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Este texto discute duas concepções diferentes sobre a origem e importância da linguagem no contexto do ensino da língua portuguesa. A primeira concepção naturaliza a linguagem, enquanto a segunda concepção a considera um produto e processo da atividade humana e da interação social. O texto também discute a importância da linguagem para o desenvolvimento da consciência humana.
O que você vai aprender
Tipologia: Notas de estudo
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Não perca as partes importantes!
Elegemos este tema – concepção de linguagem – porque ele constitui um eixo que articula todos os demais temas que compõem o conteúdo desta disciplina. Por outro lado, qualquer concepção de linguagem está articulada a uma concepção de mundo, a uma concepção de realidade. Concepção é, pois, algo mais amplo que um mero conceito.
A forma como concebemos determinado produto ou processo da re- alidade que tomamos como objeto de ensino-aprendizagem influi deci- sivamente no modo como encaminharemos nossa prática pedagógica. Não apenas a teoria sobre o ensino-aprendizagem, mas também a teoria sobre o objeto do processo de ensino-aprendizagem, ou seja, sobre o conteúdo curricular (neste caso, a língua escrita) são elementos essen- ciais que norteiam nosso encaminhamento docente. Daí a importância de aprofundarmos nossa compreensão científica sobre a linguagem, uma vez que nela se enraízam todos os fundamentos e elementos expli- cativos da língua escrita.
Podemos observar nos escritos, na literatura, ou nos discursos sobre a linguagem, diferentes formas de conceber sua origem. A concepção que cada pessoa tem sobre a linguagem tanto pode ser resultado de um estudo detalhado e aprofundado sobre o assunto, como resultar da união de múltiplas impressões que vão sendo incorporadas no dia-a-dia, e que poderíamos chamar de senso comum. De qualquer modo, desde o senso comum à consciência científica, várias são as concepções sobre a origem da linguagem.
Nesse conjunto variado de modos de pensar, de tendências e correntes teó- ricas, destacaremos duas, pela sua importância e predominância: a concepção inatista e a concepção histórico-social. Vamos nos ater apenas a elas porque en- tendemos que todas as demais constituem apenas variações – mais ou menos complexas, mais ou menos elaboradas – dessas duas concepções.
A primeira concepção de que trataremos entende a linguagem como um processo mecânico, linear de comunicação, em que alguém envia uma mensa- gem que é recebida, tal e qual, pelo seu destinatário.
Concebe a linguagem como um dado natural e, portanto, como uma ca- pacidade inata não só dos homens, mas também dos animais em geral, guar- dadas, evidentemente, as proporções de complexidade entre a linguagem de uns e de outros.
Tal concepção pressupõe a origem biológica da linguagem, uma vez que a concebe como uma função da consciência e concebe a consciência como um dom primário direto, como uma experiência psíquica inerente ao sujeito desde o princípio. Entretanto, sob essa perspectiva, ficam sem explicação consistente vários aspectos importantes que cercam essa questão. Além disso, desse enten- dimento decorre a noção de que o aprendizado da linguagem dar-se-ia espon- taneamente, visto tratar-se de um processo predominantemente natural.
Essa tendência, que naturaliza as manifestações da condição humana, atribui à educação apenas a função de zelar para que o ambiente seja adequado para o desenvolvimento normal daquela capacidade inata. Nesse sentido, diminui a importância da intervenção do professor no processo de ensino-aprendizagem, reduzindo-o à condição de mero estimulador. O papel do educador seria, assim, análogo ao do jardineiro, que não dá origem à flor, mas cuida para que as con- dições ambientais que cercam a semente permitam seu desabrochar no curso e ritmo normal de desenvolvimento determinado pela natureza. Um aspecto im- portante a ser destacado nesta concepção é a noção de que o desenvolvimento biopsicológico sempre precede e dá suporte à aprendizagem. Nesta perspectiva, reduz-se significativamente a importância da intervenção pedagógica intencio- nal e sistematizada como fator fundamental do desenvolvimento, acarretando um prejuízo evidente para a formação das crianças em geral e, especialmente,
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homens são seus atores conscientes: atuam deliberadamente, visando a obje- tivos bem definidos. Os processos sociais e seus produtos (entre eles, a lingua- gem) resultam, seja direta, seja indiretamente, da atividade humana consciente e intencional.
Cabe esclarecer que a expressão atividade humana é, aqui, tomada no sentido de trabalho e, enquanto tal, designa algo mais complexo que uma simples ação. Designa uma atividade especificamente humana, por meio da qual os homens, de forma cooperativa, agem sobre a natureza para produzir suas condições ma- teriais de existência e, ao produzi-las, produzem-se a si mesmos.
Defendemos, aqui, a concepção de que o trabalho, enquanto necessidade de produção dos bens necessários à existência, é o ponto de partida para a compre- ensão de quaisquer objetos ou processos da realidade humana.
O trabalho consiste em uma atividade especial em que as pessoas, em coope- ração, produzem tudo aquilo que necessitam consumir para viver. Os produtos do trabalho humano podem ser voltados ao atendimento de necessidades cor- porais (bebida, agasalho etc.), como para suprir necessidades espirituais (ciên- cia, arte etc.).
No processo de trabalho, as pessoas empregam instrumentos e atuam sobre os chamados “objetos do trabalho” que, em uma expressão genérica, podería- mos chamar de “matéria-prima”. Importante não confundir “produto” e “objeto”. Emprega-se a expressão “objeto” para designar aquilo que sofre uma ação. Ma- téria-prima é, por isso, objeto. É sobre ela que age o trabalhador, transforman- do-a em algum produto útil. A fonte principal de matéria-prima é a natureza. Daí dizer-se que a natureza é “o objeto do trabalho, por excelência”. É o mesmo que dizer que, ao trabalhar, as pessoas agem sobre a natureza, transformando-a em utilidades. Quando um oleiro trabalha o barro e produz uma cerâmica, o barro é o objeto de seu trabalho, pois é sobre o barro que o oleiro atua, e a cerâmica é seu produto. Quando o oleiro obtém, pelo seu trabalho, um produto – uma vasilha, por exemplo –, ele também modifica a existência humana: desde que se inventou a vasilha, as pessoas podem armazenar água dentro de casa, por exemplo, não precisando mais ir até o rio a cada ocasião em que têm sede. Por isso se diz que o homem, ao transformar a natureza, transforma a si mesmo, uma vez que transforma as suas condições de vida.
Da mesma forma que o trabalho é a condição para a invenção da linguagem, a linguagem é condição para o desenvolvimento da consciência humana. Os
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Concepções de linguagem
mecanismos superiores da consciência (memória, lógica, imaginação etc.) só se desenvolvem graças à linguagem (seja ela gestual, verbal, ou outro código).
Nesse sentido, é esclarecedora a explicitação de Spirkine e Yakhot (1975, p. 54-55):
No processo de seu trabalho em comum, da produção, os homens sentiram a necessidade de comunicar-se entre si. Esta necessidade, disse Engels, criou pouco a pouco o órgão capaz de pronunciar um som articulado a seguir a outro. Aparece, assim, a linguagem articulada, a língua, meio de trocar pensamentos, meio de comunicação entre os homens, invólucro material do pensamento. A unidade da linguagem e do pensamento dimana da própria natureza do pensamento. O pensamento só se torna real nas palavras. Enquanto está na cabeça do homem, está como morto, inacessível aos outros homens. Marx também disse que “a linguagem é a realidade imediata do pensamento”. Mesmo quando pensamos em nós próprios revestimos os nossos pensamentos dum invólucro verbal. Graças à linguagem, os pensamentos formam-se e transmitem-se aos outros homens. E graças à escrita, transmitem-se duma geração à outra. Não se saberia exprimir um pensamento abstrato senão por palavras. Desde a mais tenra idade do homem, a sua consciência forma-se com base em palavras, na linguagem, porque é com a ajuda da linguagem que se exprimem os nossos pensamentos. No decorrer deste processo, o pensamento alia-se intimamente à linguagem, fenômeno próprio do homem. É impossível separar a consciência do pensamento, da linguagem. A linguagem e o pensamento constituem uma unidade orgânica. (grifos dos autores)
Conforme bem esclarece Marx (1982, p. 202), o trabalho é: [...] um processo de que participam o homem e a natureza, processo em que o ser humano com sua própria ação impulsiona, regula e controla seu intercâmbio com a natureza. Defronta-se com a natureza como uma de suas forças. Põe em movimento as forças naturais de seu corpo, braços e pernas, cabeça e mãos, a fim de apropriar-se dos recursos da natureza, imprimindo-lhes forma útil à vida humana. Atuando assim sobre a natureza externa e modificando-a, ao mesmo tempo modifica sua própria natureza. Desenvolve as potencialidades nela adormecidas e submete ao seu domínio o jogo das forças naturais. Não se trata aqui das formas instintivas, animais, de trabalho.
A experiência prática nos permite perceber que, de todas as espécies, o homem é a única que não consegue sobreviver adaptando-se ao ambiente. Com efeito, é por meio dos produtos resultantes de seu próprio trabalho que os homens satisfazem as suas necessidades em geral: beber, comer, proteger-se das intempéries, repousar. Para realizar essa ação sobre a natureza, os homens, dada sua fragilidade fisiológica, criam instrumentos e contraem relações com outros homens, estabelecem cooperação, associam-se. É por esta razão que o trabalho não consiste em uma atividade puramente fisiológica de intercâmbio com a natureza (como se verifica no caso das demais espécies), mas caracteriza- se por sua natureza social, uma vez que, para realizar-se, pressupõe a existência de relações entre os homens.
Concepções de linguagem
aprendizagem; se, nesse campo potencial, alguma aprendizagem se realiza, essa capacidade se amplia proporcionalmente ao aprendizado, criando uma nova zona potencial de aprendizagem e, por decorrência, também gerando um novo grau de desenvolvimento da inteligência. Assim, a partir de uma base material
Vale destacar a coerência interna desta concepção, com relação à premissa de que a realidade humana se constitui na dupla relação homem-natureza e ho- mem-homem: a base natural – o organismo biológico, condição essencial para qualquer atividade humana – é progressivamente modificada a partir das ativi- dades laborais – que implicam relações sociais – e das experiências daí resultan- tes, adquirindo novas capacidades, as quais, por sua vez, permitem atividades mais complexas e experiências mais amplas.
A consequência dessa premissa para a educação é tão evidente quanto impor- tante: desencadear o processo de ensino-aprendizagem é mais do que promover o aprendizado de um dado conhecimento: é produzir capacidade intelectual mais elevada. Nesta perspectiva, atribui-se a maior relevância à intervenção pedagó- gica intencional e sistematizada como fator fundamental do desenvolvimento. Afirma-se, deste modo, a importância da escola, não como mera transmissora de informações fragmentadas, mas como instituição promotora de ricos processos de ensino-aprendizagem que vão constituindo os alicerces da capacidade inte- lectual do aluno.
(CHAUÍ, 2004, p. 174-178) Na abertura da sua obra Política, Aristóteles afirma que somente o homem é um “animal político”, isto é, social e cívico, porque somente ele é dotado de linguagem. Os outros animais, escreve Aristóteles, possuem voz (phoné) e com ela exprimem dor e prazer, mas o homem possui a palavra (lógos) e, com ela, exprime o bom e o mau, o justo e o injusto. Exprimir e possuir em comum esses valores é o que torna possível a vida social e polí- tica e, dela, somente os homens são capazes.
Na mesma linha é o raciocínio de Rousseau, no primeiro capítulo do Ensaio sobre a Origem das Línguas: “A palavra distingue os homens e os ani- mais; a linguagem distingue as nações entre si. Não se sabe de onde é um homem antes que ele tenha falado.”
Escrevendo sobre a teoria da linguagem, o linguista Hjelmslev afirma que “a linguagem é inseparável do homem, segue-o em todos os seus atos”, sendo [...] o instrumento graças ao qual o homem modela seu pensamento, seus sentimentos, suas emoções, seus esforços, sua vontade e seus atos, o instrumento graças ao qual ele influencia e é influenciado, a base mais profunda da sociedade humana.
Prosseguindo em sua apreciação sobre a importância da linguagem, Rousseau considera que a linguagem nasce de uma profunda necessidade de comunicação: Desde que um homem foi reconhecido por outro como um ser sensível, pensante e semelhante a si próprio, o desejo e a necessidade de comunicar-lhe seus sentimentos e pensamentos fizeram-no buscar meios para isto.
Gestos e vozes, na busca da expressão e da comunicação, fizeram surgir a linguagem.
Por seu turno, Hjelmslev afirma que a linguagem é: “[...] o recurso último e indispensável do homem, seu refúgio nas horas solitárias em que o espíri- to luta contra a existência, e quando o conflito se resolve no monólogo do poeta e na meditação do pensador.”
A linguagem, diz ele, está sempre à nossa volta, sempre pronta a envolver nossos pensamentos e sentimentos, acompanhando-nos em toda a nossa vida. Ela não é um simples acompanhamento do pensamento, “mas sim um fio profundamente tecido na trama do pensamento”, é “o tesouro da memó- ria e a consciência vigilante transmitida de geração a geração”.
A linguagem é, assim, a forma propriamente humana da comunicação, da relação como mundo e com os outros, da vida social e política, do pensamen- to e das artes. No entanto, no diálogo Fedro, Platão dizia que a linguagem é um phármakon. Essa palavra grega (da qual vem nosso vocábulo farmácia), que em português se traduz por “poção”, possui três sentidos principais: re- médio, veneno e cosmético. Ou seja, Platão considerava que a linguagem pode ser um medicamento ou um remédio para o conhecimento, pois, pelo diálogo e pela comunicação, conseguimos descobrir nossa ignorância e
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2. Explique a afirmação: “ao transformar a natureza, o homem transforma a si mesmo”. 3. Por que a concepção naturalista (inatista, biologicista) diminui a importância do processo de ensino-aprendizagem?
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