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2. Para os fãs cujo amor por histórias transformou um desejo ... Ela disse que nós dois somos um desastre. ... Belo plano, Travis.
Tipologia: Notas de estudo
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Não perca as partes importantes!
Para os fãs
cujo amor por histórias
transformou um desejo
neste livro que você tem em mãos
Era como se tudo naquela saída berrasse para mim dizendo que ali não era o meu lugar. As escadas se desfazendo, aquele alvoroço de clientes briguentos, e o ar, uma mescla de suor, sangue e mofo. As vozes viravam borrões enquanto as pessoas gritavam números e nomes, num constante vaivém, acotovelando-se para trocar dinheiro e gesticulando para se comunicar em meio a tanto barulho. Passei espremida pela multidão, logo atrás da minha melhor amiga.
— Deixe o dinheiro na carteira, Abby! — América gritou para mim.
Seu largo sorriso reluzia mesmo sob aquela fraca iluminação.
— Fiquem por perto! Vai ficar pior assim que começar! — Shepley avisou, bem alto para ser ouvido.
América segurou a mão dele e depois a minha, enquanto Shepley nos guiava em meio àquele mar de gente.
O som agudo de um megafone cortou o ar repleto de fumaça. O ruído me deixou alarmada. Tive um sobressalto e comecei a procurar de onde vinha aquela rajada sonora. Um homem estava em pé sobre uma cadeira de madeira, com um rolo de dinheiro em uma das mãos e o megafone na outra, colado à boca.
— Sejam bem-vindos ao banho de sangue! Se estão em busca de uma aula de economia... estão na merda do lugar errado, meus amigos! Mas se buscam O Círculo, aqui é a meca! Meu nome é Adam. Sou eu que faço as regras e convoco as lutas. As apostas terminam assim que os oponentes estiverem no chão. Nada de encostar nos lutadores, nem ajudar, nem mudar a aposta no meio da luta, muito menos invadir o ringue. Se quebrarem essas regras, vocês serão esmagados, espancados e jogados pra fora sem nenhum dinheiro e isso vale pra vocês também, meninas. Então, não usem suas putinhas para fraudar o sistema, caras!
Shepley balançou a cabeça.
— Que é isso, Adam! — ele gritou para o mestre de cerimônias, em clara desaprovação à escolha de palavras do amigo.
Meu coração batia forte dentro do peito. Com um cardigã de cashmere cor-de-rosa e brincos de pérola, me sentia uma velha professora nas praias da Normandia. Eu havia prometido a América que conseguiria lidar com o que quer que acontecesse com a gente, mas, naquele lugar imundo, senti uma necessidade urgente de agarrar seu braço magro com ambas as mãos. Ela não me colocaria em perigo, mas estar em um porão com mais ou menos cinquenta universitários bêbados, sedentos por sangue e dinheiro... Bem, eu não estava exatamente confiante quanto às nossas chances de sair dali ilesas.
Depois que América conheceu Shepley durante a recepção aos calouros, com frequência ela o acompanhava às lutas secretas que aconteciam em diferentes porões da Universidade Eastern. Cada evento era realizado em um local diferente, que permanecia secreto até exatamente uma hora antes da luta.
Como eu frequentava círculos bem mais comportados, fiquei surpresa ao tomar conhecimento do submundo da Eastern; mas Shepley já sabia daquele mundo antes mesmo de ter se juntado a ele. Travis, o primo e colega de quarto dele, participara de sua primeira luta sete meses atrás. Como calouro, os rumores diziam que ele era o competidor mais letal que Adam tinha visto nos três anos desde a criação do Círculo. Quando começou o segundo ano, Travis era imbatível. Juntos, ele e Shepley pagavam o aluguel e as contas com o que ganhavam nas lutas, fácil, fácil.
Adam levou o megafone à boca de novo, e os gritos e movimentos aumentaram em um ritmo febril.
— Nesta noite temos um novo desafiante! O lutador de luta livre e astro da Bastem, Marek Young!
Seguiram-se aplausos e gritos eufóricos da torcida. A multidão se partiu como o mar Vermelho quando Marek entrou na sala. Formou-se um círculo, como uma clareira, e a galera assobiava, vaiava e zombava do concorrente. Ele deu uns pulinhos para se preparar e girou o pescoço de um lado para o outro; o rosto estava sério e compenetrado. A multidão se aquietou, só restando um rugido abafado. Levantei as mãos depressa para tampar os ouvidos quando a música começou a retumbar, altíssima, nos grandes alto-falantes do outro lado da sala.
Adam jogou um quadrado de pano vermelho sobre o corpo caído de Marek, e a multidão explodiu. O dinheiro mudou de mãos novamente, e as expressões se dividiam entre orgulhosos e frustrados.
Fui empurrada com todo aquele movimento de gente indo e vindo. América gritou meu nome de algum lugar lá atrás, mas eu estava hipnotizada pela trilha vermelha que ia do meu peito até a cintura.
Um pesado par de botas pretas parou diante de mim, desviando minha atenção para o chão. Meus olhos foram se voltando para cima: jeans manchado de sangue, músculos abdominais bem definidos, um peito tatuado ensopado de suor e, finalmente, um par de cálidos olhos castanhos. Fui empurrada, mas Travis me segurou pelo braço antes que eu caísse.
— Ei! Cuidado com ela! — ele franziu a testa, enxotando qualquer um que chegasse perto de mim.
A expressão séria se derreteu em um sorriso quando ele viu minha blusa. Limpando meu rosto com uma toalha, ele me disse:
— Desculpe por isso, Beija-Flor.
Adam deu uns tapinhas na nuca de Travis.
— Vamos lá, Cachorro Louco! Tem uma galera esperando por você!
Os olhos dele não se desviaram dos meus.
— Uma pena ter manchado seu suéter. Fica tão bem em você...
No instante seguinte, ele foi engolfado pelos fãs, desaparecendo da mesma maneira como tinha aparecido.
— No que você estava pensando, sua imbecil? — gritou América, me puxando pelo braço.
— Vim até aqui para ver uma luta, não foi? — respondi, sorrindo.
— Você nem devia estar aqui, Abby — disse Shepley em tom de bronca.
— Nem a América — retruquei.
— Mas ela não tenta pular dentro do círculo! — disse ele, franzindo a testa. —Vamos!
América sorriu para mim e limpou meu rosto.
— Você é um pé no saco, Abby, mas mesmo assim eu te amo! Ela me abraçou e fomos embora.
América me acompanhou até o quarto, no dormitório da faculdade, e olhou com desprezo para minha colega, Kara. Imediatamente tirei o cardigã e o joguei no cesto de roupa suja.
— Que nojo! Por onde você andou? — Kara perguntou, sem sair da cama.
Olhei para América, que deu de ombros.
— Sangramento de nariz. Você nunca viu os famosos sangramentos de nariz da Abby?
Kara ajeitou os óculos e balançou a cabeça em negativa.
— Ah, então vai ver — ela disse, dando uma piscadela para mim e fechando a porta depois de sair. Nem um minuto tinha se passado e ouvi o som indicando uma mensagem de texto no meu celular. Como de costume, era América me enviando uma mensagem segundos depois de nos despedirmos.
vou ficar com o shep t vejo amanhã rainha do ringue
Dei uma espiada em Kara, que me olhava como se sangue fosse jorrar do meu nariz a qualquer instante.
— Ela estava brincando — falei.
Kara assentiu com indiferença e depois baixou o olhar para a bagunça de livros espalhados na cama.
— Acho que vou tomar um banho — falei, pegando uma toalha e meu nécessaire.
— Vou avisar os jornais — ela respondeu, sem emoção alguma na voz e mantendo a cabeça baixa.
No dia seguinte, fui almoçar com Shepley e América. Eu queria ficar sozinha, mas, conforme os alunos foram entrando no refeitório, as cadeiras à minha
— Você conhece ela, Trav. A melhor amiga da América, lembra? Ela estava com a gente na outra noite — disse Shepley.
Travis sorriu para mim, no que presumi ser sua expressão mais charmosa. Ele transbordava sexo e rebeldia, com aqueles antebraços tatuados e os cabelos castanhos cortados bem rente à cabeça. Revirei os olhos à sua tentativa de me seduzir.
— Desde quando você tem uma melhor amiga, Mare? — perguntou Travis.
— Desde o penúltimo ano da escola — ela respondeu, pressionando os lábios enquanto sorria na minha direção. — Você não lembra, Travis? Você destruiu o suéter dela.
Ele sorriu.
— Eu destruo muitos suéteres.
— Que nojo - murmurei.
Travis girou a cadeira vazia que estava ao meu lado e se sentou, descansando os braços à sua frente.
— Então você é a Beija-Flor, né?
— Não — respondi com raiva —, eu tenho nome.
Ele parecia se divertir com a forma como eu o encarava, o que só servia para me deixar mais irritada.
— Tá. E qual é seu nome? — ele me perguntou.
Dei uma mordida no que tinha sobrado da maçã no meu prato, ignorando-o.
— Então vai ser Beija-Flor — disse ele, dando de ombros.
Ergui o olhar de relance para a América, depois me virei para o Travis:
— Estou tentando comer.
Ele topou o desafio que apresentei.
— Meu nome é Travis. Travis Maddox.
Revirei os olhos.
— Sei quem você é.
— Sabe, é? — ele falou, erguendo a sobrancelha ferida.
— Não seja tão convencido. É difícil não perceber quando cinquenta bêbados entoam seu nome.
Travis se endireitou na cadeira, ficando um pouquinho mais alto.
— Isso acontece muito comigo.
Revirei os olhos de novo e ele deu uma risadinha abafada.
— Você tem um tique?
— Um quê?
— Um tique. Seus olhos ficam se revirando.
Travis riu de novo quando olhei com ódio para ele.
— Mas são olhos incríveis — ele disse, inclinando-se e ficando a pouquíssimos centímetros do meu rosto. — De que cor eles são? Cinza?
Baixei o olhar para o prato, criando uma espécie de cortina entre a gente com as longas mechas do meu cabelo cor de caramelo. Eu não gostava da forma como ele me fazia sentir quando estava tão perto. Não queria ser como as outras milhares de garotas da Eastern, que ficavam ruborizadas na presença dele. Não queria que ele mexesse comigo daquele jeito. De jeito nenhum.
— Nem pense nisso, Travis. Ela é como uma irmã pra mim —América avisou.
— Baby — Shepley disse a ela —, você acabou de lhe dizer não. Agora é que ele não vai parar.
— Você não faz o tipo dela — América disse, mudando de estratégia.
Travis se fez de ofendido.
— Eu faço o tipo de todas!
Lancei um olhar para ele e sorri.
— Ah! Um sorriso. Não sou um canalha completo no fim das contas — ele disse e piscou. — Foi um prazer conhecer você, Flor.
Tentei tranquilizar Shepley com um sorriso, mas o pessimismo dele era resultado de muitos anos de prejuízo por causa do Travis.
América se despediu de mim com um aceno, saindo com Shepley enquanto eu seguia para a aula da tarde. Apertei os olhos para enxergar sob o sol brilhante, segurando com força as tiras da mochila. A Eastern era exatamente o que eu esperava, desde as salas de aula menores até os rostos desconhecidos. Era um novo começo para mim. Finalmente eu podia andar em algum lugar sem os sussurros daqueles que sabiam — ou achavam que sabiam — alguma coisa do meu passado. Eu era tão comum quanto qualquer outra caloura ingênua e estudiosa, sem ninguém para me encarar, sem boatos, nada de pena ou julgamento. Apenas a ilusão do que eu queria que vissem: a Abby Abernathy que vestia cashmere sem nenhum resquício de insensatez.
Coloquei a mochila no chão e desabei na cadeira, me curvando para pegar o laptop na mochila. Quando ergui a cabeça para colocá-lo na mesa, Travis se sentou sorrateiramente na carteira ao lado.
— Que bom. Você pode tomar notas pra mim — disse ele, mordendo uma caneta e sorrindo, sem dúvida com o máximo de seu charme.
Meu olhar para ele foi de desprezo.
— Você nem está matriculado nessa aula...
— Claro que estou! Geralmente eu sento lá — disse ele, apontando com a cabeça para a última fileira.
Um pequeno grupo de garotas estava me encarando, e percebi que havia uma cadeira vazia bem no meio delas.
— Não vou anotar nada pra você — eu disse, ligando o computador. Travis se inclinou tão perto de mim que eu podia sentir sua respiração na minha bochecha.
— Me desculpa... Ofendi você de alguma maneira?
Soltei um suspiro e fiz que não com a cabeça.
— Então qual é o problema?
Mantive o tom de voz baixo.
— Não vou transar com você. Pode desistir.
Um lento sorriso se formou em seu rosto antes de ele se pronunciar.
— Não pedi para você transar comigo — pensativo, os olhos dele se voltaram para o teto —, ou pedi?
— Não sou uma dessas Barbies gêmeas nem uma de suas fãs ali — respondi, olhando de relance para as garotas atrás de nós. — Não estou impressionada com as suas tatuagens, nem com o seu charme de garotinho, nem com a sua indiferença forçada, então pode parar com as gracinhas, ok?
— Ok, Beija-Flor.
Ele ficou impassível diante da minha atitude rude, de um jeito que me enfureceu.
— Por que você não passa lá no meu apê com a América hoje à noite?
Olhei com desdém para ele, que se aproximou ainda mais.
— Não estou tentando te comer. Só quero passar um tempo com você.
— Me comer? Como você consegue fazer sexo falando assim?
Travis caiu na gargalhada, balançando a cabeça.
— Só vem, tá? Não vou nem te paquerar, prometo.
— Vou pensar
O professor Chaney entrou a passos largos, e Travis voltou à atenção para frente da sala. Resquícios de um sorriso permaneciam em seu rosto, tomando mais nítida a covinha da bochecha. Quanto mais ele sorria, mais eu queria odiá-lo, e no entanto era esse o motivo pelo qual odiá-lo era impossível.
— Quem sabe me dizer que presidente teve uma esposa vesga e feia de doer? — perguntou Chaney.
— Anota isso — sussurrou Travis. — Vou precisar saber disso pra usar nas entrevistas de emprego.
— Shhh — falei, digitando cada palavra dita pelo professor.
Travis abriu um largo sorriso e relaxou na cadeira. Conforme a hora passava, ele alternava entre bocejar e se apoiar no meu braço para dar uma olhada no monitor do meu laptop. Eu me concentrei, me esforcei para ignorá-lo, mas a proximidade dele e aqueles músculos saltando de seu braço tornavam a tarefa difícil. Ele ficou mexendo na faixa de couro preta que tinha em volta do pulso até que Chaney nos dispensou.
Virei uma esquina e vi América parada com Finch do lado de fora do nosso dormitório. Nós três acabamos ficando na mesma mesa durante a orientação aos calouros, e eu soube na hora que ele seria o providencial terceiro elemento da nossa amizade. Ele não era muito alto, mas passava bem dos meus 1,62 metro. Os olhos redondos equilibravam as feições longas e esguias, e os cabelos descoloridos geralmente estavam espetados na parte da frente.
— Travis Maddox? Meu Deus, Abby, desde quando você começou a pescar nas profundezas do oceano? — Finch perguntou, com um olhar de desaprovação.
América puxou o chiclete da boca, fazendo um fio bem longo.
— Você só está piorando as coisas ao rejeitar o cara. Ele não está acostumado com isso.
— O que você sugere que eu faça? Durma com ele?
América deu de ombros.
— Vai poupar tempo.
— Eu disse pra ele que vou lá hoje à noite.
Finch e América trocaram olhares de relance.
— Que foi? Ele prometeu parar de me encher se eu dissesse que ia. Você vai lá hoje à noite, não é?
— É, vou — disse América. — Você vem mesmo?
Sorri e fui andando. Passei por eles e entrei no dormitório, me perguntando se Travis cumpriria a promessa de não flertar comigo. Não era difícil sacar qual era a dele: ou ele me via como um desafio, ou como sem graça o bastante para ser apenas uma boa amiga. Eu não tinha certeza de qual das alternativas me incomodava mais.
Quatro horas depois, América bateu à minha porta para me levar até o apartamento do Shepley e do Travis. Ela não se conteve quando apareci no corredor.
— Credo, Abby! Você está parecendo uma mendiga
— Que bom — eu disse, sorrindo para o meu visual.
Meus cabelos estavam aglomerados no topo da cabeça em um coque bagunçado. Eu tinha tirado a maquiagem e substituído às lentes de contato por
óculos retangulares de aros pretos. Vestindo uma camiseta bem velha e gasta e uma calça de moletom, eu me arrastava em um par de chinelos. A ideia me viera à mente horas antes: parecer desinteressante era a melhor estratégia. O ideal seria que Travis perdesse instantaneamente o interesse em mim e colocasse um ponto final em sua ridícula persistência. E, se ele estivesse em busca de uma amiga, meu objetivo era parecer desleixada demais até para isso.
América baixou a janela do carro e cuspiu o chiclete.
— Você é óbvia demais. Por que não rolou no cocô de cachorro para completar o visual?
— Não estou tentando impressionar ninguém — falei.
— É óbvio que não.
Paramos o carro no estacionamento do conjunto de apartamentos onde o Shepley morava e segui América até a escadaria. Ele abriu a porta, rindo enquanto eu entrava.
— O que aconteceu com você?
— Ela está tentando não impressionar — disse América.
Ela seguiu Shepley em direção ao quarto dele. Eles fecharam a porta e eu fiquei ali parada, sozinha, me sentindo deslocada. Sentei-me na cadeira reclinável mais próxima da porta e chutei longe os chinelos.
Em termos estéticos, o apartamento deles era mais agradável do que um apartamento típico de homens solteiros. Sim, os previsíveis pôsteres de mulheres seminuas e sinais de rua roubados estavam nas paredes, mas o lugar era limpo, os móveis, novos, e o cheiro de cerveja velha e roupa suja notavelmente não existia.
— Já estava na hora de você aparecer — disse Travis, se jogando no sofá.
Sorri e ajeitei os óculos, esperando que ele recuasse diante da minha aparência.
— A América teve que terminar um trabalho da faculdade.
— Falando em trabalhos de faculdade, você já começou aquele de história?
Ele nem pestanejou ao ver meu cabelo despenteado, e franzi a testa com a reação dele.
Travis deu de ombros.
— É um jeito fácil de ganhar uma grana. Não conseguiria tanto assim trabalhando no shopping.
— Eu não diria que é fácil apanhar.
— O quê? Você está preocupada comigo? — ele deu uma piscadela. Fiz uma careta e ele deu uma risadinha abafada. — Não apanho com tanta frequência assim. Quando o adversário dá um golpe, eu desvio. Não é tão difícil como parece.
Dei risada.
— Você age como se ninguém mais tivesse chegado a essa conclusão.
— Quando dou um soco, eles levam o soco e tentam me bater de volta. Não é assim que se ganha uma luta.
Revirei os olhos.
— Quem é você... o garoto do Karate Kid? Onde aprendeu a lutar?
Shepley e América olharam de relance um para o outro e depois para o chão. Não demorou muito para eu perceber que tinha dito algo errado.
Travis não pareceu se incomodar.
— Meu pai tinha problemas com bebida e um péssimo temperamento, e meus quatro irmãos mais velhos herdaram o gene da idiotice.
— Ah.
Minhas orelhas ardiam.
— Não fique constrangida, Flor. Meu pai parou de beber e meus irmãos cresceram.
— Não estou constrangida.
Fiquei mexendo nas mechas que se desprendiam do meu cabelo e então decidi soltar tudo e fazer outro coque, tentando ignorar o silêncio embaraçoso.
— Gosto desse seu lance natural. As garotas não costumam vir aqui assim.
— Fui coagida a vir até aqui. Não me passou pela cabeça impressionar você— respondi, irritada por meu plano ter falhado.
Ele abriu aquele sorriso largo dele, divertido, meio infantil, e fiquei com mais raiva, na esperança de disfarçar minha inquietação. Eu não sabia como as garotas se sentiam quando estavam perto dele, mas tinha visto como se comportavam. Eu estava vivenciando algo mais parecido com uma sensação de náusea e desorientação, em vez de paixonite mesclada com risadinhas tolas, e, quanto mais ele tentava me fazer sorrir, mais perturbada eu ficava.
— Já estou impressionado. Normalmente não tenho para que as garotas venham até o meu apartamento.
— Tenho certeza disso — falei, contorcendo o rosto em repulsa.
Ele era o pior tipo de cara confiante. Não era apenas descaradamente ciente de seu poder de atração, mas estava acostumado com o fato de as mulheres se jogarem pra cima dele, de modo que via meu comportamento frio como um alívio em vez de um insulto. Eu teria que mudar minha estratégia.
América apontou o controle remoto para a televisão e a ligou.
— Tem um filme bom passando hoje na TV. Alguém quer descobrir o que aconteceu a Baby Jane?
Travis se levantou.
Eu já estava saindo para jantar. Está com fome, Flor?
— Já comi — dei de ombros.
— Não comeu, não — disse América, antes de se dar conta de seu erro. — Ah... hum... é mesmo, esqueci que você comeu... pizza, né? Antes de sairmos.
Fiz uma careta para ela, pela tentativa frustrada de consertar a gafe, e então esperei para ver a reação do Travis. Ele cruzou a sala e abriu a porta.
— Vamos. Você deve estar com fome
— Aonde você vai?
— Aonde você quiser. Podemos ir a uma pizzaria.
Olhei para minhas roupas.
— Não estou vestida para isso...
Ele me analisou por um instante e então abriu um sorriso.
— Você está ótima. Vamos, estou morrendo de fome.