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ANIMAÇÃO DIGITAL 2D: SIMULANDO O FAZER ..., Notas de estudo de Desenho

banhos químicos aplicados ao filme sensibilizado, ou seja, a imagem final do ... Gerar movimentos automáticos no computador pensando que se está fazendo.

Tipologia: Notas de estudo

2022

Compartilhado em 07/11/2022

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Simon Pedro Brethé
ANIMAÇÃO DIGITAL 2D:
SIMULANDO O FAZER TRADICIONAL ATRAVÉS DA
FERRAMENTA DO COMPUTADOR
Escola de Belas Artes
Universidade Federal de Minas Gerais
Belo Horizonte, dezembro de 2010.
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Simon Pedro Brethé

ANIMAÇÃO DIGITAL 2D:

SIMULANDO O FAZER TRADICIONAL ATRAVÉS DA

FERRAMENTA DO COMPUTADOR

Escola de Belas Artes

Universidade Federal de Minas Gerais

Belo Horizonte, dezembro de 2010.

Simon Pedro Brethé

ANIMAÇÃO DIGITAL 2D:

SIMULANDO O FAZER TRADICIONAL ATRAVÉS

DA FERRAMENTA DO COMPUTADOR

Dissertação apresentada ao programa de Pós- Graduação em Artes da Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Artes. Área de Concentração: Arte e Tecnologia da Imagem. Orientadora: Profª. Drª. Ana Lúcia Andrade EBA / UFMG

Belo Horizonte Escola de Belas Artes /UFMG

AGRADECIMENTOS

A todas as pessoas próximas pelo apoio e carinho. A Patrícia Martins pela paciência e companheirismo. À minha orientadora Ana pela orientação, apoio e amizade.

A todos aqueles que acreditam no meu trabalho como animador: Antônio Fialho Maurício Gino Chico Marinho Jalver Bethônico Ricardo Souza

E a todos os amantes da sétima arte.

“A arte é enriquecida pela sutil exploração da técnica”

Alberto Lucena Júnior

SUMÁRIO

    1. INTRODUÇÃO
  • 1.1. Uma experiência particular
    1. A ANIMAÇÃO TRADICIONAL ATRAVÉS DOS INSTRUMENTOS
  • 2.1. As primeiras experiências com desenhos animados.
  • 2.2. A animação sem a tecnologia do cinema
  • 2.3. Os pioneiros do cinema de animação
  • 2.4. A tecnologia do acetato......................................................................................
  • 2.5. O rotoscope
  • 2.6. Referências para a animação..............................................................................
  • 2.7. Os princípios da animação
  • 2.8. A técnica de múltiplos planos
  • 2.9. A técnica da reprografia
  • 2.10. A animação limitada
    1. O FAZER TRADICIONAL ATRAVÉS DAS FERRAMENTAS DIGITAIS
  • 3.1. É possível reproduzir a animação tradicional no computador?
  • 3.2. Recursos digitais para animação
  • 3.3. A película digital e o conceito de frame
  • 3.4. O símbolo: uma releitura do recorte tradicional
  • 3.5. O traço digital
  • 3.6. O canal alfa: o acetato digital
  • 3.7. Múltiplos planos
  • 3.8. Animador assistente digital
  • 3.9. Animação limitada digital.................................................................................
  • 3.10. Estratégias de animação com as ferramentas digitais
    1. CONSIDERAÇÕES FINAIS
  • ANEXOS
  • REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
  • WEBSITES VISITADOS

1. INTRODUÇÃO

O computador é uma das tecnologias mais fascinantes e se tornou uma das ferramentas mais presentes no cotidiano, auxiliando o homem em inúmeras tarefas. Desde a concretização do primeiro projeto de computador pessoal proprietário da Apple, no final da década de 1970, o Apple II – que vinha com teclado embutido, tela capaz de gerar gráficos coloridos e programas armazenados – o computador ganhou espaço como instrumento indispensável para os mais diversos ramos profissionais e cada usuário encontrou nesta tecnologia uma forma de explorar suas inúmeras ferramentas que vão desde uso para diversão a trabalhos de caráter profissional.

No ramo da arte, muitos trabalhos de pintura, desenho ou animação tem em algum momento o auxílio dessas ferramentas que são usadas desde simples tratamentos de imagens a complexos motivos gráficos realizados totalmente no computador. Os programas digitais disponibilizam inúmeras ferramentas artísticas e muitas delas permitem representar virtualmente os procedimentos e técnicas tradicionais, tais como desenho a lápis no papel, pintura a óleo, aquarelas, pastel, animação tradicional e de recorte, entre muitas outras. Além do mais, a evolução dos programas de computador vem disponibilizando cada vez mais interfaces^1 que são verdadeiras representações de ambientes de trabalho “real”, ou seja, reunindo em uma única tela de computador boa parte das informações (instrumentos) necessárias para o artista trabalhar na criação. O universo da computação gráfica , no qual as noções de área de trabalho e ferramentas específicas de desenho vão muito além daquilo que realmente se vê na tela do computador – em um único pincel virtual, por exemplo, pode-se encontrar todo tipo de formas, espessura, texturas e contendo as mais variadas cores, sem a necessidade de trocar ou lavar o pincel (Fig. 1.1).

(^1) O termo interface refere-se ao visual do programa no qual o usuário interage diretamente.

Fig. 1.1 – Exemplo de como a computação gráfica faz a representação visual de uma ferramenta tradicional: neste caso, o pincel que tem opções de tamanhos, tipos de texturas.

edição. Estava trabalhando com a técnica tradicional 2D e tinha pouco tempo para animar duas cenas finais com dois personagens que caminhavam. Resolvi, então, experimentar um software de animação para tentar animar os personagens diretamente no computador, a fim de terminar o filme no prazo. O resultado que obtive foi bastante satisfatório, usando o método de animação quadro-a-quadro, típico do tradicional, e a etapa de colorização de todas as cenas também foi feita digitalmente. Assim, utilizando ferramentas digitais similares às tradicionais nas cenas animadas no computador consegui manter o mesmo padrão visual da animação feita à mão (Fig. 1.2).

Fig. 1.2 – Três poses do personagem animado quadro-a-quadro diretamente no computador (P&B) e inserido junto ao cenário também colorido digitalmente. Filme Faltou Faca , 2004 (de Simon Brethé).

Levando em consideração que, na época, eu conhecia muito pouco o software , essa estratégia digital também acelerou a etapa de animação, quando pude perceber que o processo de animação digital que havia adotado seguia de forma semelhante o método de animação feito à mão, mas com algumas diferenças. Essas diferenças, na realidade, correspondiam aos recursos novos que o software oferecia, ou seja, havia trabalhado em um ambiente representado virtualmente cujas características se assemelhavam ao ambiente de trabalho tradicional com alguns recursos que me permitiam acelerar o processo de animação.

A ideia de refletir sobre os recursos digitais voltados para animação 2D tem como objetivo, nesta pesquisa, enfatizar como as ferramentas digitais e as interfaces gráficas são, em sua maioria, representações das mesmas ferramentas e processos tradicionais desenvolvidos ao longo da história da animação, anteriores do advento do computador. Como já dito, o computador desenvolve ferramentas que auxiliam os usuários nas mais diversas tarefas e para que isto seja possível a computação gráfica oferece ambientes virtuais de trabalho e ferramentas muito parecidas com as que são

normalmente vivenciados no ambiente “real”, nas pranchetas, nas mesas de desenho de animação, nas telas de pinturas, nos materiais artísticos, nos estúdios de filmagem etc.

Embora a ideia tenha sido a de reunir exemplos práticos pontuais na história da animação digital, nesta pesquisa esta analise também reflete experiências práticas próprias ao longo de minha aprendizagem com a animação 2D computadorizada e, com o desejo de compartilhar estratégias de animação utilizando ferramentas digitais, mostrar também em quais pontos estas diferem dos procedimentos tradicionais de animação. Não se pretende falar aqui sobre efeitos especiais , por achar que este tema exigiria outro foco da pesquisa. Ressalta-se ainda que não há pretensão alguma de colocar minhas próprias experiências como práticas substitutas das técnicas tradicionais e nem fazer qualquer juízo de valor acerca delas, mas simplesmente o desejo de poder compartilhar com outros animadores ou estudiosos de animação estas experiências. À primeira vista, pode parecer óbvio, mas nem sempre isso fica tão evidente para quem trabalha com algum tipo de tarefa no computador ou mesmo para quem deseja começar a trabalhar com as inúmeras ferramentas digitais disponíveis. Apesar de trabalhar em um ambiente virtual, nem sempre essas semelhanças são percebidas, por exemplo, para quem emprega o software Adobe After Effects e utiliza seus recursos de câmera 3D, a fim de simular a profundidade com mais eficiência e facilidade – na realidade, está trabalhando com uma espécie de câmera multiplana virtual com função muito parecida com a inventada por Walt Disney, em 1937. A tecnologia absorve um processo tradicional e, por ser um recurso inovador, insere propostas que as tornam vantajosas para o seu público alvo. São recursos novos que em alguns momentos ampliam ou alteram o sentido daquilo que já se conhece, podendo dificultar ou facilitar o seu uso – por exemplo, a representação do que se conhece como “ frame ” que é muito mais complexo quando se pensa em digital, pois há várias formas de se visualizar um frame no computador, dependendo do software utilizado: a ideia de frame ganha uma dimensão tão grande que extrapola a maneira como o conhecemos na película cinematográfica.

Voltando no exemplo da modelagem digital 3D, que é similar à maneira de esculpir tradicional, no computador a modelagem difere do fato de que o artista digital trabalha com um objeto virtual representado dentro de um ambiente tridimensional. O objeto pode estar ou não em forma malha e o artista pode escolher o tipo de malha que deseja manipular. O artista, escultor ou modelador também pode manipular cada ponto

ato criativo do artista – por exemplo, a animação feita tradicionalmente no papel em oposição à paperless animation (animação sem papel) diretamente no computador nem sempre será a melhor opção para quem prefere o desenho feito à mão. Há artistas que optam por utilizar o tradicional papel por se sentirem mais à vontade, mas outros podem preferir uma mesa digitalizadora ( tablet ) por ser mais rápida e econômica. No desenho animado dos estúdios Disney, The Princess and the Frog (EUA – 2009), os animadores tiveram a oportunidade de trabalhar com a cintiq – atualmente, uma das mais modernas mesas digitalizadoras que permite desenhar diretamente na tela do computador –, uma forma de desenhar digitalmente mais próxima do método tradicional. Porém, os animadores mais experientes optaram por continuar a trabalhar diretamente no papel.

Ter em mente que tanto o método de produção digital quanto o tradicional são processos similares que, na maioria das vezes, apresentam diferenças interessantes é uma forma de buscar uma posição mais crítica em relação às escolhas por melhores ferramentas que nos atenda, ou seja, qual seria para cada artista a melhor opção para o desenvolvimento de um bom trabalho de animação 2D? Quais seriam as contribuições, possibilidades e dificuldades que certas ferramentas digitais poderiam trazer para o trabalho do artista? Daí a importância de se evidenciar e se compreender as diferenças e semelhanças entre o ambiente digital e o tradicional para que se faça a melhor escolha de trabalho e se possa integrar da melhor forma possível as técnicas tradicionais de animação com as modernas ferramentas digitais.

2. A ANIMAÇÃO TRADICIONAL ATRAVÉS DOS INSTRUMENTOS

Estabelecer um verdadeiro marco na história da animação é uma tarefa um pouco difícil, pois é possível que as primeiras experiências cinematográficas com animação tenham se perdido com o tempo. As primeiras produções com desenhos animados tinham um caráter de simples diversão e eram, na maioria, brinquedos e passatempos curiosos^4 ; talvez por esta razão parte desse material tenha se perdido, devido ao excesso de manuseio, descuido no armazenamento e pela simples banalidade do dispositivo. Para as primeiras películas as perdas eram significativas, pois esses filmes eram extremamente inflamáveis, devido a sua composição química que exigia um cuidado extremo.^5

De acordo com o estudioso Charles Solomon (1994), acredita-se que de metade a dois terços dos filmes feitos antes de 1950 possam ter se perdido, sendo que, em relação ao cinema de animação, esta perda pode ter sido ainda maior: “Talvez duzentos filmes animados da era silenciosa permaneçam em distribuição. Uma fração mínima do que foi lançado entre 1913 e 1928. Existem mais em arquivos e coleções particulares, mas esses raramente são exibidos”^6. Solomon nos dá uma ideia da quantidade de filmes, arquivos particulares, aparelhos ou até mesmo brinquedos ópticos que podem estar esquecidos em algum lugar, esperando serem descobertos para, assim, revelar novas experiências de autores ainda anônimos sobre a arte do movimento. Os filmes e dispositivos que não foram registrados pelos historiadores e que se perderam definitivamente no tempo nos fazem pensar o quanto a história da animação possa estar incompleta.

Atualmente, os filmes ou emulsões cinematográficas são fitas fotográficas compostas de uma base fixa de celulóide recoberta por uma camada química sensível à luz, o nitrato de prata, uma substância muito mais segura e não inflamável. Os tipos

(^4) Flips books , taumatroscópios , estroboscópios são exemplos de instrumentos de uso caseiro que eram comprados em lojas de brinquedos para simples diversão. (^5) As primeiras películas tinham em sua composição o nitrato de potássio , um composto químico altamente inflamável que, guardadas em locas fechados, tornavam-se extremamente explosivas, pois liberavam um gás inflamável, principalmente quando ficavam muito tempo condicionadas dentro das latas. Para piorar a situação, os projetores da época utilizavam como fonte luminosa o arco voltaico, uma espécie de resistência elétrica que esquentava muito, tornando a projeção muito mais perigosa para o filme que era exibido, resultando, às vezes, em incêndios. (^6) SOLOMON, 1994, p. 21 (tradução livre).

vão disputar “espaço” nos cinemas; o terceiro é a fase em que a animação vai modernizar sua linguagem, correspondendo a um período de experimentação técnica, entre 1930 a 1940; e o quarto momento é a animação como arte autônoma, sendo usada nos mais variados meios de exibição, desde comercial a filmes educativos.^8 O desenvolvimento dessas fases terá influência principalmente das tecnologias aplicadas ao processo produtivo que, de diferentes formas, serão as ferramentas de expressão do artista.

O desejo do homem de tornar real o movimento a partir de imagens estáticas já era percebido bem antes do cinema surgir. Um número extraordinário de experimentos visuais e dispositivos tecnológicos conduziu o homem ao experimentalismo incessante, a fim de obter a representação gráfica do movimento da forma mais consistente e interessante possível. Somos constantemente estimulados por todo tipo de movimento que nos dá a sensação de que tudo parece ter vida. Foi através de nossa capacidade de representação por meios de símbolos gráficos que o homem aprendeu a criar narrativas e sugerir movimentos através das mais variadas formas de expressão gráfica. Essa necessidade de contar um fato ou criar o movimento no espaço e tempo vem desde a Pré-História, quando o homem das cavernas desenhava, por exemplo, javalis com mais pernas do que realmente tinha. Nas palavras de Tassara (1996):

Assim a idéia de registrar e reproduzir imagens em movimento encontra-se entre as mais remotas aspirações do ser humano. Isto se torna claro quando examinamos algumas das antigas pinturas rupestres que chegaram até nós – vindas das sombras da Pré-História – e nas quais a noção de velocidade se manifesta, representada de maneira curiosa e sintética, em desenhos de animais dotados de múltiplas pernas.^9

As representações de narrativas e tentativas de capturar o movimento continuaram nas civilizações seguintes. Dentre alguns interessantes exemplos destacam- se as representações de narrativas em murais egípcios que muitas vezes contavam a trajetória dos faraós, como Ramses II que construiu um templo em homenagem à deusa Isis, onde havia 110 colunas, cada uma com uma pintura da deusa ligeiramente diferente da anterior.^10 O famoso desenho de Proporções do corpo humano no qual Leonardo da

(^8) HALAS & MANVELL, 1979, p. 15. (^9) TASSARA in BRUZZO, 1996, p. 13. (^10) WILLIAMS, 2001, p. 12 (tradução livre).

Vinci concebeu um homem com o dobro de seus membros – um trabalho que lembra os estudos de personagens feitos por animadores, tecnicamente conhecido como model- sheet ou folha de modelo^11 (Fig. 2.2). Há também os inúmeros brinquedos ópticos cujo caráter principal era de entretenimento, servindo tecnicamente como interessantes estudos sobre o movimento. Dentre os exemplos mais famosos, temos o flipbook , o fenaquitoscópio , o zootrópico e muitos outros que se tornaram instrumentos mágicos, na segunda metade do século XIX. Destaque para o flipbook , 1868, e que Lucena Júnior (2002) cita como “a mais duradoura, barata e popular” invenção que influenciou muitos animadores.^12 Esses brinquedos eram instrumentos com pequenas sequências de desenhos, geralmente ciclos, que baseavam seu funcionamento no fenômeno da persistência da visão, como descreve Tassara (1996):

Descrevendo sucintamente este fenômeno, diríamos que qualquer imagem persiste na retina, após atingi-la durante um pequeno intervalo de tempo (aproximadamente 1/16 de segundo). Só então a imagem se desvanece por completo. Portanto, se procedermos de tal maneira a “bombardear” o olho com uma série de imagens fixas consecutivas – sendo que entre cada uma e a sua subseqüente se verifique uma ligeira diferença de posição, correspondente ao deslocamento dos objetos –, criaremos a sensação de que esses mesmos objetos estão se movendo. Para isso, bastará que, entre uma imagem e outra, o lapso de tempo seja inferior a 1/16 de segundo.^13

Fig. 2.2 – Desenhos que passam a ideia do movimento.

Portanto, o homem dispunha de conhecimentos cientifico e técnico sobre a ilusão do movimento e dominava muito bem os elementos da arte, restava uma invenção que unisse todo esse conhecimento adquirido ao longo de muitos anos, e o

(^11) Model sheet ou folha de modelo: o animador, após escolher a forma final do personagem, dispõe-no de corpo inteiro em ângulos diferentes numa mesma folha, como referência para outros animadores que irão trabalhar com este mesmo personagem. (^12) LUCENA JÚNIOR, 2002, p. 35. (^13) TASSARA in BRUZZO, 1996, pp. 16-17.

transparente chamado crystaloid^17 , sequências de imagens da mesma forma que fazia com as tiras de papel no praxinoscópio. As sequências eram dispostas em rolos e com um sistema de engrenagens ele podia controlar a velocidade de passagem das imagens pelo projetor, para dar a ilusão de movimento. Um cenário era projetado por meio de um segundo projetor na mesma tela e isto fazia com que houvesse sobreposição de imagens do personagem no cenário. Para que isso fosse possível, Reynaud desenvolveu uma estratégia na qual pintava na tira do crystaloid as sequências de imagens do personagem e, em sua volta, pintava com tinta opaca da cor preta. Dessa forma, quando projetado, apenas a imagem do personagem se sobrepunha sobre o cenário.

Fig.2.3 – Acima, o praxinoscópio e Émile Reynaud trabalhando em uma projeção do seuimagens pintadas no teatrocrystaloid óptico. Abaixo, um detalhe (. Repare no aparelho, a fita com as frame ) de dois personagens do “filme” Pauvre Pierrot (França – 1892). Reynaud pintava com tinta opaca em volta dos personagens para impedir que aluz passasse. Fonte : Wikipédia. (2010)

Importante salientar que Reynaud conseguiu naquela época, sem nenhum recurso digital, uma espécie de camada transparente – a tinta opaca preta pintada ao redor do personagem – e a montagem em camadas, ou seja, a sobreposição do personagem no cenário. Ele também introduziu o conceito de rolo fílmico, ao dispor seus filmes de 30 pés (um pouco mais de nove metros) em dois rolos em seu aparato tecnológico – um grande avanço naquele momento.

Trabalhando com a ideia de camadas e “transparência”, Reynaud não precisava redesenhar o cenário toda vez que a posição do personagem mudasse. Lembrando que

(^17) WILLIAMS, 2001, p. 14 (tradução livre).

isso é um requisito básico nos filmes de animação – que, atualmente, é muito simples de se fazer digitalmente – e tornou-se um feito extraordinário com os recursos disponíveis naquela época.

Os filmes, chamados por ele de pantomimes lumineuses , tinham a duração de 15 minutos, exigindo a confecção de centenas de desenhos. Coloridos, apresentavam enredo, trilha sonora sincronizada e personagens desenhados de maneira que seus movimentos estivessem rigorosamente adaptados ao cenário.^18

Reynaud também administrava o tempo da narrativa através do controle da velocidade de passagem das imagens dos personagens, apesar deste controle de tempo acontecer durante a projeção – uma forma primitiva de conceder um timing^19 das ações dos personagens e também o ritmo da narrativa de acordo com a música.

O que se conhece, hoje, sobre o trabalho de Reynaud baseia-se apenas em Pauvre Pierrot (França – 1892) e Autour d’une Cabine (França – 1894). Ambos apresentam narrativas simples e percebe-se claramente o uso da perspectiva bem elaborada e a sobreposição de imagens nos cenários (Fig. 2.4). A perspectiva é sugerida quando os personagens tem o tamanho reduzido ao entrarem na água e a sobreposição de imagens é percebida pela ligeira transparência nos personagens – provavelmente, algo também notado pelos espectadores, devido às duas projeções na mesma tela.

Fig. 2.4 – À esquerda, um “ frame ” de Pauvre Pierrot 1894). Fonte (França – 1892) e, à direita,: F1movies.com Autour d’une Cabine (França –

(^18) LUCENA JÚNIOR, 2002, p. 36. (^19) Do inglês Timing – o estudo detalhado do tempo para determinar o número de imagens utilizado em um movimento, calculando-se assim o tempo da ação desejado (BRUZZO, 1996, p. 223).