixe Introdução à Odontogénese: Células da Crista neural e Genes Homeóticos e outras Notas de aula em PDF para Embriologia, somente na Docsity!

Sumário: Pág.

  • Agradecimentos -------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
  • Parte A – Introdução, planificação e objectivos do trabalho ----------------------------------------------
    • Lista de abreviaturas -------------------------------------------------------------------------------------------------------------
    • Resumo -------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
    • Abstract -------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
    • Odontogénese ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
    •  Introdução -----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
    •  Células da crista neural (breves considerações) --------------------------------------------------------
    •  Genes homeóticos (alguns aspectos) ----------------------------------------------------------------------------
  • Parte B - Aspectos morfofuncionais e moleculares da odontogénese ---------------------------
    •  Fase de iniciação ------------------------------------------------------------------------------------------------------------
    •  Determinação do eixo oral-aboral -----------------------------------------------------------------------------------
    •  Interacção sequencial, recíproca e temporária entre epitélio e mesênquima ----
    •  Código odontogénico -----------------------------------------------------------------------------------------------------------
    •  Banda epitelial primária/ lâmina dentária ---------------------------------------------------------
    •  Fase de Gomo ou Broto ------------------------------------------------------------------------------------------------
    •  Fase de Capuz -------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
    •  Fase de Câmpanula --------------------------------------------------------------------------------------------------------
    •  Fase de Coroa -------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
    •  Fase de Raiz ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
  • Conclusões finais ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
  • Parte C – Bibliografia -----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

Agradecimentos

Agradeço à minha orientadora científica desta dissertação, Prof.ª Dr.ª Maria Helena Lopes Figueiredo, a completa disponibilidade continuamente demonstrada, o auxílio prestado na realização desta tese sempre que solicitada, o entusiasmo, o empenho, a dedicação sem limites, as sugestões, os esclarecimentos, os comentários e todo o material que sempre disponibilizou. Agradeço, ainda, a partilha do saber e a estimulação do meu interesse pelo conhecimento. Acima de tudo: Obrigado.

Agradeço também à Sr.ª Dr.ª Elisabete Resende pela correcção e ensinamentos na área relacionada com os mecanismos moleculares e genéticos do processo de odontogénese.

Uma palavra de agradecimento ainda à Sr.ª Eng.ª Gabriela Martins pela ajuda preciosa no tratamento informático dos esquemas e das imagens.

Quero agradecer também à Dr.ª Joana Rebola, pela ajuda no processamento de texto, particularmente na parte da bibliografia.

Lista de abreviaturas

BARX1 - BARX homeobox 1

BARX2 - BARX homeobox 2

BMP – Bone morphogenetic protein

BMP2 – Bone morphogenetic protein 2

BMP4 – Bone morphogenetic protein 4

DLX1 - distal-less homeobox 1

DLX2 - distal-less homeobox 2

HLX - H2.0-like homeobox

FGF – Fibroblastic growth factor

FGF 8– Fibroblastic growth factor 8

FGF 9– Fibroblastic growth factor 9

MSX1 – Msh homeobox 1

MSX2 – Msh homeobox 2

PAX9 – Paired box gene 9

SHH – Sonic hedgehog

Wnt – Wingless

Resumo

O conhecimento dos processos moleculares e mecanismos evolutivos relacionados com o desenvolvimento das estruturas crânio-faciais, incluindo as formações maxilares e os órgãos dentários, em vertebrados, constitui uma peça fundamental para a compreensão do desenvolvimento da cabeça. As células da crista neural, consideradas como a grande aquisição dos vertebrados durante o processo evolutivo, assumem cada vez mais um papel primordial neste processo. As características intrínsecas das células derivadas da crista neural, bem como a expressão de certos genes homeóticos, associada à acção indutora de determinados factores de crescimento, provenientes maioritariamente do epitélio suprajacente, desempenham uma posição chave no inicio e progressão dos processos de odontogénese.

A primeira fase do desenvolvimento odontogénico (iniciação) envolve um conjunto de mecanismos que determinam a área onde irão posicionar-se os dentes no seu conjunto e mais tarde a posição e diferente morfologia de cada um dos componentes das famílias de incisivos, caninos pré molares e molares. Muitos destes processos têm lugar muito antes das primeiras evidências histológicas que caracterizam as etapas iniciais da odontogénese e que também são comuns a vários órgãos de origem ectodérmica. Embora, os órgãos dentários sejam estruturas características apenas do primeiro arco, estão localizados especificamente na sua metade anterior, região oral. Com efeito, durante as fases precoces de desenvolvimento da mandíbula e da maxila começa a estabelecer-se uma nítida “polaridade”, dando origem a uma região oral (onde serão formados e desenvolvidos os dentes) e uma região aboral (com predominância de elementos constituintes do sistema esquelético). Depois de demarcada a região da futura arcada dentária (no seu todo) serão definidas as sub regiões correspondentes às áreas de desenvolvimento dos diferentes tipos de dentes (incisivos, caninos, pré molares e molares). Este processo resulta da interacção entre moléculas de sinalização (muitas vezes com sinais antagónicos) como o FGF8 e a BMP2 e a BMP4 e a consequente expressão e arranjo estratégico de certos factores de transcrição (maioritariamente ligados aos genes PAX9 e MSX1). São mecanismos deste tipo que constituem o código odontogénico responsável pelo aparecimento e evolução de germens dentários no local correcto e com a forma correcta. O código odontogénico ( the odontogenic homeobox code ) determina que a expressão combinada de certos genes homeóticos esteja altamente confinada a

dentária, devendo actuar como um factor mecânico, que pode contribuir em grande parte para o desenvolvimento da concavidade evidenciada no órgão do esmalte. Ainda nesta fase o ectomesênquima que rodeia tanto o órgão do esmalte quanto a papila dentária organiza-se, formando uma “cápsula” em torno do gérmen dentário em desenvolvimento, separando-o do restante ectomesênquima do maxilar. Esta condensação periférica é denominada por saco ou folículo dentário , sendo responsável pela formação do periodonto de inserção (cemento, ligamento periodontal e osso alveolar). No final desta fase começa a observar-se, junto ao epitélio interno, uma concentração de células que irá ser designada por nó do esmalte (primário). Esta estrutura, ainda que temporária, vai ter uma importância crucial no mecanismo de evolução do gérmen dentário para as fases seguintes, bem como na determinação da forma da coroa. Com efeito, o tamanho e forma do dente começam a esboçar-se nesta fase de capuz atingindo uma definição final na fase de campânula, sendo este processo regulado pelo nó do esmalte.

Na fase de câmpanula precoce o órgão do esmalte apresenta já quatro camadas distintas: epitélio externo, reticulo estrelado, estrato intermediário e epitélio interno. O estádio avançado de câmpanula muitas vezes designado por fase de coroa está associado à formação dos tecidos duros do dente verificando-se sempre que o aparecimento da dentina precede a formação do esmalte. De facto, ainda que o órgão do esmalte e as células do epitélio interno manifestem mais precocemente uma nítida diferenciação celular, a dentinogénese inicia-se sempre antes da amelogénese. Com efeito, os ameloblastos após adquirirem características de células secretoras de proteínas permanecem aparentemente inactivos até os odontoblastos sintetizarem a primeira camada de dentina, primeiro tecido mineralizado a surgir no órgão dentário. O crescimento da dentina ocorre de uma forma centrípeta (em direcção à polpa), enquanto que o esmalte é centrifuga (em direcção ao epitélio oral).

Uma vez completa a formação da coroa dentária inicia-se o desenvolvimento da raiz, constituindo a bainha epitelial de Hertwig uma estrutura fundamental neste processo. As células do folículo dentário dão origem aos cementoblastos que revestem a dentina radicular. Paralelamente começam também a diferenciar-se os fibroblastos do ligamento periodontal e os osteoblastos do osso alveolar. O cemento, o ligamento periodontal e o osso alveolar, estruturas todas derivadas do saco ou folículo dentário são, no seu conjunto, responsáveis pela

ancoragem do dente aos alvéolos dentários, evoluindo de maneira integrada e coordenada com a formação da raiz do dente.

Odontogénese

Introdução

Odontogénese é a denominação usualmente atribuída ao conjunto de eventos relacionados com a origem e formação dos dentes, designação da responsabilidade de Kollar e Lumsden (1979) que inclui a iniciação, morfogénese e diferenciação dos germes dentários, incidindo apenas no desenvolvimento do esmalte e complexo dentino pulpar. Esta denominação foi mais tarde alargada de modo a abranger também o desenvolvimento do periodonto, ou seja, o conjunto do cemento, ligamento periodontal e osso alveolar, formações que inicialmente não eram consideradas como parte integrante do dente. A maioria dos artigos publicados sobre o desenvolvimento e estrutura dos órgãos dentários assentava essencialmente na observação minuciosa de lâminas histológicas e sua descrição detalhada feita por individualidades como Tomes, Von Ebner, Retzius, Hertwig e outros estudiosos cujos nomes ficaram para sempre ligados à histologia oral (Kollar e Lumsden, 1979; Ten Cate, 1995). Porém, foram os trabalhos de investigação experimental, iniciados apenas há poucas décadas atrás, no campo da genética e da embriologia molecular que chamaram à atenção para o papel específico das células da crista neural nos processos de odontogénese e para as complexas interacções epitélio/mesênquima, desencadeando uma revolução e evolução notáveis neste campo. Adams (1924), Stone (1926), Raven (1931) e Lumsden (1984) foram os primeiros investigadores que demonstraram a importância da crista neural no desenvolvimento das estruturas que caracterizam o primeiro arco branquial. Os estudos baseados em células marcadas com timidina tritiada (Slavkin Diekwisch, 1996; Thesleff et al, 1996) permitiram seguir a migração das células da crista neural, estabelecendo que a formação da face e a determinação do número, forma e localização dos dentes, nos mamíferos, estava definitivamente ligada ao ectomesênquima associado às células neurais. Levantava-se, então, uma outra questão: qual o papel do epitélio oral e do ectomesênquima nos mecanismos de odontogénese e qual deles seria o responsável pelo desencadear do processo. Muitos foram os trabalhos que apontavam para a função dominante do ectomesênquima (Osborn, 1978; Vainio et al , 1994; Kollar, 1970; Kollar, 1972) e muito poucos os que sugeriram que era o epitélio oral que exercia uma influência determinante e crucial como “motor de arranque” do processo de odontogénese. Foi, no entanto mais tarde demonstrado,

que o factor indutor responsável pelo início do desenvolvimento do órgão dentário residia, de facto, no epitélio oral, mas que rapidamente o ectomesênquima, por ele induzido, assumia um papel dominante nos processos de morfogénese e diferenciação que se seguiam. Está actualmente confirmada uma interacção recíproca que se exerce alternadamente, de parte a parte, tendo sido possível identificar vários factores de crescimento, moléculas de sinalização, factores de transcrição e componentes da matriz extracelular como elementos responsáveis pelo diálogo entre o epitélio oral e o ectomesênquima adjacente. As características intrínsecas das células derivadas da crista neural, bem como a expressão de certos genes homeóticos (genes com sequências homeobox) associada à acção indutora de determinados factores de crescimento desempenham uma posição chave no desenvolvimento crânio-facial e na regulação do inicio e progressão dos processos de odontogénese (Yoshikawa e Kollar, 1981). Pareceu- nos, pois, importante proceder a uma breve exposição sobre células da crista neural e sobre genes homeóticos, antes de desenvolver alguns aspectos morfofuncionais e moleculares do processo de formação dos órgãos dentários.

Células da crista neural (breves considerações)

A crista neural é uma estrutura constituída por um conjunto de células com grandes capacidades pluripotenciais, formada na região dorsal do tubo neural (entre o tubo neural e a ectoderme) durante a neurulação, exibindo um gradiente rostrocaudal muito definido (Nonaka 2006; Garcez, 2009; Silva, 2007; Suomalainen, 2010). Estas células, ainda que de origem epitelial, adquirem propriedades mesenquimatosas e um acentuado comportamento migratório, seguindo rotas e destinos bastantes diferentes. De facto, mesmo antes do fecho do tubo neural, muitas destas células desprendem-se do neuroepitélio de origem, sofrem uma transição epitélio mesênquima e assumem um fenótipo migratório como células isoladas. Assim, iniciam um extenso movimento por todo o embrião dando origem a um grande número de tipos celulares diferentes (figura 1) que, maioritariamente, vão constituir elementos do sistema nervoso periférico. A distribuição destas células é tão ampla e a sua contribuição tão significativa que já têm sido consideradas, no seu conjunto, como um quarto folheto embrionário. As rotas de migração e destino final das células da crista neural foram já mapeadas pondo em evidência as suas diferentes potencialidades e a existência de várias sub-populações, acompanhando a intrínseca segmentação da crista neural ao

A história evolutiva da crista neural e a natureza dos primeiros craniatas estão intimamente ligadas à evolução do encéfalo, do crânio, dos receptores neuro sensoriais e da musculatura da faringe. Carl Gand e Glen Northcutt (1983) propuseram uma teoria que indicava que o ancestral dos vertebrados teria sido um animal semelhante ao anfioxo (Garcez, 2009). Como o anfioxo, este animal seria um filtrador, desprovido de musculatura faríngea, invólucro rígido para o encéfalo, bem como outras estruturas típicas da cabeça de vertebrados. As principais inovações que viabilizaram a transição e evolução da extremidade cefálica foram particularmente o desenvolvimento de elementos cartilaginosos e ósseos (que permitiram a protecção do SNC), o aparecimento de uma formação mandibular, a organização de estruturas sensoriais e plexos nervosos associados e o progresso da musculatura faríngea. Estas novas características permitiram aos animais passar de um estado filtrador para predador. Gans & Northcutt (1983) propõem, assim, que o aparecimento da crista neural num vertebrado ancestral, foi um ponto-chave que contribuiu tanto para o desenvolvimento de estruturas que formam a cabeça, quanto para o aprimoramento de um sistema sensorial. Os primeiros vertebrados exibindo uma “nova cabeça” foram, provavelmente organismos, muito parecidos aos modernos peixes sem mandíbula, como a lampreia. Apesar das lampreias não terem mandíbula, apresentam contudo um lábio superior e inferior com morfologias distintas, expressando já marcadores moleculares típicos de estruturas derivadas da crista neural. A mandíbula surge, pois, como uma inovação da maior importância resultante de alterações topográficas decorrentes da migração de células da crista neural e de interacções epitélio-mesenquima, permissivas à formação de estruturas mandibulares. Este facto permitiu o desenvolvimento de excepcionais condições e capacidades de sobrevivência aos animais (Chai & Maxson, 2006; Mallatt, 2008).

O início do processo de migração das células da crista neural ainda não é totalmente conhecido, porém, sabe-se que a partir da sua posição e especificação na crista neural passa a ser activado um conjunto de factores de transcrição, preparando-as para um determinado trajecto migratório e destino final. Com efeito, o padrão de migração e diferenciação das células da crista neural não depende somente duma possível pré-programação intrínseca (resultante da sua localização

topográfica de origem) mas vai sendo determinado por factores moleculares “residentes” nos diferentes tecidos por onde vão passando. Como estas células estão fortemente aderentes às demais células do neuroepitélio, a perda da expressão das N-caderinas é o primeiro passo para o início da sua migração (Akitaya & Bronner-Fraser, 1992). Em seguida, a presença de certos elementos da matriz extracelular apresenta-se fundamental para determinar algumas rotas de migração destas células. Posteriormente, combinações de moléculas da matriz extracelular aliadas a factores quimiotáticos solúveis guiam de maneira específica as células da crista neural no seu processo de diferenciação, direccionando-as para os seus mais diversos destinos (Löfberg et al., 1985). Uma vez no seu destino final, as células da crista neural recebem sinalizações e mensagens para que assumam um fenótipo final e definitivo. Em síntese, pode afirmar-se que certas especificidades da matriz extra celular, juntamente com as características intrínsecas das células, bem como a existência de gradientes de factores de crescimento, com importantes funções indutoras (presentes em regiões específicas do embrião), são os principais responsáveis pela diferenciação das células da crista neural. Entre os componentes mais importantes (que participam nas interacções epitélio-mesênquima) capazes de estimular a sobrevivência, proliferação, migração e diferenciação destas células estão elementos pertencentes às seguintes famílias de factores de crescimento e diferenciação: factores de crescimento fibroblásticos (FGFs), proteínas morfogénicas ósseas (BMPs), proteínas hedgehog (Shh) e proteínas Wnt (Kalcheim, 1989; Murphy et al., 1994; Kubota et al., 2000; Holland et al, 2007). Estes compostos formam no seu conjunto importantes moléculas sinalizadoras.

As células da crista neural da região cefálica (figura 2) têm uma participação decisiva e prioritária na formação da face e dos arcos branquiais. De facto, as células que migram do prospectivo diencéfalo até ao rombómero 8 constituem a região com maiores potencialidades.

próximo-distal da mandíbula e determinar um modelo odontológico específico de cada espécie (Helms et al., 2005). Assim, pode afirmar-se que as células da crista neural vão formar órgãos dentários somente quando associadas com o epitélio oral. Com efeito, durante o desenvolvimento normal as células da crista neural que entram no primeiro arco são odontologicamente inespecíficas, necessitando da presença do epitélio oral para desenvolverem um potencial odontogénico. Na verdade, o epitélio oral constitui um importante agente “instrutor” sobre o ectomesênquima subjacente regulando (estimulando ou inibindo) a expressão de genes específicos (maioritariamente genes homeóticos) envolvidos no desenvolvimento inicial de células da linha odontoblástica. Os odontoblastos derivados deste ectomesênquima, com origem nas cristas neurais, vão mais tarde formar dentina. A dentina constitui um tecido muito sensível a alterações mecânicas, térmicas e osmóticas. Quaisquer alterações no fluxo de fluidos presentes no interior dos túbulos dentinários são capazes de estimular as células odontoblásticas. Este aspecto demonstra bem que estas células “carregam” ainda muitas das características do seu neuroepitélio de origem, (Magloire, et al., 2004). Dentro desta filosofia, foi proposto, que os odontoblastos seriam originalmente receptores sensoriais, respondendo a alterações químicas e térmicas do ambiente, especificidades que ainda hoje se mantêm. Embora os seus prolongamentos ou processos estejam protegidos por uma matriz extracelular mineralizada de natureza conjuntiva (por eles próprios sintetizada), estudos recentes demonstraram que os odontoblastos de mamíferos, para além de características mesenquimatosas, expressam uma série de receptores neuronais. Estão incluídos neste contexto o receptor de capsaicina, os canais de sódio e receptores sensíveis a tetradotoxina. Em cultura de células, os odontoblastos, mostraram-se também capazes de gerar potenciais de acção. Estas células são, por isso mesmo, responsáveis pela recepção e transmissão de estímulos relacionados com os processos de dor (Allard et al., 2006). Todas estas evidências reforçam o que a este respeito Slavkin et al (1996) afirmaram, sublinhando a origem neural do órgão dentário “ Teeth per se are essentially neurological structure that are suggested to have originated as exoskeletal chemosensory organ in early agnathan chordates .”

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Uma última nota para descrever sumariamente algumas das alterações morfológicas e funcionais observadas nos órgãos dentários, durante o processo de

evolução filogenética, visando um melhor entendimento dos mecanismos que controlam a formação dos dentes. A complexidade e a dinâmica da formação do dente podem ser mais facilmente exemplificadas e compreendidas observando as mudanças ocorridas nas dentições, durante o decurso da evolução dos vertebrados. Na dentição dos vertebrados inferiores, apesar de já apresentarem formações maxilo-mandibulares, não se verifica oclusão entre as mandíbulas opostas. A sua função está, assim, limitada à preensão e perfuração da comida. O estabelecimento da oclusão dentária veio permitir um melhor processamento da comida e um consequente aumento na eficiência da entrada de nutrientes no sistema digestivo. O desenvolvimento da mastigação foi um passo chave que permitiu aos mamíferos suportar maiores níveis de actividade, conferindo-lhes importantes capacidades. O dente constitui o factor mais significativo no controlo da oclusão, uma vez que o ajuste entre maxila e mandíbula, durante a mastigação, é regulado principalmente pelos contactos oclusais entre as cúspides, depressões e fissuras de dentes opostos (Silva e Alves, 2008). A transformação verificada na forma dos molares constitui, também, um outro exemplo que demonstra bem a mudança da capacidade do dente de perfurar e cortar para a de esmagar e moer. As alterações adaptativas observadas nas diferentes dentições, ao longo da escala filogenética, permitiram um melhor processamento da comida e maior eficiência na absorção de nutrientes pelo organismo, possibilitando aos mamíferos competir pela energia necessária à sua sobrevivência (Silva e Alves, 2008).

Em síntese, o conhecimento dos processos moleculares e mecanismos evolutivos relacionados com o desenvolvimento das estruturas crânio-faciais, incluindo as formações maxilares e os órgãos dentários, em vertebrados constitui uma peça fundamental para a compreensão do desenvolvimento da cabeça. Estas noções são também indispensáveis para alicerçar estudos de medicina regenerativa, como as regenerações ósseas, vasculares, nervosas e dentárias. As células da crista neural, consideradas como a grande aquisição dos vertebrados durante o processo evolutivo, assumem cada vez mais um papel primordial no futuro da medicina e da medicina dentária.

como factores de transcrição. Estas proteínas de regulação génica ligam ou desligam conjuntos específicos de genes devido à sua capacidade de reconhecer uma determinada sequência de DNA. A interface proteína/DNA assegura uma interacção altamente específica e muito forte, podendo facilmente activar ou reprimir a transcrição de outros genes. Estas sequências, altamente conservadas ao longo da escala filogenética, assumem um papel crítico no desenvolvimento e estabelecimento de regiões corporais distintas e formações específicas nos vertebrados, inclusive no homem. A Drosophila (figura 3) possui oito genes homeóticos ( HOM-C ) que especificam as estruturas que se desenvolvem a partir de cada um dos seus segmentos corporais. Nos vertebrados os genes homólogos ao complexo homeótico da drosophila ( HOM-C ) estão dispostos de uma maneira agrupada (formando até ao presente quatro grupos distintos) e são designados por cluster HOX. No homem (figura 3) estes genes estão representados por 39 membros dispostos em quatro grupos (A, B, C e D), localizados nos cromossomos 7, 17, 12 e 2, respectivamente e contém 9 a 11 genes em cada um desses grupos. Os genes HOX são um subgrupo dos genes homeobox. A expressão dos genes HOX é iniciada na gastrulação e segue um padrão de colinearidade temporal e espacial (Hunt et al, 1991; Shah et al 1996; Suzuki et al, 2006). Com efeito, a expressão dos genes HOX é colinear com o padrão de expressão temporal e espacial da Drosophila , seguindo a mesma ordem ao longo do eixo cefalo-caudal. Este aspecto pressupõe a existência de um mecanismo de regulação comum responsável pelo desenvolvimento de regiões específicas (tanto na mosca como nos mamíferos). Por outro lado a expressão destes genes selectores reflecte a sua ordem de organização no genoma. Assim, os genes HOX das regiões 3’ são transcritos mais precocemente do que os da região 5’, que são expressos mais tardiamente e controlam, por sua vez, áreas localizadas numa posição mais posterior, quando consideradas ao longo do eixo crânio caudal do embrião (Garcez, 2009).

Figura 3: Representação esquemática da localização e correspondência dos genes HOM-c e HOX respectivamente no genoma da drosophila, no homem e no rato. Adaptada de Grays´s Anatomy

A segmentação embrionária da cabeça e pescoço é mais notória do que em qualquer outro local do embrião exercendo os genes homeóticos um papel fundamental na morfogénese e desenvolvimento dos arcos branquiais (Ten Cate et al, 2003; Garrant, 2003). Diferentes combinações da expressão destes genes ajudam a seleccionar o destino final de muitos grupos de células e, deste modo, o aparecimento de formações específicas e estrategicamente posicionadas no tempo e no espaço. Pode considerar-se, pois, que a função básica dos genes homeóticos em todos os animais consiste em determinar e estabelecer a individualidade dos diferentes segmentos formados ao longo dos eixos corporais e ao longo do desenvolvimento. A conservação da estrutura e função destes genes na escala