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A fenomenologia e a. Gestalt foram as responsáveis por essas mudanças, ao defender que não há diferença entre sensação e percepção, porque não temos sensações ...
Tipologia: Notas de aula
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Orientador: Prof. Dr. Carlos Alberto Mourão Júnior
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Psicologia por Andréa Olimpio de Oliveira Orientador: Prof. Dr. Carlos Alberto Mourão-Júnior.
“ Esclarecimento (Aufklärung) significa a saída do homem de sua minoridade, pela qual ele próprio é responsável.” (Kant)
O presente estudo tem como objetivo investigar o conceito de percepção na Filosofia e Neurociência. Para tanto, descrevemos alguns aspectos históricos da neurociência cognitiva sobre as funções psicológicas superiores, bem como ressaltamos a importância do estudo da percepção no desenvolvimento humano e processos sócio-educativos. Na Filosofia, duas grandes concepções sobre a sensação e a percepção fazem parte da tradição filosófica: o Empirismo e o Racionalismo. No século XX, contudo, a Filosofia alterou bastante essas duas tradições através de uma nova concepção do conhecimento sensível. As mudanças foram trazidas pela Fenomenologia e pela Psicologia da Forma ou teoria da Gestalt. A percepção apresenta estreita ligação com os sentidos, sendo as primeiras etapas realizadas pelos sistemas sensoriais, responsáveis por sua fase analítica. É como se cada característica fosse separada em suas partes constituintes, tais como forma, cor, movimentos e assim por diante. Porém, percebemos o mundo com totalidades integradas e não com sensações fracionadas, o que faz supor que existam outros mecanismos, além daqueles de natureza analítica, que contribuem para nossa percepção sintética. Faz-se necessário entender como a percepção, conceito estritamente subjetivo, se relaciona com o cérebro, abordagem amplamente estudada pela Neurociência Cognitiva. Finalmente, destacamos a importante investigação acerca da percepção realizada pelo neurocientista contemporâneo, Joaquin Fuster, demonstrando como William James, no final do século XIX, já havia escrito de forma muito semelhante. Palavras-chave: Percepção. Neurociência Cognitiva. Filosofia.
Figura 1 Área de Brodmann
Figura 2 Estrutura do neurônio
Figura 3 Um exemplo de fenômeno figura-fundo
Figura 4 Exemplo de formas incompletas
Figura 5 Vista lateral do hemisfério esquerdo de uma macaco rhesus
Figura 6 Geons: arranjos de diferentes objetos
Figura 7 Objetos degradados
Figura 8 Princípios Gestalt de organização
LISTA DE FIGURAS ............................................................................................ vii INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 01 CAPÍTULO 1 - Neurociência Cognitiva e as Funções Psicológicas Superiores: Aspectos Históricos .................................................................................................. 04 CAPÍTULO 2 - Importância da Percepção no Desenvolvimento Humano e nos Processos Sócio-Educativos ..................................................................................... 11 CAPÍTULO 3 - O Conceito de Percepção ............................................................... 21 3.1 O conceito de percepção na filosofia ................................................................. 22 3.2 O conceito de percepção na visão das neurociências ......................................... 33 3.3 A filosofia da mente ........................................................................................... 43 CAPÍTULO 4 – Percepção Segundo William James e Joaquin Fuster..................... 49 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 73 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................... 76
às etapas do desenvolvimento humano, bem como correlaciona-los aos processos de aprendizagem. Numa perspectiva filosófica, duas grandes concepções, sobre a sensação e a percepção, vêm sendo adotadas para explicar como a percepção influencia a aquisição de conhecimentos: o empirismo e o racionalismo. O empirismo é uma corrente filosófica que defende a ideia de que apenas as experiências são capazes de gerar conhecimentos. O racionalismo acredita que a mente humana é o único instrumento capaz de chegar à verdade sobre as coisas, a razão, tomada em si mesma e sem apoio da experiência sensível, é o fundamento do conhecimento verdadeiro. No século XX, porém, a filosofia alterou essas duas tradições através de uma nova concepção do conhecimento sensível. A fenomenologia e a Gestalt foram as responsáveis por essas mudanças, ao defender que não há diferença entre sensação e percepção, porque não temos sensações parciais, ou seja, sensações separadas de suas qualidades. Sentimos e percebemos totalidades estruturadas dotadas de sentido e significação. Para a neurociência, sensação e percepção são dois fenômenos distintos. A percepção está intricamente relacionada à sensação, sendo sua primeira etapa realizada pelos sistemas sensoriais, responsáveis por sua fase analítica. Contudo, percebemos os objetos integrados, como um todo, e não características fracionadas, o que faz supor que existam outros mecanismos, além daqueles de natureza analítica, que colaboram para a formação da percepção sintética. Além do mais, é necessário compreender como a percepção, conceito estritamente subjetivo se relaciona com o cérebro, abordagem estudada pela Neurociência Cognitiva. Diversas abordagens na Filosofia da Mente vêm tentando responder esses questionamentos, sobre o caráter redutível da percepção a um fenômeno biológico. As concepções variam desde explicações de que não possuirmos ainda uma ciência capaz de dar explicações detalhadas acerca do cérebro, até outras que utilizam explicações puramente funcionais. Contudo, permanece uma objeção a esse conjunto de indagações que se refere aos qualia, ou seja, tudo aquilo que possui caráter qualitativo-fenomenal na consciência. Finalmente, para enriquecer esse debate conceitual sobre a percepção, lançamos mão de dois autores: Joaquin Fuster e William James. Em Fuster encontramos uma explicação neurocientífica acerca das bases da cognição, sua relação com as modalidades sensoriais, seu caráter histórico e uma defesa da Gestalt aplicada à neurociência. A Gestalt é vista como a abordagem mais provável à investigação do isomorfismo entre percepção e função cerebral. William James abordou a percepção de forma muito semelhante no final do século XIX,
ressaltando a diferença entre percepção e sensação, seu caráter histórico, os diversos tipos de ilusão perceptiva, o debate acerca da apercepção, bem como os processos fisiológicos existentes.
A Neurociência contemporânea está construída sobre o forte fundamento de descobertas individuais, e cada uma dessas descobertas desempenhou sua função ao revelar os mistérios do cérebro e como este se relaciona com nossos pensamentos e comportamentos. A visão acerca do funcionamento do cérebro mudou nos últimos cem anos e continua a mudar. No século XIX, entre 1810 e 1819, o frenologista Franz Joseph Gall, acreditava que as saliências na superfície do crânio refletiam circunvoluções na superfície do cérebro e propôs que a propensão a certos traços de personalidade, como a generosidade, a timidez e a destrutividade podia estar relacionada às dimensões da cabeça. Assim, funções cognitivas básicas como a linguagem e a percepção, esperança e autoestima, eram concebidas como sendo mantidas por regiões específicas do cérebro. Para sustentar seu argumento, Gall e seus seguidores coletaram e mediram cuidadosamente o crânio de centenas de pessoas representando uma variedade de tipos de personalidades, desde indivíduos mais privilegiados até os criminosos e loucos. Esta nova “ciência” de correlacionar a estrutura da cabeça com traços de personalidade foi denominada de frenologia – phrenos = mente e logos = estudo. (Bear et al ., 2008). Gall propôs ainda, que como resultado do uso, o centro para cada função mental aumentaria de tamanho, de forma idêntica ao aumento do tamanho de um músculo pelo exercício. Esse aumento de tamanho de uma região cerebral causaria uma distorção no crânio. Assim Gall, a cerca de 200 anos, foi o pioneiro da noção de que diferentes funções mentais são realmente localizadas em diferentes partes do cérebro – localizacionismo cerebral, porém ele estava enganado em como isso é conseguido pelo cérebro (Kandel, Schwartz & Jessell, 2000). Mais tarde a frenologia foi rejeitada e descartada pela comunidade científica como uma forma de charlatanismo e pseudociência, tendo, apenas, uma importância histórica, sendo suplantada pelos campos em desenvolvimento da Psicologia e da Neurociência. Podemos afirmar, que os frenólogos desempenharam um papel relevante, ainda que equivocado, nos primeiros avanços da Neurociência moderna. Hoje sabemos que existe uma nítida divisão de trabalho no encéfalo, com diferentes partes realizando funções bem distintas. O cientista creditado por influenciar a comunidade científica a estabelecer a localização das funções cerebrais foi o neurologista francês Paul Broca, em 1861. Broca descreveu o caso de um paciente que era capaz de entender o que se dizia a ele, mas incapaz de falar. Esse paciente não apresentava qualquer problema motor aparente em sua língua, boca ou cordas vocais passível de interferir em sua fala. Era capaz de enunciar palavras isoladas e de cantar uma melodia sem dificuldade, mas não conseguia falar gramaticalmente
ou utilizando frases completas, nem tampouco conseguia expressar seus pensamentos por escrito. O exame do cérebro desse paciente, após sua morte, revelou uma lesão posterior do lobo frontal esquerdo – região que hoje é conhecida por Área de Broca. Baseado em estudos de oito pacientes com quadros semelhantes, este neurologista concluiu que esta região do cérebro humano era especificamente responsável pelo controle da expressão motora da fala (Kandel et al. , 2000). O trabalho de Paul Broca estimulou a busca dos locais corticais de outras funções comportamentais específicas. Em 1870, na Alemanha, o fisiologista Gustav Fritsch e o psiquiatra Eduard Hitzig descobriram que a estimulação elétrica de determinadas regiões do cérebro do cão produzia movimentos característicos dos membros. Verificaram que movimentos isolados eram controlados por regiões bem definidas do córtex e que esses movimentos das patas eram produzidos pela estimulação do giro pós-central do córtex motor contralateral. Essa descoberta levou os neuroanatomistas a uma análise mais detalhada do córtex cerebral e sua organização celular. Assim, no ser humano, a mão direita, usada comumente para a escrita e para os movimentos que exijam habilidades, é controlada pelo mesmo hemisfério esquerdo que controla a fala e, na maioria das pessoas, o hemisfério esquerdo é considerado como dominante (Kandel et al. , 2000), responsável pelo pensamento lógico e competência comunicativa, enquanto o hemisfério direito é responsável pelo pensamento simbólico e criatividade. Nos canhotos as funções estão invertidas. O hemisfério esquerdo diz-se dominante, pois nele localiza-se a área de Broca, a área responsável pela motricidade e pela fala e a área de Wernicke, o córtex responsável pela compreensão verbal. Carl Wernicke, em 1876, propôs uma teoria para a linguagem a partir do estudo de um caso de uma vítima de acidente vascular cerebral. Nesse trabalho Wernicke descreveu um novo tipo de afasia – uma categoria de distúrbio de linguagem, relacionado ao distúrbio da compreensão e não da execução. Enquanto os pacientes de Broca podiam entender, mas não conseguiam falar, o paciente de Wernicke podia falar, mas não compreendia a fala, já que o que o paciente dizia não fazia sentido nem mesmo para ele mesmo. De acordo com Wernicke, as funções mentais não estariam localizadas em regiões cerebrais específicas, mas sim, cada função estaria difusamente representada por todo o córtex. Ele propôs que apenas as funções mentais mais básicas, as relacionadas com as atividades perceptivas e motoras mais simples, estariam localizadas em áreas corticais únicas, e que as funções intelectuais mais complexas resultariam das interconexões entre várias regiões funcionais. Ao colocar o princípio da localização das funções dentro de uma perspectiva conexiva, Wernicke admitia que os vários componentes de um mesmo comportamento seriam processados em regiões cerebrais
Figura 1 – Área de Brodmann
Assim, no começo do século XX, já existiam evidências convincentes, funcionais e anatômicas, para a existência de várias áreas distintas no córtex, e para algumas delas podiam ser atribuídas participação específica em determinados comportamentos. No início do século XX quase todos queriam provar que algum grau de localização funcional ocorria no córtex cerebral. No final de 1930, o médico Edgar Adrian, na Inglaterra e Wade Marshall e Philip Bard, nos Estados Unidos, comprovaram que estímulos aplicados sobre a superfície corporal (no caso de um gato) geravam atividades elétricas em áreas específicas do córtex cerebral descritas por Brodmann. No final de 1950, o neurocirurgião Wilder Penfield usou pequenos eletrodos para estimular o córtex cerebral de pacientes que, em neurocirurgias, estavam despertos e assim, conseguiu confirmar as áreas descritas por Broca e Wernicke. Mais recentemente, George Ojemann, professor no Departamento de Cirurgia Neurológica, da University of Washington School of Medicine, descobriu outras áreas essenciais para a linguagem, indicando que as redes neurais para a linguagem são maiores do que aquelas delimitadas por Broca e Wernicke. (Tabacow, 2006). Lent (2010) ressalta que o trabalho de mais de um século dos neurologistas que estudaram o efeito das lesões cerebrais sobre a linguagem possibilitou concluir que os diversos componentes dessa função estão representados em regiões cerebrais circunscritas. A lógica desses estudos, no entanto, admitia que, se o desaparecimento de uma região do cérebro produzisse um déficit funcional, então seria essa região, em condições normais, a “sede” dessa função.
Atualmente esse quadro se modificou, pois essa lógica não considerava a hipótese de que após uma lesão o cérebro poderia se reorganizar de algum modo, com outras regiões passando a participar da função. Assim, o déficit final poderia não refletir exatamente a pura falta da região lesada, e sim o resultado da reorganização funcional do sistema. Essa dúvida foi esclarecida com o advento das técnicas de imagem funcional computadorizada do sistema nervoso. Através dessas técnicas, podem-se produzir imagens precisas do fluxo sanguíneo cerebral ou do metabolismo neuronal de indivíduos normais, representando-os em cores diversas para os diferentes valores medidos. (Lent, 2010). O desenvolvimento tecnológico, a ressonância magnética, a tomografia e outros exames possibilitaram um melhor estudo do cérebro. Os avanços tecnológicos – os estudos de imagem como a IRMf – Imagem por Ressonância Magnética Funcional, permitem várias maneiras de obter informações detalhadas sobre a estrutura e o funcionamento do cérebro, como por exemplo, nos ajuda a identificar quais regiões do cérebro ficam relativamente mais ativas quando um pensamento, emoção ou comportamento correspondente acontece. Hoje, é possível estabelecer onde e quando ocorrem no cérebro os processos cognitivos específicos. Essa informação pode permitir determinar a ordem em que diversas partes do cérebro tornam- se ativas quando alguém está realizando uma tarefa, além de permitir também verificar se duas tarefas envolvem as mesmas partes do cérebro da mesma maneira ou se há diferenças consideráveis entre elas (Eysenck & Keane, 2007). Posner e seus colegas, por exemplo, usando a tomografia por emissão de pósitrons ( Pósitron Emission Tomography, PET ), descobriram que as vias neurais aferentes para a produção e para a compreensão da linguagem eram processadas por mais de uma via. Pretendiam investigar como as palavras individuais são codificadas, no cérebro, quando essas palavras são lidas ou ouvidas. Através da utilização do PET , verificaram que, quando as palavras eram ouvidas, a área de Wernicke fica ativa, mas quando as mesmas são vistas, mas não ouvidas, ou faladas, não ocorre ativação desta área. A informação visual, do córtex occipital, parece passar diretamente para a área de Broca, sem ser, contudo, transformada em uma representação auditiva, no córtex temporal posterior. A partir desses resultados, Posner e seus colegas concluíram que diferentes vias cerebrais e códigos sensoriais são usados na percepção de palavras apresentadas visual ou verbalmente. E, mais ainda, propuseram que essas vias teriam acesso independente à atribuição de significado e de expressão da linguagem, relacionadas às regiões superiores do cérebro (Kandel et al., 2000). Experimentos como esses são fortes evidências da tese dos localizacionistas de que o sistema nervoso opera como um mosaico de regiões, cada uma responsável por realizar uma
Todo ato mental, seja ele a percepção de um objeto, um enunciado verbal, a resolução de um problema, é constituído de um conjunto dinâmico e interconexo de componentes psicológicos (volitivos, afetivos, cognitivos) e de regiões cerebrais, onde cada uma dessas áreas contribui com operações básicas para o funcionamento do sistema ou ato como um todo. Sua estrutura psicológica e sua organização cerebral mudam a cada instante, da mesma forma em que mudam as tarefas em pauta, conferindo a esse processo um caráter dinâmico. Cada tarefa pressupõe um conjunto diferente de operações psíquicas básicas adequadas aos seus objetivos e, ainda, componentes motivacionais e emocionais sempre presentes. Segundo este conceito, apenas algumas operações ou mecanismos básicos podem ser localizados em determinadas regiões do cérebro, não as próprias funções psíquicas superiores; permanecendo constantes apenas os objetivos ou resultados finais da atividade, devendo variar seus mecanismos ou operações básicas na medida em que mudam as condições na qual se realizam. (Damasceno, 2004). O cérebro humano é formado por quase cem bilhões de neurônios intrinsecamente conectados que permite desde a regulação de funções básicas, como a respiração, até tarefas elaboradas, tais como acreditar num conceito (Ledoux, 2002). Todas as condutas humanas, sejam elas explícitas ou implícitas, são possibilitadas por essas redes neurais. Nos seres humanos, grande parte dos neurônios é formada em um período que antecede o nascimento. O auge de produção pode chegar a aproximadamente 250. neurônios por minuto (Cowan, 1979). Esse processo é controlado por diversos fatores que se difundem no tubo neural. Pode parecer, num primeiro momento, que o desenvolvimento embrionário depende unicamente de um comando genético. Entretanto, fatores epigenéticos desempenham um papel crucial nesse processo (Ledoux, 2002). Por exemplo, se houver a ingestão de álcool, drogas, no período inicial da gestação, a produção neural sofre alterações e podem surgir quadros de anencefalia, espinha bífida (Leonardo & Hen, 2006). A idéia de que a vida humana inicia-se a partir da fecundação envolvendo a
participação de células germinativas, masculina e feminina, data do século XIX. Antes disso e por milhares de anos, a grande maioria das pessoas acreditava que a vida iniciava-se no nascimento e que a explicação para o fato dos filhos se parecerem mais com os pais do que com outros membros do grupo a que pertenciam baseava-se na hereditariedade ( Nature: natureza biológica) ou no ambiente ( Nurture: “ alimentado” pelo ambiente) (Pinheiro, 2007). Tais conceitos distorcidos resultaram, entre outros, nas crenças da Herança do Sangue (os filhos se parecem com os pais porque recebem destes, via sangue, uma mistura de elementos) e da Herança do Sêmen (o sêmen possui a capacidade de dar vida ao novo ser; a mulher é um mero receptáculo onde se semeia o germe da vida), ambas inatistas, pois admitem que o indivíduo “já nasce pronto”, podendo-se aperfeiçoar pouco aquilo que ele é ou fatalmente virá a ser, pois “o que é bom já nasce feito”. Estas concepções têm até hoje inúmeros adeptos e sua influência pode ser percebida facilmente no cotidiano através do uso de expressões do tipo “está no sangue”, “João é inteligente porque herdou a inteligência do pai e/ou da mãe”, “filho de peixe peixinho é”, entre outras (Pinheiro, 1996). Ao lado dessas crenças, destaca-se uma concepção conhecida na esfera da Biologia como Herança dos Caracteres Adquiridos ; esta se resume em admitir que as condições a que os pais estão expostos ao longo da vida determinam as características dos filhos. Neste sentido, os processos de interação que se realizam entre as pessoas dependem da aprendizagem e nada têm a ver com o desenvolvimento das estruturas biológicas. Em outras palavras, todo conhecimento provém da experiência, e por isso o indivíduo é considerado um produto do meio. A superação da questão dualista nature-nurture , ocorrida no século XIX, resultou no reconhecimento da participação tanto dos fatores hereditários quanto dos fatores ambientais na determinação das características físicas e comportamentais do ser humano, dando início ao paradigma interacionista. Desse modo, em relação a uma dada característica, por exemplo, a inteligência, admite-se que ela resulta da interação dos genes herdados com o ambiente (intra e extrauterino) em que a criança se desenvolve (Pinheiro, 1996). Natureza e cultura interagem nas experiências do sujeito, contribuindo para a formação do cérebro e para o estabelecimento de sinapses (Ledoux, 2002). A construção da intersubjetividade, a consciência de si e dos outros, o conhecimento social, a capacidade de entender as intenções alheias, entre tantas outras capacidades, só se constituem na interação e pela interação com os outros. Deparamo-nos assim, com o problema de explicar a grande adaptabilidade do cérebro frente aos variados ambientes sociais e culturais ao longo da história. Como é possível a plasticidade?