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Uma análise da normas jurídicas ambientais no brasil, sua hierarquia e a importância de sua aplicação. Além disso, discute as diferentes gerações de direitos humanos e o papel do direito ambiental como direito coletivo. O texto também aborda a supremacia do direito ambiental sobre o direito privado e a importância da educação ambiental.
O que você vai aprender
Tipologia: Notas de aula
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(^1) Art. 4º da lei 4771/65, alterado pela Medida Provisória 2.166-67/2000.
As leis são fruto do desejo coletivo demonstrado através de documentos normativos elaborados por representantes democraticamente escolhidos. No entanto, pode-se afirmar que, no momento da sua elaboração, há também a democrática manifestação de segmentos da sociedade, exercendo mecanismos de “pressão”, no sentido de fazer aprovar uma ou outra norma, conforme o interesse representado. No momento da discussão para elaboração dos atos normativos, vários são os interesses envolvidos; dentre os quais se pode considerar o interesse ecológico, seja no sentido de proibir totalmente o uso do bem ambiental, ou no sentido de impor o seu uso racional, donde podem sair várias correntes, de acordo com o que se entende como “uso racional”. No entanto, tal interesse é apenas um dos fatores na formação do “jogo” de vontades que alicerçam a construção normativa. Ainda que haja um conhecimento atual e abrangente sobre um bem ou componente ambiental, isto não quer dizer que ele obrigatoriamente tenha que ser empregado na elaboração das leis ou a elas incorporado. Isto acontece porque a sociedade, através dos representantes escolhidos, pode optar por um uso para o bem ambiental, diverso do proposto pela recomendação técnica. Os manguezais estão entre os ecossistemas costeiros com maiores restrições normativas de uso, tanto em escala global como no litoral brasileiro. Na realidade, em virtude dos diversos diplomas legais que incidem sobre este bem ambiental, constata-se que, juridicamente, no Brasil, “exceto nos casos de utilidade pública, devidamente caracterizados e motivados em procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto” , apenas a extração de caranguejos e ostras é permitida, e ainda assim^1 fora dos eventuais períodos de defeso. Para Lana (2003a, p. 322), uma das conseqüências paradoxais destas atuais normas restritivas seria o fato de que, uma vez que os manguezais não podem ser legalmente explorados ou utilizados, costumam ser tratados como recursos sem valor, não havendo interesse das populações locais em conservá-los.
O que se vislumbra é que o homem busca, de forma direta ou indireta, o uso da natureza, e que no caso específico dos manguezais, a restrição total ao uso do ecossistema pode paradoxalmente colocá-los em risco. Embora as normas ambientais venham sugerindo ou impondo a conservação estrita destes sistemas, há evidências científicas ou práticas históricas de uso que amparam a sua utilização sustentada e racional (LANA, 2003a). Apesar das restrições legais, estes ambientes vêm sofrendo alterações antrópicas ao longo do tempo, de forma direta ou indireta. O uso direto dos manguezais, através da exploração para obtenção de madeira; para instalação de moradias ou através do extrativismo, é tradicionalmente praticado pelas camadas da população de baixo poder aquisitivo, que vêem no manguezal uma maneira informal de sobrevivência. Há ainda o desmatamento para expansão de bairros populares, ocupados por populações de baixa renda e poluição por esgotos ou lixo sólido (LACERDA, 2003). Por outro lado, o uso indireto, para expansão portuária ou especulação imobiliária para áreas de lazer, é reflexo da interferência de grupos economicamente “fortes”. É uma crença corrente, que resta por demonstrar de forma sistemática, que “o uso do mangue por pessoas e interesses externos tem desmatado mais a vegetação do que o que seria realizado pelas comunidades locais” (DIEGUES, 2001, p. 212). O grande desafio da atualidade é frear o crescimento contínuo e ilimitado do uso dos recursos naturais, de forma a manter um desenvolvimento viável ou sustentável. Percebe-se, pois, que o problema não está somente nas normas em si, mas na falta de políticas públicas adequadas, que visem um desenvolvimento sustentável, cientificamente viável. Há a necessidade de “um esforço de construção cumulativa de uma estrutura teórica cada vez mais consciente e alimentada pela utilização de métodos de coleta e análise de dados empíricos comensurados à complexidade dos problemas sócio-ambientais” (VIEIRA & WEBER, 1997, p. 20). Neste contexto, o conhecimento científico a respeito da repercussão do uso do bem ambiental torna-se essencial para aferir a sua sustentabilidade seja no tocante aos aspectos econômicos, seja nos aspectos sociais envolvidos. Este conhecimento é imprescindível para a implantação de planos de gerenciamento que
Considerando-se que a produção normativa depende do momento político vivido pela sociedade e que o momento da produção científica depende do avanço de pesquisas e do desenvolvimento tecnológico, e que ambos, o político e o científico, ocorrem de forma independente, é pertinente avaliar se uma convergência destes momentos ocorre de fato na elaboração da norma jurídica no quadro legislativo e sócio-político brasileiro. Desta forma, o presente trabalho propõe-se a testar a hipótese de que a legislação ambiental nem sempre mantém consonância com o melhor conhecimento científico disponível à época de sua elaboração; tendo como estudo de caso a situação jurídica e a evolução do conhecimento científico sobre os manguezais. Neste sentido, a pergunta que surge naturalmente e que constitui o objetivo central deste trabalho é a seguinte: As normas ambientais são resultado do melhor e mais abrangente conhecimento científico disponível? Até que ponto sua aplicabilidade e eficiência dependem da aderência ao conhecimento científico disponível? Para tanto, é necessário saber como as normas são elaboradas e como o conhecimento científico é utilizado, quando utilizado. Para cada norma ambiental editada, cabe uma análise do seu grau de aplicabilidade, eficiência e eficácia. Paralelamente, faz-se necessário um estudo sobre o conhecimento científico disponível em cada fase de inovação normativa. Não obstante possa existir o melhor conhecimento técnico-científico empregado na norma ambiental, ainda resta saber se ele será utilizado, de que forma isto vai acontecer ou a que finalidade ele se prestará, considerando que nem sempre a produção do conhecimento científico toma em consideração os resultados a que se destina no momento político vigente. Neste contexto, a aplicação das leis depende também da conscientização pública do porquê da proteção normativa. Para uma melhor compreensão das etapas da elaboração das normas legais, o presente trabalho será apresentado em seções que abordarão os seguintes pontos específicos:
interpretadas e aplicadas, e como integram o ordenamento jurídico brasileiro. Esta será uma abordagem teórica, com apoio na literatura pertinente.
Houve ainda análise direta a partir do texto normativo, bem como através de atas de Reuniões do Conselho Nacional do Meio Ambiente, entrevistas e análise de algumas Resoluções do CONAMA. Em seguida foi feita uma avaliação crítica da cientificidade das normas jurídicas incidentes sobre os manguezais do litoral brasileiro. Para tanto, apresentou- se uma evolução das normas ambientais relativas aos manguezais, bem como do conhecimento científico disponível em cada momento normativo. A partir dos dados compilados foi possível fazer uma inter-relação entre o normativo e o científico no intuito de se verificar a incorporação deste naquele nos vários momentos normativos. Houve necessidade, também, de se apresentar um panorama das normas incidentes atualmente sobre os manguezais, o que se fez através de um quadro jurídico atual e os conceitos científicos incorporados. Apresentado o aspecto normativo, foi feita uma análise dos estudos científicos atualizados no intuito de se verificar se as normas atuais incorporam o conhecimento científico contemporâneo. A apresentação foi feita com base nos textos normativos e estudos científicos disponíveis.
A Teoria Pura do Direito, preconizada por Kelsen (Doutrina Positivista), vislumbra o caráter meramente formal da norma jurídica, a qual, entende, deva ser libertada do elemento ideológico, desligando-a completamente da norma moral. “Assim, lei jurídica associa condição jurídica à conseqüência jurídica” (KELSEN, 2003, p. 67). A pena é aplicada ao delito, não como efeito de uma causa. Esta corrente doutrinária interpreta a norma jurídica tal qual uma lei matemática ou física. Ocorre, porém, que as leis da física são interpretadas através de um reducionismo lógico cujas conseqüências se desenrolam através da simples dedução comprovada. A doutrina positivista é considerada superada pelas teorias contemporâneas, de modo que o Direito é muito mais do que propôs essa doutrina. É um trabalho axiológico que deve considerar todos os preceitos que circundam a norma, como os éticos e morais. Neste caso, a “verdade” encontrada ou a conclusão específica estarão impregnadas de valores sociais obtidos através da realidade posta. Nos dizeres de Reale, “as leis físicas são resultado de uma elaboração direta a partir do fato, porque são explicações transubjetivas do fato. A norma jurídica tem o fato como sua condição; mas não como razão suficiente de sua gênese”, tendo o valor como pressuposto para a tomada de posição perante o fato (2002a, p. 253). Como preceitua Reale, “interpretar uma lei não é explicar a lei, mas é compreendê-la. Não basta ter o espírito lógico, procurando penetrar nas nuances, nos matizes dos textos legais, porque muitas vezes, esse trabalho de mera análise formal leva à deturpação do direito” (2002a, p. 255). Para Weber, a pessoa dotada de vontade “confronta e escolhe os valores em causa segundo a sua própria consciência e a sua própria concepção do mundo” (1979, p. 15). Nos dizeres de Montoro, a realidade física, “é apenas o ‘suporte’ de um ‘sentido’. O importante é compreender este ‘sentido’ ou significação, que está sempre ligada a um valor, porque o homem sempre age em função de valores” (2000, p. 88). O direito é um objeto cultural, “isto é, uma realização do espírito
Uma vez que o presente trabalho busca avaliar o grau de cientificidade da norma ambiental, é necessário entender o conceito destas normas, a que se prestam e como são elaboradas. Vejam-se alguns conceitos de norma trazidos pelo Dicionário Aurélio: a. Aquilo que se estabelece como base ou medida para realização ou avaliação de alguma coisa; b. Princípio, preceito, regra, lei; c. Modelo, padrão; (FERREIRA, 1999, p.1415) A sanção contra sua violação é o atributo que diferencia as demais normas de convivência da norma jurídica, que disciplina a experiência social, objeto do direito (REALE, 2002b; NUNES, 2002), ou seja, contém aplicação de força coercitiva do poder social para protegê-la e, contém a exigência da justiça (MONTORO, 2000). Norma jurídica é, portanto, “a compreensão de um fato enquanto cultural, que se realiza em virtude de uma tomada de posição volitiva, de que resultam juízos de valor, que implicam responsabilidade e sanção” (REALE, 2002a, p. 262). As normas jurídicas são elaboradas de forma genérica e abstrata, adequando-se ao caso concreto, o que dependerá do aplicador do direito, “cujo primeiro trabalho consiste em fixar o verdadeiro sentido da norma e, em seguida, determinar o seu alcance ou extensão” (MONTORO, 2000, p. 369), levando-se em conta para tanto, todo o sistema jurídico vigente, de cuja noção dependerá grandemente o sucesso do ato interpretativo (NUNES, 2002). ”No sistema jurídico os elementos são as normas jurídicas, e sua estrutura é formada pela hierarquia, pela coesão e pela unidade” (NUNES, 2002, p. 246). “Interpretar logicamente um texto de Direito é situá-lo ao mesmo tempo no sistema geral do ordenamento jurídico” (REALE, 2002b, p. 280), cujo trabalho hermenêutico é sempre necessário, sejam obscuras ou claras as palavras da lei ou de qualquer outra norma. “É sempre preciso determinar seu sentido e alcance” (MONTORO, 2000, p. 371). São várias as técnicas para interpretação das normas jurídicas, sendo as principais:
Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles. (CF, art. 61, 2/). As leis complementares têm quorum legislativo especial, ou seja, maioria absoluta (CF, art. 69), cuja qualidade é expressamente conferida pela Constituição Federal. (MONTORO, 2000, p. 336). “A lei ordinária é a norma jurídica elaborada pelo Poder Legislativo em sua atividade comum e típica” (MONTORO, 2000, p. 336). Leis delegadas são elaboradas pelo Presidente da República, por delegação expressa do Congresso Nacional. Os decretos estão hierarquicamente subordinados à lei e prestam-se a regulamentá-la. São emanados diretamente do Poder Executivo e não podem ampliar nem restringir o conteúdo normativo (NUNES, 2002; FERRAZ JR, 2003). E, por fim, há as normas hierarquicamente inferiores, baixadas por órgãos da Administração Pública, como as portarias, resoluções, instruções normativas, circulares, ordens de serviço. Todas devem estar adstritas à lei que as condiciona (NUNES, 2002; FERRAZ JR, 2003). A norma superior sempre prevalece sobre uma hierarquicamente inferior. Da mesma forma, norma posterior revoga norma anterior no que lhe for contrária, respeitando os graus de hierarquia, ou seja, no tempo as normas atingem as hierarquicamente iguais ou inferiores.
Os leigos comumente confundem o direito com a norma jurídica. Não se pode, de fato, vislumbrar um sem o outro, já que a norma é o elemento principal do direito positivado. Uma vez que não é objeto desta tese tratar da epistemologia do direito, mas tão somente situar o leitor quanto ao sistema jurídico ambiental, será feita apenas uma abordagem de forma direta ao assunto em tela, atendo-se tão somente ao conceito atual de direito positivo, sem discussão ideológica. É interessante citar um dos conceitos de direito trazido pelo Dicionário Aurélio, como “ciência das normas obrigatórias que disciplinam as relações dos homens em sociedade” (FERREIRA, 1999, p. 687). Logo, pode-se dizer que o direito corresponde a uma exigência social, que regula o comportamento humano no intuito de assegurar uma convivência pacífica. Ou seja, nos dizeres de Montoro, “é constituído pelo conjunto de normas elaboradas
(^3) Lei 8078/90, art. 81, parágrafo único, inciso I. (^4) Idem. (^5) Idem. (^6) Lei 7347/85. (^7) Art. 225 da Constituição Federal. (^8) Princípio n. 3 da Declaração do Rio de janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (1992). (^9) Constituição Federal, art. 225, § 3/. (^10) Princípio n. 15 da Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (1992)
por uma sociedade determinada, para reger sua vida interna, com a proteção da força social”, sendo fundamentado pelos princípios que advêm do direito natural (2000, p. 34). Para Derani, o direito somente pode ser considerado “enquanto ação e reação da sociedade, sendo composto pelo texto normativo, contudo, não se encerrando nele” (2001, p. 29). Já a norma jurídica é um elemento constitutivo do direito e “se constitui no eixo central ao redor do qual os demais elementos integrantes da ordem jurídica gravitam” (ANTUNES, 2005, p. 12). É a regra ou o princípio instituído formalmente, cuja observância é obrigatória, para definir os procedimentos em sociedade. Conforme José Afonso da Silva, o direito ambiental tem algumas peculiaridades frente aos outros ramos do direito. Apresenta-se não somente como o conjunto de normas jurídicas que tutelam o meio ambiente, mas também como “ciência que busca o conhecimento sistematizado das normas e princípios ordenadores da qualidade do meio ambiente” (2002, p. 28). É difuso, ou seja, não tem titular definido, pertence a todos e a ninguém ao mesmo tempo. Significa que são direitos transindividuais , que nos dizeres de Fiorillo^3 (2002, p. 6), são “aqueles que transcendem o indivíduo, ultrapassando o limite da esfera de direitos e obrigações de cunho individual”. Têm natureza indivisível , e os^4 titulares são indeterminados e interligados por circunstâncias de fato , ou seja,^5 abrange os indivíduos que estão numa mesma condição, numa mesma circunstância fática (FIORILLO, 2002, p. 6). “O dano ambiental tem, assim, uma dimensão subjetiva referida ao interesse pluriindividual, numa relação estreita com a tutela objectiva do próprio bem ambiental” (ANTUNES, 1998, p.70). Sendo o meio ambiente de interesse difuso, é possível a reparação do dano ambiental através da Ação Civil Pública , importante^6 instrumento processual. O Direito Ambiental também possui princípios próprios, tais como o princípio do direito à sadia qualidade de vida , o princípio do desenvolvimento sustentável , o^7 princípio do poluidor-pagador ,^9 o princípio da prevenção 10 , o princípio da
natureza, sobretudo por meio da ciência moderna e da tecnologia. A natureza se constitui numa reserva de recursos naturais a serem explorados pelo homem. Essa dicotomia homem-natureza e o enfoque antropocêntrico ter-se- iam agravado com o surgimento da ciência moderna, em que o mundo natural se torna objeto do conhecimento empírico-racional. Essa ciência, segundo Bacon, tinha por finalidade devolver ao homem o domínio sobre a criação que havia parcialmente perdido com o pecado original. (Diegues, 2002, p. 43), É crescente o número de doutrinadores que entendem que está havendo no atual mundo jurídico brasileiro a ruptura do antropocentrismo no direito. No entender de PHILIPPI JR. e RODRIGUES (2005, p. 14), as normas do Direito Ambiental a cada dia vêm reconhecendo direitos próprios da natureza, independentemente do valor que esta tenha para o ser humano. Para José Robson da Silva ”os fundamentos dos direitos da natureza estão a demandar uma filosofia que não tenha apenas o humanismo como guia e que os direitos dos homens estão a exigir eficácia social” (2002, p. 35). Logo, no entender do mencionado autor, “o sistema normativo nacional, embora antropocêntrico, abre-se para uma perspectiva biocêntrica” (2002, p. 35). Esta é uma discussão que tem avançado em ambos os lados. Para Antunes (2002b, p. 24), em função da atribuição de “personalidade jurídica e processual a coletividades, associações e reconhecimento de algum status jurídico a animais e ecossistemas, tem sido possível a defesa de formas de vida não humana”. Não se pode negar que há uma proteção jurídica ao patrimônio ecológico como um todo. Pode-se até citar o caso da proibição de maus tratos em animais, o que vislumbraria uma típica posição biocêntrica, que nos dizeres de José Robson da Silva, “a proibição de se produzir crueldade contra os animais está a garantir um mínimo de tutela cujo centro é a integridade física dos animais” (2002, p. 342). No entanto, há que se considerar a finalidade desta tutela. Ao defender o novo paradigma (biocêntrico), o mesmo autor assim se manifesta: O ecossistema é uma plêiade de relações de interdependência entre elementos bióticos e abióticos. O desaparecimento de uma espécie animal desequilibra as relações ambientais e compromete a vida em outras espécies. O mesmo ocorre quando do esgotamento de recursos abióticos. Na perspectiva exclusivamente antropocêntrica a preservação dos animais estaria conectada apenas na medida em que esta preservação é fundamental para que situações ambientais desequilibradas não alcancem a pessoa humana. (2002, p. 342)
(^13) Texto disponível em www.dhnet.org.br/direitos/sip/onu/doc/estoc72.htm. Acessado em 9/05/ (^14) Idem. (^14) Idem. (^15) Idem. (^16) Idem. (^17) Idem.
A consciência da importância do ambiente para a sobrevivência do homem está mudando, mesmo a passos lentos, o modo de pensar a respeito da visão de concepção das relações do homem com a natureza, ainda que tal visão não tenha sido expressamente incorporada pela legislação ambiental. No entender de Antunes (1998, p.19-20), “espera-se mesmo que os seres naturais, dispondo de um valor próprio, sejam capazes de se afirmar como sujeito jurídico”. Não se trata, por exemplo, de reconhecer a personalidade jurídica de um animal, mas de respeitar a complexidade de um sistema ecológico como essencial à manutenção da vida. Seguindo o entendimento de Antunes, “o direito que pacifica o oikos deve ser substancialmente um direito objetivo e natural, que constitua a base de uma específica ética da responsabilidade do homem para com o ambiente” (1998, p. 23). Entretanto, no direito brasileiro, as qualidades do meio ambiente ainda não são preponderantes na elaboração das normas ambientais. Conforme se verá no Capitulo 3.3.2, a preocupação mais consciente a respeito das questões ambientais teve início com a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente em Estocolmo, no ano de 1972. Neste encontro foi proferida a denominada Declaração de Estocolmo, na qual foi proclamado que “é o meio ambiente essencial para o bem-estar e para gozo dos direitos humanos fundamentais, até mesmo o direito à própria vida 13 ”. A declaração afirma ainda que “pela ignorância ou indiferença podemos causar danos maciços e irreversíveis ao ambiente terrestre de que dependem nossa vida e nosso bem-estar” 14. Menciona também que “tornou-se imperativo para a humanidade defender e melhorar o meio ambiente, tanto para as gerações atuais como para as futuras” 15. O mesmo documento expressa a convicção comum que “O homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao desfrute de condições de vida adequadas” 16. Para tanto, tais condições devem estar presentes “em um meio ambiente de qualidade tal que lhe permita levar uma vida digna, gozar de bem - estar”^17 sendo caracterizado como “portador solene de obrigação de proteger e
si, mas porque qualquer dano a um bem ambiental pode desequilibrar o meio ambiente como um todo, trazendo um prejuízo aos seres humanos. A partir do texto constitucional sobre o meio ambiente, é inegável a visão claramente antropocêntrica no sistema jurídico brasileiro, ainda que os demais seres vivos tenham proteção jurídica garantida seja na Constituição Federal ou em normas infraconstitucionais. Isto ocorre pela opção do legislador constituinte que, conforme Antunes, “ao atribuir ao meio ambiente a condição de um direito a ser desfrutado pelo Ser Humano, desta e de outras gerações, efetivamente, deu-lhe uma conotação essencialmente política e, portanto cultural”. Este direito a ser desfrutado pelo ser humano deve ainda ser visto como direito fundamental, senão vejamos: Os direitos fundamentais devem ser considerados enquanto direitos jurídicos positivamente vigentes numa ordem constitucional (CANOTILHO, 2002). ...cumprem a função de direitos de defesa dos cidadãos sob uma dupla perspectiva: (1) constituem, num plano jurídico-objetivo, normas de competência negativa para os poderes públicos, proibindo fundamentalmente as ingerências destes na esfera jurídica individual; (2) implicam, num plano jurídico-subjetivo, o poder de exercer positivamente direitos fundamentais (liberdade positiva) e de exigir omissões dos poderes públicos, de forma a evitar agressões lesivas por parte do mesmos (liberdade negativa) (CANOTILHO, 2002, p. 405). Podem ser consideradas normas de direito fundamental, nos dizeres de Lorenzi e Vulcanis (2005, p. 24) quelas expressamente assim definidas pela Constitui o, [...] como aquelas que de alguma forma se relacionam com as normas formais de direito fundamental, [...] para as quais se possa dar uma argumenta o de direito fundamental A Constituição Federal do Brasil de 1988 apresenta elencado no Titulo II os direitos e garantias fundamentais, o que à primeira vista pode fazer crer que, existindo um capítulo exclusivo para tratar do assunto, somente seriam considerados como direitos fundamentais o que lá estivesse apresentado. Tal assertiva não pode prosperar, já que, como será apresentado a seguir, o Titulo II da Constituição vigente não encerra os direitos cuja dimensão pode ser alcançada fora dos parâmetros do mencionado título. Pois bem, para que sejam configurados os direitos como fundamentais, é necessário, “assinalar-lhes a dimensão de Fundamental Rights ” (CANOTILHO, 2002, p. 375). Assim, “a categoria de ‘fundamentalidade’(Alexy), aponta para a especial
dignidade de proteção dos direitos num sentido formal e num sentido material” (CANOTILHO, 2002, p. 375). Para Antunes os interesses considerados fundamentais pelo texto constitucional prescindem ou não são diretamente conotados com aspectos econômicos e patrimoniais reconduzíveis a situações jurídicas de cunho individualista, mas ao invés, exprimem valores diversos – imateriais, éticos (1998, p. 79-80). Quando a Constituição Federal de 1988 elencou, no Título II, os direitos e garantias fundamentais, o fez em cinco capítulos: 1. direitos e deveres individuais e coletivos, 2. direitos sociais, 3. nacionalidade, 4. direitos políticos, e 5. partidos políticos. Com relação aos direitos e deveres individuais e coletivos, apresentam-se: o direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, estando este último vinculado ao atendimento de sua função social. Para a efetividade destes direitos, o artigo 5º da mencionada Carta Magna, apresenta um rol de preceitos, dentre os quais, o inciso LXXIII, que vislumbra a possibilidade de proposição, por parte de qualquer cidadão, de ação popular que vise a anular ato lesivo ao meio ambiente, dentre outros. Atente-se também para o parágrafo 2º do artigo 5º da Constituição Federal que diz: “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. Canotilho, discorrendo sobre as gerações de direitos humanos, menciona que além dos “direitos de liberdade” e os “direitos de solidariedade”, nos quais estariam incluídos o direito ao desenvolvimento e direito ao patrimônio comum da humanidade, há uma terceira geração de direitos denominada “direito dos povos”, que, ainda nos dizeres do mesmo autor, “por vezes (...) são chamados de quarta geração. A primeira seria dos direitos de liberdade (...); a segunda seria a dos direitos democráticos de participação política; a terceira seria a dos direitos sociais e dos trabalhadores; a quarta a do direito dos povos” (2002, p. 384). Aduz ainda Canotilho que A d i s c us s ã o inte rna c io na l e m to rno d o p ro b l e m a d a autodeterminação, da nova ordem econômica internacional, da participação no patrimônio comum, da nova ordem de informação, acabou por gerar a idéia de direitos de terceira (ou quarta geração):