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Este documento discute as complexidades linguísticas de megacidades, que afetam significativamente as operações militares. O artigo apresenta um modelo analítico proposto pelo chefe de estado-maior do grupo de estudos estratégicos do exército dos eua para estudar as diversas dimensões de megacidades a partir de uma perspectiva militar. Além disso, o texto aborda como o entendimento do panorama linguístico de uma megacidade pode ajudar a visualizar futuras operações militares e aplicar o modelo sugerido.
O que você vai aprender
Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas
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MILITARY REVIEW Março-Abril 2016 101
desafio de conduzir futuras operações militares dentro de megacidades (cidades com populações de mais de 10 milhões de habitantes) consiste em entender as complexidades dinâmicas e multidimensionais dessas áreas urbanas. Quer sejam voltadas ao combate quer não, as opera- ções militares em megacidades serão semelhantes às
conduzidas em outros ambientes urbanos, mas serão complicadas por fatores exclusivos de seu ambien- te1, que incluem a expansão geográfica, o volume e densidade populacional, a diversidade sociocultural e socioeconômica, os desafios relativos à governança, diferentes qualidades de infraestrutura e a (inter) conectividade regional e global.
Uma rua apinhada típica de Mumbai, capital do Estado indiano de Maharashtra e cidade mais densamente povoada da Índia, 31 Jan 06. Embora a língua oficial de Mumbai seja o marathi, são utilizados 16 idiomas principais em toda a cidade, além de vários dialetos e deriva- dos pidgin (mistura de línguas). (Foto de Hitesh Ashar via Wikimedia Commons)
Visão panorâmica das favelas de Mumbai, 09 Fev 06. (Foto de Joel Newel)
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O modelo analítico proposto pelo Chefe de Estado-Maior do Grupo de Estudos Estratégicos ( Strategic Studies Group — SSG ) do Exército dos Estados Unidos da América (EUA) oferece uma base sólida para o estudo das diversas dimensões das megacidades a partir de uma perspectiva mi- litar2. Assim, as megacidades são ambientes com- plexos e dinâmicos, que exigem uma visão holística de suas partes inter-relacionadas. Para incentivar um “novo pensamento” e “concentrar esforços”, o SSG identifica cinco componentes centrais (con- texto, escala, densidade, conectividade e fluxo), que ajudam a considerar as megacidades como sistemas fracamente, moderadamente ou extremamente integrados. Ainda que esse enfoque incentive, acertada- mente, uma abordagem holística para a análise das megacidades, há um elemento notadamente ausente do modelo sugerido: o idioma. Embora esse aspecto do terreno humano possa estar implícito no compo- nente “contexto”, a diversidade linguística das mega- cidades terá implicações para vários componentes desse modelo, incluindo contexto, conectividade, escala e fluxo. Este artigo discutirá as característi- cas linguísticas dinâmicas das megacidades e como um entendimento desse panorama linguístico pode ajudar a visualizar as futuras operações militares e a aplicar o modelo sugerido.
Antes de mais nada, as megacidades são, predo- minantemente, multilíngues. Embora se possa dizer o mesmo das cidades grandes em geral, a escala do multilinguismo nas megacidades amplia seus efeitos. Por exemplo, em Nova York — uma mega- cidade metropolitana com mais de 18 milhões de habitantes —, nove idiomas estrangeiros são falados por comunidades de cem mil pessoas ou mais3. A língua também exerce um papel em determinar a identidade de um indivíduo e a comunidade lin- guística mais ampla em que ele decide viver. Por exemplo, a maioria dos falantes de russo em Nova
York costuma morar no sul do Brooklyn e em Staten Island, ao passo que os falantes de chinês tendem a concentrar-se em Manhattan e Sunset Park4. Nas megacidades, o idioma, a cultura e o contexto regio- nal caminham de mãos dadas, indo, muitas vezes, além de identidades étnicas5. Para compreender, plenamente, o contexto de uma megacidade, precisamos entender o papel das línguas utilizadas em suas comunidades. Como as comunidades linguísticas interagem nas megacida- des? Que tensões são geradas pelas várias comuni- dades linguísticas no espaço urbano? Que papel o idioma desempenha nas estruturas de poder (gover- namentais ou não) das megacidades? Que desafios são gerados pelo multilinguismo na coleta e disse- minação de informações, na prestação de assistência social ou na resposta a desastres? Embora não possa responder, completamente, a todas essas perguntas, este artigo demonstrará por que o panorama linguístico das megacidades consti- tui uma consideração importante para os decisores do segmento militar.
A implementação de uma política de língua ofi- cial permite que um país regulamente qual idioma ou idiomas utilizará para interagir com seus habi- tantes. Embora essas políticas possam proporcionar informações úteis sobre o ambiente linguístico den- tro de um país, isso geralmente não basta para que se possa compreender, totalmente, o multilinguismo próprio de uma megacidade. Os idiomas oficiais da Índia são, por exemplo, o hindi (principal) e o inglês (secundário)6. Contudo, em Mumbai, uma megacidade costeira com uma população metropolitana de mais de 21 milhões de habitantes espalhados em uma área de cerca de 600 km2, o marathi serve como uma terceira língua oficial7. Para muitos em Mumbai, o marathi, idioma nativo do Estado de Maharashtra, é falado em casa, ao passo que o inglês e o hindi são, frequentemente, ensinados apenas como segundas línguas, podendo ou não ser utilizados oficialmente8. Além disso,
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conforme mais e mais indianos migram para Mumbai, vão levando consigo seus idiomas regionais, transfor- mando a cidade em um microcosmo do multilinguismo indiano. Portanto, na Índia, o multilinguismo deve ser assu- mido não apenas em um plano abstrato, mas também no administrativo. A figura 1 apresenta uma represen- tação gráfica dos diversos grupos linguísticos do país. Para responder ao desafio, a constituição indiana o di- vide, administrativamente, em Estados etnolinguísticos, conferindo a cada um deles a liberdade de acrescentar sua própria língua regionalmente significativa à lista das oficiais, institucionalizando, assim, os idiomas regionais na identidade nacional indiana9.
Quer as operações militares nas megacidades se concentrem na busca de Inteligência, quer na resposta a desastres, quer no combate, será preciso interagir com habitantes pertencentes a comunidades de diferentes línguas regionais a fim de estabelecer os relacionamen- tos necessários para o êxito da missão. Reconhecer as línguas regionais existentes em uma megacidade terá implicações práticas para a criação de um treinamen- to pré-desdobramento adequado de familiarização linguística e cultural, identificação de capacidades de apoio a distância e formação de um quadro efetivo de intérpretes das Forças Armadas e do país anfitrião.
O idioma também desempenha um papel nas estruturas de poder que operam e exercem influên- cia dentro e entre as comunidades linguísticas nas megacidades. Uma análise sobre como essas estruturas de poder (ex.: organizações governamentais, educacio- nais, religiosas, tribais ou sociais) operam e interagem dentro das comunidades de uma megacidade pode revelar os desafios operacionais que o Exército talvez enfrente nesses ambientes. Por exemplo, em Lagos, na Nigéria, outra megaci- dade costeira onde o inglês é a língua oficial, muitos habitantes falam ioruba, idioma nativo com fortes laços históricos e culturais com a região10. Embora o inglês seja utilizado oficialmente por organizações governamentais e educacionais, não falar ioruba é algo malvisto por muitos11. As organizações religiosas em
Lagos também promovem o uso de línguas nativas, com alguma influência dos principais idiomas estran- geiros ligados a cada religião (ex.: o árabe no caso de grupos islâmicos e o inglês entre os grupos cristãos)12. Em muitas megacidades, o contato entre diversos idiomas dentro do espaço urbano produz desafios únicos para as estruturas de poder. Em Lagos e em Mumbai, megacidades situadas em países com o que podem ser consideradas economias em desenvolvi- mento, grande parte de seu crescimento se deve à migração interna no país. Como as línguas que entram em contato nessas megacidades são semelhantes (con- sistindo, muitas vezes, em dialetos de uma ou mais línguas regionais), há um grande aprendizado mútuo desses idiomas13. Entretanto, em Nova York — uma megacidade extremamente integrada, de um país com uma economia bem desenvolvida —, uma porcenta- gem consideravelmente maior de crescimento advém da imigração14. Isso levou a um multilinguismo mais variado. Em consequência, as estruturas de poder precisam se esforçar mais para assegurar a cooperação entre e junto aos grupos linguísticos. Organizações sociais, como o Shorefront Community Center, em Brighton Beach, uma grande comunidade de falantes de russo no sul de Brooklyn, ou o Chinese Community Center, em Manhattan, fornecem acesso a serviços e assistência nos respectivos idiomas para aqueles que tenham baixa proficiência no inglês15. Além disso, essas organizações servem, muitas vezes, como elos vitais entre as comunidades linguísti- cas e as organizações governamentais locais e fede- rais. O Centro de Recuperação do Sul de Brooklyn, estabelecido pela Agência Federal de Gestão de Emergências ( Federal Emergency Management Agency — FEMA ) após o furacão Sandy, foi instalado dentro do Shorefront Community Center e se apoiou em seus conhecimentos especializados para coordenar a resposta ao desastre junto à comunidade de língua russa16. Observa-se um outro exemplo de parceria entre governo e organizações públicas no Departamento de Polícia da Cidade de Nova York ( New York City Police Department — NYPD ), que, há pouco tempo, reconheceu, formalmente, a Associação de Policiais Russo-Americanos ( Russian-American Officers Association — RAOA ) como uma de ordens frater- nas17. O NYPD, que reconheceu 31 organizações
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desse tipo, apoia-se na RAOA para se comunicar com a comunidade de falantes de russo e “promover a cooperação com os órgãos de segurança pública”18. Entender como as estruturas de poder operam dentro das megaci- dades pode fornecer informações vitais para os decisores militares. Embora seja importante conhecer as áreas administrativas oficiais de uma megacidade (os cinco distritos de Nova York, as 16 áreas gover- namentais locais de Lagos ou as 23 divisões municipais de Mumbai), é igualmente fundamental iden- tificar onde as comunidades linguísticas estão localizadas em relação a elas. Isso contribuirá para o estabelecimento de parcerias efetivas com as estruturas de poder relevantes (governamentais ou não) nos vários níveis da sociedade de uma megacidade19.
O modo pelo qual a energia e os materiais fluem através das megacidades é um aspecto impor- tante para a compreensão de seu metabolismo. Além desses bens físicos, o fluxo de informações pode revelar o possível grau de conexão e integração de uma megacidade. As informações fluem bem entre as estruturas de poder e seus públicos? Como são compartilhadas dentro e entre as comunidades? Qual é o papel das mídias sociais e de massa? Qual é o grau de acesso às tecnologias de comunicação (ex.: celula- res, computadores, internet)? No âmago dessas questões estão as práticas linguís- ticas e de comunicação dentro de uma megacidade. O fluxo multilíngue de informações de uma megacidade pode ser um dado difícil de analisar, especialmente a distância. Ainda que dados estatísticos sobre o uso de telecomunicações móveis e a ampliação da cobertu- ra de internet de banda larga possam ser utilizados
para discutir o fluxo geral de informações, eles não oferecem um grande entendimento sobre o caráter multilíngue dos fluxos através dessas redes. O uso de idiomas na televisão, rádio ou veículos da imprensa, assim como a proliferação e a utilização de mídias sociais em megacidades selecionadas, pode ser mais revelador. A título de ilustração, em Mumbai, a mídia im- pressa é publicada em hindi, marathi, inglês e outros idiomas locais. O número de leitores das fontes de notícias em hindi e outros idiomas locais é maior que os de veículos da mídia em inglês20. Por outro lado, em Lagos, as notícias impressas são, em geral, publicadas em inglês21. As estações de rádio e televisão de ambas as cidades também transmitem em vários idiomas.
Bhili
Idiomas hindi
Assames
Malayalam
Kannada
Gujarati
Urdu
Tâmil
Marathi
Telugu^ Bengali
(Dados do Censo Nacional Indiano (2001) via Mapsofindia.com)
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PERSPECTIVA LINGUÍSTICA
diferentes em um período de três anos26. Utilizando georreferências ( geotags ) embutidas nos tuítes, os pesquisadores os sobrepuseram (codificando por cor os dez idiomas mais comuns) a um mapa da cidade (veja a figura 2)27. Esses dados não apenas mostram a geografia linguística da cidade de Nova York, como também fornecem informações sobre a densidade de idiomas em pontos de acesso de comunicação (ex.: distrito dos teatros de Manhattan).
Um claro entendimento dos fluxos de informa- ções multilíngues dentro de uma megacidade aju- dará os decisores militares a compreender melhor como as comunidades linguísticas preferem receber e compartilhar informações. Esses dados fornecerão informações sobre como comunicar mais efetiva- mente com forças amigas ou interromper e manipu- lar as comunicações de forças inimigas. Os agentes de busca e analistas de Inteligência podem utilizar esses dados para concentrar e avaliar suas inicia- tivas. Os operadores de infraestrutura e logística podem utilizar esses dados para entender melhor outros dados sobre fluxos, como os de energia e de suprimentos.
O ambiente complexo e dinâmico das megacida- des é complicado ainda mais pelo panorama linguís- tico igualmente complexo nelas presente. Como par- te do contexto cultural e regional das megacidades, o idioma afeta vários componentes de uma abordagem holística quanto a seu estudo. Em comparação às ca- racterísticas multilíngues de outras cidades grandes, a escala do multilinguismo e seus efeitos nas megaci- dades exige particular atenção. Embora o panorama linguístico de cada megacidade seja diferente, os processos mais amplos descritos neste artigo podem servir como um ponto de partida para estudos adap- tados a megacidades individuais. De operações de contrainsurgência e busca de Inteligência à infraestrutura e resposta a desastres, as operações militares serão afetadas pelo singular ambiente operacional multilíngue das megacidades. Quer se trate de estabelecer relacionamentos efetivos com forças e estruturas de poder estratégicas, quer de minimizar tensões etnolinguísticas entre as comunidades de uma megacidade, quer de utilizar as práticas de comunicação existentes para nossa vantagem, o Exército dos EUA se beneficiará de um entendimento mais profundo do panorama linguísti- co das megacidades.
Jeff Watson, Ph.D., é professor catedrático de Linguística e Aquisição de Línguas no Centro de Línguas, Culturas e Estudos Regionais da Academia Militar de West Point, Estado de Nova York. Tem os títulos de mestre no en- sino de idiomas estrangeiros pelo Middlebury Institute of International Studies em Monterey e de doutor em Teoria Sociocultural e Aquisição de Segunda Língua pelo Bryn Mawr College. Além de lecionar Linguística e Russo em West Point, Watson conduz pesquisa aplicada em campos relacionados a línguas, conhecimentos regionais e cultura em contextos acadêmicos e militares.
in Every New York Neighborhood That Isn’t English or Spanish”, Business Insider, 6 August 2014, acesso 28 out. 2015, http://www. businessinsider.com/nyc-non-english-language-maps-2014-8; “New York-Languages”, City-Data website, acesso em 28 out. 2015, http://www.city-data.com/states/New-York-Languages.html.
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in Brooklyn; Working with Local Community Groups to Reach Out to the Borough’s Russian-Jewish Population”, Department of Homeland Security website, 10 January 2013, acesso em 28 out. 2015, https://www.fema.gov/disaster/4085/updates/trust-grows- -brooklyn-working-local-community-groups-reach-out-boroughs- -russian.