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Neste sentido, survey é um instrumento de pesquisa de opinião. Embora seja possível realizar surveys com perguntas abertas, sua forma predominante caracteriza- ...
Tipologia: Esquemas
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Não perca as partes importantes!
Márcio Cunha Carlomagno
É crescente o número de pesquisas utilizando a aplicação de questionários online, especialmente – mas não exclusivamente – entre jovens investigadores, como mestrandos e doutorandos. A facilidade tecnológica, tanto para a cria- ção destes questionários (ofertada gratuitamente por ferramentas como Google Forms), quanto para sua difusão, traz um potencial problema: pesquisas pro- blemáticas, seja por questionários mal formulados ou por desenhos de pesquisa que não contemplam questões metodológicas desta ferramenta de pesquisa. Este é um capítulo metodológico e didático, não de cunho empírico. Nosso objetivo é apresentar uma introdução aos principais tópicos sobre surveys online, suas limitações e técnicas de como proceder corretamente com sua apli- cação. Desejamos ofertar à leitora e ao leitor um conjunto direto e sucinto dos principais aspectos a serem considerados ao optar-se por esta ferramenta, reu- nindo uma bibliograia diversa. Não é propósito do capítulo apresentar novas proposições ou aplicações, mas servir como entrada na área para jovens pesqui- sadores – público-alvo ao qual se destina. O termo em inglês survey, apesar de sem equivalente preciso no português, usualmente é traduzido como “levantamento de dados” (GÜNTHER, 2003). Embora survey possa signiicar qualquer tipo de coleta ou levantamento de dados, com o passar dos anos seu sentido estrito passou a ser usado somente para um tipo de pesquisa: aquela com utilização de questionários. Neste sentido, survey é um instrumento de pesquisa de opinião. Embora seja possível realizar surveys com perguntas abertas, sua forma predominante caracteriza-se pelo uso de perguntas fechadas, o que permite a comparabilidade das respostas. Outra característica em surveys é que, usualmente, são amostrais. Mick Couper (2000) propôs uma categorização dos tipos de survey online a partir da distinção entre métodos de amostragem probabilística e não-probabilística. Este é um elemento central para as pesquisas cientíicas. Em amostras probabilísticas, cada membro
de uma população possui uma chance de seleção, que é: (i) conhecida e (ii) dife- rente de zero. Em amostras não-probabilísticas, as chances de seleção são des- conhecidas (COUPER; BOSNJAK, 2010). Nas palavras do autor, em amostras não-probabilísticas, “inferências ou generalizações para a população são basea- das em saltos de fé ao invés de estabelecidos princípios estatísticos” (COUPER, 2000, p. 477). Ao contrário, em amostras probabilísticas, os resultados podem ser extrapolados, com uma margem de erro que pode ser calculada para o uni- verso que a amostra representa. Isso torna possível a realização de inferências sobre o conjunto maior da população. O tipo de survey que podemos, cotidiana- mente, observar ser compartilhado em mídias sociais, como o Facebook, é o que Couper (2000) chamou de “surveys com autosseleção irrestrita”. As principais implicações amostrais deste tipo de survey, como veremos adiante, são a ausên- cia de controle sobre os respondentes e o viés de autosseleção. Podemos dividir os problemas metodológicos encontrados em surveys em duas ordens principais: problemas de construção do questionário e problemas de amostragem estatística (ALMEIDA, 2009). Este capítulo pretende apresentar um resumo dos mais importantes tópicos nestes dois âmbitos. Não é nossa pretensão esgotar o tema. Existem questões fundamentais relacionadas com as surveys que não são nosso foco, tais como o potencial viés gerado pelas respostas socialmente aceitáveis (ALMEIDA, 2009)^1 ou de que maneira abordar temas polêmicos, como preconceito ou corrupção (TURGEON; CHAVES; WIVES, 2014). O capítulo se organiza da seguinte maneira: a primeira seção é dedicada ao que chamamos “preliminares” – os elementos fundamentais na construção de um bom questionário. A qualidade dos resultados de um survey depende daquilo que antecede sua aplicação, que é a existência de um bom questionário. Questionários online possuem suas idiossincrasias, que precisam ser levadas em conta. Apenas transferir a mesma técnica dos questionários tradicionais para os online é um equívoco. Por isso, tratar deste aspecto é fundamental. Reunimos nove tópicos importantes aos quais o/a pesquisador(a) deve se atentar ao formu- lar seu instrumento de pesquisa. A seção seguinte é dedicada aos “desaios”, ou limites, enfrentados por questionários online, sobretudo em relação às questões amostrais. Resumimos cinco tópicos, com especial destaque a três problemas: o viés de autosseleção, a ausência de controle sobre os respondentes e a homiilia
1 Um dos exemplos mais célebres neste tópico é o chamado tory shy vote (voto conservador envergonhado), termo consagrado na eleição de 1992 no Reino Unido. Muitas vezes, candidatos conservadores vão sistematicamente pior nas pesquisas do que no desempenho nas urnas, pois há uma pressão social que compele as pessoas a não se manifestarem favoráveis a candidatos deste campo ideológico. Já há um debate recente se isso teria ocorrido na eleição de Donald Trump, nos Estados Unidos, em que as pesquisas falharam em prever o resultado eleitoral (COPPOCK, 2017).
A pergunta deve ser clara e objetiva, de modo que não reste margem para compreensões distintas de dois respondentes diferentes. Por exemplo, na per- gunta “você saiu para jantar fora recentemente?”, o termo “recentemente”^2 pode ser interpretado de formas profundamente diferentes a depender do respon- dente. É preciso que a pergunta seja direta e clara sobre o período que o/a pes- quisador(a) deseja saber. Podemos pensar em como ajustar essas perguntas, como exercício. Para o primeiro caso, supondo que a questão era sobre o âmbito “este”, na compra do livro, a pergunta poderia ser algo como “por que você escolheu [título do livro]?”, eliminando, assim, os âmbitos que poderiam causar embaraço. No segundo caso, “você saiu para jantar fora nos últimos 30 dias?” apresenta um intervalo de tempo claro, sem margem para interpretações diversas. Esse tópico também vale sobre tentar questionar a respeito de conceitos, que são construções intelectuais humanas e, portanto, podem implicar interpretações variadas. O conceito teórico que se queira medir precisa ser traduzido em perguntas especíicas – e são estas questões especíicas que devem ser emitidas ao entrevistado. Imagine a clássica pergunta: “em uma escala de ideologia política, como você se considera?”, apresentando uma escala entre esquerda e direita. Mas, ora, o que é esquerda e direita? É razoável supor que alguns respondentes pode- rão atribuir signiicados muito distintos a uma mesma posição. “Direita”, a depender do entrevistado, pode signiicar tanto liberalismo econômico (livre mercado) quanto conservadorismo moral. Pode signiicar ambos ao mesmo tempo, mas também apenas um deles e não outro. Talvez existam pessoas que sejam liberais econômicos sem ser conservadores morais – e vice-versa. Neste exemplo, o ideal seria fazer, ao menos, duas perguntas: uma sobre liberalismo econômico e outra sobre conservadorismo moral^3 , para que, depois, o/a pesqui- sador(a) construa, a partir dos dados, seu conceito de “ideologia política”.
II) Fluidez O propósito de um questionário é duplo: seu primeiro objetivo é traduzir os conceitos e hipóteses de pesquisa em perguntas e respostas especíicas, a im de mensurar aquilo que se propõe e o segundo é motivar o entrevistado a
2 O mesmo se aplica a termos como “frequentemente”, “raramente” etc., por vezes encontrados em opções de respostas. Estes termos não devem ser usados, substituindo-se pelo número exato que se quer mensurar. 3 Perceba que, ainda assim, os conceitos continuam abstratos. Perguntar “o quão conversador moral você é?” também não é uma boa solução, pois comporta diferentes interpretações do con- ceito. Devem ser feitas perguntas especíicas sobre situações especíicas. Como, por exemplo, no caso do conservadorismo, “você é contra ou a favor do casamento homoafetivo?”, “você é a favor ou contra o direito da mulher ao aborto?” e assim por diante.
continuar respondendo e concluir o questionário (CANNELL; KAHN, 1954). O segundo ponto se torna ainda mais fundamental no caso dos questionários online, que são autoadministrados, sem a presença de um entrevistador. Quando falamos em luidez, não signiica que se deve apelar a recursos heterodoxos, mas, pelo menos, não se deve atrapalhar o respondente. Deve-se reduzir ao mínimo o esforço de leitura desnecessária. Evite redundâncias, evite demandar do respondente um esforço que não é necessário para que ele res- ponda à pergunta. Se alguma informação é desnecessária para a resposta, não precisa ser incluída. Lembre-se que, enquanto nos questionários tradicionais o entrevistador pode adequar tons de voz, nos questionários autoadministrados o próprio respondente lerá as perguntas. Como veremos adiante, o tamanho das perguntas também tem impacto direto nisto. Podemos ressaltar algumas questões importantes para que o respondente possa chegar ao im do questionário, embora tal lista não seja exaustiva (outros aspectos também podem ser pertinentes). Primeiro, o bloco de perguntas sobre “peril” do respondente deve vir ao inal do questionário, não no seu começo. Colocar perguntas sobre o peril do indivíduo no começo pode ser duplamente prejudicial: pode tanto cansar o respondente (com perguntas que, por serem automáticas, não farão mal estarem ao inal), como também enviesar as res- postas, especialmente – mas não unicamente – se a pesquisa for sobre temas sensíveis ou o respondente tiver respostas que não sejam esperadas para alguém de sua posição social. Segundo, é necessário coerência e coesão interna na ordem das perguntas. Perguntas fora de contexto podem causar estranheza, além do potencial viés provocado. Terceiro, como veremos adiante, a forma visual (layout) tem impactos diretos em surveys online. É necessária a adequa- ção para os diversos dispositivos que podem ser utilizados pelo entrevistado (mobile, tablet, desktop etc.). Por vezes nos deparamos com questionários em que a página ica desconigurada, a depender do dispositivo em uso. Isto é um fator que cria diiculdades para que os respondentes completem o questionário.
III) As palavras A forma – palavras e termos utilizados – com a qual a pergunta é apre- sentada pode inluenciar as respostas. Este é um dos mais antigos tópicos rela- cionados com o estudo metodológico do efeito de surveys (RASINSKI, 1989; SCHRIESHEIM; EISENBACH, 1995; SCHUMAN; PRESSER, 1977). Embora continuem sendo debatidas suas diferentes intensidades, um ponto pacíico é o fato de que a escolha de palavras importa. Os termos utilizados podem inluenciar as respostas a partir de diferentes mecanismos. Esta inluência pode ocorrer pela pressão psicológica em prol de
O exemplo mais clássico talvez seja o da pesquisa de intenção de voto (ou de avaliação de governo), onde, antes da pergunta com essa inalidade, ques- tiona-se a satisfação do respondente com vários assuntos (como saúde pública, educação, economia, segurança etc.). Nesta circunstância, tende-se a diminuir a aprovação do mandatário (ou seu candidato). Ser “lembrado”, pelo próprio questionário, de questões que podem interferir na resposta posterior, induz esta resposta. Isto ocorre, sobretudo, pelo chamado learning efect – um assunto tratado anteriormente conduz o pensamento do respondente em uma direção especíica (BETHLEHEM, 2009). A ordem das perguntas é uma questão delicada em questionários online, pois, hipoteticamente, o respondente pode, diante de informações apresentadas posteriormente, retornar à pergunta anterior e alterar sua resposta. Uma solu- ção para evitar isso pode ser a adoção de survey com multipáginas, separando as perguntas em blocos diferentes, como abordado na seção (viii). Ainda relacionado à questão da ordem de apresentação, a “ordem que as respostas são apresentadas” também afeta as respostas (MALHOTRA, 2008; MCFARLAND, 1981). Opções mais próximas das pontas (a primeira e a última) tendem a ser mais escolhidas, em detrimento das opções que são apresentadas no meio. Na aplicação presencial, a solução para isso – adotada, por exemplo, em pesquisas de intenção de voto – é oferecer ao respondente um disco circu- lar que contenha todas as alternativas. Na aplicação online, deve-se utilizar o recurso “embaralhar a ordem das respostas”, ofertado por praticamente todas as ferramentas online. Neste caso, a cada vez que o questionário for aberto, as opções de resposta aparecerão em uma ordem diferente, de forma aleatória.
V) Respostas exaustivas e mutuamente exclusivas Em perguntas nas quais apenas uma resposta pode ser dada (como é a parte majoritária das perguntas utilizadas nestes questionários), as respostas devem ser exaustivas e mutuamente exclusivas (FOWLER JR; COSENZA, 2008). Estes são dois conceitos fundamentais e recorrentes na organização lógica de classiicação, como, por exemplo, nas categorias para análise de conteúdo (CARLOMAGNO; ROCHA, 2016; KRIPPENDORFF, 2004). Ser exaustivo signiica que deve-se esgotar as possibilidades de resposta, isto é, todas as respostas possíveis devem estar previstas como alternativas. Ser mutuamente exclusivo signiica que não pode existir a possibilidade lógica de duas alternativas serem verdadeiras ao mesmo tempo. Elas devem se excluir mutuamente. Um exemplo que podemos ofertar de respostas não exaustivas é o de um questionário que, ao perguntar a raça do respondente, ofereça as alternativas:
branco, negro, pardo, amarelo. Podemos notar que, além do “preiro não res- ponder”, falta a opção “indígena”. Embora talvez naquela pesquisa não fosse esperado que nenhum indígena respondesse ao questionário, se esta é uma res- posta possível, logo, deve estar prevista.^5 O fato de que todas as respostas pos- síveis devem estar previstas implica que, por padrão, todas as perguntas devem conter a opção: “Não sei/Preiro não responder”, pois esta é uma possibilidade de resposta dos entrevistados. Apesar dessa regra padrão, este tópico é um pouco mais complexo, conforme trataremos no tópico seguinte. A questão de respostas não mutuamente excludentes é mais grave, pois não pode ser resolvida posteriormente, podendo vir a invalidar a pergunta e todas as respostas obtidas. Um exemplo que pode ser ofertado, retomando a pergunta “por que você comprou este livro?”, utilizada como exemplo anterior, seriam as alternativas de resposta, em uma pergunta de resposta única: a) preço acessí- vel, b) interesse pelo assunto ou autor, c) recomendação de amigos, familiar ou conhecido, d) capa bonita e e) outros. Perceba que, neste exemplo, a exaustivi- dade foi, ainda que mal, atendida com o uso da opção “outros”, mas as respostas não se excluem mutuamente, pois mais de uma (ou mesmo todas) podem ser verdadeiras ao mesmo tempo. No caso deste exemplo, haveria diversas saídas possíveis. A mais rápida poderia ser qualiicar melhor a pergunta, como “qual o principal motivo por que você comprou...”. Neste caso, assume-se que outras respostas também podem ser verdadeiras, mas se quer saber o principal motivo. Uma segunda abordagem seria transformar a pergunta em resposta múltipla. Este tipo de pergunta, contudo, tende a não fornecer respostas muito robustas, pois não se sabe qual a ordem de importância dos fatores marcados. Uma ter- ceira saída para o exemplo ofertado seria listar os fatores e pedir para elencar-se a ordem de importância. Esta é a abordagem que fornece mais informações aos pesquisadores, mas deve ser usada com parcimônia, pois, se utilizada de forma excessiva, pode-se correr o risco de cansar o respondente.
VI) “Não sei” O uso de uma opção “não sei” enseja uma longa discussão, quando em pesquisas mais soisticadas. Por padrão, precisa ser ofertado ao respondente a possibilidade de dizer que não sabe alguma resposta. Contudo, alguns estudos testaram cenários em que esta opção está ausente, apresentando resultados que não são unânimes. Há argumentos que apontam indiferença (POE et al., 1988) e que discutem quando utilizar ou não esta opção (MCCLENDON; ALWIN,
5 É preciso, contudo, ter cuidado para não criar alternativas demais de respostas. Muitas opções geram perda considerável na qualidade da análise.
A título ilustrativo, a igura a seguir apresenta a mesma questão em três tipos de escalas diferentes: apenas os extremos rotulados; todas as categorias rotuladas e ponto médio e todas as categorias rotuladas e sem ponto médio.
Figura 1 - Exemplo de escalas
Fonte: elaboração própria
Não há maneira correta ou errada, mas a que melhor se encaixa aos objetivos da pesquisa. Em alguns casos, em que a nuance é clara, o ponto intermediário pode ser pertinente. Em outros casos, pode ser uma estratégia mais vantajosa não oferecer um ponto intermediário, para evitar o risco de uma parcela grande escolher icar “em cima do muro”. Em qualquer caso, o/a pesquisador(a) deve escolher de forma consciente sua escala e saber justiicar esta escolha à luz de seus objetivos de pesquisa. Vale lembrar que as escalas que você usará dependem, também, de como você pretende tratar estes dados e da conversação com a literatura da área. Outro elemento a se considerar é a adequação ao público-alvo.
XIII) A forma visual ( layout ) Em questionários autoadministrados, em que não há um entrevistador para auxiliar nas perguntas, questões que usualmente não se aplicam a questionários tradicionais surgem. Uma destas questões salientes é a forma visual (layout)
com que o questionário se apresenta. Destacam-se dois aspectos: (a) design de página única (estática) ou múltiplas páginas e (b) plano de fundo e cores. A forma da página se refere a dois tipos visuais que o questionário pode apresentar: uma página única, estática, com todas as perguntas de uma vez, que demande a rolagem com o mouse, ou múltiplas páginas, que apresente somente algumas perguntas de cada vez e que demande ao respondente clicar em “pró- xima” para acessar a página seguinte. Embora os resultados sobre estas questões não sejam conclusivos – nem a pesquisa conduzida até aqui esteja perto de seu im, existindo muito caminho ainda a ser explorado –, experimentos conduzidos por Manfreda, Batagelj e Vehovar (2002) apontam que:
Como se percebe, há pontos negativos e positivos nas duas formas. Os auto- res também testaram dois modelos visuais, um simples e outro com ilustrações visuais. Os resultados da pesquisa indicam que o uso de logotipos aumenta o número de respondentes abandonando o survey sem completá-los – embora este aspecto esteja estatisticamente correlacionado ao equipamento usado e ao tipo de conexão com a internet^7. Pelo lado positivo, este design tende a diminuir as não-respostas ao item. A comparação dos dois tipos, contudo, parece não exercer inluência sobre o conteúdo do que é respondido. Em suma, o uso de recursos visuais pode tanto aumentar a atratividade perante os respondentes quanto, eventualmente, torná-lo mais difícil de ser acessado e completado, o que pode reduzir a taxa de respostas. Ganassali (2008) sugeriu que a questão visual depende do tipo de incentivo visual, aumentando a taxa de respostas quando o incentivo visual era relevante para a pesquisa. Ou
7 Aqui, precisamos ponderar o contexto em que foi produzida a pesquisa destes autores, que talvez não se aplique mais atualmente.
Relacionado a isso, o erro amostral ocorre quando mesmo membros da população recortada não são selecionados de forma adequada. Neste caso, a replicabilidade da pesquisa é prejudicada, pois se outros pesquisadores reize- rem a pesquisa, com outra amostra, poderão chegar a resultados diferentes. A diferença dos dois aspectos, segundo Couper (2000), é que:
Enquanto o erro de cobertura se refere a pessoas ausentes do recorte (neste caso, aqueles sem acesso à internet), o erro amostral surge durante o processo de seleção de uma amostra da população estudada (COUPER, 2000, p. 467).
O processo de seleção exerce um papel fundamental para o erro amostral, como veremos adiante, no tópico (iii).
II) Não-respostas A não-resposta ocorre quando uma parcela dos convidados a responder ao questionário não o fazem – ou respondem apenas parcialmente. A não-resposta pode ocorrer: (a) ao questionário e (b) ao item (pergunta). A não-resposta só pode ser calculada em amostras probabilísticas – e nesta probabilidade, como argumenta Groves (2006), reside a capacidade inferencial dos surveys de representar a população total sem viés. Se a taxa de não-res- postas é alta, não é possível garantir que os resultados não contenham viés de alguma natureza^8. Em surveys não-probabilísticos, não é possível calcular a taxa de não-resposta, logo, não é possível saber o nível de incerteza da pesquisa e se ela contém ou não algum viés. Em questionários online, aspectos distintos daqueles presentes em aplica- ções presenciais podem levar a não-respostas. Por exemplo, enquanto em apli- cações presenciais os atributos físicos dos aplicadores afetam a taxa de não- -resposta (GROVES, 2006), em questionários online este fator é residual. Os mais célebres aspectos relacionados à não-resposta ao questionário online são o tamanho (questionários menores aumentam as taxas de resposta) e a presença de elementos visuais (DEUTSKENS et al., 2004), embora, em termos mais bási- cos, também seja preciso considerar questões como o equipamento técnico para acesso à web e a familiaridade do respondente em lidar com estas ferramentas, para o correto preenchimento. Já a não-resposta ao item, contudo, pode estar
8 Vale notar que as taxas de não-resposta não obrigatoriamente indicam a presença de um viés, mas a possibilidade do mesmo.
relacionada a vários aspectos, entre os quais perguntas formuladas inadequada- mente (por isso a importância de um bom questionário).
III) Viés de autosseleção Este provavelmente seja o mais grave problema envolvendo surveys online – e diretamente se aplica ao tipo mais popular atualmente, aquele de autosseleção irrestrita. O problema da autosseleção reside no fato de que, nestas pesquisas, o ques- tionário é distribuído em sites e redes onde pessoas possuem algum interesse no assunto relacionado à pesquisa. Sua participação, portanto, está diretamente relacionada às variáveis do estudo (COUPER; BOSNJAK, 2010) e o/a pesquisa- dor(a) não controla quem decide participar ou, principalmente, seus motivos (BETHLEHEM, 2009). É provável que os indivíduos engajados em participar da pesquisa sejam mais interessados naquele tema e, portanto, potencialmente, possuam opiniões distintas da população em geral (COUPER, 2000). Isso, aliado à ausência de controle sobre os respondentes, leva ao perigo potencial do fenômeno que Duda e Nobile (2010) chamaram de stakeholder bias (viés do investidor). Pessoas interessadas no resultado da pesquisa podem agir deliberadamente para alterar os resultados da mesma, respondendo informa- ções que não necessariamente correspondam à verdade factual.
IV) Ausência de controle sobre respondentes A ausência de controle sobre quem responde afeta, tal como o tópico anterior, sobretudo os surveys de acesso irrestrito com autosseleção. Não há controle sobre se um mesmo indivíduo respondeu a pesquisas diversas vezes (ballot-stuing) – ou mesmo se encaminhou para outras pessoas (que não fazem parte do recorte amostral), com a intenção de “ajudar” a pesquisa. Uma possibilidade mínima de controle – ainda que não seja completamente eicaz – é solicitar o e-mail e conirmar a resposta através do mesmo. Isto não impede, contudo, que e-mails falsos sejam criados, e pode gerar outras impli- cações, como tender a diminuir a taxa de respostas. Na internet, também precisamos considerar os casos de indivíduos que querem intencionalmente prejudicar eventuais pesquisas, pelos mais diver- sos motivos. O fac-símile reproduzido na Figura 2 ilustra o caso em que uma página, intencionalmente, age para distorcer os resultados de uma pes- quisa, sendo conduzida por outra página (aparentemente, somente a título de galhofa).
responda por si. Essa é uma limitação verdadeira, embora ainda exista espaço aberto para pesquisas nas quais seja indiferente a resposta do indivíduo, em si, ou “do gabinete”, como nos casos de Spada e Guimarães (2013), Vaccari (2014) e Carlomagno (2018).
V) Homiilia É comum a prática de questionários serem distribuídos em mídias sociais, como o Facebook, através da rede de amigos do/da pesquisador(a) ou da publi- cação em grupos de interesse. Uma das principais limitações, neste caso, além daquelas já tratadas, refere-se à homiilia. O termo, cunhado por Paul Lazarsfeld e Robert Merton, foi resumido por McPherson, Smith-Lovin e Cook (2001) como o princípio de que a conexão entre pessoas semelhantes tende a ocor- rer com maior frequência do que entre pessoas diferentes, constituindo, por- tanto, redes pessoais com alta homogeneidade. Existem dois tipos de homiilia: de “status” e de “valor”. A primeira se refere aos aspectos sociodemográicos, como classe social, raça, sexo, idade, escolaridade etc., a segunda se refere ao conjunto de valores, atitudes e crenças, como interesses intelectuais e orienta- ção política (MCPHERSON et al., 2001). “Homiilia implica que a distância em termos de características sociais se traduz em distâncias dentro de uma rede” (MCPHERSON et al., 2001, p. 416). Isto signiica que os luxos informacionais em uma rede de contatos estarão limitados ao mesmo espaço social, a pessoas com o mesmo peril. Esse fenômeno – que alguns analistas contemporâneos chamam pelo termo “bolha” – é um limitador imenso e razão pela qual redes pessoais diicilmente podem ser utilizadas para distribuir surveys, uma vez que o espectro de res- pondentes tende a ser limitado àqueles que já compartilham o mesmo espaço social do aplicador. Uma solução possível para isso é a técnica de snowball, que veremos na próxima seção.
Nesta seção, abordamos três possibilidades – ou estratégias – distintas para o uso de questionários online. As três possuem limitações de naturezas distin- tas. As duas primeiras só poderiam ser utilizadas em certas circunstâncias e têm alcance limitado para pesquisadores individuais. A terceira lexibiliza a preo- cupação com a amostragem e extrapolação em prol do alcance a certos grupos.
I) Amostras baseadas em listas O tipo que Couper (2000) chamou de survey com amostras baseadas em listas, embora restrito a somente algumas áreas, tem um grande potencial a ser explorado. Esse tipo de pesquisa visa populações limitadas, como um recorte de um subgrupo de uma população com alta taxa de cobertura ou cobertura com- pleta. Esta técnica é muito utilizada em surveys intraorganizacionais, como, por exemplo, empresas que queiram enviar questionários a todos os seus funcioná- rios, universidades ou departamentos que enviem pesquisas a todos seus alunos e assim por diante. Um requisito para a aplicação é que o/a pesquisador(a) tenha acesso a todos os contatos de e-mail da população-alvo. Convites são enviados por e-mail e o acesso é controlado para evitar múltiplas respostas pelo mesmo respondente. Uma vez que a população e a amostra são valores conhecidos, é possível calcu- lar as taxas de não-respostas. Embora ainda possa existir o viés de autosseleção (cuja existência pode ser veriicada), esta abordagem evita alguns dos proble- mas apresentados na seção anterior. Na ciência política, por exemplo, existe um potencial grande a ser explorado, com o estudo de parlamentares e candidatos (SPADA; GUIMARÃES, 2013; VACCARI, 2014). Possivelmente, esse é o tipo que mais se aproxima da consistência de surveys tradicionais. Contudo, sua aplicabilidade nas pesquisas em geral é, em alguma medida, limitada.
II) Painéis pré-recrutados O survey com base em painéis para voluntários pré-selecionados é outro tipo que potencialmente evita os problemas mais comuns em surveys online. Esta estratégia consiste, conforme explicado por Couper (2000), em criar-se uma base da dados de potenciais respondentes voluntários a partir de convites exibi- dos em sites, portais e mídias sociais. Esta técnica evita o viés de autosseleção. Embora, esta técnica, ainda não seja vastamente usada no meio acadêmico
A amostra intencional (purposeful sampling) “envolve identiicar e selecio- nar indivíduos ou grupos de indivíduos que possuam especial conhecimento ou experiência no fenômeno de interesse” (PALINKAS et al., 2015, p. 534). Ou seja, como o próprio termo indica, a amostra deixa de ser aleatória e passa a ser dire- cionada por algum objetivo. Couper e Bosnjak (2010) apontam que o recruta- mento em mídias sociais pode ser especialmente efetivo se a pesquisa está bus- cando membros de um grupo raro ou de nichos especíicos, que não poderiam ser acessados de outra forma. Neste escopo se encontram as pesquisas sobre hard to reach groups (grupos de difícil alcance) (ANDREWS; NONNECKE; PREECE, 2003). Essa técnica tem sido aplicada especialmente em áreas de saúde (SADLER et al., 2010; YUAN et al., 2014). O caso narrado por Schumacher e sua equipe (SCHUMACHER et al., 2014), em que utilizaram o Facebook para buscar crianças portadoras de uma doença rara, é um exemplo disto. Os autores argu- mentam que, na área médica, é difícil encontrar um grande grupo de pacien- tes com doenças raras. Contudo, portadores destas doenças tendem a se juntar em comunidades online, como grupos de Facebook. Portanto, a amostragem intencional seria, segundo estes autores, a modalidade dominante para alcan- çar estes indivíduos. Essa técnica, portanto, é apropriada para examinar comu- nidades de indivíduos que tendam a se reunir online por algum motivo. Dentro de amostra intencional há diversas técnicas, mas uma das mais utili- zadas é a chamada snowball. Trata-se da técnica em que o/a pesquisador(a) pede que o entrevistado indique outros respondentes, que se encaixariam no peril de interesse, e assim sucessivamente, ampliando a amostra inicial. Esta abor- dagem permite alcançar os grupos sociais mais impenetráveis, tais como elites ou setores mais vulneráveis e socialmente estigmatizados (ATKINSON; FLINT, 2001), embora também já tenha sido aplicada em uma longa lista de casos, como acesso à comunidade LGBT (BROWNE, 2005). Bhutta (2012) argumentou que especiicamente o Facebook pode ser um recorte amostral promissor para recrutar respondentes, devido às suas carac- terísticas e, sobretudo, pelo acesso via “grupos”. Inclusive, no caso analisado por ela, as características dos respondentes tenderam a se aproximar do recorte de sua população, embora isto não possa ser tomado como regra. Por sua vez, Baltar e Brunet (2012) argumentaram que a amostragem snowball baseada no Facebook apresenta taxas de respostas superiores às taxas de pesquisas com snowball tradicionais. É preciso ponderar-se que alguns dos problemas apontados anteriormente podem continuar existindo nessa estratégia, contudo tendem a ser diminuídos. Por exemplo, o recrutamento em “grupos”, não na rede particular de amigos,
pode diminuir a homiilia, embora ela continue existindo, já que o algoritmo do Facebook faz com que postagens de amigos, mesmo em grupos, sejam mais exibidas do que de desconhecidos. A técnica de bola de neve, por sua vez, reduz o viés de autosseleção. Essas técnicas, provavelmente, têm sido algumas das mais utilizadas recen- temente nas pesquisas acadêmicas que empregam mídias sociais como difuso- ras de questionários. Contudo, é preciso parcimônia nas conclusões derivadas das mesmas. Ambas são usualmente identiicadas como “qualitativas”, pois – e é preciso ter claro isto – são não-probabilísticas. Logo, as conclusões obtidas não podem ser extrapoladas para toda a população, como surveys usualmente objetivam fazer.
Não há dúvidas de que surveys online são um método ainda a ser empreen- dido, que oferece alto potencial e oportunidades. Estes surveys começaram a se popularizar vinte anos atrás e somente há cerca de dez anos estas ferramentas se tornaram acessíveis a basicamente qualquer indivíduo com acesso à internet, de graça ou a preços módicos. Reconhecendo os limites do método, muitas pesqui- sas podem ser conduzidas satisfatoriamente, dentro de seu propósito restrito (COUPER; BOSNJAK 2010). Há muito caminho aberto para a aplicação de surveys online. Questionários online facilitam enormemente a técnica de split ballot (ALMEIDA, 2009). A ideia não é nova, mas em surveys presenciais demanda certo grau de diiculdade em sua operacionalização. Trata-se de subdividir o questionário, com pergun- tas diferentes a partir das respostas anteriores, em busca de questões especíi- cas que se apliquem somente aos respondentes que ofertaram aquela resposta. Surveys online também abrem a possibilidade para experimentos controlados, randômicos, como sugerido por Kohavi et al. (2009), com a aplicação de testes do tipo A/B, em que um elemento muda a cada aplicação, de forma aleatória. Estes testes já são utilizados de forma exaustiva na área do marketing digital, mas ainda não foram explorados em sua totalidade na aplicação de surveys. Eles podem ajudar a estabelecer uma relação causal no comportamento observado do usuário, não apenas com perguntas e respostas. Neste tópico, também há diversos experimentos que são feitos com questionários online que, embora não se preocupem com validade externa (extrapolação), podem responder satisfato- riamente a problemas importantes de validade interna. Por im, como Bhutta (2012) apontou, as mídias sociais ainda são pouco utilizadas como ferramentas para pesquisa, algo que provavelmente tende a mudar em breve.