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Criptococose: Sintomas, Diagnóstico, Tratamento e Prevenção, Notas de estudo de Diagnóstico

Este documento discute sobre a criptococose, uma infecção causada pela levedura encapsulada cryptococcus neoformans. Apresenta sintomas, diagnósticos, tratamentos e prevenções para indivíduos imunocompetentes e imunossuprimidos. Menciona as diferentes variedades do agente, sua distribuição geográfica e as principais formas da doença. Além disso, discute os métodos de diagnóstico, como cultura e exame histopatológico, e os tratamentos, como antifúngicos como anfotericina b e fluconazol.

O que você vai aprender

  • Como é diagnosticada a criptococose?
  • Qual é a causa da criptococose?
  • Quais são os sintomas da criptococose?

Tipologia: Notas de estudo

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Maracana85
Maracana85 🇧🇷

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102 Arq Med ABC. 2006;31(2):102-9.
Resumo
A criptococose é uma infecção fúngica, predominante-
mente oportunista, causada por levedura encapsulada
Cryptococcus neoformans. Pode afetar indivíduos imu-
nocompetentes, mas freqüentemente acomete imunos-
suprimidos, principalmente indivíduos infectados pelo
vírus da imunodeficiência humana. A doença, geralmente,
é adquirida através da inalação do agente, determinando
a primoinfecção pulmonar, que pode ser sintomática ou
assintomática e usualmente resolve-se espontaneamente.
Posteriormente, por disseminação hematogênica, pode
atingir outros órgãos – principalmente o Sistema Nervoso
Central (meningoencefalite), pele, linfonodos, ossos e
outros. De acordo com a literatura, há três variedades e cinco
sorotipos do C. neoformans, segundo suas características
genéticas e estruturais, sendo o sorotipo A (C. neoformans
var grubii) a mais freqüente no Brasil e com acentuado
dermotropismo. As lesões cutâneas ocorrem de 10 a 15%
dos casos de criptococose sistêmica. De modo mais raro,
pode haver inoculação primária na pele, determinando a
criptococose cutânea primária. Para o tratamento pode-se
utilizar antifúngicos como a anfotericina B associado com
5-fluocitosina, em infecções disseminadas; ou fluconazol e
itraconazol, como opções para infecções cutâneas.
Unitermos
Criptococose; cutânea; imunossuprimidos.
Abstract
Criptococcosis is a fungal infection, predominantly opportunist;
caused by encapsulated yeast Cryptococcus neoformans.
It can affect individuals with normal immune function, but
frequently attacks immunocompromised patients, mainly
individuals infected by human immunodeficiency virus
(HIV). Usually, disease is acquired by inhaling aerosolized
infectious particles, primarily affects the lungs, can be
symptomatic or no, and heals spontaneously. Later, the
disseminated cryptococal disease can reach other organs
- mainly the Central Nervous System (meningoencephali-
tis), skin, lymph nodes, bones or else. In agreement with
the literature there are three varieties and five serotypes
of the C. neoformans, in agreement with their genetic and
structural characteristics. The literature reports marked
dermotropism of the so-called grubii variety of C. neofor-
mans, serotype A. The cutaneous lesions are seen in 10 to
15% of the cases of disseminated cryptococcosis. Seldom
it can have primary inoculation in the skin, determin-
ing primary cutaneous Criptococcosis. For treatment of
cryptococcosis antifungal regimen can be used with the
combination of amphotericin B with 5-flucytosine for the
disseminated disease; or fluconazol and itraconazole for
cutaneous lesions, as an alternative.
Keywords
Criptococcosis; cutaneous; immunocompromised patients.
Introdução
Cryptococcus neoformans é uma levedura encapsulada
que causa infecção em indivíduos com função imune
adequada ou prejudicada, particularmente em indivíduos
infectados pelo vírus da imunodeficiência humana. O
fungo afeta primariamente os pulmões, e posteriormente
outros órgãos – como a pele. Esta última também pode
ser afetada, mas raramente, por inoculação traumática
(criptococose cutânea primária). As lesões cutâneas são
muito variadas, sendo, portanto, de difícil diagnóstico,
devendo-se considerar também a história clínica e exames
laboratoriais para auxiliar o diagnóstico.
Criptococose cutânea
Cutaneous cryptococcosis
Fabiana Carla Bivanco, Carlos d’Aparecida S. Machado, Eduardo Lacaz Martins
Recebido: 31/6/2006
Aprovado: 20/8/2006
Serviço de Dermatologia (Instituto da Pele) da Faculdade de Medicina do ABC
Artigo Original
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102 Arq Med ABC. 2006;31(2):102-9.

Resumo A criptococose é uma infecção fúngica, predominante- mente oportunista, causada por levedura encapsulada Cryptococcus neoformans. Pode afetar indivíduos imu- nocompetentes, mas freqüentemente acomete imunos- suprimidos, principalmente indivíduos infectados pelo vírus da imunodeficiência humana. A doença, geralmente, é adquirida através da inalação do agente, determinando a primoinfecção pulmonar, que pode ser sintomática ou assintomática e usualmente resolve-se espontaneamente. Posteriormente, por disseminação hematogênica, pode atingir outros órgãos – principalmente o Sistema Nervoso Central (meningoencefalite), pele, linfonodos, ossos e outros. De acordo com a literatura, há três variedades e cinco sorotipos do C. neoformans , segundo suas características genéticas e estruturais, sendo o sorotipo A ( C. neoformans var grubii ) a mais freqüente no Brasil e com acentuado dermotropismo. As lesões cutâneas ocorrem de 10 a 15% dos casos de criptococose sistêmica. De modo mais raro, pode haver inoculação primária na pele, determinando a criptococose cutânea primária. Para o tratamento pode-se utilizar antifúngicos como a anfotericina B associado com 5-fluocitosina, em infecções disseminadas; ou fluconazol e itraconazol, como opções para infecções cutâneas.

Unitermos Criptococose; cutânea; imunossuprimidos.

Abstract Criptococcosis is a fungal infection, predominantly opportunist; caused by encapsulated yeast Cryptococcus neoformans. It can affect individuals with normal immune function, but frequently attacks immunocompromised patients, mainly individuals infected by human immunodeficiency virus

(HIV). Usually, disease is acquired by inhaling aerosolized infectious particles, primarily affects the lungs, can be symptomatic or no, and heals spontaneously. Later, the disseminated cryptococal disease can reach other organs

  • mainly the Central Nervous System (meningoencephali- tis), skin, lymph nodes, bones or else. In agreement with the literature there are three varieties and five serotypes of the C. neoformans , in agreement with their genetic and structural characteristics. The literature reports marked dermotropism of the so-called grubii variety of C. neofor- mans , serotype A. The cutaneous lesions are seen in 10 to 15% of the cases of disseminated cryptococcosis. Seldom it can have primary inoculation in the skin, determin- ing primary cutaneous Criptococcosis. For treatment of cryptococcosis antifungal regimen can be used with the combination of amphotericin B with 5-flucytosine for the disseminated disease; or fluconazol and itraconazole for cutaneous lesions, as an alternative.

Keywords Criptococcosis; cutaneous; immunocompromised patients.

Introdução

Cryptococcus neoformans é uma levedura encapsulada que causa infecção em indivíduos com função imune adequada ou prejudicada, particularmente em indivíduos infectados pelo vírus da imunodeficiência humana. O fungo afeta primariamente os pulmões, e posteriormente outros órgãos – como a pele. Esta última também pode ser afetada, mas raramente, por inoculação traumática (criptococose cutânea primária). As lesões cutâneas são muito variadas, sendo, portanto, de difícil diagnóstico, devendo-se considerar também a história clínica e exames laboratoriais para auxiliar o diagnóstico.

Criptococose cutânea

Cutaneous cryptococcosis

Fabiana Carla Bivanco, Carlos d’Aparecida S. Machado, Eduardo Lacaz Martins

Recebido: 31/6/ Aprovado: 20/8/

Serviço de Dermatologia (Instituto da Pele) da Faculdade de Medicina do ABC

Artigo Original

Arq Med ABC. 2006;31(2):102-9. 103

Histórico

O Cryptococcus neoformans foi inicialmente isolado do suco de frutas, na Itália por Francesco Sanfelice em 1894. No mesmo ano, médicos germânicos, Abraham Buschke e Otto Busse isolaram o mesmo fungo de lesões ósseas simulando um sarcoma. Sanfelice chamou a levedura de Saccharomyces neoformans enquanto Busse a chamou de Saccharomyces hominis e a doença, de sacaromicose^1.

Em 1895, o patologista francês Ferdinand Curtis des- crevia uma levedura isolada de tumores de partes moles e pele – alguns de aparência mixomatosa, sendo chamada de S. subcutaneus tumefasciens ou Megalococcus myxoides.

Em 1901, o micologista francês Jean-Paul Vuillemin classificou essa levedura isolada por Busse e Curtis no gênero Cryptococcus , com a denominação de C. neoformans.

Em 1916, nos Estados Unidos, Stoddard & Cutler descreveram casos de blastomicose com lesões cutâneas ou nervosas, de onde isolaram uma levedura denominada de Torula histolytica , posteriormente denominada de C. neoformans^1_._

Desse modo a criptococose também foi denominada de blastomicose européia e torulosis.

Etiologia

A criptococose é uma infecção fúngica causada por uma levedura encapsulada Cryptococcus neoformans 1,2,3,^. Este último é o principal patógeno humano, dentre 37 espécies presentes no gênero Cryptococcus. Na literatura há raros casos causados por outras espécies: Cryptococcus albidus e Cryptococcus laurentii , no caso de criptococose cutânea secundária 5.

O agente é caracterizado por uma cápsula polissa- carídea, que apresenta espessura variável; em ambiente natural a cápsula é fina e pequena, enquanto em tecidos infectados revela-se espessa. Os polissacarídeos da cápsula, a enzima fenoloxidase e a fosfolipase do C. neoformans e a capacidade de crescimento do organismo a 37ºC são os maiores fatores de virulência 1.

A atividade patogênica da levedura depende princi- palmente da cápsula, a qual contém glucuronoxilomanana (GXM) – presente em todos os sorotipos; além de manose, polímeros de xilose e ácido glucurônico. Os polissacarídeos da cápsula com sua capacidade antigênica são capazes de inibir a fagocitose, consumir complemento, absorver e neutralizar opsoninas e outros anticorpos protetores; além de poder bloquear a quimiotaxia de neutrófilos e monóci- tos. Outro fator patogênico é a produção de fenoloxidase quando o C. neoformans cresce em meio à base de ágar con- tendo extratos de batata, cenoura e determinadas sementes ( Vicia faba ou Guizotia abyssinica ); e também em meios que contêm tirosina e ácido clorogênico. Atuando sobre os mesmos, por oxidação, produz pigmento tipo melanina,

dando às colônias coloração escura – não observada em outras leveduras 1,^. De acordo com Rodrigues et al.^7 quando o hospedeiro é imunocomprometido, o C. neoformans tenta escapar dos mecanismos de defesa do organismo pela produção de ácido siálico, melanina, manitol e fosfolipase e polissacarídeos da cápsula. Diferentemente, em imunocompetentes, os mecanis- mos ainda não estão esclarecidos. A melanina parece auxiliar na virulência da levedura, que apresenta grande tropismo pelo Sistema Nervoso Central, rico em catecolaminas. O criptococo utiliza tais substâncias para produzir melanina, protegendo a arginina da ação oxidativa, pela remoção de radicais livres7,8. Franzot et al. 9 , baseado em características biológicas, ecológicas, epidemiológicas e genéticas, verificou que o C. neoformans apresenta três variedades e cinco sorotipos: sorotipo A (chamado de C. neoformans variedade grubii ); sorotipo D ( C. neoformans var. neoformans ); sorotipos B e C ( C. neoformans var. gatti ); e, recentemente, o sorotipo AD (anteriormente incluído na variedade neoformans )10,11^ (Tabela 1). O sorotipo A tem distribuição mundial, com acentuado dermotropismo; o sorotipo D é achado principalmente no norte da Europa, principalmente em solo contaminado por excretas de aves/pombos; o sorotipo B e C são limitados às áreas tropical e subtropical – encontrados geralmente em árvores de Eucalyptus camaldulensis (sudeste da Califórnia, África, Austrália, Ásia e Brasil). O sorotipo AD foi isolado na Europa e América do Norte10,^. O C. neoformans var shangaiensis parece ser idêntica a variedade gatti^1. A cápsula polissacarídea do agente é o maior fator de virulência, como já citado, sendo que a complexidade estrutural do material aumenta do sorotipo D para o A; e do B para o C 1. A infecção pelo C. neoformans var neoformans (sorotipo D) e grubii (sorotipo A) geralmente acometem indivíduos imunossuprimidos; enquanto a var gatti (sorotipo B e C) in- fecta predominantemente imunocompetentes^12. O sorotipo D tende a produzir lesões cutâneas sem envolvimento sistêmico, e segundo autores é considerado o agente mais freqüente nas lesões cutâneas primárias 1,10,13. A variedade gatti é a mais virulenta e pode levar a terapias antifúngicas recalcitrantes; além de produzir mais seqüelas^14. Segundo Lacaz & Rodrigues 15 , no Brasil predomina o C. neoformans sorotipo A ( grubii ); e em relação à var gatti , a maioria das amostras é do tipo B. Já Steenbergen & Ca- sadevall^16 registraram na cidade de Nova York a prevalência dos sorotipos A e D. O patógeno é classificado entre os basidiomicetos, sendo suas formas sexuadas perfeitas denominadas: Filobasidiella neoformans var neoformans (sorotipo A e D); e Filobasidiella neoformans var bacillispora (sorotipo B e C). In vitro as duas variedades são idênticas1,^.

Fatores de risco / epidemiologia

A criptococose pode afetar, raramente, indivíduos imuno- competentes. No entanto, é mais comum acometer imunos- suprimidos, principalmente aqueles com deficiência imune da linhagem de células T, particularmente pacientes com Aids. Atualmente, a infecção por HIV é um fator predisponente em aproximadamente 80-90% das infecções criptocócicas 18. Alguns autores relatam que a criptococose ocorre em cerca de 6 a 13% dos pacientes com Aids, e é a causa mais freqüente de meningite nesses pacientes5,19. As lesões de criptococose cutânea, geralmente secundárias ao acometimento sistêmico, ocorrem em 10% dos indivíduos com Aids19,20.

A doença acomete geralmente imunocomprometidos, principalmente indivíduos HIV positivo, além de indivíduos com doenças de base como: neoplasias, malignidades hema- tológicas (linfoma, leucemia, mieloma múltiplo), pacientes sob transplantes de órgãos, colagenoses (lúpus eritematoso sistêmico), sarcoidose, diabetes mellitus , hepatite crônica / cirrose e mesmo indivíduos em uso de imunossupressores e corticoterapia 21,^.

Segundo Pappas et al.^21 , pode haver criptococose em indivíduos sem supressão imune aparente; nesses casos, provavelmente associados a defeitos no sistema imune (ex. linfopenia). Esses autores verificaram em um estudo com 306 pacientes HIV negativo com criptococose, 22% não apresen- tavam alteração imune aparente a não ser a linfopenia. De acordo com o Centro de Controle de Doenças da Turquia 21 , linfopenia seria considerada quando a contagem de linfócitos T CD4 +^ fosse menor que 300 células/mm 3 ou menor que 20% do total, em mais de uma determinação.

Zaharatos et al.^24 descreveram caso de um paciente HIV negativo com linfocitopenia T grave (44 células/mm^3 ), tuberculose disseminada, pneumonia criptococócica e cripto- coccemia. Verificaram que com a terapêutica para tuberculose houve restabelecimento do número de linfócitos, concluindo que o M. tuberculosis poderia causar depleção de linfócitos CD4 quando associado à doença oportunista.

Fisiopatologia / manifestações clínicas

O C. neoformans constitui um poluente aéreo nos grandes centros urbanos em que a infecção e reinfecções ocorrem com grande freqüência, mas casos de doença são raros, demons- trando elevada resistência natural ao fungo.

Em geral, o fungo atinge o organismo através da inala- ção de partículas infectadas, e raramente pode ocorrer por inoculação direta do agente na pele (criptococose cutânea primária) 2,10^. Pode considerar-se ainda a possibilidade de disseminação a partir da colonização de mucosas em pa- cientes imunossuprimidos.

Com a entrada do agente no trato respiratório ocorre a primoinfecção, que pode ser sintomática ou assintomática, e, usualmente, resolver-se espontaneamente^2. A sintomatologia vai desde manifestações de infecção aguda com tosse, febre,

dor torácica como pneumonia a insuficiência respiratória grave, principalmente em indivíduos com Aids; ou de infecção crônica com presença de nódulos, massas, cavidades, derrame pleural, infiltrado intersticial ou linfoadenopatias, devendo excluir doenças como neoplasia pulmonar e até tuberculose, dentre outras^2. Quando o hospedeiro é imunocompetente, o C. neofor- mans tenta escapar dos mecanismos de defesa do organismo produzindo substâncias dentre elas a melanina, como já citado, que interfere favorecendo a virulência do fungo, com grande tropismo pelo Sistema Nervoso Central (SNC), rico em catecolaminas, importante para formação da melanina, protegendo-se da ação de radicais livres. As células com mela- nina são menos susceptíveis a ação da medicação anfotericina B, promovendo maior reação no SNC^7. Freqüentemente em imunocomprometidos, e ocasio- nalmente em imunocompetentes, o agente dissemina-se pelo sangue acometendo outros órgãos, principalmente o SNC (manifestando como meningoencefalite, usualmente), e outros sítios como pele, linfonodos, ossos/articulações, olhos, coração, fígado, baço, rins, tireóide, supra-renais e até a próstata – podendo ser considerada como reservatório para a recidiva da doença2,^. Na maioria dos casos de criptococose disseminada (ex- trapulmonar), o envolvimento pulmonar não é mais detectado (já se resolveu), no momento das manifestações clínicas. A meningoencefalite é a manifestação mais comum após o acometimento pulmonar, mas pode também manifestar-se com envolvimento de pares cranianos, papiledema, perda visual, hidrocefalia e massas intracerebrais (criptococomas, raramente). Com a disseminação hematogênica pode haver acometimento do esqueleto em 5 a 10%, sendo a vértebra o local mais acometido^18. Segundo autores, acredita-se que a criptococose possa apresentar de duas formas: 1) criptococose por C. neoformans var neoformans – acometendo indivíduos imunocomprometidos, com quadro generalizado, não respondendo satisfatoriamente ao tratamento clássico, com decurso geralmente fatal; e 2) causada por C. neoformans var gatti – em imunocompetente, com manifestação pulmonar exuberante, com resposta satis- fatória ao tratamento e com bom prognóstico1,6. As lesões cutâneas ocorrem geralmente por disseminação hematogênica (criptococose cutânea secundária – CCS). Po- rém pode haver uma forma rara, localizada, por inoculação do fungo de modo traumático, sendo chamada de criptococose cutânea primária (CCP) 2,10,11. Em indivíduos com Aids, as lesões cutâneas geralmente representam um marcador da doença disseminada; desse modo quando há hipótese de criptococose cutânea deve-se fazer uma procura cuidadosa por doença extracutânea, evitando a alta taxa de mortalidade de pacientes com doença disseminada não tratados^11. O envolvimento cutâneo apresenta manifestações clínicas polimorfas. Podem consistir de pápulas, placas infiltradas, pústulas, vesículas herpetiformes, nódulos, edema / massas

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subcutâneas, celulite/abscessos (que não respondem a anti- bióticos clássicos) ou úlceras 2,6,7,10,11. Há ainda relatado na literatura, caso de criptococose cutânea simulando quelóide em indivíduo com Aids^9.

Pápulas umbilicadas (molusco contagioso like ) e nódulos na mucosa oral também podem ocorrer10,26^. Embora qualquer área da pele e/ou mucosa possa ser acometida, existe certa predileção, segundo autores, da doença disseminada em comprometer cabeça e pescoço^26.

Kumar et al.^2 descreveram três casos de criptococose cutânea secundária, sem manifestações sistêmicas evidentes ou história de injúria cutânea, em indivíduos HIV negativo, apresentando-se como edema subcutâneo, sem sinais flogísticos, sem ulceração ou linfoadenopatia, em região occipital e perna esquerda. Inicialmente tiveram como hipóteses diagnósticas: lipoma, cisto sebáceo ou dermóide, mas foram confirmados para criptococose cutânea através do exame direto do aspirado por agulha fina, e com o anatomopatológico pela exerese de uma lesão. Isso demonstra o grande espectro de manifestações clínicas que a criptococose cutânea pode apresentar.

Segundo literatura, as lesões de molusco contagioso like (que fazem diferencial com molusco contagioso, histoplasmose e infecção fúngica por Penicillium marneffei ) estariam mais freqüentemente presentes durante a criptococose cutânea dis- seminada5,6,10. Enquanto manifestações de celulite e ulceração seriam mais comuns na criptococose cutânea primária6,8,^.

Recentemente, Neuville et al.^27 propôs critérios para diagnóstico de criptococse cutánea primária (CCP): ausência de disseminação da doença, ausência de doença de base, pre- sença de lesão cutânea solitária em áreas descobertas presentes como edema ou flegmão associado com história de injúria cutânea ou exposição a fezes de aves; além do isolamento de C. neoformans sorotipo D dessas lesões. Segundo autores, esse último critério pode não estar presente rotineiramente, uma vez que já foram descritas lesões cutâneas de criptococose em indivíduo HIV negativo, causada por C. neoformans var gatti (sorotipo B)^7.

Criptococose-infecção

A criptococose pode, de forma rara, ser causada por ou- tras espécies de criptococos, além do Cryptococcus neoformans , dentre elas: C. laurentii, C. albidus, C. gastricus, C. luteolus, C. terreus, C. unigattulatus 1,.

Considera-se a presença de criptococose infecção, mas é necessário melhor abordagem epidemiológica. Há estudos realizados, como os de Lacaz e Melhem^17 indicando uma positividade à criptococina (através de teste intradérmico) de 2,6% na população geral (utilizando antígeno de natureza peptídeo – polissacarídea em 190 pacientes sem criptococose ativa), indicando a presença de criptococo em indivíduos sadios. O antígeno foi utilizado na diluição 1:10 em soro fisiológico, sendo a reação avaliada após 48 h da injeção intradérmica de 0,1 mL do antígeno. Foram consideradas como positivas a

formação de pápulas eritematosas com mais de cinco milí- metros no maior diâmetro. Dos cinco reatores (2,6%) foram coletadas amostras (fezes, escarro e urina), sendo isolado C. laurenttii em uma das amostras de fezes, sugerindo a presença da infecção em nosso meio. O agente já foi isolado na orofaringe e mesmo pele de indivíduos sadios agindo em comensalismo; podendo ocasionalmente causar infecção, geralmente em indivíduos predispostos (imunossuprimidos)17,28.

Diagnóstico

A história e o quadro clínico são parâmetros iniciais para o diagnóstico, podendo ser auxiliados por recursos laboratoriais. Exame direto: pesquisa do patógeno em material suspeito, como secreções de lesões cutâneo-mucosas, escarro, liquor cefalorraquidiano (LCR), gânglios e outros. Após coloração com KOH 10% e tinta da China / Índia ou nigrosina pode-se visualizar células leveduriformes globosas com um ou mais brotamentos, envoltos por cápsula polissacarídea, sendo que a cápsula pode ou não ser visualizada1,^. Cultura: pode-se utilizar aspirados de lesões cutâneo- mucosas, secreções traqueal ( swab ) ou endobrônquicas/la- vado bronco-alveolar, secreção prostática, urina, fezes, LCR, tecidos processados (pulmonar, por exemplo), dentre outros. Inocula-se o material em ágar glucose sabourand acrescido de cloranfenicol; ou ágar BHI (infusão cérebro-coração) acrescido de sangue, sendo incubado a 30ºC (30-37ºC), com crescimento usual em dois a cinco dias1,4,11,29. Alguns autores consideram a cultura e exame histopa- tológico os métodos de maior sensibilidade e especificidade para o diagnóstico de infecção criptocócica da pele^11. O isolamento e a identificação também podem ser feitos em ágar-niger (ágar Staib). A levedura tem seu crescimento inibido em meios de cultivo contendo cicloeximida e à tem- peratura de 42ºC^29. A colônia desenvolve-se com aspecto cremoso, brilhante e úmida; de coloração branco-amarelada de início, tornando-se bege escuro a marrom com o tempo (aspecto macromorfoló- gico). Com a evolução a colônia escorre no tubo de cultura e torna-se escura; o anverso de aspecto mucóide branco, úmido, viscoso; e o reverso claro, apresentando reação para urease e inositol positivas, e do nitrato e de assimilação de lactose, melibiose e da fermentação de carboidratos negativas^30. O C. neoformans produz a enzima fenoloxidase (depositada em sua parede) capaz de oxidar substâncias fenólicas (tirosina, ácido clorogênico) presentes no meio de cultivo preparados com extratos vegetais e sementes, produzindo pigmento tipo melanina – conferindo coloração escura para a colônia, diferenciando-a de outras leveduras1,6^. A reação no meio de CGB (ágar canavanina-glicina-azul e bromotimol) é positiva em dois a cinco dias para o C. neoformans var gatti e negativa

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Referências bibliográficas

conazol (200-400 mg/dia via oral ou endovenosa) por 10 a 12 semanas. Com manutenção com fluconazol (200 mg/dia via oral) por toda vida. Sendo considerado critério de cura a presença de três culturas de LCR negativas com intervalo maior de um mês.

Recomenda-se tratamento com fluconazol por três a seis meses para indivíduo imunocompetente com doença pulmonar, sem envolvimento do SNC, mas podendo utilizar a anfotericina B.

Tratamento de paciente com acometimento extraneural, extrapulmonar (por exemplo, pele, próstata, osso), com ou sem envolvimento pulmonar é considerado mais complicado, de- vendo usar inicialmente anfotericina B associado ou não com 5-flucitosina, com fluconazol e itraconazol como opções.

O fluconazol pode servir como terapia alternativa, porém com taxa de esterilização do LCR de modo mais

lento. É também usado como terapia de manutenção em indivíduos com Aids com criptococose disseminada (na dose de 200-400 mg/dia); ou Itraconazol (200 mg/dia), ou anfotericina B 1 mg/kg endovenoso, de uma a três vezes por semana – mas mais efeitos colaterais. Pode-se pensar na interrupção da terapia nesses indivíduos assintomáticos com taxa de linfócitos CD4 normal e sustentada por mais de seis meses. Na literatura há relatos de tratamento de lesão cutânea (primária e secundária), com fluconazol inicialmente endo- venoso (200 mg a cada 12 h por 14 dias) e após manutenção com a droga via oral (400 mg/dia) por no mínimo 45 dias com cura das lesões6,^. Quando a lesão é localizada e bem delimitada na pele, osso ou SNC (lesão única maior de 3 cm), pode se pensar em excisão cirúrgica.

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Endereço para correspondência: Fabiana Carla Bivanco Instituto da Pele – FMABC Avenida Príncipe de Gales, 821 CEP 09060-650 – Santo André (SP) Tel.: (11) 4993- E-mail : fcbivanco@uol.com.br

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