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Uma análise histórica e técnica do desenvolvimento da impressão, desde a invenção da imprensa de caracteres móveis por gutenberg no século xv até à era digital. Ao longo do texto, são abordados os fatores culturais e tecnológicos que contribuíram para a gênese da impressão, o impacto da tecnologia de caracteres móveis na disseminação de ideias e informação, e as inovações que marcaram a evolução da imprensa ao longo dos séculos. Além disso, são discutidas as implicações da impressão na cultura europeia, na ciência, religião, política e modos de pensar associados à cultura ocidental da era moderna.
Tipologia: Notas de estudo
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1 Raízes tecnológicas 1 2 Gutenberg e o momento histórico na Europa ocidental 2 3 A impressão e o pensamento moderno 4 4 Desenvolvimentos na tecnologia da palavra impressa 5
A invenção da imprensa de caracteres mó- veis é considerada a origem da comunicação de massas por constituir o primeiro método viável de disseminação de ideias e de infor- mação a partir de uma única fonte para um auditório numeroso e disperso. Analisando mais atentamente os fenómenos que consti- tuíram a génese da impressão com caracteres móveis, verifica-se que esta resulta da con- fluência de factores culturais e tecnológicos que se vinham desenvolvendo ao longo dos três séculos precedentes. A cultura da pala- vra impressa e a tecnologia tipográfica pre- cisaram igualmente de atravessar séculos de mudança após o tempo de Gutenberg até que
∗Maio 1999
a massificação se pudesse concretizar plena- mente. A história da impressão é longa e com- plexa. Seria excessivo proclamar a imprensa a causa das mudanças sociais, políticas e psi- cológicas a que está associada. Mas a ela se deve uma marca indelével em todos os aspectos da cultura europeia, ou pelo me- nos, aceitar-se-á pacificamente que consti- tuiu o instrumento de mudança que permi- tiu a emergência da ciência, religião, cultura, política e modos de pensar vulgarmente as- sociados à cultura ocidental da era moderna.
A invenção da imprensa só foi possível pela invenção e refinamento das técnicas de fa- brico de papel na China ao longo de vários séculos. Em 105 d.C. os Chineses desen- volveram o papel de farrapos, fabricado com fibras vegetais e trapos velhos, constituindo uma alternativa económica às pesadas pastas de bambu e cascas de árvores ou ao preci- oso e dispendioso papel de seda. Os segredos desta técnica foram revelados aos árabes por prisioneiros chineses no século VIII sendo posteriormente introduzidos na Europa nos séculos XII e XIII. Muito antes de Guten-
2 Jorge Bacelar
berg, as inovações chinesas nas tintas, im- pressão xilográfica e impressão com carac- teres móveis de argila, tinham já prestado o seu contributo para a divulgação da palavra impressa. Apesar de ter demorado séculos a chegar à Europa, o seu impacto cultural só aqui se fez efectivamente sentir. O uso desta tecnologia de caracteres móveis na es- crita chinesa, que emprega milhares de ideo- gramas, implicava um esforço e um dispên- dio de recursos materiais insuportável. As- sim, o seu impacto na eficácia da produção só se viria a verificar no ocidente, pela fácil adequação e adaptação dos 26 caracteres do alfabeto latino a esta tecnologia. Algumas teses na historiografia afirmam que o carác- ter normalizado, sequencial e linear da tipo- grafia se adaptou admiravelmente ao particu- larismo ocidental, direccionado para o pro- gresso técnico e para a conquista caracterís- ticas que favorecem a mudança rápida e in- tensiva.
As rápidas mudanças culturais que se faziam sentir na Europa desde o início do século XV estimularam uma crescente procura (e a necessária produção) de documentos es- critos mais baratos. Desde a sua introdu- ção na Europa, no século XII, o papel foi-se afirmando como alternativa viável ao vellum e ao pergaminho, que constituíam à época os meios convencionais de para o registo e transporte da informação escrita. O papel de farrapo foi-se tornando cada vez mais barato e abundante e, simultaneamente, a alfabeti- zação expandia-se. Em parte, os dois pro- cessos aceleraram por se estimularem mutu-
amente. A necessidade de documentação au- mentava com o desenvolvimento do comér- cio, assim como com o aumento da com- plexidade dos processos de governo e admi- nistração política e religiosa. Por seu lado, os processos comerciais mais sofisticados e o número de funcionários necessários para manter em funcionamento as crescentes bu- rocracias políticas, religiosas e comerciais, criaram a necessidade de um sistema de en- sino que produzisse esses mesmos funcio- nários. Para tal era necessária a existência e disponibilidade de material escrito. Du- rante séculos, os monges copistas garanti- ram a manutenção e a reprodução dos textos sagrados, mas o mundo secular emergente criou a sua própria versão de copista, sur- gindo o amanuense profissional. Os novos scriptoria ou lojas de escrita que surgiram, empregariam virtualmente qualquer clérigo letrado que procurasse trabalho. Apesar do seu rápido aumento, os ama- nuenses não conseguiam dar resposta à cres- cente procura comercial de livros. Outro po- tencial campo de negócio era a venda de in- dulgências, folhas de papel oficial da Igreja, concedendo o perdão pelos pecados cometi- dos, emitidas a troco de fundos destinados à construção de edifícios e a outros projectos dirigidos para a expansão do seu domínio. De facto, tiragens de 200.000 exemplares já eram vulgares pouco depois das indulgências manuscritas se tornarem obsoletas. Gutenberg, ourives na cidade de Mainz, pressentiu o potencial de lucro duma tecno- logia que pudesse dar resposta a estes pro- blemas e, para o efeito, contraiu um emprés- timo que lhe permitisse desenvolvê-la. Para tal, desenvolveu e adaptou características das tecnologias têxtil, papeleira e de prensagem de uvas já disponíveis na época, mas a ino-
4 Jorge Bacelar
A revolução científica que viria a questionar as verdades à guarda da Igreja foi igualmente uma consequência directa da tecnologia da impressão. O princípio científico da repetibi- lidade, garantido pela verificação imparcial de resultados experimentais, estabeleceu-se como paradigma, graças à rápida e ampla disseminação, pela imprensa, de reflexões e descobertas científicas. Acelerando a troca de ideias, estimulou a produção de conhe- cimento científico, contribuindo para o nas- cimento de uma comunidade científica que funcionasse sem constrangimentos geográfi- cos. Sistematizaram-se assim metodologias e acrescentou-se sofisticação ao pensamento racional. À medida que mais e mais livros se tornavam acessíveis, o corpo de conhe- cimentos expandiu-se, originando o surgi- mento de índices e de sistemas de referência cruzada como formas de possibilitar a gestão da informação disponível, bem como para associar criativamente ideias e assuntos apa- rentemente distantes e sem qualquer relação. Estas inovações no acesso ao conheci- mento científico e às estruturas do pensa- mento humano que acompanharam o estabe- lecimento da imprensa na Europa influencia- ram igualmente as artes, a literatura, a filoso- fia e a política. A inovação explosiva que ca- racterizou o Renascimento foi amplificada, e em parte gerada, pela imprensa de caracteres móveis. A rígida estrutura social que deter- minava o estatuto de cada um em função do seu nascimento e do património familiar co- meçou a diluir-se, com o surgimento e ascen- são de uma classe média intelectual. A pos- sibilidade de modificar o estatuto individual graças à ambição e ao mérito pessoal, foi
despertando uma incontrolável fome de edu- cação nos menos privilegiados de nascença. A tecnologia da impressão desencadeou uma revolução nas comunicações que viria a tocar muito fundo nos modos de pensar e nas interacções sociais. A impressão, em conjunto com a linguagem falada, com a es- crita e os meios electrónicos, é considerada um dos marcos de mudanças fulcrais na his- tória da comunicação e que viriam por sua vez a influenciar as mudanças sociais e inte- lectuais subsequentes. A cultura oral passa de geração em gera- ção através de uma atmosfera de interacção pessoal emotiva e sensorial. A escrita facilita a interpretação e a reflexão, uma vez que a memorização já não é tão essencial para a co- municação e o processamento das ideias. A história registada pode ser acrescentada e ac- tualizada ao longo dos tempos. O texto ma- nuscrito originou uma variação nas tradições orais: o hábito comunitário de contar histó- rias, associando à palavra a expressão corpo- ral, a dança, etc., transforma-se na leitura do texto, por um orador, para o grupo. A impressão, por seu lado, estimulou a procura da privacidade. Livros mais bara- tos e portáteis, levaram à leitura silenciosa e solitária. Esta orientação para a privacidade integra-se num movimento mais amplo de conceptualização e reivindicação de direitos e liberdades individuais, cujo surgimento a imprensa estimulou e contribuiu para divul- gar. A impressão impregnou a cultura oci- dental com os princípios da estandardização, da verificabilidade e da divulgação de ideias e conhecimentos, a partir de uma fonte, e sua disseminação por muitos receptores disper- sos geograficamente. Tal como influenciou profundamente a reforma do pensamento re- ligioso e do método científico, as inovações
Apontamentos sobre a história e desenvolvimento da impressão 5
da imprensa desafiaram igualmente o con- trolo institucional. A imprensa estimulou a procura e o credo numa verdade fixa e veri- ficável, assim como abriu caminho aos ho- mens para o livre arbítrio e ao direito de es- colher individualmente percursos intelectu- ais e religiosos. Se num primeiro tempo a tipografia cons- tituiu, por si, uma revolução, séculos mais tarde passaria a ser instrumento de revolu- ções: veja-se como exemplo, o papel que a imprensa desempenhou nas colónias ingle- sas da América, divulgando e defendendo as ideias visionárias que deram forma à Revolu- ção Americana ou, mais tarde ainda, o papel que desempenhou nos aparelhos de agitação e propaganda para a disseminação dos ide- ais de todos os movimentos ideológicos re- volucionários que, a partir de finais do século XIX, se propuseram transformar o mundo. Até ao século XIX, a tecnologia estabe- lecida por Gutenberg foi apresentando al- guns melhoramentos, mas no essencial man- tinha as características dos primitivos prelos do século XV. O fabrico de prelos em aço em vez de madeira, movidos pela energia da máquina a vapor e a alimentação de papel em bobine, em conjunto, contribuíram para o vertiginoso aumento da eficiência da im- prensa. Estes avanços tecnológicos permiti- ram em 1833 a redução para o preço de um penny do jornal diário New York Sun. Para alguns historiadores, esta penny-press cons- titui o primeiro mass-medium genuíno: nas palavras do seu fundador, Benjamin Day, o seu jornal estava concebido para "apresentar ao público e a um preço acessível a todos, as notícias do dia".
Um grande número de inovações tecnológi- cas acrescentaram a importância, o carácter e o papel da imprensa na cultura. Monotype e Linotype, métodos mecânicos de fundição e composição de tipos móveis, alternativos à composição manual, foram lançados ainda antes do virar do século (1884 e 1887) e mar- caram um salto significativo na velocidade de produção. Os processos de composição passaram por inúmeras transformações com o desenvolvimento da composição fotome- cânica, que marca o fim da época da com- posição a quente, ou seja com ligas de me- tal fundidas, despejadas em moldes para pro- duzir letras, números e sinais, e o início da composição a frio, primeiro pelo recurso à máquina de escrever, que tornou comum e acessível o look da impressão normalizada e, de seguida, à tecnologia fotográfica, depois à electrónica, ao tubo de raios catódicos e à tecnologia laser. A máquina de fotocópias permitiu finalmente o acesso do documento impresso a todos. Os processadores de texto transformaram as tarefas de edição e trouxe- ram novas características e flexibilidade aos processos de escrita. A impressão informati- zada já percorreu vários degraus evolutivos, desde os primeiros discos de margarida e im- pressoras de agulhas, até aos actuais e co- muns processos de impressão caseiros: jacto de tinta, laser e transferência térmica. Tanto a Internet como a interactividade dos produtos multimedia estão a revelar no- vos métodos para a aplicação e uso da pala- vra impressa, acrescentando-lhe novas possi- bilidades culturais. A palavra visível é agora utilizada na interacção social em tempo real e para a navegação individualizada em docu-