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História da Fractura Distal do Rádio: Descoberta e Evolução, Notas de aula de Biomecânica

A história da descoberta da fractura distal do rádio, sua distribuição estatística e as principais características anatómicas. A documentação remonta à descoberta inicial no século xix e aborda as questões relacionadas à incidência, tipos e causas dessas fracturas, especialmente em idosos.

Tipologia: Notas de aula

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Mauricio_90
Mauricio_90 🇧🇷

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LUÍS MANUEL ALVIM SERRA
BIOMECÂNICA DA
EXTREMIDADE DISTAL
DO RÁDIO E DA
FRACTURA DE COLLES
HL
PORTO
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Baixe História da Fractura Distal do Rádio: Descoberta e Evolução e outras Notas de aula em PDF para Biomecânica, somente na Docsity!

LUÍS MANUEL ALVIM SERRA

BIOMECÂNICA DA

EXTREMIDADE DISTAL

DO RÁDIO E DA

FRACTURA DE COLLES

HL

P O R T O

BIOMECÂNICA DA

EXTREMIDADE DISTAL

DO RÁDIO E DA

FRACTURA DE COLLES

CORPO CATEDRÁTICO

DA

F A C U L D A D E D E M E D I C I N A D O PORTO

PROFESSORES EFECTIVOS

Doutor Alexandre Alberto Guerra de Sousa Pinto — Anatomia

Doutor Amândio Gomes Sampaio Tavares — Genética

Doutor António Alberto Falcão de Freitas — Terapêutica Médica

Doutor António Augusto Lopes Vaz — Propedêutica Médica

Doutor António Carvalho de Almeida Coimbra — Histologia

Doutor António Fernandes da Fonseca — Psiquiatria

Doutor António Fernandes Oliveira Barbosa Ribeiro Braga — Prope-

dêutica Cirúrgica

Doutor António Germano Pina da Silva Leal — Propedêutica Cirúrgica

Doutor António Luís Tomé da Rocha Ribeiro — Clínica Médica

Doutor António Manuel Sampaio Araújo Teixeira — Patologia Cirúrgica

Doutor Artur Manuel Giesteira de Almeida — Clínica Cirúrgica

Doutor Cândido Alves Hipólito Reis — Bioquímica

Doutor Carlos Rodrigo de Magalhães Ramalhão — Patologia Médica

Doutor Carlos Sampaio Pinto de Lima — Ortopedia

Doutor Casimiro Águeda de Azevedo — Medicina Operatória

Doutor Celso Renato Paiva Rodrigues da Cruz — Neurologia e Neuro-

cirúrgica

Doutor Daniel dos Santos Pinto Serrão — Anatomia Patológica

Doutor Eduardo Jorge Cunha Rodrigues Pereira — Terapêutica Geral

Doutor Fernando Carvalho Cerqueira Magro Gomes Ferreira — Clínica

Médica

Doutor Francisco de Sousa Lé — Clínica Cirúrgica

Doutor João da Silva Carvalho — Ginecologia

Doutor Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva— Anatomia

Doutor Joaquim de Oliveira Costa Maia — Higiene

Doutor José Augusto Fleming Torrinha — Imunologia

Doutor José Carvalho de Oliveira — Ortopedia

Doutor José Fernando Barros Castro Correia — Oftalmologia

Doutor José Manuel Costa Mesquita Guimarães — Dermatologia

Doutor José Manuel Gonçalves Pina Cabral — Fisiologia

Doutor José Pinto de Barros — Química Fisiológica

Doutor Levi Eugénio Ribeiro Guerra — Clínica Médica

Doutor Luís António Mota Prego Cunha Soares de Moura Pereira Leite

— Clínica Obstétrica

Doutor Manuel Augusto Cardoso de Oliveira — Clínica Cirúrgica

Doutor Manuel Fonseca Pinheiro Coelho Hargreaves — Propedêutica

Médica

Doutor Manuel Machado Rodrigues Gomes — Pneumologia

Doutor Manuel Maria Paula Barbosa — Anatomia

Doutor Manuel Miranda Magalhães — Histologia

Doutor Manuel Teixeira Amarante Júnior — Propedêutica Cirúrgica

Doutora Maria da Conceição Fernandes Marques Magalhães — Histologia

Doutor Mário José Cerqueira Gomes Braga — Patologia Médica

Doutor Norberto Teixeira Santos — Clínica Pediátrica

Doutor Serafim Correia Pinto Guimarães — Farmacologia

Doutor Valdemar Miguel Botelho Santos Cardoso — Medicina Operatória

Doutor Victor Manuel Oliveira Nogueira Faria — Anatomia Patológica

Doutor Walter Friedrich Alfred Osswald — Terapêutica Geral

PROFESSORES JUBILADOS

Doutor Abel Tavares

Doutor Albano dos Santos Pereira Ramos

Doutor António Martins Gonçalves de Azevedo

Doutor Carlos Ribeiro da Silva Lopes

Doutor Eduardo Esteves Pinto

Doutor João Costa

Doutor Joaquim José Teixeira Bastos

Doutor Júlio Machado Vaz

Doutor Manuel Sobrinho Simões

Doutor Manuel José Bragança Tender

Doutor José Ruiz Almeida Garrett

PREFÁCIO

O trabalho aborda a biomecânica de uma zona anatómica restrita

sem completamente a retirar do contacto mais vasto das ciências básicas.

Contém apontamentos de história (da descoberta e do tratamento)

e de epidemiologia sobre a fractura de Colles. Usa a filogenia, a demo-

grafia e a anatomia (funcional, comparada, descritiva) para explicar o

como e o porquê da extrema frequência de fracturas no topo distai

do rádio.

A «Introdução» funciona como depósito da maioria dessas matérias

acessórias. Em cada um dos seus capítulos há uma folha inicial com um

resumo e uma final com as conclusões, para permitirem uma leitura

optativa mais rápida.

A matéria principal pode ser encontrada nos dois estudos seguintes,

a «Prospecção Radiográfica» e a «Biomecânica». O primeiro, possui

ainda resumo e conclusões separadas, o segundo, não, pois antecede o

«Resumo Geral e Conclusões» de todo o trabalho, com que se finaliza

o escrito.

Cada uma das três partes da introdução, bem como os dois estudos

seguintes, contém a lista das suas próprias referências numéricas ao texto.

No seu conteúdo, este trabalho defende que a fractura de Colles

da 3.a^ Idade, cujo tratamento parece hoje estagnado, pode obter benefícios

terapêuticos da aplicação de um novo conceito clínico, prático: o da

Correcção Total da cortical palmar no Rx de perfil. Baseia-se num novo

conceito biomecânico, teórico: o Binário Coluna-Tirante, sistema fun-

cional da extremidade distai do osso.

Com rigor, retoma apenas o conceito já velho de cento e cinquenta

anos criado por Ward (1838) para o funcionamento da extremidade

superior do fémur (*):

(*) DOBSON, J.: «Pioneers of osteogeny: FREDERICK OLDFIELD WARD». J. Bone Jt. Surg., 3 IB: 596-599, 1949. (a ilustração foi retirada deste artigo).

Simplesmente, a extremidade superior do fémur só funciona assim

no osso isolado e desarticulado, sujeito à compressão vertical. No rádio,

parece funcionar mesmo no vivo. Sobretudo na posição em que o punho

mais vezes é utilizado: em extensão.

which a is the principal support, and b a cross piece tying

a to the wall or column which sustains the whole. It is

evident that the piece a contributes by its rigidity, and

the piece 6 by its tenacity, to the support of the weight ;

in other words, that the weight tends to bend the forner,

and to stretch the latter. Referring to Fig. 1 (in which

the direction of the principal fibres is shown with fictitious

Foi em 1978, durante um trabalho com dois grandes amigos (José

Alves e Miranda Soares), que nos pareceu necessário olhar a extremidade

distai do rádio como uma estrutura complexa. Não sabíamos ainda

totalmente como funcionava mas tínhamos descoberto a Correcção Total,

o factor da estabilidade intrínseca da fractura de Colles reduzida.

No ano de 1980 retomamos o assunto até ao conceito teórico actual.

O termo «binário», próprio da física mecânica, foi sugerido pelo Miranda

Soares. Ê hoje memória dolorosa desse infortunado amigo que viveu

apenas até vislumbrar a singela realização pessoal que tão intensamente

procurava.

Depois de 1980, a vida separou-nos um pouco; eu fui usando tempos

livres para requentar o trabalho. Visitei laboratórios, tirei apontamentos.

Juntando papéis, perseguia um sonho: mostrá-los ao Professor Carlos

Lima. Mas, com o passar do tempo, cada vez mais minúsculos me

pareciam os resultados. Em vez de subir, cavava.

Í N D I C E

l.a Parte — INTRODUÇÃO

  • RESUMO I — A FRACTURA DISTAL DO RÁDIO
  • E N Q U A D R A M E N T O HISTÓRICO - O Início - A Escola Francesa - A Escola Britânica - A Radiografia - Cronologia das obras clássicas
  • INCIDÊNCIA - A mais frequente de todas as fractur as - — o aumento da longevidade Causas de predomínio da fractura: - — o fatalismo causal
  • R E F E R Ê N C I A S AO T E X T O
  • CONCLUSÕES
  • RESUMO II — A FRACTURA DE COLLES
  • D E F I N I Ç Ã O
  • INCIDÊNCIA - Idade - Sexo - Causa - Lado - Fractura exposta - Fracturas associadas
    • CARACTERÍSTICAS ANATÓMICAS - l.a Idade - 2.a Idade - 3.a Idade - — características radiográficas - — tipos morfológicos (perfil) - — o foco de fractura
    • R E F E R Ê N C I A S AO T E X T O
    • CONCLUSÕES

O TRATAMENTO RESUMO LINHAS GERAIS DO TRATAMENTO Métodos de anestesia Métodos de redução Métodos de imobilização Selecção dos cuidados após a redução Complicações A FORMA E A FUNÇÃO Metade final do século XIX Primeira metade do século XX Segunda metade do século XX A década de oitenta ... O COLAPSO DA REDUÇÃO A fragmentação distai O efeito da osteoporose A ineficácia da contenção REFERÊNCIAS AO TEXTO CONCLUSÕES

129 131 131 132 132 134 135 139 140 142 143 146 147 148 149 150 159 167

2.a Parte — PROSPECÇÃO RADIOGRÁFICA

RESUMO
OBJECTIVO ...
MATERIAL ...
MÉTODO
RESULTADOS
COMENTÁRIO
CONCLUSÕES

3.a Parte —BIOMECÂNICA

I — BIOMECÂNICA DA EXTREMIDADE DISTAL DO RÁDIO

ASPECTOS GERAIS O rádio como coluna mecânica A lei de WOLFF e as diáfises O postulado de PAUWELS e as epífises. ANATOMIA FUNCIONAL E DESCRITIVA. Material e Método Resultados e Comentários — a superfície articular do rádio com o — a posição funcional da mão ... — a cortical palmar do rádio na zona epifisiometafisária distai

carpo 204 205

206

A

PARTE

INTRODUÇÃO

I

A FRACTURA DISTAL DO RÁDIO

(PONTOS DE REFERÊNCIA INICIAIS)

INTRODUÇÃO

ENQUADRAMENTO HISTÓRICO

A QUESTÃO DOS EPÓNIMOS

O INÍCIO

Durante séculos de História da Medicina, desde a Antiguidade até ao século XIX, a fractura da extremidade distai do rádio é completa mente desconhecida S1. A lesão traumática do punho é sempre interpretada como luxação ou entorse cujo nome varia com os termos em voga. No século XVIII, já próximo da época em que vai ser descoberta, chamase

subluxação ou diastase. O tratamento, esse, não variou: ligadura na fase

aguda, massagem depois "■a8.

Os critérios da Medicina Científica de há cento e cinquenta anos persistem na Medicina Popular dos nossos dias. Pelo menos neste ponto, deve ser entendida como uma medicina arcaica e não uma medicina «paralela». Foram aí vertidos por numerosas obras de divulgação científica cuja publi cação era muito comum no século XVIII por toda a Europa «das Luzes». Algumas foram traduzidas entre nós. O «Aviso ao Povo acerca da sua saúde, ou TRATADO DAS ENFERMIDADES», editado em Lisboa no ano de 1796 (dois volumes em pequeno formato), traduzido do francês por Manuel de de Paiva, é um exemplo 74. O tradutor acrescentou um terceiro volume da sua autoria e dedicado ao conde de Avintes em que descreve «com toda a clareza» algumas afecções não incluídas na obra traduzida, entre elas, as afecções traumáticas 56. Baseiase na sua experiência e nas «obras dos doutores Stork, Macbrid, Buchan, Plenck, Ducan, Webster e, sobretudo nas Instituições de Medicina Prática do doutor Cullen». Muito provavelmente tratase da lista dos mais conhecidos divulgadores de então pois Paiva, dirigindose ao público leigo a que destina o tomo declara que «o Leitor que tiver o trabalho de comparar esta Obra com as daqueles Sábios Médicos conhecerá bem onde me valeu o próprio cabedal».

I — A FRACTURA DISTAL DO RÁDIO (Enquadramento Histórico)

No Capítulo XXXII, «Das Deslocações», informa que a «deslocação da munheca se reduz jazendo huma extensão em diversas direcções e pondo a cabeça do osso em seu lugar. Feita esta operação cumpre applicar panos molhados em vinagre ou em agua ardente alcanforada e conservalla em descanço; pois que da omissão disto resultão algumas consequências péssimas e então não he de admirar que (a articulação) fique para sempre fraca e sensível»^56.

A primeira referência à existência de fractura local surge em 1705

ainda misturada com o conceito tradicional de luxação e apenas con-

tribuindo para o tornar mais confuso. Foi feita por Jean-Louis Petit

(1674-1730) o mais influente médico francês do seu século, obreiro

do prestígio da Academia Real de Cirurgia 81 : «une ère nouvelle, c'est

l'époque à jamais fameuse de l'Académie royale de chirurgie qui a exercé

sur le XVIIIe siècle et sur le nôtre une influence considérable et salutaire»

(Ricard, 1893)^64. O Traité des Maladies des Os, publicado por Petit

em 1705, é reeditado setenta anos depois. Em 1801 são publicadas as

obras póstumas de Desault (1744-1795), um dos seus «inúmeros dis-

cípulos e continuadores» G4, repetindo os erros de interpretação de Petit

sobre as lesões traumáticas do punho 81.

É em 1783, entre a segunda edição da obra de Petit e a publicação

póstuma de Desault, que se publica em Paris as OEuvres posthumes de

M. Pouteau: Mémoire, contenant quelques reflexions sur quelques frac-

tures de l'avant-bras, sur les luxations incomplettes du poignet et sur le

diastasis.

Claude Pouteau (1725-1775), cirurgião em Lyon, foi «dos mais distintos médicos de província franceses» 01 , clarividente precursor da assepsia: defendia a lavagem cuidadosa das mãos antes de iniciar a cirurgia e reprovava o hábito de as ir limpando do sangue aos panos para esse fim sempre presentes nas salas de operações — tinha-os substituído por papéis de utili- zação única. Tinha-se apercebido de que algo causal relacionava a sépsis puerperal e a cirúrgica, um século antes da maioria dos cirurgiões e l^. Fez «uma excelente descrição da fractura distai do rádio com desvio dorsal, distinguindo-a bem das entorses e luxações com que era confundida» 52 , que só foi publicada oito anos depois da sua morte. Também neste campo estava quase um século à frente dos seus congéneres.

Ofuscada por Petit, contrariada por Desault, autor de um tratado

sobre fracturas e luxações traduzido para inglês em 1805, a obra

inovadora de Pouteau vai cair no esquecimento. Quando Colles em 1814

jnvia de Dubin para Edinburg o seu memorável trabalho diz no primeiro

parágrafo: «The injury to which I wish to direct the attention of surgeons,

I — A FRACTURA DISTAL DO RÁDIO (Enquadramento Histórico)

palmar, à fractura do tornozelo e do punho. Esta última, descreveu-a impe- cavelmente em uma das famosas Leçons Orales de Clinique Chirugicale, publicada em 1833. Aí afirma a raridade da luxação do punho, nunca por si vista em trinta anos de prática, e faz uma das primeiras referências à fractura na criança (*).

Dupuytren não cita Colles, que provavelmente desconhecia, mas parece ignorar propositadamente o trabalho de Goyrand (1832), logo seguido do de Malgaigne. Pelo menos assim entende Goyrand que reage com acinte: «En 1833, les éditeurs des leçons orales de Dupuytren publièrent comme leçon du chirurgien de l'Hôtel-Dieu, une copie très exacte de mon mémoire et de celui de Malgaigne»^13.

Jean-Gaspar-Blaise Goyrand (1803-1866) formou-se em Paris e retornou a Marselha onde, como Pouteau em Lyon e Dupuytren em Paris, dirigiu o Hôtel-Dieu (Misericórdia) da sua cidade. Segundo Peltier, cientista e cirur- gião geral norte-americano, «um amante da história da Medicina com pro- fundo conhecimento do século XIX» 7r-, Goyrand foi um dos mais célebres cirurgiões do seu tempo 61.

Goyrand caracterizou o sentido do desvio, dorsal ou palmar, do fragmento distai da fractura e notou a concomitância, em algumas, da

(*) Os quatro Volumes das «Leçons Orales» foram publicados de 1830 a 1834; Dupuytren morreu no ano seguinte, 1835. Em Portugal, o período de 1830 a 1834 corresponde aos anos mais críticos da longa convulsão social provocada pela repulsão que o país tradicional (corpo- rizado no Miguelismo) faz das novas ideias trazidas pelos estrangeirados e que cativam os malhados (o Liberalismo). Nesta época de intolerância e extremismo, todas as ideias vindas do exterior, mesmo (ou sobretudo) as de carácter puramente científico, aparentemente não filiadas, eram suspeitas. Segundo Oliveira Martins (Portugal Contemporâneo, 3.a^ ed., 1894) «esse choque traduziu-se em um quarto de século (1826-1851) de guerras civis e revoluções»; o ano de 1833, data da publicação das «Leçons Orales» que abordam as fracturas do punho, «é o ano em que colapsa o forte exército da nação Miguelista (80 000 homens) frustrado pela mediocridade dos seus generais e batido de estupefacção perante o incrível sucesso da surtida das tropas liberais pelo Algarve, cercadas no Porto».

No Porto, em 1840, passado meio século sobre a obra «Aviso ao Povo» de Manuel Paiva (1796), um outro Paiva (António da Costa P., «doutor em Medicina pela Faculdade de Paris, bacharel em Filosofia pela Universidade de Coimbra, Lente de Botânica e Agricultura da Academia Politécnica do Porto») edita os «Aforismos de Medicina e Cirurgia Práticas». É uma obra completamente diferente da anterior. Esta não é endereçada aos leigos mas «aos médicos de Portugal e do

INTRODUÇÃO

avulsão da apófise estiloide do cúbito. Relacionou a direcção do desvio com a posição da mão ao contactar o solo: dorsal quando a mão bate de palma, palmar quando bate de dorso. Foi mais longe que os seus contemporâneos na compreensão da fractura; a sua explicação global do mecanismo, conhecida como a Teoria do Esmagamento ou Penetração

■ Directa do Fragmento Superior no Inferior, acabou por ser preterida

em favor das elegantes especulações experimentais de Lecomte (1860), criador da Teoria da FracturaArrancamento (do topo distal sob a acção dos ligamentos rádiocárpicos tensos) que considera herdeira da linha estética da pretensa Teoria da Contracção Muscular que atribui a Pouteau*^4.

A Escola Francesa vai demonstrar um pendor irresistível pelas teorias elegantes sobre o mecanismo da fractura até ao fim do século. A teoria das tensões ligamentares rádiocárpicas, como causa indirecta de lesões do punho, ainda hoje sobrevive, com destaque ou mitigada, na explicação da fractura distai do rádio^13 e da pseudoartrose do escafoide 51. A apreciação da sua penetração na obra dos autores do século passado foi pedradetoque para os tratadistas seus compatriotas e contemporâneos e motivo de inflexões na atribuição da autoria da descoberta da fractura e suas variedades^52. °^4.

Brasil», privados «dos progressos do século», vítimas «do estado de decadência em que se acha esta Faculdade (de Medicina) na Universidade de Coimbra», o que «se pode em grande parte aplicar às Escolas Cirúrgicas de Lisboa e Porto». Costa Paiva é um estrangeirado (companheiro de exílio de Alexandre Herculano com quem publica a «Crónica de EIRei D. Sebastião de Fr. Bernardo da Cruz»), já fortsmente marcado pelo Positivismo. Formouse em Paris na década de trinta e frequentou o HôtelDieu onde assistiu às palestras do maior dos mestres, Dupuytren, mais tarde «Recueillies et Publiées par une Société de Medicine», publicação que lhe pareceu fidedigna («cumpreme todavia dizer que tendo eu assistido em Paris às lições orais... as vi fielmente transcritas e bem redigidas numa obra de Clínica Cirúrgica recentemente publicada»). Sobre as fracturas, Costa Paiva dispende tempo a distinguir a luxação do ombro da fractura do colo do úmero e menos, por já mais conhecido, a caracterizar «os sinais dife renciais da fractura do colo do fémur em referência às luxações da extremidade superior deste osso». Este assunto que considera momentoso, a distinção entre fractura e luxações, recolheuo em Dupuytren («tive ocasião de observar o tratamento que Dupuytren fazia às fracturas»). Nada recorda sobre as diferenças entre a luxação do punho e a fractura distai do rádio. Aparentemente Costa Paiva não ouviu de Dupuytren as referências sobre a fractura distai do rádio que depois aparecem escritas. É um testemunho indirecto em favor da alegação de Goyrand: Dupuytren só se apercebe da importância do assunto depois de 1er a sua publicação em 1832.