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Comportamento Assertivo: Consequências Sociais e Autocontrole, Notas de estudo de Psicologia

Este documento discute o comportamento assertivo, sua definição, dimensões e consequências sociais. Além disso, analisa a importância do autocontrole na emissão de respostas assertivas e o papel desse comportamento no grupo. O texto também compara comportamentos assertivo, passivo e agressivo, destacando as consequências reforçadoras e aversivas associadas a cada um.

Tipologia: Notas de estudo

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Osvaldo_86
Osvaldo_86 🇧🇷

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Psicologia: Teoria e Pesquisa
Abr-Jun 2010, Vol. 26 n. 2, pp. 295-304
Assertividade e Autocontrole: Interpretação Analítico-Comportamental1
Vívian Marchezini-Cunha2
Emmanuel Zagury Tourinho
Universidade Federal do Pará
RESUMO - Questões relacionadas à assertividade têm recebido atenção por parte de terapeutas comportamentais há mais de
três décadas. É mais recente, porém, o esforço de terapeutas analítico-comportamentais para examinar problemas dessa ordem
com os mesmos recursos conceituais e metodológicos empregados por seus pares da pesquisa básica e conceitual. O presente
trabalho tem como objetivo oferecer uma interpretação analítico-comportamental para padrões de comportamento assertivos,
agressivosepassivos.Recuperamosalgumasdefiniçõesdeassertividade/agressividade/passividadeeexaminamososfenômenos
correspondentes enquanto relações comportamentais; discutimos alguns aspectos da abordagem analítico-comportamental
parao autocontrole;e sugerimosque asrelações comportamentaisdefinidas comoassertividade/agressividade/passividade
podemserinterpretadasenquantoinstânciasdeautocontrole ouimpulsividade.Aabordagempodeabrirnovasperspectivas
de investigação clínica de habilidades sociais sob um enfoque analítico-comportamental.
Palavras-chave:assertividade;agressividade;passividade;autocontrole;conflitodeconsequências.
Assertiveness and Self-Control: A Behavior-Analytic Interpretation
ABSTRACT - Issues related to assertiveness have been investigated by behavior therapists for over three decades. It is
more recent, however, the effort made by behavior-analytic therapists to examine such issues with the same conceptual and
methodological tools employed by their colleagues in basic and conceptual research. This study aims to provide a behavior-
analyticinterpretationofassertive,aggressiveandpassivebehaviorpatterns.Werecoveredsomedefinitionsofassertiveness/
aggressiveness/passiveness and then examined the corresponding phenomena as behavioral relations, discussed some aspects of
thebehavior-analyticapproachofself-control,andsuggestedthatbehavioralrelationsdefinedasassertiveness/aggressiveness/
passiveness may be interpreted as instances of self-control or impulsiveness. Such approach may give rise to new directions
in clinical research of social skills from a behavior-analytic standpoint.
Keywords:assertiveness;aggressiveness;passiveness;self-control;conflictofconsequences.
1 Este artigo reproduz partes da Dissertação de Mestrado apresentada
pela primeira autora ao Programa de Pós-Graduação em Teoria e Pes-
quisa do Comportamento, Universidade Federal do Pará, e orientada
pelosegundoautor.TrabalhoparcialmentefinanciadopeloConselho
NacionaldeDesenvolvimentoCientíficoeTecnológico,CNPq(Bolsa
de Mestrado, Processos 305743/2004-0 e 470802/2004-9).
2 Endereço para correspondência: Rua Padre Willian Silva, 39. Bairro
Planalto. Belo Horizonte, MG. CEP 31.720-060. Telefone: (31) 3495-
2810. E-mail: vivianpsi@yahoo.com.br.
A questão da expressão adequada de sentimentos,
contemporaneamente abordada na terapia comportamental
com o conceito de assertividade, vem sendo estudada pela
Psicologia há quase cinquenta anos. Buscando promover
compo rtament os asser tivos, m uitas d efiniçõe s já fora m
propostas, diversos inventários foram criados e treinamen-
tosforamdesenvolvidosparaindivíduoscomdificuldades
para expressar seus sentimentos em situações interpessoais
(e.g. Alberti & Emmons, 1970/1978; Lazarus, 1971/1980;
Wolpe,1973/1980).Dentreasdiversasdefiniçõespropostas
para o comportamento assertivo, interessa-nos especial-
mente a de Rich e Schroeder (1976), de acordo com a qual
a assertividade consiste de repertórios autodescritivos
eficazesemcontextos sociais específicos.Comose verá
adiante,taldefiniçãoofereceumavisãomaisfuncionalno
sentido de indicar variáveis controladoras do comporta-
mento assertivo, portanto mais coerente com a Análise do
Comportamento, abordagem na qual se apoia o presente
trabalho.
O comportamento assertivo pode envolver a produção de
consequências reforçadoras diversas tanto para o indivíduo
que age assertivamente, quanto para o grupo com o qual
interage. O comportamento assertivo pode também produzir
consequências aversivas, sendo que ambas as reforçadoras
e as aversivas – podem constituir um produto imediato ou
atrasado desse comportamento.
O presente artigo analisa o tema da assertividade, ou os
padrõesquesetornaramsocialmenteeficazesdeexpressão
de sentimentos na cultura ocidental moderna por meio
do exame de processos comportamentais descritos como
“autocontrole”.Assim,espera-secontribuirparaumaespe-
cificaçãodasrelaçõescomportamentaisquepossivelmente
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desenvolvida consiste das possíveis relações entre assertivi-
dade e autocontrole, uma relação pouco referida na literatura
sobre assertividade. Ao explorar essas relações, o que se
busca é promover a articulação de duas áreas de pesquisa
bastante relevantes na psicologia e, com isso, aumentar o
alcance de uma apreciação dos fenômenos relativos à as-
sertividade, por exemplo, no contexto clínico onde o tema
é recorrente.
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295 Psicologia: Teoria e Pesquisa Abr-Jun 2010, Vol. 26 n. 2, pp. 295-

Assertividade e Autocontrole: Interpretação Analítico-Comportamental^1

Vívian Marchezini-Cunha^2 Emmanuel Zagury Tourinho Universidade Federal do Pará RESUMO - Questões relacionadas à assertividade têm recebido atenção por parte de terapeutas comportamentais há mais de três décadas. É mais recente, porém, o esforço de terapeutas analítico-comportamentais para examinar problemas dessa ordem com os mesmos recursos conceituais e metodológicos empregados por seus pares da pesquisa básica e conceitual. O presente trabalho tem como objetivo oferecer uma interpretação analítico-comportamental para padrões de comportamento assertivos, agressivos e passivos. Recuperamos algumas definições de assertividade/agressividade/passividade e examinamos os fenômenos correspondentes enquanto relações comportamentais; discutimos alguns aspectos da abordagem analítico-comportamental para o autocontrole; e sugerimos que as relações comportamentais definidas como assertividade/agressividade/passividade podem ser interpretadas enquanto instâncias de autocontrole ou impulsividade. A abordagem pode abrir novas perspectivas de investigação clínica de habilidades sociais sob um enfoque analítico-comportamental. Palavras-chave: assertividade; agressividade; passividade; autocontrole; conflito de consequências.

Assertiveness and Self-Control: A Behavior-Analytic Interpretation

ABSTRACT - Issues related to assertiveness have been investigated by behavior therapists for over three decades. It is more recent, however, the effort made by behavior-analytic therapists to examine such issues with the same conceptual and methodological tools employed by their colleagues in basic and conceptual research. This study aims to provide a behavior- analytic interpretation of assertive, aggressive and passive behavior patterns. We recovered some definitions of assertiveness/ aggressiveness/passiveness and then examined the corresponding phenomena as behavioral relations, discussed some aspects of the behavior-analytic approach of self-control, and suggested that behavioral relations defined as assertiveness/aggressiveness/ passiveness may be interpreted as instances of self-control or impulsiveness. Such approach may give rise to new directions in clinical research of social skills from a behavior-analytic standpoint. Keywords: assertiveness; aggressiveness; passiveness; self-control; conflict of consequences. 1 Este artigo reproduz partes da Dissertação de Mestrado apresentada pela primeira autora ao Programa de Pós-Graduação em Teoria e Pes- quisa do Comportamento, Universidade Federal do Pará, e orientada pelo segundo autor. Trabalho parcialmente financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, CNPq (Bolsa de Mestrado, Processos 305743/2004-0 e 470802/2004-9). 2 Endereço para correspondência: Rua Padre Willian Silva, 39. Bairro Planalto. Belo Horizonte, MG. CEP 31.720-060. Telefone: (31) 3495-

  1. E-mail: vivianpsi@yahoo.com.br. A questão da expressão adequada de sentimentos, contemporaneamente abordada na terapia comportamental com o conceito de assertividade, vem sendo estudada pela Psicologia há quase cinquenta anos. Buscando promover comportamentos assertivos, muitas definições já foram propostas, diversos inventários foram criados e treinamen- tos foram desenvolvidos para indivíduos com dificuldades para expressar seus sentimentos em situações interpessoais (e.g. Alberti & Emmons, 1970/1978; Lazarus, 1971/1980; Wolpe, 1973/1980). Dentre as diversas definições propostas para o comportamento assertivo, interessa-nos especial- mente a de Rich e Schroeder (1976), de acordo com a qual a assertividade consiste de repertórios autodescritivos eficazes em contextos sociais específicos. Como se verá adiante, tal definição oferece uma visão mais funcional no sentido de indicar variáveis controladoras do comporta- mento assertivo, portanto mais coerente com a Análise do Comportamento, abordagem na qual se apoia o presente trabalho. O comportamento assertivo pode envolver a produção de consequências reforçadoras diversas tanto para o indivíduo que age assertivamente, quanto para o grupo com o qual interage. O comportamento assertivo pode também produzir consequências aversivas, sendo que ambas – as reforçadoras e as aversivas – podem constituir um produto imediato ou atrasado desse comportamento. O presente artigo analisa o tema da assertividade, ou os padrões que se tornaram socialmente eficazes de expressão de sentimentos na cultura ocidental moderna por meio do exame de processos comportamentais descritos como “autocontrole”. Assim, espera-se contribuir para uma espe- cificação das relações comportamentais que possivelmente definem assertividade. O aspecto central da análise a ser desenvolvida consiste das possíveis relações entre assertivi- dade e autocontrole, uma relação pouco referida na literatura sobre assertividade. Ao explorar essas relações, o que se busca é promover a articulação de duas áreas de pesquisa bastante relevantes na psicologia e, com isso, aumentar o alcance de uma apreciação dos fenômenos relativos à as- sertividade, por exemplo, no contexto clínico onde o tema é recorrente.

V. Marchezini-Cunha & E.Z. Tourinho

Assertividade

A maior concentração de publicações sobre compor- tamento assertivo pode ser situada nas décadas de 1970 e 80, período no qual se encontram muitos trabalhos sobre definições do comportamento assertivo (e.g., Alberti & Em- mons, 1970/1978; Lazarus, 1971/1980; Wolpe, 1973/1980), o treinamento assertivo e os prováveis determinantes de sua eficácia (e.g., Eisler, Hersen & Miller, 1973; Kazdin, 1974; McFall & Lillesand, 1971; Pitcher & Meickle, 1980; Zollo, Heimberg & Becker, 1985). As definições propostas nessa época tornaram-se clássicas e orientam ainda hoje tanto pesquisas quanto a prática da Terapia Comportamental. No entanto, dentre tantas publica- ções é difícil encontrar trabalhos que examinem criticamente o próprio conceito de assertividade, principalmente se o pesquisador busca trabalhos realizados sob o enfoque da Análise do Comportamento. Também não são tão numerosos os trabalhos que examinam a relação entre a demanda por comportamentos assertivos e as contingências socioculturais às quais os indivíduos estão expostos. Segundo as definições clássicas, o comportamento assertivo seria a expressão de sentimentos de maneira socialmente adequada, preservando tanto os direitos/inte- resses do indivíduo que responde assertivamente quanto os de seu interlocutor. Sob o ponto de vista da Análise do Comportamento, as definições clássicas são insatisfatórias para uma compreensão do comportamento assertivo por serem vagas, pouco operacionais (cf. Heimberg, Mon- tgomery, Madsen Jr. & Heimberg, 1977; Martinez, 1997; Rich & Schroeder, 1976) e muito baseadas na topografia da resposta. Contudo, Rich e Schroeder definem assertividade de acordo com critérios funcionais, propondo que se trata de uma “habilidade para procurar, manter ou aumentar o reforçamento em uma situação interpessoal por meio da expressão de sentimentos ou desejos quando tal expressão envolve riscos de perda de reforçamento ou até de punição” (p. 1082). Ou seja, diante de uma situação interpessoal na qual respostas passivas ou agressivas produziriam punição ou perda de reforçamento, uma resposta assertiva é aquela que garante a produção, manutenção ou aumento de refor- çadores. Com essa definição, Rich e Schroeder identificam o ambiente no qual o comportamento ocorre (social), o tipo de resposta emitida (verbalização de sentimentos), as consequências prováveis (punição ou perda de refor- çamento) e as consequências produzidas pelo comporta- mento, necessárias para sua caracterização como assertivo (produção, manutenção ou aumento de reforço positivo). Uma definição que identifique as variáveis controladoras do comportamento assertivo é relevante na medida em que traz para o ambiente da Análise do Comportamento a investigação acerca desse comportamento, propiciando aos terapeutas analítico-comportamentais uma prática mais coerente. Pesquisas experimentais têm possibilitado a identificação de dimensões do comportamento assertivo e de variações destas em diferentes contextos de interação social (e.g., Alberti, 1977; Arrindell, Sanderman, Van Der Molen, Van Der Ende & Mersch, 1988; Lorr & More, 1980), contribuindo para uma compreensão mais completa acerca do comportamento assertivo. Especificações do comportamento assertivo O comportamento assertivo é frequentemente contrastado com os comportamentos agressivo e passivo. Na literatura da terapia comportamental é muito comum encontrar definições desses comportamentos baseadas em suas características topográficas. Assim, comportamentos assertivos tendem a se caracterizar por maior contato visual entre o indivíduo assertivo e seu interlocutor, maior uso de afirmações do- tadas de afeto, tom de voz audível, verbalizações de maior duração, uso adequado de características paralinguísticas da fala (como fluência, variabilidade de expressões, vivacidade) (cf. revisão de literatura realizada por Rich & Schroeder, 1976). A postura corporal, os gestos utilizados, a distância do interlocutor e as expressões faciais do indivíduo também são diferentes entre o comportamento assertivo e os compor- tamentos agressivos e passivos. Segundo Hull e Schroeder (1979), são características típicas do comportamento passi- vo: não olhar o interlocutor diretamente nos olhos; usar um tom de voz suave, hesitante, com uma pequena entonação que transmite vacilação; falar de maneira pouco clara e se posicionar curvadamente, sem encarar o interlocutor. Já no comportamento agressivo, de acordo com os autores, o indivíduo ‘tem um olhar fulminante’; usa um tom de voz que transmite raiva e ressentimento; fala muito alto e sem hesitação, encara o interlocutor e fala imediatamente, quase interrompendo o interlocutor (cf. Hull & Schroeder). Apesar de caracterizações topográficas ajudarem na identificação daqueles tipos de comportamentos, suas di- mensões funcionais são reconhecidamente relevantes. De um ponto de vista funcional, um aspecto importante a ser considerado é que respostas assertivas/agressivas/passivas produzem consequências variadas. Por exemplo, quando um indivíduo informa que está cansado demais para aceitar um convite para um passeio, essa resposta pode produzir tanto a evitação de um programa que seria aversivo naquele contexto, como críticas de seus amigos e ameaças de não mais convidá-lo para nada. Alguém que, no mesmo contexto, aceita o convite, pode produzir a aprovação dos amigos, mas, também, a condição aversiva de passear quando preferiria estar descansando. Uma tentativa de classificar os tipos de consequências produzidas por comportamentos assertivos/agressivos/passi- vos consiste em diferenciá-las quanto à questão da aprovação social. Assim, em termos funcionais, pelo menos dois con- juntos de consequências da assertividade/agressividade/pas- sividade são referidos na literatura: (a) as consequências de aprovação/desaprovação; e (b) outras consequências (adiante referidas como consequências reforçadoras ou aversivas diversas). As consequências diversas “poderão ser entendi- das como satisfação de outras necessidades, consequências mediadas socialmente ou não, mas em sentido diverso àquele específico de aprovação/desaprovação” (Marchezini-Cunha, 2004, p. 3). Os dois conjuntos de consequências se combinam na manutenção de cada comportamento (assertivo, agressivo ou passivo). As combinações entre as consequências serão discutidas adiante. Antes de avançar na análise das consequências da asser- tividade/agressividade/passividade para o indivíduo , será necessário considerar outra diferenciação importante. Por

V. Marchezini-Cunha & E.Z. Tourinho agressivas, quanto consequências aversivas diversas, que seriam produzidas por respostas passivas). Pode-se ainda supor que indivíduos assertivos respondam dessa maneira sob controle de contingências sociais adicio- nais àquelas referidas até aqui (de aprovação/desaprovação). Nesse sentido, cabe uma análise de aspectos culturais na determinação de comportamentos assertivos. A função de aspectos culturais na demanda por comportamentos assertivos A produção de consequências de aprovação/desaprovação social por comportamentos assertivos, agressivos e passivos envolve aspectos mais complexos do que a questão de agradar ou não ao interlocutor, por exemplo. Um comportamento será reforçado ou não socialmente dependendo de seus efeitos para a sobrevivência da cultura, se são positivos ou nega- tivos. Os parâmetros para a avaliação desses efeitos como positivos ou negativos são encontrados nas normas e valores de cada cultura, os quais podem variar. No que diz respeito à assertividade, nem todas as culturas compartilham com as culturas europeia e norte-americana a crença na necessidade de defender os próprios direitos e de proteger os próprios sentimentos. Alguns comportamentos que nessas culturas são considerados assertivos, em outras culturas são vistos como agressivos, desrespeitosos ou até desnecessários; além disso, comportamentos que as culturas européia e norte- americana caracterizam como desprovidos de habilidades sociais podem ser adequados em outras culturas (cf. Chan, 1993; Furnham, 1979). Nas sociedades ocidentais modernas, fatores como a grande valorização da individualidade, da privacidade, da capacidade pessoal de alcançar bens materiais e bons re- lacionamentos interpessoais independentemente da classe social de origem envolvem – e até requerem – a expressão de sentimentos de maneira adequada. Comportamentos assertivos teriam, então, a função de preservar as noções de individualidade e privacidade na medida em que ressaltam a diferenciação do indivíduo dos demais. Ao defender seus direitos e expressar seus sentimentos de maneira contida, o indivíduo age como se estivesse demarcando seu espaço e estabelecendo até onde o grupo pode controlar seu compor- tamento. A partir desse limite, para o indivíduo, a fonte de controle estaria em contingências não sociais – erroneamente o indivíduo ocidental acredita que o que ocorre em seu am- biente privado não tem relação com contingências sociais, e sim com construtos como a mente, o self ou a personalidade (para uma discussão mais ampla acerca das noções de priva- cidade e interdependência na sociedade ocidental moderna, ver Tourinho, 2009). O controle social do comportamento assertivo fica ainda mais claro quando se observa que respostas de expressão de sentimentos só são reforçadas socialmente se produzirem pouca ou nenhuma estimulação aversiva para o grupo. Ao apelar para a questão do respeito aos direitos interpessoais, o grupo promove comportamentos assertivos e assim evita a estimulação aversiva produzida por comportamentos agressivos. Heimberg e cols. (1977) salientam que: claramente, o conceito de direitos interpessoais coloca o comportamento assertivo dentro de um arcabouço orientado por valores moralistas. Comportamento assertivo é visto como ‘bom’ porque os direitos de cada interessado são protegidos. Comportamentos passivos e agressivos são vistos como ‘maus’ porque os direitos de uma das partes envolvidas são ignorados ou violados. (p. 954) Considerando os efeitos de respostas passivas e agressivas para o grupo, é aparentemente muito mais interessante para o grupo suprimir ou evitar comportamentos agressivos, pela magnitude ou extensão das consequências desses compor- tamentos. Quando um indivíduo se comporta passivamente, deixa de produzir consequências reforçadoras diversas para si, no entanto produz reforçadores diversos para o grupo. As consequências aversivas dos comportamentos passivos geram para o indivíduo sentimentos de fracasso, baixa autoestima, ansiedade, formulação de autorregras depreciativas etc (cf. Schwartz & Gottman, 1976; Zollo & cols., 1985). O que muitas vezes não se leva em conta é que comportamentos passivos produzem, sim, consequências aversivas para o grupo, especialmente no longo prazo. Membros passivos não ajudam o grupo a enfrentar seus problemas e produzir soluções. Por exemplo, quando não consegue dizer “não” às agressões de outro membro do grupo, ou até de uma agência de controle, o indivíduo passivo está permitindo que comportamentos agressivos continuem sendo emitidos, e que contingências coercitivas continuem controlando não só o seu comportamento, mas o comportamento do grupo. A emissão de respostas assertivas seria, então, uma maneira de o grupo não só evitar as consequências aversivas imediatas do comportamento agressivo, como, também, promover o bem estar do indivíduo e do grupo em longo prazo. Até este ponto da análise, foram consideradas algumas variáveis relevantes para a emissão do comportamento as- sertivo: a produção de consequências reforçadoras diversas de magnitude média, quando comparado ao comportamento agressivo; a produção de aprovação social, também de mag- nitude média, quando comparado ao comportamento passivo; a produção de consequências reforçadoras para o grupo, preservando as noções de individualidade e privacidade presentes na sociedade ocidental moderna. A questão da produção de consequências para o indiví- duo versus para o grupo aproxima a noção de assertividade da noção de autocontrole. Além dessa questão, também a da imediaticidade versus atraso do reforço (mencionada brevemente nesta seção) constitui um aspecto comum aos dois temas. Nas seções seguintes, discutem-se a abordagem analítico-comportamental para o autocontrole e a possibili- dade de interpretar assertividade/agressividade/passividade como relações comportamentais pertinentes ao tema do autocontrole.

Autocontrole

A interpretação analítico-comportamental para o autocon- trole focaliza basicamente circunstâncias em que há dois tipos de conflitos de consequências produzidas pelo responder do indivíduo: consequências imediatas versus consequências

Assertividade e Autocontrole atrasadas e consequências para o indivíduo versus conse- quências para o grupo (cf. Hanna & Todorov, 2002; Nico, 2001; Rachlin, 1991; Skinner, 1953/2000, 1968/2003). Os parágrafos seguintes explicam essa abordagem. Nico (2001) sistematiza as considerações que Skinner fez, ao longo de sua obra, a respeito das contingências que produzem o comportamento de autocontrole. Segundo Nico, “para Skinner, o conflito entre as consequências do comportamento está na raiz de toda e qualquer forma de autocontrole” (p. 64). As relações de autocontrole podem ser didaticamente categorizadas da seguinte maneira: (1) situações nas quais o autocontrole é originado somente do conflito entre as consequências diretas do comportamento do indivíduo e (2) situações nas quais o conflito entre as consequências do comportamento é acentuado por sanções éticas impostas pelo grupo. As situações da categoria (2) podem ser ainda subdivididas em: (a) conjunto de condições sob as quais o grupo impõe sanções éticas como forma de facilitar o auto- controle e assim “proteger” o indivíduo das consequências aversivas de seu comportamento impulsivo e favorecer um comportamento vantajoso para o indivíduo (neste caso, as consequências afetam diretamente apenas o próprio indiví- duo; o grupo intervém apenas para proteger o indivíduo); e (b) conjunto de condições sob as quais as sanções éticas visam à promoção do autocontrole, evitando assim consequências que seriam reforçadoras para o indivíduo, mas aversivas para o grupo (situação em que há o conflito entre consequências para o indivíduo e consequências para o grupo). É este último conjunto de condições que nos interessa particularmente no presente estudo, uma vez que aborda diretamente a questão da produção de reforçadores para o indivíduo e para o grupo, questão envolvida no conceito de assertividade. Tal conjunto de condições constitui autocontrole como autogerenciamento ético (cf. Skinner, 1968/2003). No exemplo que nos interessa, as sanções éticas são es- tabelecidas não só com o objetivo de “proteger” o indivíduo das consequências aversivas de seu próprio comportamento, mas também de proteger os interesses do próprio grupo, que é de algum modo estimulado aversivamente pelo com- portamento impulsivo do indivíduo. Sanções éticas podem ser compreendidas como estímulos aversivos dispostos pelo grupo, contingentes a uma resposta impulsiva, com a função de reduzir a frequência dessa resposta. Podem também ser interpretadas como regras, alterando a função de certos estímulos, colocando assim o comportamento do indivíduo sob controle de estímulos que não o controlariam sem a regra. Assim, o conjunto de condições correspondente à ca- tegoria 2b “é composto por condições nas quais o mesmo comportamento que constitui ‘vantagem para o indivíduo’ implica ‘desvantagem para o grupo’” (Nico, 2001, p. 74). Nessas condições, o comportamento vantajoso para o indi- víduo pode ser consequenciado por reforçadores primários imediatos como comida, sexo, autoproteção (por meio de comportamentos agressivos, por exemplo), que, se no pas- sado eram essenciais para o homem, hoje em dia implicam consequências aversivas para o grupo, como obesidade, superpopulação e contatos sociais agressivos. Muitas dessas consequências aversivas para o grupo são produzidas pelo comportamento de mais de um indivíduo e no longo prazo, às vezes com um atraso tão grande que os próprios indiví- duos que as produzem não chegam a entrar em contato com elas, o que diminui ainda mais a probabilidade de emissão de respostas autocontroladas. Segundo Nico, “neste segundo caso é ainda menos provável que o indivíduo se autocontrole, sendo o planejamento de consequências especiais, na forma de sanções éticas, o único modo possível de estabelecer tal comportamento” (p. 77). As sanções éticas exercem então a função de trazer, para o presente, estimulações aversivas (contingentes à impul- sividade) que aumentem a probabilidade de autocontrole. Diante disso, Nico (2001) destaca que o comportamento de autocontrole “pode ser definido como um comportamento de esquiva socialmente instalado e que aparece sob condições muito particulares: as de conflito entre consequências” (p. 85). Mais especificamente, o autogerenciamento ético diz respeito ao conflito entre consequências para o indivíduo e para o grupo. Situações regulamentadas por leis são exemplos claros de autogerenciamento ético. Nessas situações, o indiví- duo comporta-se de maneira autocontrolada sob controle das consequências aversivas impostas ou descritas pelo grupo, embora imediatamente as consequências produzidas pelo comportamento impulsivo sejam mais vantajosas. Para Rachlin (1991), o conflito entre consequências tam- bém é algo fundamental para a emissão de comportamento de autocontrole. A questão temporal envolvida nesse conflito é enfatizada pelo autor. De acordo com Rachlin, autocontrole é o ato de emitir uma dada resposta sob controle de conse- quências ambientais temporalmente atrasadas quando esta concorre com outra resposta sob controle de consequências temporalmente restritas ou imediatas. Aliada à questão tem- poral está a magnitude da consequência: a resposta controlada seria aquela que produz consequências de maior magnitude e no longo prazo. Já a resposta impulsiva produz consequências de menor magnitude e imediatas Rachlin (1991) lança mão do conceito de “desconto” a fim de calcular o valor reforçador de uma consequência e assim prever o grau de controle que ela exercerá sobre o comportamento. Segundo o autor, o valor reforçador de uma consequência é dado pela relação entre magnitude e atraso, sendo diretamente proporcional à magnitude e inversamente proporcional ao atraso. Assim, o indivíduo compararia o valor de uma consequência atrasada, descontado o custo da espera, com o valor de uma consequência imediata. Se, ainda assim, o valor reforçador da consequência atrasada for superior, a resposta emitida será a autocontrolada; por outro lado, se seu valor for inferior, não compensando o custo da resposta de esperar, a resposta emitida será a impulsiva. Numa análise sobre o autocontrole como um comporta- mento vantajoso para o grupo, Rachlin (1991) afirma que o conflito entre consequências imediatas e atrasadas que afetam o mesmo indivíduo é análogo ao conflito entre consequên- cias para o indivíduo e para o grupo. Segundo a analogia de Rachlin, em situações envolvendo o indivíduo e o grupo, a resposta impulsiva é aquela que produz consequências ime- diatas, de menor valor reforçador para o próprio indivíduo, enquanto a resposta de autocontrole é aquela que produz consequências no longo prazo, de maior valor reforçador para o grupo como um todo (incluindo o próprio indivíduo).

Assertividade e Autocontrole ências de aprovação social produzidas pelo comportamento assertivo podem situar-se em um ponto intermediário entre as consequências de respostas passivas e as consequências de respostas agressivas. As consequências da resposta assertiva também podem ser descritas de acordo com a população afetada por elas. Assim, diz-se que a Rass produz reforçadores positivos de magnitude moderada para o indivíduo (SR+ indiv) e reforçadores positivos de magnitude moderada para o grupo (SR+ grupo) (cf. Lorr & More, 1980). O comportamento agressivo pode ser descrito como uma resposta (Ragr) emitida necessariamente numa situação inter- pessoal de risco (SD social), produzindo consequências reforça- doras diversas (SR++ diversas) e consequências de desaprovação social aversivas (SR-- desap), ambas de grande magnitude. Diz-se que uma resposta agressiva produz reforçadores positivos para o indivíduo (SR+ indiv) e consequências aversivas para o grupo (SR- grupo) (cf. Epstein, 1980; Hull & Schroeder, 1979). Já o comportamento passivo pode ser descrito como resposta (Rpas) emitida necessariamente numa situação interpessoal de risco (SD social), produzindo consequências diversas aversivas (SR-- diversas) e consequências reforçadoras de aprovação social (SR++ aprov), ambas de alta magnitude. Especificando-se a população afetada, diz-se que a resposta passiva produz, do ponto de vista imediato, consequências (diversas) aversivas para o indivíduo (SR- indiv) e reforçadores positivos para o grupo (SR+ grupo) (cf. Epstein, 1980; Hull & Schroeder, 1979). Uma sistematização das respostas asser- tiva, agressiva e passiva, com relação a população afetada, tipo e imediaticidade das consequências produzidas é apre- sentada na Tabela 2. As descrições possibilitam uma noção mais clara a respeito da relação entre assertividade e autocontrole, pelos seguintes aspectos: (a) assertividade e autocontrole são rela- ções comportamentais produzidas em ambientes sociais, que (b) envolvem a produção de consequências para o indivíduo e para o grupo e que (c) favorecem diferencialmente o grupo. Também os padrões de resposta concorrentes ou alternativos ao autocontrole e à assertividade (comportamento impulsi- vo, no caso do autocontrole e comportamentos agressivo e passivo, no caso da assertividade) compartilham aquelas características, à exceção do favorecimento do grupo. As semelhanças entre o comportamento assertivo e o de auto- controle sugerem que a assertividade constitui uma instância de resposta autocontrolada, bem como os comportamentos agressivo e passivo funcionariam como “instâncias interpes- soais” de comportamento impulsivo. Tal qual o comportamento de autocontrole, o comporta- mento assertivo configura-se mais vantajoso para o grupo do que uma resposta impulsiva (a resposta agressiva). O compor- tamento passivo requer uma análise mais detalhada. Em uma análise apressada poder-se-ia supor que a resposta passiva não constitui um tipo de resposta impulsiva, representando vantagem maior para o grupo do que a resposta assertiva. No entanto, no caso da resposta passiva, torna-se importante ob- servar como se articula ao conflito de consequências a questão temporal assinalada por Rachlin (1991). Isto é, respostas passivas são mais vantajosas para o grupo apenas do ponto de vista imediato. No longo prazo, a passividade representa uma dependência onerosa do indivíduo em relação ao grupo (considerem-se, a propósito, as consequências atrasadas, para os pais e para a sociedade, do fortalecimento de um padrão passivo de comportamento de crianças na infância). Considerando-se as consequências atrasadas, portanto, será mais vantajoso para o grupo, pelo menos em uma cultura “ocidentalizada”, contar com indivíduos que se comportem assertivamente, produzindo consequências positivas para si e para o grupo. Um aspecto dessa análise que requer exame adicional é o fato de que, por essa ótica, agressividade e pas- sividade constituiriam, ambas, instâncias de comportamento impulsivo, diferindo com respeito às modalidades e ao atraso das consequências. A questão é que esses padrões diferem, substancialmente, também, com respeito à topografia das respostas, com base na qual mais frequentemente o leigo categoriza um comportamento como agressivo ou passivo. Trata-se, enfim, de um problema que merece ser examinado com maior detalhamento em trabalho que dê continuidade a este curso de análise. Resumindo, então, respostas assertivas produzem con- sequências reforçadoras diversas e consequências de apro- vação social que, imediatamente, podem não ter a mesma magnitude daquelas que seriam produzidas por respostas Tabela 1. Tipos de consequências produzidas por respostas impulsivas e autocontroladas. RESPOSTAS CONSEQUÊNCIAS População afetada Tipo de consequência Tempo Impulsiva Indivíduo Positiva Negativa Imediata Atrasada Grupo Negativa Atrasada Autocontrolada Indivíduo Negativa Positiva Imediata Atrasada Grupo Positiva Atrasada

V. Marchezini-Cunha & E.Z. Tourinho agressivas ou passivas. Mesmo diante da possibilidade de produzir imediatamente consequências reforçadoras de grande magnitude – de aprovação social, se a resposta for passiva; e consequências diversas, se a resposta for agressiva

  • o indivíduo pode emitir uma resposta assertiva, instalada sob controle de regras ou contingências.

Conclusão

As referências ao autocontrole foram orientadas, ao longo do presente artigo, pelo objetivo de contribuir para a interpretação da assertividade. Embora esse percurso analítico tenha conduzido a digressões por vezes distantes do tema da assertividade, buscamos sugerir certas relações comportamentais em que pode se basear uma interpretação do responder assertivo, consistente conceitualmente com princípios da Análise do Comportamento. Certamente, a literatura sobre assertividade remete a questões mais diversas do que aquelas aqui mencionadas. Desse ponto de vista, a análise apresentada constitui apenas um ponto de partida para uma apropriação mais ampla do tema da assertividade na literatura analítico-comportamental. A análise desenvolvida baseou-se em pesquisas empíricas realizadas por terapeutas comportamentais (não necessaria- mente analítico-comportamentais) e em trabalhos conceituais Tabela 2. Tipos de consequências produzidas por respostas passivas, agressivas e assertivas. RESPOSTAS CONSEQUÊNCIAS População afetada Tipo de consequência Magnitude Tempo Passiva Indivíduo Negativas diversas Alta Imediata Positivas sociais Alta Imediata Grupo Positiva ---- Imediata Negativa ---- Atrasada Agressiva Indivíduo Positivas diversas Alta Imediata Negativas sociais Alta Atrasada Grupo Negativa ---- Imediata Negativa ---- Atrasada Assertiva Indivíduo Positivas diversas Moderada Imediata Positivas sociais Moderada Imediata Grupo Negativa ---- Imediata Positiva ---- Atrasada