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Considerações sobre a aprendizagem social do desenho, baseado nas teorias de lev vygotski e brent e marjorie wilson. O texto discute as atitudes de apropriação e cópia observadas em desenhos de crianças de 8 a 10 anos, e as influências culturais que impactam o desenho infantil. Os autores exploram o conceito de fonte de imagem e discutem por que as crianças copiam desenhos.
O que você vai aprender
Tipologia: Notas de estudo
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Camilla Carpanezzi La Pastina FAEL, Lapa-PR
Resumo: Neste artigo busca-se refletir sobre a apropriação e a cópia no desenho infantil. Tem-se como base desenhos de tema livre de crianças de 8 a 10 anos coletados em recente pesquisa de mestrado. Traçam-se considerações sobre a aprendizagem social do desenho a partir das teorias de Vigotski (2007) e Brent e Marjorie Wilson (1997). Considera-se que, ao desenhar, a criança interage com pessoas mais experientes de seu grupo, como pais, professores, colegas de classe ou irmãos mais velhos, procurando assimilar formas de desenhar através da imitação e da cópia. A criança interage também com objetos, tais como livros, álbuns ilustrados, gibis, cadernos decorados, entre outros. Define-se a cópia, a apropriação e o decalque como formas de interação presentes no desenhar das crianças. Embora a compreensão da cópia como atividade humana possa ser elucidativa do ponto de vista educacional, espera-se que o professor seja o propositor de novas e variadas imagens de modo a obter avanços no desenho das crianças.
Palavras-chave: desenho infantil, apropriação, cópia, fonte de imagem, interação.
1. Introdução
Este artigo apresenta um recorte de dissertação de mestrado defendida no ano de 2008 na Universidade do Estado de Santa Catarina, UDESC. No ano de 2007 observaram- se duas turmas de 3ª série, uma na cidade de Curitiba, PR, outra na região rural da cidade da Lapa, PR. Foram realizadas quatro visitas em cada turma com a solicitação de desenhos de tema livre. Solicitou-se ainda às crianças a realização de desenhos em sua própria casa, com tema também livre. Durante a coleta de desenhos nas salas de aula permitiu-se a interação entre as crianças e puderam-se observar atitudes de apropriação e cópia nos desenhos. Não foi permitida a realização de decalques em sala, embora algumas crianças desejassem, porém esta atitude ocorreu em alguns desenhos trazidos de casa.
Quem convive com crianças provavelmente já percebeu atitudes de cópia em seus desenhos. Em casa ou na escola a criança procura se inspirar nas imagens que observa: desenhos de colegas ou familiares, desenhos de gibis, da televisão, imagens presentes na sala de aula, entre muitas outras. A cópia é uma atitude controversa e problemática dentro do ensino da arte e gera uma situação curiosa: as crianças percebem que na escola não se pode copiar desenhos, por isso copiam em casa, sem a presença do professor.
Assim, muitas perguntas surgem: Por que as crianças copiam desenhos? Até que ponto é saudável copiar? Diante destas questões procura-se pensar como o desenho da criança dialoga com as imagens existentes ao seu redor. Inicialmente discute-se a aprendizagem social do desenho a partir de Vigotski (2007). Posteriormente aborda-se a concepção de desenho de Brent e Marjorie Wilson (1997) e o conceito de fonte de imagem. Em seguida definem-se os conceitos de interação, apropriação, cópia e decalque. Por fim apresentam-se desenhos infantis que exemplificam os conceitos definidos, para então traçarem-se algumas considerações finais.
2. A aprendizagem social do desenho
A partir do momento em que uma criança nasce, passa a participar de uma determinada cultura. Para Vigotski, psicólogo russo do início do século XX, o estar no mundo é mediado por outras pessoas. “Desde os primeiros dias do desenvolvimento da criança, suas atividades adquirem um significado próprio num sistema de comportamento social e, sendo dirigidas a objetivos definidos, são refratadas através do prisma do ambiente da criança” (VIGOTSKI, 2007, p. 19-20). Rego (1994) afirma que, para Vigotski, a interação com indivíduos mais experientes de seu grupo é fundamental para a formação do comportamento e do pensamento humano.
Com a ajuda do adulto, as crianças assimilam ativamente aquelas habilidades que foram construídas pela história social ao longo de milênios: ela aprende a sentar, a andar, a controlar os esfíncteres, a falar, a sentar-se à mesa, a comer com talheres, a tomar líquidos em copos, etc. (REGO, 1994, p. 60). A esta lista pode-se acrescentar que a criança aprende a desenhar. A própria decisão de dar uma folha de papel para seu filho desenhar é cultural. Toma-se melhor consciência deste fato quando se observam outras culturas. Algumas sociedades indígenas brasileiras, por exemplo, até os anos 60 nunca haviam desenhado usando papel e lápis, já que, na concepção das mesmas, o lugar do desenho é o corpo (VIDAL, 2000). Desta forma, cada cultura estabelece qual o suporte (pele, papel, entre outros) e qual o estilo de desenho adotar.
Segundo Vigotski, o desenvolvimento humano é constituído socialmente. “A internalização das atividades socialmente enraizadas e historicamente desenvolvidas
Desenho realizado pela mãe (40 anos) e sua filha (7 anos). Dia 06/09/
Interagindo com pessoas mais experientes de seu grupo, a criança imita as coisas para assimilá-las. No momento de desenhar a criança interage com familiares, colegas, professores. No âmbito doméstico a criança mostra seu desenho para os pais, esperando seus comentários. Os pais muitas vezes desenham com seus filhos. Na escola as crianças observam os desenhos dos colegas, sentam juntas para desenhar e tentam aprender com os amigos.
A criança necessita integrar-se ao mundo, à sociedade. Isso "[...] envolve ‘ser semelhante ao coleguinha do lado’ e, portanto, copiar os seus desenhos, desenhar como ele, para dessa maneira ‘assemelhar-se’, passar a fazer parte daquele meio sociocultural" (DUARTE, 2005, p. 2).
Em síntese, o ato de desenhar passa por uma aprendizagem social e, desta forma, contém atitudes de imitação ou cópia. Quando interage é comum que a criança copie ou se aproprie (copie fazendo modificações) de algumas imagens observadas. Brent e Marjorie Wilson procuram explicar como e porque as crianças copiam desenhos, através do conceito de fonte de imagem.
3. Fontes de imagens dos desenhos infantis
Brent e Marjorie Wilson iniciaram, na década de 70, pesquisas voltadas para influências culturais no desenvolvimento artístico das crianças. O interesse dos autores pela relação entre desenho infantil e cultura levou-os a pesquisar o desenho de crianças americanas e egípcias, entre outros estudos comparativos de crianças de diferentes nacionalidades.
Em Uma visão iconoclasta das fontes de imagem nos desenhos de crianças (escrito originalmente em 1974 e publicado no Brasil em 1997) os autores mostram a influência de fontes externas nos desenhos infantis e o papel da imitação na aprendizagem do desenho.
Durante vários anos, Wilson e Wilson observaram que "as crianças mais bem dotadas e produtivas em arte desenham primariamente a partir de imagens derivadas das medias populares e de ilustrações - este empréstimo e o trabalho em cima de imagens preexistentes em alguns casos começou antes dos seis anos" (WILSON e WILSON, 1997, p. 59). Os autores observaram que as crianças que trabalhavam a partir dessas fontes tinham habilidade de construir ideias visuais e trabalhar com esboço, perspectiva e ação nos desenhos. Então, os autores passaram a observar como o desenho é influenciado por fontes externas, qual o papel da imitação na aprendizagem do desenho e como as crianças adotam, desenvolvem e modificam as imagens.
Wilson e Wilson fizeram uma pesquisa com 147 estudantes de Ensino Fundamental e Médio. Inicialmente os alunos foram entrevistados sobre seus desenhos de infância, e alguns desses desenhos foram analisados. Posteriormente os pesquisadores solicitaram às crianças que desenhassem diversas coisas de memória: pessoas, animais, móveis, máquinas, plantas etc. Após terem feito os desenhos, os pesquisadores procuravam conversar, saber a opinião do estudante sobre seu desenho, se o desenho havia sido inventado por ele, se era cópia de algo, se alguém havia ensinado, entre outras perguntas. Após a realização dessa pesquisa os autores chegaram a algumas considerações. A primeira refere-se ao fato de que as imagens desenhadas foram, em sua maioria, tomadas de outras fontes e não criadas pela criança. Desta forma, os autores buscaram seguir a imagem até sua origem e chegaram a “uma fonte gráfica previamente existente” (WILSON e WILSON, 1997, p. 64). As fontes eram bastante diversificadas, como desenhos feitos por colegas e familiares, ilustrações, fotografias, imagens da televisão, mas não imagens derivadas da Arte. Essas fontes eram, entretanto, extremamente variáveis. Elas variavam de imagens tomadas de desenhos que tinham sido feitos pelos pais, irmãos mais velhos, colegas, até imagens dos meios de comunicação populares, especialmente revistas em quadrinhos e televisão, mas também ilustrações e fotografias. Foi surpreendente o fato de que as Belas Artes representassem um papel mínimo; só ocasionalmente essas imagens tiveram como fonte as representações das Belas Artes e mesmo assim apenas aquelas dos livros do tipo “Como desenhar” (WILSON e WILSON, 1997, p. 64).
fora do campo de Belas Artes" (WILSON e WILSON, 1997, p. 73). Por fim os autores salientam a necessidade de instrumentalizar a criança, a partir dos 8 ou 9 anos, a adquirir o maior número possível de programas de desenho.
4. Interação no desenho infantil: apropriação, cópia e decalque
Na presente pesquisa realizada destacou-se o fato de como as crianças se inspiram em fontes externas para desenhar. Percebe-se que as crianças copiam imagens, decalcam, combinam imagens copiadas, enfim, utilizam diversas táticas. O copiado pode ainda ser internalizado, decorado, e repetido sem a fonte da imagem. Em todos os casos a criança interage com algo ou alguém. É o que se denomina aqui de interação no desenho infantil.
Interação criança-criança e interação criança-livro. Lapa-PR
A interação, isto é, o inter-agir, pode ocorrer com outra pessoa, com um livro ou gibi, com a televisão, com a decoração da sala. Quando a criança interage com seu colega, muitas vezes os desenhos ficam parecidos, pois as crianças se apropriam dos desenhos umas das outras. No exemplo abaixo, podem-se observar dois desenhos semelhantes. No dia da feitura dos desenhos, estes dois meninos se isolaram do restante da turma e sentaram bem ao fundo da sala.
Desenhos realizados por meninos que sentaram juntos: menino, 9 anos; menino, 8 anos. Lapa, PR
O desenho foi originalmente feito por um menino (desenho à esquerda) que já havia mostrado um outro desenho seu praticamente igual a esse, realizado em casa com lápis de escrever. Nesse momento ele afirmou rapidamente que havia copiado de um livro. O desenho traz um escravo sendo castigado, e, muito provavelmente, a fonte de imagem original é uma ilustração de livro didático. No dia 01/06/07 o desenho é feito sem a fonte de imagem. O ambiente procura ser sombrio, está chovendo e um raio cai sobre o carrasco, um castigo de Deus, segundo ele conta na entrevista. Ainda na entrevista, o menino procura convencer o entrevistador de que não copiou o desenho de livro algum, que ele inventou.
As afirmações abaixo, obtidas em entrevistas com as crianças, fornecem exemplos de diversas formas de interação. Ao interagir a criança pode copiar ou se apropriar de imagens de colegas ou outras fontes. Pode ainda simplesmente decalcar imagens de livros, cadernos, etc.
Eu vivo lendo gibi, daí eu aprendo a fazer desenhos. Por exemplo, eu vou pegar o gibi e ponho debaixo do meu caderno pra copiar. Eu copio, copio, até que um dia fica bonito (Menino, 8 anos, Curitiba, PR). Esse daí meu irmão me ajudou a fazer. [...] Ele tira das revistas que tem (Menino, 8 anos, Lapa-PR). Eu assisti um programa. [...] Art Attack. Daí eu consegui fazer o nariz (Menina, 8 anos, Curitiba, PR). (o desenho) é de um cartaz que tem dentro da sala (Menina, 8 anos, Lapa, PR). Eu copiei do alfabeto que tem aqui na sala, o sapinho, daí o fundo fui eu que inventei (Menina, 9 anos, Curitiba, PR).
presente até os dias de hoje. Brent e Marjorie Wilson afirmam que a não interferência do mundo adulto é impossível, pois a todo o momento o adulto está presente e relacionando-se com o desenho da criança. A criança tem diversos modelos a sua volta – a percepção de desenho dos adultos, desenhos de outras crianças, ilustrações em livros e revistas, a arte dos museus - de modo que é impossível mantê-la apartada de tudo isso (WILSON e WILSON, 1982). A observação de atitudes de cópia no desenho infantil levou os autores a inúmeras reflexões, com as quais se concorda. Em Teaching children to draw (1982) os autores apresentam prós e contras do ato de copiar. Observa-se que, para estes autores, a cópia em si pode ser um obstáculo, já a apropriação pode ser de grande ajuda no processo de desenho da criança. Segundo os autores, a cópia é positiva quando a criança é também capaz de criar, de modificar os esquemas assimilados - o que denomina-se aqui apropriação. É pela cópia que se aprendem técnicas e se ganha confiança. Os autores observaram algumas crianças que praticavam cópias e tinham habilidades bem desenvolvidas em esboço, perspectiva e ação, além de melhorar a percepção de detalhes. Algumas crianças, porém, podem se fixar na cópia, sendo incapazes de sair dela, neste caso a cópia torna-se "um esquema congelado e inflexível que a criança não consegue utilizar de maneira diferente da imagem original" (WILSON e WILSON, 1982, p. 76, tradução da autora). A afirmação de uma criança entrevistada nesta pesquisa parece revelar essa posição: “Eu gosto bastante de copiar porque não podendo copiar eu não sei da onde tirar idéia. Às vezes fica até meio esquisito o desenho” (Menina, 9 anos, Curitiba-PR). Ainda segundo os autores, outro problema é que as imagens copiadas geralmente são derivadas da cultura de massa, desta forma não contribuem para desenvolver novos olhares em relação ao desenho. Os autores defendem que a criança não pode produzir desenhos sem as informações necessárias sobre os objetos, lugares e ações que pretende desenhar. Isso é especialmente válido para crianças maiores (a partir dos 8 ou 9 anos) que têm necessidade de desenhar com maior acuidade e complexidade. Sem esse subsídio a criança tende a se desinteressar e inclusive cessar suas atividades gráficas. "Para que as crianças continuem a desenhar, a informação que elas requerem deveria estar disponível e acessível" (WILSON e WILSON, 1982, p. 77, tradução da autora). Quando a informação necessária não é dada à criança, ela procura descobrir sozinha, através de revistas, gibis etc.
Segundo Wilson e Wilson, as crianças deveriam ser alimentadas com muitas imagens para desenhar, formando, por exemplo, com o suporte do professor, uma coleção de fotos, pinturas, desenhos e ilustrações variadas. Os autores deixam claro que adquirir convenções artísticas é importante, mas que a criança deve se mover da simples convenção para a invenção. Por isso sugerem que sejam propostas às crianças atividades de invenção, para que ela consiga criar em seu trabalho e não utilizar a cópia como única forma de desenho. Desenvolvendo o desenho, a criança fará melhor uso da cópia e de toda fonte de imagem com que vier a ter contato. Os autores sugerem jogos para aumentar o número e a variedade de coisas para desenhar, incrementar as expressões faciais, tentar desenhar figuras em ação etc. (WILSON e WILSON, 1982). Wilson e Wilson, portanto, defendem não a cópia, mas a reinterpretação de uma imagem, atitude inerente ao processo criativo, comum aos artistas.
4.1. Exemplos de apropriação, cópia e decalque no desenho de crianças
Nesta seção destacam-se desenhos de crianças coletados durante a pesquisa que apresentaram atitudes de apropriação, cópia e decalque. No embate entre as imagens reais e as imagens desenhadas, a imagem desenhada tende a prevalecer, porque sua rememoração é mais simples e também porque a imagem está de certa forma validada, consolidada, cristalizada. Por mais que se vejam árvores diariamente, no momento de desenhar, se a situação permitir, ou seja, se houver um desenho de árvore ao alcance, a criança tende a observá-la no momento de desenhar. Desta forma, a árvore do cartaz é tão real quanto a árvore que existe na rua. Em termos de desenho, talvez até mais real, pois ela se comunica diretamente com o desenho. O cartaz ao lado, presente na sala de aula de uma escola de Curitiba - PR, mostra as palavras ANDORINHA, AMBULÂNCIA e ÁRVORE, com respectivos desenhos. No ambiente escolar, povoado de regras, o cartaz mostra como se escreve corretamente cada palavra e, ao trazer o desenho consigo, implicitamente, comunica que aquela é a forma correta de desenhar cada objeto.
Cartaz presente em sala de aula, Curitiba-PR.
teste piloto em uma turma de 4ª série de uma escola da zona rural da Lapa - PR. Os desenhos eram bastante semelhantes e traziam no céu alguns pássaros. Pode-se ver a transformação destes pássaros, enquanto vai sendo passado de colega a colega. O terceiro já está bastante distante do primeiro e assemelha-se mais a um inseto que a um pássaro.
Menino, idade não registrada Menino, idade não registrada Menino, idade não registrada
Apropriação e transmissão de desenhos entre colegas (detalhes ampliados). Lapa - PR
Como se pode observar na foto adiante, o material didático e o material escolar da criança são ricamente ilustrados, de modo que também funcionam como fonte de imagem. A foto abaixo mostra o material escolar de uma menina, que foi deixado em cima da mesa no momento em que as crianças estavam no recreio. O caderno traz uma ilustração da Minnie, o estojo traz a figura da personagem Mel, e o livro traz, na página em que se encontrava aberto, um quadrinho do Chico Bento. Percebe-se que o cotidiano infantil é povoado por imagens comerciais. Sobre a presença destas imagens no imaginário infantil, destaca Gomes:
São personagens dos desenhos animados ou de histórias em quadrinhos das grandes corporações que, além de serem veiculados amplamente na televisão e em filmes, também são propagados por uma infinidade de produtos industriais. O material escolar, por exemplo, é produzido com figuras extraídas da mídia: lancheiras, cadernos, estojos, pastas e mochilas, quase sempre apresentando os consagrados personagens acima mencionados, personagens de desenhos japoneses, fotos de atores, a boneca Barbie, entre outros. Produtos de higiene, vestimentas, acessórios, embalagens de alimentos, qualquer produto pode servir como base para a veiculação desses ícones. Além dos produtos industrializados, essas figuras aparecem manufaturadas como decoração de creches e festas infantis, em folhas mimeografadas que muitas vezes as crianças recebem para colorir, em camisetas pintadas e nos mais variados tipos de produtos artesanais (GOMES, 2002, p. 35).
O desenho abaixo foi realizado por uma menina no primeiro encontro. Na entrevista a garota conta como o fez: " Foi que eu peguei emprestado uma agendinha da minha amiga, daí eu copiei". Tem-se aí um exemplo de interação entre criança e objeto (agenda).
Material escolar de menina Menina, 9 anos (desenho ampliado) O material escolar como fonte de imagem. Curitiba - PR.
Um desenho da escola urbana que chamou a atenção foi o realizado por um menino de 8 anos. Aqui o que se destaca é que o garoto não copia exatamente uma imagem, mas apenas a logomarca Hot Wheels. Não foi observado de onde foi tomada a imagem, se foi uma cópia ou um decalque. A foto abaixo foi realizada posteriormente, a partir de uma caixa de pista de carros, para que se pudesse estabelecer uma comparação entre as imagens. Parece que o menino já percebe a marca como sinal de status.
Símbolo da Hot Wheels Desenho de menino, 8 anos. Cópia de logotipo. Curitiba, PR.
O exemplo a seguir é curioso, pois uma imagem foi desenhada tantas vezes que foi "decorada" por um garoto. O desenho, segundo afirmação obtida do próprio autor, foi copiado de um álbum de figuras do desenho animado Carros. Este foi, segundo suas
Menina, 9 anos Menino, 9 anos Menina, 9 anos Menina, 9 anos Desenhos realizados em casa. Curitiba, PR
O primeiro desenho da escola rural foi realizado por uma menina e as flores parecem ter sido copiadas de toalha de mesa ou pano de prato. Em outra ocasião uma pessoa da região nos contou que copiou desenhos da toalha de mesa. Os desenhos de relógio foram feitos por meninas diferentes que afirmaram ter copiado a imagem do livro escolar. O desenho de carro foi trazido por um menino, que posteriormente confirmou ter sido feito por seu irmão mais velho, que copia de revistas. Observem-se agora os desenhos da escola urbana. O primeiro é uma cópia da personagem Margarida. Este desenho foi trazido de casa e posteriormente a menina afirmou, um tanto sem jeito, que ela não fez exatamente para aquela ocasião, que ele já estava pronto, era a capa de uma pasta e foi sua mãe que o fez. O Pato Donald foi trazido por um menino, o gato e a personagem Moranguinho por meninas. Nesta pesquisa as crianças se inspiraram em diversas fontes externas, porém não permitimos o decalque de imagens em sala de aula. Entretanto, essa prática ocorreu em casa, sem a presença da autora. O último desenho (Moranguinho) tem uma estratégia para decalque de imagem: foi passado óleo na folha, que deste modo fica transparente. Em relação ao desenho feito em casa, observa-se que nas duas escolas a criança busca ajuda de outras pessoas, ou seja, interage com pessoas mais experientes de seu grupo enquanto desenha. Entre os desenhos realizados em casa, nas duas turmas, encontra-se também grande número de cópias e decalques de imagens, mesmo em crianças que em sala não apresentaram esse comportamento. Dessa forma, conclui-se que o ambiente doméstico é mais propício às cópias, pois ali a criança sente-se à vontade para interagir com as fontes de imagens disponíveis, já que não tem a presença do professor.
5. Considerações finais
Discutiram-se aqui as atitudes de interação, apropriação e cópia no desenho infantil, diante da solicitação por trabalhos de tema livre. Acredita-se que a ausência de proposta específica de desenho seja um fator propício à cópia, pois diante da falta de proposta, muitas vezes a criança se encontra sem saber por onde iniciar um desenho. Assim, as imagens que estão ao seu redor no momento da atividade servem-lhe como motivo. Outro fator a ser considerado é que nesta pesquisa se permitiu efetivamente a interação entre as crianças e desta forma pôde-se observar que as crianças sentam juntas, formam grupos, movimentam- se pela sala, observam e comentam desenhos. Interagem com as imagens que estão ao seu alcance naquele momento, presentes no livro didático, estojo, caderno, nas paredes da sala de aula. Enfim, a criança está buscando modelos ou a aquisição de convenções artísticas.
Disso pode-se concluir que, como Brent e Marjorie Wilson sugerem, a criança a partir dos 8 - 9 anos deveria ser orientada na aquisição de algumas convenções de modo a sentir- se satisfeita com seu desenho, pois nesse período é importante que a criança obtenha as informações necessárias sobre os objetos que pretende desenhar. Quando a informação do desenho é negada ao aluno, ele busca por seus próprios meios, copiando imagens ou pedindo ajuda a alguém mais experiente.
Em síntese, pode-se perceber que a cópia acontece:
De maneira geral, percebe-se que as fontes de imagens utilizadas pelas crianças são as imagens da cultura de massa presentes em livros e materiais de consumo diversos,
[...] the copy often becomes a frozen and inflexible schema which the child is unable to employ in ways other than of the original image.
In order for children to continue to draw, the information they require should be available and accessible.
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